XXXIV| Maldição
Após falar com o general através de um comunicador, avisando que o Nicholas estava sendo mantido preso e muito bem vigiado pelo James, Arthur seguiu até o local onde o Rey disse que estaria.
Como o menino não sabia andar por aquele castelo, o Rey havia instalado as direções no aparelho que o mesmo usara para se comunicar. Arthur não conseguiu conter o sorriso enquanto uma voz robótica dizia em seu ouvido para que direção ele deveria seguir.
Por enquanto, tudo estava tranquilo, e quanto mais tempo as coisas ficassem assim, melhor. Ele já havia até arquitetado em sua mente como iria conseguir se livrar do Yuri sem que o Rey suspeitasse de sua lealdade.
O sorriso presente em seus lábios se alargou um pouco mais graças a esse pensamento, ainda que o seu coração tivesse acelerado com um certo receio. Arthur respirou fundo, impedindo que ideias contrárias e ruins surgissem em sua mente.
Era só ele fazer as coisas exatamente da mesma forma que planejara e tudo ficaria bem.
Ao ouvir a voz robotizada lhe guiar para a esquerda, o mesmo adentrou num corredor e começou a caminhar mais depressa, ansioso para realizar logo o seu plano e todo aquele nervosismo sumir – ou ao menos diminuir um pouco.
A voz soou de novo, e, quando o rapaz seguiu o comando e virou a esquerda outra vez, dando de cara com uma porta, ele a abriu, mas ao ver as pessoas que estavam lá dentro, o mesmo parou de andar e congelou no lugar em que estava.
A porta dava para uma sala não muito grande, porém a mesa larga, as cadeiras e um telão mostravam que aquele era um ambiente na qual poderiam ser feitas reuniões; no entanto, não foi o espaço em si que o afetou, e sim as pessoas que estavam ali – ou melhor, a pessoa.
— Você? — questionou, sem conseguir esconder o choque presente em sua voz. O mesmo engoliu em seco quando o indivíduo que estava ao lado do Rey abriu um sorrisinho felino e o encarou.
O silêncio que recaiu na sala serviu como uma espécie de sinal para o Arthur que, como havia sido ignorado pelo seu superior, rapidamente abaixou a cabeça e entrou ali, sentando-se ao lado do Yuri.
— O Rey decidiu trazer o pupilo dele também — comentou o rapaz de olhos puxados, ao ver que o general e o Lynn haviam voltado a conversarem entre si como se fossem os únicos presentes naquele cômodo.
Instintivamente, Arthur engoliu em seco. O jovem não contava com a presença daquele homem nos seus planos, isso só tornava as coisas mais delicadas do que já estavam e...
Os olhos do garoto de cabelos cacheados se arregalaram ainda mais quando, enfim, a sua atenção foi atraída até a pessoa na cadeira ao lado da do Lynn.
Alephe.
A criança o encarava com um semblante confuso, como se não entendesse o motivo do Arthur estar ali, porém, graças ao ômega, o menino não falou absolutamente nada; porém uma expressão meio pensativa meio acusadora continuou na face do pequeno.
Sem querer parecer tão abalado quanto estava, Arthur desviou os seus olhos da criança e buscou controlar a sua respiração, tentando se manter o mais natural possível enquanto os seus pensamentos eram reorganizados.
A presença do Lynn naquele castelo mudava tudo e, por causa de um único homem, todo o seu plano com o Nicholas e a Daphne poderia ir para o ralo num piscar de olhos.
Um pequeno deslize e as coisas poderiam ficar muito complicadas para o lado deles.
Inquieto, Arthur engoliu em seco e passou as mãos pela calça numa tentativa de se acalmar e de secar o suor que se acumulara em suas palmas.
Pelo canto dos olhos, Yuri observou o nervosismo elevado de Arthur, porém, o mesmo apenas elevou ligeiramente uma das sobrancelhas antes de voltar a atenção para um ponto fixo qualquer. Não era possível dizer se o garoto agora estava refletindo sobre a postura ansiosa do Arthur ou se só estava tentando conter os seus próprios sentimentos, porém, seja o que fosse, o Yuri não podia mais ser considerado um alvo fácil – ele estava alerta.
Com a presença do Lynn, as coisas haviam mudado.
Logo depois de declarar que tiraria todos daquele castelo, Thomas começou a se movimentar pela passagem secreta. Os oitenta e três ex prisioneiros seguiram o jovem, andando todos juntos para não se perderem na escuridão que tomava conta do interior do local, no qual só estava sendo iluminado pela tocha que o capitão da equipe X havia trazido consigo e pela que a Ária e o Kal tinham.
Dois pontinhos de luz guiavam a multidão como um farol em meio ao labirinto que eram as passagens.
— Certo... — iniciou Cássia, mantendo o tom de voz baixo para que apenas os seus companheiros a ouvissem. — Para onde exatamente nós estamos indo? Não será nada fácil sair desse esconderijo com toda essa gente, além do mais, que eu saiba, estamos presos nesse castelo.
Devido aos questionamentos válidos da mesma, os olhares dos demais seguiram até o Thomas na expectativa de que ele tivesse um plano milagroso, afinal, além de estarem em grande número, a maioria das pessoas ali não podiam fazer uso dos poderes para ajudarem em alguma coisa.
Sentindo os olhares sobre si, Thomas parou de andar, fazendo com que, aos poucos, o povo fosse diminuindo os passos até pararem também. Murmúrios começaram a surgir pelo ambiente graças a parada, mas ninguém se atreveu a perguntar nada.
O capitão da equipe X estava com os olhos fixos na escuridão à sua frente enquanto os seus companheiros o encaravam com uma crescente expectativa; até mesmo a Cássia parecia rezar para que ele tivesse algo realmente surpreendente em mente.
— Nós iremos ter que en...
— AAAAAAAAH!
O estridente grito interrompeu a fala do garoto, chamando a atenção dele e de todos os outros presos para o final da fila. Por não conseguirem enxergar ao certo o que estava acontecendo, uma onda de pânico começou a se alastrar entre os prisioneiros, causando gritos, choros, gemidos e uma dose de sons nada agradáveis.
Eles poderiam estar dentro de uma passagem secreta aparentemente segura, mas o grito de oitenta e três pessoas poderia muito bem acabar sendo ouvido por alguém indesejado, o que acabaria revelando as suas posições.
Sabendo disso, Thomas imediatamente olhou para os seus parceiros, como se tivesse estudando qual deles seria melhor para auxilia-lo naquele momento, e, em questão de segundos, o mesmo decidiu a quem pediria ajuda.
— Cássia! — exclamou, e a capitã apenas assentiu antes de criar um campo de força abaixo dos próprios pés, no qual o Thomas também subiu.
O rapaz soltou a mão de Flora com um certo pesar, mas sinalizou para que os seus companheiros permanecessem ali, com uma das tochas iluminando o início da multidão. Logo em seguida, Cássia fez com que a barreira abaixo dos pés dela e dos de seu parceiro seguisse rapidamente até o fim da fila, passando por cima da cabeça dos ex encarcerados que, ao verem ambos indo em direção ao perigo, pareceram se acalmar um pouco mais, depositando as suas esperanças nas mãos deles.
Antes mesmo de chegar ao final, já era possível especular o motivo do alvoroço.
As pessoas estavam caídas pelo solo, e, ao notar isso, o Thomas apoiou a mão no ombro da garota que, devido a esse gesto, fez com que o seu campo de força parasse antes de chegar junto daquele povo.
O capitão da equipe X deu um passo adiante e estendeu a mão que segurava a tocha. Cássia o observou com um olhar sério que logo adquiriu uma certa surpresa ao ver a chama começar a se mexer mais freneticamente antes de serpentear pelo ar, rumo as pessoas desacordadas. A capitã da equipe I não conseguiu esconder o fascínio que sentiu ao ver os olhos violetas do jovem brilharem de um modo sobrenatural, quase como se a gravidade que ele controlava estivesse queimando dentro dele, ansiando para ser liberada em sua totalidade.
Ao ver que o jovem tentava esconder o esforço que estava fazendo para que os seus poderes o obedecessem, ela se questionou até que ponto o menino conseguiria chegar caso ele não tivesse tanto autocontrole, caso libertasse todo aquele poder acumulado dentro de si.
Inconscientemente, ela engoliu em seco.
— Cristal de ópitys — declarou Thomas, assim que a névoa esbranquiçada pôde ser vista graças a luz do fogo.
— Tínhamos fechado a passagem! — respondeu Cássia, piscando algumas vezes para sair de seus devaneios e se concentrar no que estava acontecendo. — Não deveria ter mais nenh...
Antes que a capitã pudesse terminar, Thomas urrou ao mesmo tempo em que ergueu a mão livre, fazendo com que o fogo que antes serpenteava pelo ar sumisse e que o gás, que estava no solo pairando sobre algumas pessoas drogadas e outras inconscientes, fosse em direção ao teto.
Cássia piscou, adaptando a sua vista à pouca iluminação, e imediatamente ergueu um campo de força para impedir que a névoa atingisse os outros. Quando a barreira da menina foi erguida, Thomas abaixou os braços, parando de usar o seu poder, e encarou o caminho escuro pelo qual o gás estava vindo.
— Devem ter aberto a passagem — comentou o rapaz, mantendo o tom de voz o mais tranquilo possível. — Temos que correr. Não podemos mais continuar andando nesse ritmo.
— Correr para onde? — indagou a integrante da A1, que não teve tanto êxito em esconder o seu assombro.
Thomas abriu a boca para responder, porém, assim que os olhos dele focaram na chama da tocha, ele franziu o cenho, adquirindo uma expressão reflexiva e um tanto quanto desconfiada.
— Thomas? — questionou Cássia, incomodada com o silêncio do menino.
Ele permaneceu calado.
Os olhos violetas do mesmo continuaram fixos no fogo, como se houvesse algo de errado nas chamas. De repente, o jovem se virou na direção de uma das paredes e saiu da barreira de sua parceira, usando a gravidade para levita-lo até as pedras que os cercavam. Próximo delas, o garoto aproximou as chamas dali, e um brilho fino serpenteou entre as rachaduras das rochas.
Contra a sua vontade, Thomas deu uma risada ao sentir uma sensação prazerosa surgir dentro de si, fazendo cócegas no seu cérebro e aliviando um pouco de sua tensão.
Bruscamente, ele se afastou da parede, arregalando os olhos devido as reações reproduzidas pelo seu corpo.
— Temos que sair daqui agora — exclamou, ao mesmo tempo em que levitava o seu físico de volta para o local onde a Flora e os demais estavam.
— O que está acontecendo? — perguntou Cássia, tentando acompanhar a velocidade do jovem, e, como estava ansiosa por respostas, a menina só foi notar que o seu tom era alto demais quando os prisioneiros voltaram a murmurar de pavor.
— Há muitas falhas aqui, muitas pedras soltas e rachaduras que... — o jovem parou, decidindo não perder tempo explicando coisas desnecessárias. — O gás está vazando pelas paredes! — expôs, já quando estava perto dos companheiros, que arregalaram os olhos graças a notícia.
— E agora? — questionou Camille, ignorando o grito da multidão atrás deles, que agora espalhavam o boato um para o outro.
Sabe-se lá como ficaria a versão final da fofoca.
— Temos que sair daqui! — declarou Eduardo, em posição de alerta, afinal de contas, os presos que antes os seguiam calmamente agora pareciam prestes a passar por cima deles para escaparem do gás.
Thomas também notou a agitação e, mais por instinto do que por qualquer outra coisa, o rapaz agarrou a mão da Flora outra vez e a puxou, começando a correr.
— Venham — ordenou, mas, mesmo que ele não tivesse dito nada, todos já teriam feito exatamente aquilo.
O coração de Flora acelerou devido aos gritos e aos passos agitados atrás de si, uns empurrando os outros. Se alguém caísse no meio de toda aquela gente, com certeza essa pessoa acabaria sendo pisoteada e deixada para trás. A mesma engoliu em seco e apertou a mão do seu parceiro com mais força, grata por ele ter lhe puxado, pois, caso contrário, a garota não sabia se teria tido reação suficiente para fugir como os outros, não depois de tudo.
A corrida não durou muito, pois foi só questão de tempo para que o Thomas alcançasse uma parede logo a frente, na qual o menino não pensou duas vezes antes de chuta-la, abrindo uma passagem que os levaria para fora daquele espaço.
A porta aberta dava acesso a um dos salões de treinamento usado pelos guardas – que, infelizmente, ainda era próximo ao setor das prisões. Contudo, o ambiente amplo era perfeito para todas aquelas pessoas que estavam com eles e, quem sabe, não daria tempo de desligar as câmeras e se trancarem ali dentro? Assim eles teriam mais tempo para pensar em como iriam agir.
Ao sair de dentro das passagens escuras, Thomas arregalou os olhos.
Dos oitenta e três ex encarcerados, quinze a vinte deles haviam sido deixados para trás, desacordados ou pisoteados pelo alvoroço. Além do povo sem poderes, que agora eram menos de setenta pessoas, ainda havia a Flora, a Cássia, a Ária, o Kal e a Camille para lutarem do lado do Thomas, porém...
Como isso poderia ser suficiente contra o dobro de soldados altamente armados, protegidos e muito bem preparados que os aguardavam naquele espaço?
Theo Brytleofber, primogênito e herdeiro do trono de Bry, ergueu-se bruscamente da cadeira ao ver a cena através das câmeras.
— O Thomas está ali?! — indagou, sem conter o choque presente em sua voz e rosto. Os homens da sala de controle ficaram em silêncio, revelando estarem tão chocados com aquilo quanto o futuro rei.
Imediatamente, o príncipe seguiu até o canto daquele cômodo para pegar um comunicador. Ao fazer isso, ele tentou falar com o Thadeu ou com o Thales para saber o que havia acontecido, contudo, como nenhum dos dois atendeu, o homem bufou furiosamente e jogou o aparelho com tudo no chão, quebrando-o.
— Eu quero o Thomas vivo! — exclamou, fazendo com que os demais que estavam ali se arrepiassem de medo antes de assentirem e começarem a tomar as providências para que a ordem fosse atendida.
— Acho que nenhum soldado seria louco a ponto de tentar matar um Brytleofber, principalmente o “perfeito” — comentou um dos que estavam ali, e, quando o indivíduo sentiu a atenção de Theo ser levada até si, o mesmo pareceu se arrepender por ter aberto a boca.
Porém, para o imenso alívio deste homem, o Theo logo voltou os olhos para o telão, mostrando-se mais preocupado com o que se passava ali do que com o comentário do seu servo, que suspirou e pareceu agradecer a tudo o que fosse mais sagrado pelo livramento.
— Como ele conseguiu escapar? — sussurrou, com os olhos violetas fixos na câmera que mostrava o rosto de seu irmão mais novo. — Eu não me surpreenderia se isso tivesse acontecido sob o olhar do Thadeu, mas o Thales não é tão descuidado e fraco. O Thomas com certeza teve ajuda — murmurou, enquanto tentava pensar em alguém que pudesse derrotar os seus dois irmãos. Ninguém veio a sua mente. Nem mesmo o Thiago conseguiria. — Parece que temos mais uma peça importante nesse tabuleiro.
O seu coração estava tão acelerado que era quase possível ouvi-lo retumbando em seus ouvidos.
Ver o seu pai segurando a sua mãe daquele jeito havia acendido uma fúria ardente no interior de Thiago, e, enquanto os seus olhos violetas encaravam o rei de Bry, o jovem tentou buscar dentro de si todo o autocontrole que aprendeu para se manter calmo.
Mas nem todo o treinamento do mundo conseguiria tranquiliza-lo.
Quando um murmúrio baixo, quase inaudível, alcançou os seus ouvidos, Thiago levou o olhar até a sua mãe, mas só por tempo o bastante para ver se ela estava bem – ele não podia ignorar a presença de seu pai, era arriscado demais.
No canto daquela sala, com a postura erguida mesmo perante a gravidade pesando arduamente, Dara Brytleofber observou o filho e, ao notar que tinha a atenção dele, a mesma balançou a cabeça de um lado para o outro, mandando o homem sair dali e não ser louco o bastante de arrumar briga com o Thor.
Thiago fechou os punhos, fazendo com que a sua armadura emitisse um barulho mecânico fino devido a força do gesto.
Quando mais novo, a mãe havia feito com que ele e o Thomas fugissem. Ela havia arcado com as consequências daquilo sozinha, mas agora, depois de todo esse tempo, o homem não podia permitir que isso acontecesse uma segunda vez, não quando ele havia treinado tanto só para esse momento.
As coisas eram diferentes agora. O Thor não sabia mais os seus truques ou o grau da sua periculosidade. O mesmo valia para si, mas o Thiago sentiu que podia contornar essa situação, afinal, querendo ou não, o seu pai estava ficando velho.
Thiago Brytleofber terminou o ginásio com antecedência e excelência, sendo chamado de garoto prodígio. Ele passou do grau bronze para o diamante num piscar de olhos e, após derrotar quatro treinadores de elite usando seu próprio esforço, artimanhas e inteligência, o homem havia conquistado a sétima cadeira. A sua posição era alta, diferente de quando o mesmo saíra daquele castelo.
Apenas as outras seis cadeiras, a Classe S, o conselheiro do Ômega e o próprio Ômega estavam acima de si. Dessa vez, ele tinha chance de bater de frente com o seu progenitor.
As coisas eram diferentes.
— Não acha melhor fugir de novo? — questionou Thor, após um momento de silêncio e troca de olhares. — Ou você acha que vai me derrotar, três?
Três. Por um instante, Thiago foi levado de volta para o passado.
Durante os treinos, o rei costumava chamar cada um dos filhos pela ordem que haviam nascido. Theo era o número um, Thales o dois e assim sucessivamente. O seu pai dizia que, no campo de batalha, laços sanguíneos e amizades não importavam, cada um deveria se virar para que pudessem alcançar o que almejavam: a vitória.
Chamá-los por números, ao invés de pelos nomes, era um lembrete para todos de que o Thor não iria pegar leve, um lembrete de que aquele homem era capaz de fazer qualquer coisa para ter filhos fortes que fossem capazes de manter o reino em suas mãos.
E agora, que ele chamara o Thiago dessa forma depois de tantos anos, era óbvio que ele o estava desafiando a enfrenta-lo.
O rei estava deixando claro que o Thiago não seria visto como filho naquela luta, e sim como um inimigo, um traidor da coroa. Thor Brytleofber definitivamente não iria pegar leve ou subestima-lo.
Tendo completa noção disso, Thiago colocou a máscara da armadura de volta no rosto e, com a voz grave e robotizada, provocou;
— Eu não derroto os meus oponentes, zero — um brilho predatório surgiu nos olhos do rei ao ser chamado daquele modo. Thiago havia aceitado o desafio. — Eu os ensino a não me desafiarem outra vez.
Num rompante, o treinador de elite se direcionou ao rei de Bry; a sua armadura lhe conferiu uma velocidade inumana, fazendo com que o jovem alcançasse o pai em questão de segundos.
Thor nem mesmo piscou perante a aproximação repentina, e, sem que ele precisasse mexer um centímetro do seu corpo, a gravidade que o governante controlava reagiu ao seu favor, parando o punho de Thiago no ar, impedindo que um soco atingisse a sua face.
Incapaz de prosseguir com o golpe devido ao peso dos poderes do rei sobre o seu braço, a armadura de Thiago abriu pequenos compartimentos que ficavam nos dedos, fazendo com que o Thor finalmente saísse do lugar para evitar que um raio violeta o acertasse.
O rei lançou um olhar para a parede na qual os raios haviam acertado, mas ele não pareceu surpreso ao ver que as pedras do cômodo haviam derretido, abrindo um buraco para a sala ao lado.
Sabendo que era a sua vez de contra-atacar, Thor Brytleofber aumentou o peso de sua habilidade, obrigando o Thiago a permanecer imóvel. Sem perder tempo, o governante segurou o capacete que protegia a cabeça do filho e, ao fazer isso, uma onda sinistra emanou de sua mão. O ar ao redor do punho do rei parecia ter se distorcido devido a gravidade, como se o mesmo tivesse conseguido deixar o ar denso e maleável como uma espécie de gelatina transparente.
Os olhos violetas do homem brilharam, como se o poder dentro dele estivesse implorando para ser usado ainda mais. Imediatamente, e com um certo prazer, o governante jogou a cabeça do Thiago até o chão, fazendo com que o solo reverberasse devido a força do ataque, emitindo um tremor parecido com o de um leve terremoto.
Thor se abaixou, apoiando-se em um dos joelhos, e apertou o capacete da armadura com mais força, fazendo com que o ar ao redor do objeto começasse a tremer. Devido a força da gravidade, o chão ao redor da cabeça do jovem começou a rachar e a afundar, não suportando o peso que estava sendo colocado ali.
Era impossível erguer a cabeça novamente, e o Thiago tinha plena certeza disso.
O capacete que o protegia chiava, tentando combater a pressão esmagadora que estava sendo colocada. No entanto, quando o treinador de elite pensou em mexer o corpo, todo aquele peso pareceu se alongar pelo seu físico, paralisando-o completamente.
Thor Brytleofber tinha gravitocinese pura. A extensão dos poderes dele eram enormes e avassaladoras. Thiago engoliu em seco. O Thomas carregava aquilo nas veias também, e o treinador de elite havia criado a sua armadura para conseguir suportar esse peso – ele até já havia pedido para o seu irmão usar os seus poderes nele para testar a resistência. No entanto, por mais que o Thomas já houvesse usado a gravidade em si, o Thiago sabia que os poderes de seu pai estavam muito mais maduros. Ele se perguntou por mais quanto tempo a sua proteção iria suportar aquilo.
A luz da sala atingiu os olhos do Thiago antes mesmo dele ouvir o barulho do capacete se quebrando ao meio. E, antes que ele pudesse pensar em fazer qualquer coisa, a mão quente de seu pai agarrou a sua nuca. O peso da gravidade empurrou a sua cabeça para baixo, e aquele poder pareceu fazer o cérebro do jovem tremer enquanto alguns estalos eram emitidos pela sua cabeça, que não suportava a pressão que era exercida sobre si.
Thiago abriu a boca, deixando escapar um gemido excruciante devido a sensação de ter o seu crânio sendo esmagado, porém, quando um grito horrível saiu de sua garganta, o treinador de elite mordeu os lábios com força como se estivesse impedindo a si mesmo de proferir algo. Ele não queria dar mais aquela satisfação ao seu progenitor.
Contudo, sem que ele pudesse controlar, lágrimas escorreram de seus olhos.
Ele havia treinado tanto, mas, ainda assim, não havia sido o bastante.
— Eu posso esmagar a sua cabeça facilmente, três — anunciou Thor, sem se mostrar abalado com aquela situação; era quase como se o mesmo já soubesse que o resultado final seria aquele. — Você é patético — declarou, com a voz cheia de desprezo.
Patético. A palavra ecoou pela mente do Thiago.
O nível de habilidade entre ele e o pai ainda era um abismo. Era como se todos os treinos, as noites em claro, as missões, as provas e as dores que o jovem havia suportado e passado durante todos esses anos não valessem de nada. Será que o Theo e o Thales, seus dois irmãos mais velhos, estavam tão mais poderosos que ele também?
Thiago Brytleofber sempre soube que seria inferior a seus irmãos durante um combate, afinal, ele havia herdado apenas a inteligência. O dom monstruoso da gravidade era muito mais eficaz em um campo de batalha. Era por isso que o mesmo havia criado aquela armadura, mas o poder do seu pai se mostrou mais forte. Será que os seus irmãos conseguiriam quebra-la também?
Theo tinha herdado a gravitocinese do pai e o Thales conseguia tornar a gravidade mais pesada – só que não era capaz de fazer as coisas flutuarem. Talvez, se tivesse enfrentado eles, a sua proteção teria aguentado. Thor Brytleofber era diferente – os poderes dele eram latentes, puros.
Thiago sentiu a garganta queimar devido ao choro.
Ao ver o seu progenitor agarrar a sua mãe daquela forma, o treinador de elite havia abandonado todos os seus instintos e entrado numa luta sem se preparar com antecedência. Ele havia deixado de lado toda a vantagem que a sua inteligência poderia lhe conferir para bater de frente com o rei.
Agora, não só a sua mãe iria apanhar, mas ele também – ou pior.
Thiago nunca havia se sentido tão estúpido.
— Eu sempre soube que você era um caso perdido. Talvez, se não tivesse fugido como o covarde que é, você estaria mais preparado — o rei riu de maneira amarga. — Sinceramente, o que você fez durante esses anos? Que decepção, três. Garanto que não sentirei remorso nenhum depois de m...
Repentinamente, o homem se calou.
O silêncio foi tão intenso e pesado que quase era possível escutar as batidas dos três corações que haviam naquela sala. Contudo, um desses três corações estava mais acelerado, seja pelo medo, seja pela surpresa.
Com certeza Thor Brytleofber não esperava ter uma adaga de Dinks rente ao seu pescoço.
— Mexa-se e será um homem morto — anunciou Dara, pressionando a lâmina no pescoço do marido com um pouco mais de pressão, fazendo um filete de sangue escorrer.
Sem o peso da gravidade sobre si, Thiago se ergueu aos poucos, ainda com a cabeça um pouco tonta. Uma enxaqueca atingiu o jovem quando o mesmo se levantou, e ele precisou de alguns segundos antes de conseguir focar os olhos em sua mãe e na cena que existia em sua frente.
Por um momento, o estômago do rapaz se revirou e o seu corpo tremeu, ameaçando ceder, mas a armadura que ainda estava cobrindo o seu físico impediu que o jovem desabasse.
— Saia — ordenou a rainha, e o Thiago franziu o cenho, visivelmente sem querer obedecer. Aquela era a chance perfeita de acabar com o Thor. — Por favor — suplicou a mulher, fazendo o filho encara-la com um olhar aflito.
Thiago deu alguns passos hesitantes para trás, confuso. O jovem queria ignorar o pedido de sua mãe, afinal de contas, aquele era o momento ideal para matar o governante de Bry. No entanto, mesmo que o homem ansiasse por acabar com o pai, ele não foi capaz de passar por cima da ordem de sua progenitora, não depois de tudo o que ela já fizera por ele.
Notando a dúvida de seu filho, Dara fez um sinal com a cabeça para que ele se retirasse, porém, o Thiago franziu ainda mais o cenho, mostrando que queria entender o motivo daquele pedido, contudo, o mesmo só recebeu um sorriso como resposta. O jovem observou o semblante da mãe com uma certa angústia e ficou assim por alguns segundos, como se precisasse desse tempo para decorar cada traço presente na face da mesma.
Algo dentro do Thiago supôs que aquela seria a última vez que ele a veria, mas o treinador de elite afastou esse sentimento.
Você não pode morrer. O homem pareceu dizer isso para a mãe através do olhar preocupado, e, para a felicidade do mesmo, Dara pareceu ouvi-lo, ainda que ele não tivesse proferido nada. Então, um sorriso mais confiante surgiu no canto dos lábios da mulher, que o encarou intensamente.
A típica expressão que ela utilizava quando tinha um plano bem arquitetado em mente.
Ela tinha uma estratégia e estava fazendo as coisas visando alcançar um objetivo maior que o Thiago ainda não conhecia. De certa forma, isso o tranquilizou. Agarrando-se a essa esperança o jovem contrariou todos os seus instintos e deu as costas para a sua mãe, entretanto, quando o rapaz saiu daquela sala, uma parte de si pareceu ficar para trás.
Quando só ficou a Dara e o Thor naquele ambiente, a mulher fechou os olhos por alguns minutos. Ela não era mãe apenas do Thiago e do Thomas, mas a mesma havia desistido de tentar se conectar com os outros depois de tudo. Agora, Dara estava perto de criar um vínculo com o Thales e, por mais egoísta que isso pudesse parecer, ela não queria abandona-lo.
Não outra vez.
A mulher também não gostava da ideia de ver o Thiago tendo que matar o pai, por mais que o homem merecesse esse destino. Ademais, ela poderia tentar contornar o seu marido, mas, se ele falecesse e o Theo virasse o novo regente, Dara não teria como controlar o filho, afinal, a mesma era praticamente uma estranha. Independente da punição que fosse receber, era melhor o Thor permanecer no poder por mais algum tempo.
Dara Brytleofber soltou um suspiro e abriu os olhos, afastando os pensamentos antes de observar, com os olhos levemente marejados, a porta que o Thiago havia passado há pouco.
— Essa é uma das poucas decisões que já tomei em minha vida na qual não me arrependo — sussurrou para si mesma, baixo o bastante para que o seu marido não escutasse.
Em seguida, ela afastou a adaga do pescoço do rei, fazendo com que a gravidade do local voltasse a ficar pesada, indicando que o homem havia recuperado os poderes. Mesmo após ele se erguer, Dara continuou de joelhos no solo, e a mulher só ergueu a cabeça quando o Thor pôs um dedo em seu queixo, levantando-o para que ela pudesse encara-lo.
Por um instante, uma certa angústia passou pelo olhar do governante, quase como se uma parte dele ainda se recordasse de tudo o que ambos haviam passado juntos, contudo, esse sentimento logo sumiu, dando lugar a seriedade de sempre.
— Eu preciso de você, da sua inteligência... — Dara sabia que era isso que ainda o mantinha com ela. O Thor que um dia ela conhecera, ou achava que conhecera, estava morto, dando vida ao rei arrogante e brutal de Bry. Porém, o que mais a afetou no momento foi saber que a mesma havia testemunhado toda a mudança de seu marido sem nem poder fazer nada para impedir que ele se tornasse quem era hoje. O pior era que, mesmo depois de tudo, uma parte dela ainda sentia carinho por ele. A Dara mais jovem, que ficara encantada com a coragem e a determinação que um menino de rua tinha por se manter de pé mesmo tendo perdido tudo, todavia, agora que o “menino” havia conseguido ter tudo, o poder o havia enlouquecido, transformando-o no homem de hoje. Dara se perguntou se as coisas teriam sido diferentes caso não tivessem tomado o controle daquele reino. Eles haviam pegado o caminho mais fácil e brutal para conquistar o trono e a glória, mas o preço havia sido alto demais. Mais do que a mesma havia esperado. — ... e eu a terei... – prosseguiu Thor. — ... nem que para isso eu precise usar a “maldição”.
Imóvel devido ao choque, a rainha nem piscou quando o homem tocou na testa dela, usando a gravidade para esmagar um pouco o seu cérebro e deixa-la inconsciente.
Maldição. Uma das armas mais amadas pelo governo criada no reino Valir, o mais avançado tecnologicamente. Muitos já ouviram falar dessa arma, mas poucos viram o seu real efeito.
Com a mulher desacordada, Thor a pegou nos braços e a observou com um olhar neutro, como se tivesse refletindo sobre o que planejava fazer, contudo, o rei logo suspirou, como se estivesse deixando aquilo para outra hora. Depois, o homem colocou a rainha numa cadeira, prendeu-a ali para que a mesma não voltasse a atrapalhar e saiu daquele espaço, fechando a porta do cômodo pra garantir que ninguém a encontraria facilmente.
Com passos silenciosos e calmos, Thor Brytleofber caminhou para longe daquele espaço, visando acabar de uma vez por todas com a confusão que estavam fazendo no seu território.
E aí gente, tudo bem?
Estou passando no final do capítulo pra lembrar vocês de deixarem uma estrela ☆ e um comentário dizendo o que vocês acharam ♡
Preparem os seus corações.
Um abraço e até breve.
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