XIII| Arrependimento
A notícia de que Diego não estava na mesma prisão que os demais chocou a todos.
Dentre os integrantes do grupo de Cássia, a Ária foi a que mais demonstrou preocupação em seu semblante. Além do sumiço do Kal, que tinha deixado a garota bastante tensa e amedrontada, agora o seu amigo, seu companheiro de equipe, estava desaparecido também. Essa informação havia deixado a moça abalada, fazendo com que a mente da mesma a levasse de volta ao passado – ao fatídico dia da morte de James e Yuri.
Sim, ela sabia que eles estavam vivos, mas... não eram os mesmos. O James e o Yuri que ela um dia conhecera estavam realmente mortos, e a Ária não queria sentir a sensação de perder os seus amigos novamente.
Ela não sabia se poderia suportar passar por aquilo outra vez.
Uma emoção desesperadora apertou sua garganta, fazendo com que a menina respirasse com dificuldade e de uma maneira descontrolada. Ela não podia ficar ali parada. Não podia deixar que levassem o seu companheiro sem que ela pudesse fazer algo para impedir – não de novo.
Ela definitivamente não iria passar por aquilo outra vez!
— Está tudo bem? — questionou Arthur, tirando-a de seus devaneios ao pôr a mão sobre o seu ombro como forma de consolo.
A garota piscou algumas vezes, um pouco atordoada com toda a situação.
— E-Eu... — ela engoliu em seco, como se estivesse engolindo a vontade de chorar junto à sua saliva. — ... quero achar o Diego. Não posso deixar que... — seus olhos arderam devido as lágrimas que forçavam a saída; — ... ele mude também.
Arthur franziu o cenho.
— Que ele mude?
Ária assentiu, virando o rosto para encara-lo com um sorriso torto; uma mera linha falsa criada em seus lábios para tentar esconder a real amargura que a consumia por dentro. Ela não queria transparecer seus traumas para o seu parceiro.
— Não é nada de mais, eu só quero que o Diego seja o mesmo de sempre quando eu o reencontrar, entende? — Arthur inclinou a cabeça, um pouco confuso com o que a menina dissera. — Eu gosto muito dele, não suportaria se ele mudasse.
O jovem a observou intensamente. O olhar dele parecia levemente entristecido; era como se o mesmo estivesse sentindo remorso pela companheira, todavia, ao perceber que se sentia dessa maneira, o menino fechou os olhos com força e, quando tornou a abri-los, eles estavam neutros e sérios outra vez – o mesmo olhar que possuía quando entregou o Kal ao Rey.
— Vamos procura-lo juntos!
Ária ergueu as sobrancelhas, surpresa com a fala do garoto de cabelos encaracolados.
— O quê? Espera, é sério?! — um pequeno sorriso esperançoso se formou nos lábios dela.
Este sorriso também ocupou a boca do rapaz quando ele concordou com a cabeça e se virou para a Cássia com um olhar decidido.
— Nós vamos dar uma volta pela prisão para procurarmos o Kral e o Diego! — declarou, fazendo com que a moça de cabelos trançados desviasse o olhar da cela para guia-lo até o rapaz.
Ela estreitou os olhos perante a ideia dele.
— Não.
Ária chegou a erguer as sobrancelhas de espanto devido a grosseria presente na voz de Cássia. A capitã da A1 não fez a menor questão de ser delicada na hora de negar a sugestão de Arthur, que também pareceu surpreso com a severidade da jovem.
— Por que? — insistiu o rapaz. — Não vamos demorar!
— É arriscado.
E não confio em você. Essa frase provavelmente passava pela mente de Cássia enquanto a mesma encarava duramente o garoto, que estava entre os principais suspeitos de sua curta lista de possíveis traidores.
— Nós vamos! — rebateu, firmemente. — A Ária está preocupada com os meninos e eu não vou ficar aqui de braços cruzados se tenho a chance de procura-los. Não posso ficar parado esperando que os matem! — exclamou, guiando a sua atenção até a Ária, que havia arregalado os olhos por conta da fala dele.
— Não vá! — vociferou Cássia, fazendo com que a garota se encolhesse um pouco perante aquele tom de voz extremamente rígido e autoritário.
Arthur balançou a cabeça de modo negativo.
— O que você quer fazer, Ária?
Quando o jovem fez essa pergunta, a mesma alternou o seu olhar entre os dois enquanto pensava em qual deles iria ouvir. Naquele momento, aquela já não era mais uma situação onde ela deveria simplesmente escolher entre a opinião de Arthur ou a de Cássia; era uma guerra entre a emoção e razão.
Seu lado racional e emocional disputavam o controle de suas ações, e a Ária não tinha muito tempo para decidir qual dos dois lados iria controla-la.
Assim que a reunião dos governantes do reino Bry findou, o Thadeu retornou ao seu quarto. No momento em que o mesmo adentrou em seu cômodo, a primeira coisa que ele fez foi levar a sua atenção até a Flora e, ao vê-la desacordada, um sorrisinho irônico se formou em seus lábios.
— As pessoas que invadiram o castelo provavelmente querem te salvar também... — murmurou, sem tirar os seus sombrios olhos da moça. — Na verdade, eu realmente não ligo se todos os outros prisioneiros escaparem, mas você fica. Além disso, eu adoraria se, por algum milagre, fosse o meu irmão quem viesse atrás de você. Mal posso esperar para revê-lo.
Ao dizer isso, o garoto retirou uma faca de dentro de um compartimento de sua calça preta e a fincou com tudo num pequeno móvel que ficava ao lado de sua cama. Como o objeto estava afiado, não foi difícil afunda-lo na madeira.
— Irei mata-lo com as minhas próprias mãos, porém, como essa será uma ocasião especial, primeiro eu farei questão de tortura-lo da forma mais lenta e dolorosa possível, mesmo que a minha especialidade seja fazer isso rápido. Bem, abrirei uma exceção para ele, afinal, um traidor não pode ter uma morte rápida — murmurou, ao mesmo tempo em que abria um sorrisinho insano. — Quem trai a própria família não é digno nem do chão em que pisa.
Ao terminar de amaldiçoar o seu irmão mais novo, o Brytleofber retirou a faca afiada de seu móvel e a guardou novamente num bolso que ficava na altura de sua coxa. Em seguida, seus olhos seguiram até a Flora, e uma expressão um tanto quanto pensativa se formou em sua face ao observa-la.
— Eu poderia tirá-la daqui, todavia, quando descobrirem que você está comigo, o Thomas com certeza vai se lembrar que eu sempre trago os meus souvenirs para a prisão que há em meu quarto... — proferiu, rindo.
De imediato, o jovem tocou no relógio que estava em seu pulso e, graças a isso, a tela do objeto se expandiu para um pequeno holograma. O rapaz começou a mexer com bastante velocidade na imagem projetada em sua frente até, enfim, apertar o botão de chamar; indicando que iria se comunicar com alguém, e, pela quantidade de nomes que havia tocado, não eram com poucas pessoas.
— Vou preparar uma surpresinha para o meu caçula, até porque, captura-lo está no topo da minha lista de prioridades. Nem mesmo a morte do Rey me chama mais atenção do que isto.
O lado emocional de Ária venceu.
Mesmo com os protestos de Cássia, a garota decidiu que não podia simplesmente permanecer parada. Ficar sem fazer alguma coisa a fazia pensar, e ela não desejava isso, pois a sua mente refletia demais – e dava bastante ênfase as coisas ruins que poderiam acontecer.
Sendo assim, a menina logo começou a caminhar com o Arthur pela prisão, chegando a descer ao andar onde estavam anteriormente – no qual o rapaz havia “perdido’’ o Kral de vista – pois pensavam que as chances de achar o rapaz da A1 seriam maiores se eles procurassem por ali.
E realmente eram, afinal, o Arthur sabia muito bem aonde o Kral estava sendo mantido.
— Obrigada por vir comigo — proferiu ela, assim que o seu companheiro parou em frente a uma porta. A porta que os levaria até o depósito em que o Kal estava preso. — Eu já perdi amigos para a Divisão e... ou melhor, eu achei que perdi. Não se pode perder o que nunca teve, não é?
O jovem hesitou em segurar a maçaneta da porta perante o comentário da moça.
— Como assim?
Ela riu. Uma risada amarga, cheia de dor.
— O James e o Yuri eram do meu time...
Arthur ergueu as sobrancelhas. Ele sabia muito bem quem aqueles dois eram – e a quem pertencia a lealdade deles.
— Eu pensei que os conhecia e, até hoje, ainda não consigo acreditar que eram espiões... Talvez eles estejam sendo forçados a ficar do lado do governo ou...
— Não estão.
Devido a essa afirmação, a garota chegou a inclinar um pouco a cabeça para o lado, confusa com tamanha certeza que estava presente no tom de voz de seu parceiro.
— Quer dizer... foi o que me pareceu quando lutamos naquele dia, não é?! — desconversou, citando a ocasião em que eles se encontraram na floresta de Bry após fugirem da confusão que estava acontecendo no local onde outrora ocorrera o exame de prata.
A moça abriu um sorriso fraco e assentiu, deixando claro que se lembrava muito bem desse dia.
— Bem, depois que eles “morreram", eu tentei não me apegar tanto a outras pessoas pois tinha medo de perde-las também, mas a presença do Diego e do Ryan foi tão agradável e divertida para mim que, quando menos notei, já havia me apegado a eles — confessou, abrindo um sorriso ao relembrar dos bons momentos que passara com os companheiros. — E o nosso laço se fortaleceu ainda mais depois que a Isis se foi. Eles me apoiaram muito — disse, ao mesmo tempo em que levava os seus olhos esperançosos para o Arthur, que a encarou com uma certa condescendência. — Eles são amigos mais chegados que irmãos, e eu os amo muito. Além disso, com o tempo, também me apeguei ao time X, ao Kral, a você e até a Cássia — prosseguiu; seu semblante já era mais tranquilo. Falar de seus companheiros a havia reconfortado e lhe passado uma prazerosa sensação de segurança. — Vocês são como uma família para mim, por isso não quero que nada e nem ninguém os machuque, mesmo que para isso eu precise...
Ela se interrompeu, baixando o olhar. Parecia assustada com o fato de que as suas palavras eram bastante sinceras e que ela realmente não teria medo de morrer por eles.
Por qualquer um deles.
— Até eu?
Ária levantou a cabeça para encara-lo com um olhar confuso.
— V-Você também me considera sua... família?
A menina sorriu; os olhos dela o encaravam de uma maneira tão gentil que o rapaz nem precisou que ela o respondesse com palavras. Completamente chocado com aquilo, o jovem não teve como não arregalar os olhos; atordoado.
Um arrependimento arrebatador o atingiu, fazendo com que o menino começasse a tremer dos pés a cabeça.
— E-Eu fiz uma coisa — admitiu ele; sua postura havia ficado cabisbaixa e já era possível notar que o mesmo estava bem angustiado.
Sem perder tempo, a Ária se aproximou do menino e apoiou a sua mão no ombro dele, da mesma forma que ele havia feito com ela quando a mesma estava precisando de consolo momentos atrás. Os olhos da moça exalavam preocupação devido ao tremor que se instalava no corpo de seu parceiro.
— O que você fez? — sua voz saiu de um modo bastante terno; coisa que só deixou o garoto mais aflito ainda.
Ele ergueu a cabeça para encara-la, revelando através de seus olhos o turbilhão de emoções que havia dentro de si. A intensidade do olhar do jovem foi tanta que acabou fazendo com que a Ária erguesse as sobrancelhas, espantada e, ao mesmo tempo, apreensiva com a situação dele.
Ela conhecia esse olhar de desespero. Já o havia visto muitas vezes no espelho após a perda de seus amigos.
— Eu...
O menino tentou falar, porém logo chacoalhou a cabeça de um lado para o outro e se calou.
— ... não posso.
Ária se aproximou mais dele, ansiosa para saber o que o atormentava. Ela não aguentava mais vê-lo daquele jeito.
— Arthur, o que está acontecendo? Você não pode o quê?!
O menino segurou os ombros da companheira, que apertou o dele com mais força devido a essa ação como se, por meio disso, pudesse tentar reconforta-lo de alguma forma.
— E-Eu gosto muito de vocês! — anunciou ele; os olhos marejados. Ária o segurou com ainda mais força, alarmada com aquilo. — Muito. Mas eu não posso voltar atrás, não dá para trai-los... Eu não quero morrer! — murmurou, com as lágrimas escorrendo pela sua face. — Eu juro que faria tudo diferente se eu pudesse, mas eu não tinha família nem ninguém para cuidar de mim e eles me deram dinheiro! E-Eu pensei que eles eram bons, mas depois me obrigaram a trabalhar para eles como forma de “devolver” a grana que me deram e, depois, ficou impossível sair! No começo eu pensei que iriamos ajudar os outros, porém, com o tempo, foram acontecendo coisas que eu não concordava e... Por Envyr, se eu soubesse que fosse assim eu juro que não m... — ele parou, devido aos soluços.
Mesmo sem compreender direito sobre o que o parceiro estava falando, a Ária imediatamente o puxou para um abraço.
Ele retribuiu. Com força.
— Perdão, por favor, me perdoe! — implorou, e, antes que a garota pudesse perguntar o por que das desculpas, o mesmo rapidamente abriu a porta que estava perto deles e a empurrou para dentro, trancando-a no mesmo ambiente que o Kral.
A princípio, quando ela avistou o companheiro, a moça não teve como não sorrir de alívio, contudo, assim que notou o olhar aterrorizado do garoto, o seu sorriso sumiu. Confusa, a mesma se virou para a porta na qual havia entrado, e, quando tentou abri-la, gemeu ao sentir o Dinks que cobria a maçaneta e o resto daquela entrada.
Ela não demorou para sacar que estava presa ali dentro.
Do outro lado, Arthur tremia mais que antes. Estava em pânico. Todavia, ele não podia simplesmente ajudar os seus companheiros e ignorar as ordens do governo; não se ele quisesse continuar vivo.
E ele queria.
— Cássia! — exclamou Arthur, assim que retornou ao local onde a capitã da equipe I estava. Inicialmente, a moça parecia tranquila conversando com os seus companheiros de time – que estavam presos do outro lado daquele vidro resistente –, contudo, assim que ela tirou os olhos deles e os levou até o jovem, os mesmos se estreitaram rudemente.
Ao ver a expressão de desprezo na face dela, o menino engoliu em seco e imediatamente parou de se aproximar dela, pois aquele olhar hostil da garota já havia revelado a ele que a mesma sabia o por quê de a Ária não estar ali.
— Eu não q...
— Não dê uma de estúpido, seu pérfido! — gritou; um brilho arroxeado perpassou pelos olhos pretos da capitã por alguns segundos, revelando o tamanho da sua indignação. — Diga de uma vez, você é o traidor, não é?!
Era uma pergunta retórica, visto que a Cássia já sabia perfeitamente a resposta para aquilo. Mesmo assim, o rapaz ainda tentou abrir a boca para proferir algo, todavia, no momento em que os olhos surpresos daqueles que estavam na cela foram em sua direção, o mesmo deu alguns passos para trás e baixou a cabeça, envergonhado de si próprio.
Sem demora, uma aura roxa tomou conta dos punhos da integrante da A1, e, sem contestar nada, o Arthur apenas ajeitou a postura e ergueu as mãos para ficar em posição de combate. Não havia mais o que explicar ali, e, mesmo se ele quisesse explicar algo, era nítido que a Cássia não iria ouvi-lo.
Num movimento rápido, a garota criou um campo de força e, assim que fez impulso para move-lo, o Arthur fechou os olhos; esperando o golpe. Porém, quando o barulho da barreira se chocando contra outra coisa – que claramente não era ele – ecoou, o mesmo tornou a abrir os olhos, confuso.
A capitã estava usando as habilidades para tentar quebrar o vidro que prendia os seus amigos, mas não estava tendo tanto sucesso naquela ação. Sem pensar duas vezes, o jovem fez menção de ir ajuda-la, entretanto, na mesma hora que pensou em fazer isso, o seu corpo parou e a sua mente se abriu para um problema no qual ele não havia pensado antes.
Haviam câmeras por ali.
Se o Rey visse que ele ajudou os prisioneiros a fugir, seria o seu fim. Então, devido a isso, o menino forçou seu rosto a se manter neutro e, quando respirou fundo, amaldiçoou a si mesmo por ter que fazer aquilo por sua própria sobrevivência. Um lado seu lhe chamava de egoísta por só pensar em sua vida e ter que trair os seus amigos, mas o seu lado amedrontado preferia mil vezes fazer isso do que ser morto ele e os amigos pelas mãos do governo.
Talvez, se ele continuasse com a Divisão, poderia evitar mais desgraças.
— Pare com isso... — exclamou, ao mesmo tempo em que estendia a sua palma e, graças a esse movimento, uma circunferência dourada surgiu em frente a sua mão. Assim que ele segurou aquele círculo, uma espada dourada surgiu simultaneamente as suas asas. Os seus olhos e cabelos brilharam no mesmo tom de sua arma quando a Cássia parou de bater contra o vidro para encara-lo. Aquele tom celestial também havia tomado a sua pele como purpurina, dando a entender que o seu físico também havia sido aprimorado devido a sua transformação. — ... ou terei que impedi-la a força.
Por segundos, que mais pareceram horas, ambos se encararam intensamente. Era como se um estivesse esperando o outro dar o primeiro ataque.
— Pessoal! — proclamou Eduardo, que, pela sua cara fechada, era possível perceber de longe que ele não estava gostando nem um pouco daquela situação. — Será que vocês podem explicar o que está acontecendo aqui?!
Por conta dessa indagação, a Cássia rangeu os dentes. A fala do Edu pareceu lembrar a mesma da razão pela qual estava enfrentando o Arthur, então, graças a esse incentivo, ela atacou primeiro.
O campo de força, que antes estava sendo usado para bater contra o vidro, foi, rapidamente, levado em direção ao garoto que, como forma de se defender, estendeu a sua espada na direção da barreira. Ao fazer isso, a sua arma dourada lançou uma rajada ofuscante capaz de derreter a habilidade de Cássia em poucos segundos.
A espada dele era feita de pura luz, e os seus ataques queimavam tanto quanto.
Logo após se defender, o menino brandiu a sua espada, criando um corte luminoso que voou pelo ar até a capitã da equipe I, que criou um campo de força mais resistente que o anterior para se defender do golpe. Assim que aquele ataque lampejante acertou a sua barreira, a garota foi obrigada a fechar os olhos devido ao clarão que encandeou por conta da colisão do corte dourado contra a sua habilidade defensiva.
Notando que o resplendor de luz a havia incomodado, o Arthur prontamente fez com que a sua espada brilhasse continuamente, impedindo a moça de atacar, pois ela era compelida a manter os olhos fechados, isso é, se ainda quisesse continuar enxergando.
Como não tinha muito o que fazer, a Cássia se virou em direção a cela de seus companheiros, que, assim como ela, também não conseguiam ficar de olhos abertos. Com exceção de Ed. Mesmo com a luz queimando as suas retinas, o jovem fez questão de levar a sua atenção à capitã do time I quando ela se virou para ele.
— Eu volto! — afirmou, ignorando a confusão presente no rosto do rapaz.
Ele ainda não entendia o por quê daquela luta estar ocorrendo.
— Eu sei — respondeu, sorrindo.
A garota retribuiu o gesto do parceiro antes de lançar o seu campo de força em direção a Arthur para que, por meio disto, conseguisse uma oportunidade para fugir, visto que o menino iria perder um tempinho tentando se proteger da barreira que ia em sua direção.
O tempo que Arthur perdeu não foi muito, já que o mesmo apenas desviou da habilidade da colega, contudo, assim que notou que ela fugira, o mesmo fez com que o brilho de sua espada voltasse ao normal.
Assim que as pessoas que estavam dentro da cela conseguiram abrir os olhos novamente, eles logo levaram as suas atenções ao Arthur para ver se o jovem iria atrás de Cássia. Ele não foi; tanto é que, quando o garoto notou que a sua companheira não iria retornar, as suas asas e espada sumiram.
Um suspiro pesaroso e lento saiu de sua boca, revelando o quão duro aquilo havia sido para ele, todavia, quando os seus olhos se encontraram com os de Eduardo, que o encarava atentamente, o mesmo engoliu em seco.
Parecia que o Ed conseguia sentir a angustia de Arthur, e isso deixou o menino um tanto quanto surpreso. Os olhos compassivos de Edu transmitiam uma paz impressionante, fazendo com que o Arthur demorasse para conseguir tirar a sua atenção dele para, em seguida, se recompor por si só.
O Ed não poderia ajuda-lo. Tentar pedir o apoio de um de seus amigos, de qualquer um deles, era o mesmo que mata-los. Nenhum tinha forças o bastante para vencer o governo, nenhum.
Pensar nisto fez algo ruim subir pela garganta do jovem. Ele estava preso à Divisão, e ninguém ali poderia salva-lo. Arthur não suportaria que algum deles morressem para tentar ajuda-lo, sendo assim, o mesmo se forçou a ficar com a face séria e, quando viu a boca de Ed se mover, indicando que iria dizer algo, ele rapidamente deu as costas e fugiu daquele lugar. Rápido; como se estivesse não só correndo das perguntas de seu amigo, mas do seu próprio medo e inseguranças também.
Se continuar na Divisão fosse o preço a ser pago pela segurança de seus companheiros, o garoto não se importava de parecer um traidor aos olhos daqueles que ele mais estimava.
— Nicholas falando, câmbio! — proferiu o menino, sem muita empolgação.
A notícia do desaparecimento do Diego e do Kal havia causado uma grande perturbação em todos os integrantes daquele grupo; e o fato da raiva de Ryan ter sido tanta ao ponto de deixar aquele ambiente repleto de gelo só tornava as coisas ainda mais delicadas.
— Espero que seja uma boa notícia, pra variar... — murmurou Alephe, balançando os pés como se, assim, pudesse ativar os “poderes" das suas meias da sorte.
— Não trago boas novas! — anunciou Cássia, arfante, fazendo com que o Tony pegue o comunicador da mão de Nicholas, pois o homem estava um tanto quanto desconfiado em relação a atitude da moça.
Ele sabia que algo errado estava acontecendo.
— Eu descobri quem é o traidor!
Devido aquela notícia, um silêncio pesado atingiu aquele espaço.
Por conta do estado raivoso de Ryan e do medo que se estampava no rosto dos demais, o Tony não quis perguntar o nome do espião e, disfarçadamente, tentou abaixar o volume do aparelho, afinal, não queria causar ainda mais inquietude nos jovens. Entretanto, o rapaz de cabelos brancos notou essa astúcia do mais velho, então, sem demora, elevou a voz e questionou;
— Quem é?!
A resposta de Cássia foi rápida e objetiva.
— Arthur.
E os semblantes de todos mudaram de receio para perplexidade na mesma velocidade que o informe da garota foi proclamado.
— Mas... — tentou dizer, no entanto, o seu espanto não permitiu que ele conseguisse falar; a descoberta o havia abalado mais que o esperado. — Mas...
Vendo que o estado de choque do Ryan era tanto ao ponto dele nem conseguir formular uma frase, o Tony respirou fundo e trouxe o comunicador para perto da boca.
Os mais novos estavam abismados demais com o rumo das coisas, então, naquele instante, o homem se viu obrigado a tomar o controle da situação antes que fosse tarde. Ele não podia permitir que os jovens tomassem uma decisão errada no calor do momento, pois aquilo poderia ocasionar no total fracasso de tudo o que já haviam feito.
— Você está sozinha?
— Sim, ele sumiu com a Ária assim como fez com o Kal! — revelou; sua respiração era ligeira devido ao receio que a assolava. — Eu estou correndo em círculos pela prisão e não sei onde me escond...
— Vá para o duto de ar e espere. Os seus companheiros irão ao seu encontro — alegou, lançando um olhar para os quatro que estavam consigo.
Entre eles, o Nicholas era, por incrível que pareça, o mais sereno. O garoto parecia pensativo enquanto os outros a sua volta tinham semblantes que variavam de fúria a pavor; Tony não pôde deixar de erguer as sobrancelhas, mostrando-se surpreso com o controle emocional que o menino estava tendo numa ocasião tão tensa como aquela.
— Está bem! Avisarei caso aconteça mais alguma coisa e, por favor, diga ao Thomas tudo o que eu falei a vocês! — pediu, para, em seguida, desligar.
Assim que a Cássia se desconectou, o homem ainda ficou calado por alguns segundos antes de dirigir a palavra aos adolescentes que com ele estavam.
— Não confiem muito nessa menina, há a probabilidade dela ser a traidora e ter dado sumiço nos outros só para nos enganar — alertou-os, e, como ninguém fez menção de dizer algo, o mesmo prosseguiu; — Quando tudo estiver esclarecido eu...
— ... vou matá-lo! — vociferou Ryan, fervilhando em ódio, ou melhor, congelando; sua pele já estava cercado com uma camada cristalina de gelo.
— Não! — proferiu Nicholas, apressadamente, ao perceber o rancor que se revelava na voz de seu colega. — O Arthur não tem cara de traidor!
Este comentário pôs semblantes confusos nos rostos de todos os que estavam ali, exceto no de Tony, que, ao invés de ficar confundido, apenas estreitou os olhos; curioso para saber o que o menino queria dizer com aquilo.
— Desde quando traidor tem cara? — indagou Camille, tentando achar lógica na justificativa de seu companheiro.
— Desde sempre! — rebateu; ele não parecia ter uma resposta plausível para aquela afirmação. — A Sara, por exemplo, tem cara de traidora!
A garota riu, ao mesmo tempo em que balançava a sua cabeça de maneira negativa.
— Isso é implicância sua, Niquinho.
O garoto deu de ombros, mostrando que não ligava se era ou não implicância, mas, antes que ele pudesse voltar a tentar defender a inocência de Arthur, o Ryan socou com força o metal do duto de ar.
A fúria que havia se acumulado no interior do garoto não podia mais ser contida.
— Não me interessa se ele tem ou não tem cara de espião! — bradou, ignorando o gesto de Tony que pedia para que ele se acalmasse e fizesse silêncio; querendo ou não, todos ainda estavam se escondendo e... bom, gritar não ajudaria a mantê-los em oculto. — Ele vai pagar por ter...
— O Arthur é nosso companheiro! — declarou, aumentando o tom de voz para se equiparar ao de seu colega.
O menino de cabelos platinados não conseguiu segurar a risada áspera e irônica que ecoou de sua garganta graças a resposta ingênua do integrante da equipe X.
— James e Yuri também eram.
O Tony até estava pensando em fazer alguma coisa para calar a boca dos meninos, contudo, após o comentário de Ryan, o mais velho não precisou fazer mais nada.
O peso do silêncio que recaiu sobre aquele lugar revelou ao homem que o assunto relacionado a “James e Yuri" era algo que não mexia apenas com o Nicholas, mas com todos naquela área. A tensão que surgiu ali foi tanta que a Camille precisou abraçar o Alephe quando o pequeno segurou a mão da mesma, preocupado com a melancolia que havia perpassado pela face de Nicholas.
— Não é a mesma coisa — retrucou, num tom mais baixo.
— Por que? — ainda havia raiva na voz de Ryan, porém, agora, o rapaz não possuía mais o tom elevado de antes.
Até ele havia se abalado com a própria fala.
— Porque o Arthur gosta de nós.
Outro silêncio se instalou ali, todavia, dessa vez, a ausência de som se formou porque o menino de cabelos brancos não sabia o que responder. A justificativa do Nicholas era bem rasa, mas o menino tinha tanta convicção naquilo que havia dito que simplesmente não existia mais lugar para contestações ou dúvidas.
Naquele momento, o Tony ergueu as sobrancelhas. Era por isso que o garoto estava tão tranquilo enquanto todos a sua volta estavam chocados. O Nicholas, diferente dos outros, simplesmente havia se recusado a acreditar que o seu amigo o havia traído, e, mesmo que as chances disso ter acontecido fossem altas, a confiança que o jovem tinha em seu parceiro era superior a essas probabilidades.
Mesmo não devendo – porque aquele era um posicionamento totalmente ariscado e precoce – o Tony sorriu. Era admirável ver a confiança que o garoto tinha em seus amigos, mas o homem sabia que, se o mais novo não tomasse cuidado, poderia se decepcionar grandiosamente.
Quanto maior as expectativas, maior é a queda – e o Nicholas não tinha medo de apostar todas as suas fichas naquilo que acreditava.
— Como é?! — questionou Ryan, quando achou forças para rebater o argumento do companheiro.
— Ele gosta de nós! — repetiu. — Dá para ver isso nos olhos dele, pois são iguais aos... aos... aos meus.
Ryan franziu o cenho; Camille ergueu as sobrancelhas.
— Niquinho... — sussurrou.
Os olhos de Arthur exalavam algo que o Nicholas achava familiar, e se dar conta disso fez com que Camille abraçasse o Alephe com ainda mais força.
Vazio.
Era isso que havia no olhar de Arthur, quase como se ele estivesse acostumado a não pertencer a certos ambientes ou, quem sabe, acostumado a não ter alguém. Os olhos do Nicholas definitivamente não eram assim, mas, se ele se identificava de certa forma com aquilo, então...
A garota mordeu os lábios; amargurada. Naquele instante, tudo o que a garota ansiava em saber era: “como havia sido a infância do rapaz, para que ele se identificasse com o Arthur dessa forma?”.
Talvez o Nicholas tivesse conseguido esse brilho no olhar graças a ajuda de alguém que o acolheu, mas, quando não se tem uma pessoa assim em sua vida, a ferida se aprofunda e vira uma cicatriz.
O olhar da solidão, da indiferença. Esses eram os olhos de Arthur, porém, quando ele esteve junto dos demais no jantar, no jogo de queimada, nas conversas quando ainda faziam parte da mesma aliança e em todo o momento em que estavam juntos, o seu olhar havia mudado. O de Kral também. Camille levou os olhos ao Nicholas, maravilhada com o que havia acabado de se dar conta.
Sorrateiramente, o garoto da equipe X estava curando as feridas internas dos outros – da mesma forma que, no passado, alguém curara as suas.
— Ele é um de nós — Nicholas voltou a falar. — E eu não ligo se ele já foi da Hope, da Divisão ou de sei lá onde! Enquanto eu não me encontrar com ele e o olhar nos olhos, ninguém vai chama-lo traidor! — proclamou, com uma expressão séria capaz de fazer o Ryan o observar com uma certa hesitação; seu semblante fechado era intimidador. — Eu não acredito que ele seja como o James e o Yuri.
Após afirmar aquilo, o garoto e o Ryan se encararam intensamente por um tempo; o rapaz com poderes de gelo parecia mais calmo como se, de alguma forma, tivesse absorvido a segurança que o Nicholas havia exalado.
— E o Diego? — indagou; sua expressão decaiu ao relembrar da situação de seu rival. — Será que ele está b...
— O Diego será encontrado! — afirmou Tony, antes que o rapaz pudesse pensar no pior. — Eu já sei exatamente o que fazer para resolver isso.
Ryan o encarou; os olhos emanando ódio e descrença.
— Eu não vou deixar isso nas suas mãos de novo — rosnou. — Se for para deixar isso sob a sua responsabilidade, eu prefiro ir atrás dele por conta própria e...
— Eu juro pela minha vida.
O menino se calou perante a seriedade na voz de Tony.
Sem parar de encara-lo, o homem se aproximou do jovem e apertou firmemente a mão álgida dele para confirmar o seu juramento; isso sem nem se importar com a queimação do gelo que estava presente na pele do mais novo. Essa ação fez com que o Ryan erguesse um pouco as sobrancelhas, surpreso com a determinação de Tony em assegurar que cumpriria o que havia jurado.
— Eu irei cuidar disso agora — revelou, ao mesmo tempo em que levava a mão livre até sua orelha; provavelmente havia um comunicador ali. — O Diego sairá daqui vivo. Confie em mim.
Ryan o observou por um tempo e, aos poucos, o gelo que cobria o seu corpo foi sumindo. A sua raiva também foi diminuindo, dando lugar a um sentimento que a ira antes tentava esconder: o medo. Como essa emoção estava sendo abafada há um tempo, o mesmo não conseguiu mais esconde-la, então, sem que pudesse evitar, os seus olhos rapidamente ficaram marejados.
— Salve-o, por favor.
E aí gente, tudo bem?
Estou passando no final do capítulo pra lembrar vocês de deixarem uma estrela ☆ e um comentário dizendo o que vocês acharam ♡
O que vocês acham que vai rolar com o Arthur? Vocês acham que ele realmente se arrependeu? E que surpresa será essa que o Thadeu vai preparar pro Thomas? Comentem suas teorias pra mim! :)
Por hoje é só, galera, um abraço e até breve!
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