3 - Arrogância

  "A educação tem raízes amargas, mas os seus frutos são doces!" 




Melinda sentiu uma forte dor nas costas quando foi empurrada, içada do chão, sobre a estante de vidro.

— Você é louca! Me larga!

Fabí a largou e se dirigiu à saída da sala. Os presentes estavam assustados com a abordagem.

Melinda ofegava, pegou o telefone, tremendo.

— Cadê a droga da segurança daqui que deixou essa doida entrar?

— Você está bem, Melinda? O que houve? — perguntou Antônio, um colunista da revista.

— Sim. — Respirou fundo.

— Acho que está tudo certo, né? O último anúncio é o da revendedora de carros mesmo. Por hoje é só, pessoal.

Melinda agradeceu ao colega e se sentou respirando profundamente quando todos saíram. Pegou seu celular e tinha vinte e uma ligações de Caio.

— O que aconteceu, Melinda?

— Que droga! Dei um calmante para a filha do Caio e essa louca é mãe da menina. Um capeta, isso sim. Só quis um pouco de paz, ela virou um anjo.

O celular tocou de novo, ela atendeu.

— Oi, meu amor, tudo bem?

— A Ângela vai tirar a minha filha de mim por causa da sua palhaçada, Melinda. Que droga! Se tivesse falado, eu teria levado a menina de volta para a casa das mães, não precisava daquilo.

— Eu vou processar a Fabiana por invasão e agressão, Caio. Ela acabou de sair daqui. Estou pouco preocupada se a bela filha de vocês não irá mais à minha casa...

— Tá, Melinda, então tchau! Não me procura mais, não, ok?

— Espera, Caio, você está terminando comigo por telefone e por causa daquela endemoniada da tua filha, é isso mesmo?

— É exatamente isso, Melinda. Já chega! E minha filha não é endemoniada. — Desligou.

— Que droga! Mais isso... — disse cheia de ódio. — A revista só precisa ir pra impressão, não estou em condições de ficar aqui. Preciso falar com o Caio, preciso descansar minha cabeça.

— Tudo bem, vai lá resolver tua vida, eu seguro as pontas aqui.

— Obrigada. — Pegou o celular e procurou o nome de Luísa. — Oi, amor, está na minha casa? — indagou saindo da sala.

— Estou no dentista, Melinda. Vou extrair o siso.

— Preciso de você em casa. Adia isso, por favor!

— Não dá, Melinda. A gente se vê em dois dias. Beijo! — avisou e desligou, pois havia chegado a sua vez de ser atendida.

A jornalista odiava ser contrariada, mas aquilo fazia com que quisesse com mais vontade. Caio era permissivo demais, mas era cobiçado pelas mulheres, e ela gostava disso.

Depois de muito insistir, Melinda conseguiu, finalmente, beijar Luísa.

— Fica comigo esta noite! — pediu abraçada à estudante, que sugou o cheiro da patroa com os olhos fechados.

— Eu não posso! — sussurrou e enfiou os dedos nos cabelos da nuca dela e a puxou para mais um beijo.

O encaixe perfeito. O gosto perfeito. As sensações perfeitas. Aquele arrepio ardente que tomava conta dela toda vez que via a faxineira, intensificou-se com o beijo.

— Preciso ir. — avisou, deu um último beijo nela e saiu sorrindo se desvencilhando da loura.

Sorrindo e tocando nos lábios, Melinda caiu de costas no sofá.

Naquela noite, Luísa ficou no hospital com a avó, que passara mal.

Melinda entrou em casa furiosa, sentia um nó na garganta. Tentou falar com Caio e o arquiteto não atendeu.

Caio estava no Bueno Sanchez esperando Hope sair com Ângela.

A médica apareceu na recepção depois de ser avisada por uma enfermeira.

— O que você quer aqui, Caio?

— Notícias da minha filha! — disse e fez uma pausa. — Desculpa, eu não devia tê-la levado para a casa da Melinda, ela estava com enxaqueca e insistiu que ficássemos. Por favor, Ângela, não tira minha filha de mim. Eu terminei com a Melinda!

Ângela respirou fundo e o encarou, mexeu nos cabelos.

— Caio, a Hope vai dormir o dia todo. A dose de lorazepam foi alta.

— Você nunca pensou que ela pode mesmo precisar de tratamento? O médico vai saber indicar o remédio certo para a idade dela...

Ângela não permitiu que ele concluísse o raciocínio. Estava furiosa com a ideia de tratar a filha com remédios.

— Nunca mais sequer pense nisso, Caio. Não vamos impedir o desenvolvimento da Hope por causa de falta de paciência.

— Você já a levou a um especialista, pelo menos, para que ele possa dizer se ela tem alguma patologia?

— Já, Caio. Mas não para saber se tem alguma doença, e sim em busca de ajuda na educação dela. O Paco já chegou para nós com onze anos de idade, então é nossa primeira experiência. E não queremos medicar a nossa filha.

— Posso vê-la?

— Você vai poder ficar com ela uma vez por semana, como era, mas hoje não. Vai embora, por favor.

— Ângela...

Ela apenas o olhou e ele resolveu não questionar mais. Estava arrasado. Gostava de Melinda, mas ela fora longe demais.

Mesmo assim levaria Hope a um especialista, ele saberia dizer se ela precisaria de tratamento ou não.

Melinda estava em casa tentando a todo custo falar com Caio e Luísa.

O que aconteceu, Melinda? Você nunca me liga a essa hora! — Luísa perguntou por mensagem.

Me atende, por favor, preciso falar com você. Preciso de você aqui, comigo. — Melinda respondeu por áudio.

Não estou podendo falar, extraí o siso, tudo anestesiado ainda. Estou sentindo dor, vou dormir um pouco. — avisou se despedindo.

Que droga! Preciso de você, vem descansar aqui, por favor.

Amanhã eu vou, agora estou na cama, vou dormir um pouco, fica bem. Beijo.

O Caio terminou comigo! — disse num áudio com a voz embargada.

Não sou sua amiga para esse tipo de confidencia, Melinda! Já sofri muito com essa história, não quero ouvir suas lamentações por ter terminado com outra pessoa... — A jovem respondeu e ficou olhando para a tela do celular depois de sair do aplicativo.

Melinda ficou furiosa.

— Que droga! Tudo culpa daquela maldita! E a mãezinha mafiosa dela me paga.

Ofegava enquanto procurava um número em seu celular. Quando achou, ligou para a pessoa, que atendeu depois de algumas chamadas.

— Oi, preciso que você dê um susto numa pessoa. — Calou-se para ouvir. — Não, não é jornalista, não é ninguém da área. É uma advogadazinha recém-formada. Eu poderia chamar a polícia, mas não daria em nada. — Analisou o que ouvia. — Olha só, não quero que matem, é só um susto, ela me agrediu e vai ser agredida também, para nunca mais se meter comigo.

Deu as coordenadas para o comparsa e desligou o celular. Resolveu ir procurar Caio, já que ele não a atendia.

Queria Luísa ao seu lado, mas não podia ir à casa dela. A avó não sabia de sua natureza sexual e estranharia se visse a patroa ali.

Ângela estava finalizando uma cirurgia, extração de um tumor no pulmão de uma mulher.

— Fecha, por favor! — pediu e saiu da sala, retirando touca e luvas, e se dirigiu ao seu consultório.

Ligou para Fabí, que estava numa audiência naquele momento e não pôde atendê-la. Deixou um recado.

— Hope vai dormir o dia inteiro. Você está bem? Quando puder falar comigo, me liga, por favor! — falou em um tom preocupado.

Sentia uma sensação estranha, queria muito notícias da esposa.

Uma hora depois, Fabí retornou sua chamada.

— Oi, amor, estou indo para o Bueno Sanchez. A gente se fala aí. Tá tudo bem?

— Tá, só fiquei preocupada. Aperto no peito...

— Fique tranquila. — disse enquanto arrumava suas coisas e saía.

Havia uma van branca estacionada na frente do prédio do Palácio da Justiça do estado do Rio de Janeiro, fórum central.

A advogada saiu do prédio e seguiu para o hospital, foi seguida pela van.

Distraída, ouvindo uma música, ela cantarolava e batucava o volante do carro. Depois de dez minutos, notou que estava sendo seguida.

— Ah, pelo amor de Deus!

Pegou um atalho, viu pelo GPS que havia um posto da polícia próximo e passou perto. Precisou avançar o sinal vermelho para despistar os comparsas de Melinda.

Hope entrou em casa quando já era noite, pulou no colo do irmão, que estava sentado na escada com Vanessa.

— Andou aprontando, Sabiá?

— Andei! — respondeu rindo.

— Aprontou muito mesmo, amanhã de manhã vamos conversar, dona Hope! — Fabí avisou e foi para a cozinha.

Hope arregalou os olhos e olhou para Ângela, que observava os filhos juntos.

— Não me olhe assim. Eu estou tão furiosa quanto sua mãe.

Hope olhou para Paco e viu a mãe subir a escada. O músico sorriu.

— Acho que alguém vai ficar de castigo!

— Não vou. — garantiu e correu até a cozinha.

Fabí tomava água enquanto falava com Veronica. A menina sentou no colo da mãe e a encheu de beijos.

— Amo você daqui até plutão, mamãe!

— Estou ligada. — disse afastando o rosto para olhar pra filha. — Estou de olho em você, sua sem vergonha! Amanhã a gente conversa, viu?

— Por que não conversa agora? Fala logo...

— Oxe, baixe sua bola!

Ângela entrou e viu as duas discutindo.

— Não fiz nada, não podem me deixar de castigo. — falou para chamar a atenção de todos.

— Que é isso, Hope? Isso é jeito de falar?

— Falem comigo agora...

— Ok. Pois, sente. — Fabí mandou. — Soubemos hoje que você anda coagindo seus colegas, o que está acontecendo? Nós já conversamos sobre isso.

— Mas...

— Shh! Sua mãe não acabou, Hope! — Ângela foi incisiva. — Aprenda a ouvir. Você não pode sair por aí falando que as pessoas são assassinas, que devem pagar ou não...

— Mas ele é, mamãe. Falar a verdade não pode mais?

— Você não é melhor que ninguém, Hope. Se aquele menino foi assassino ele que arque com as consequências dos atos dele, não é você quem precisa apontar o erro dele, não.

— Ele é um chato!

— Isso não é da sua conta, menina. Oxente, agora eu vi mesmo!

— Hope, se esse garoto fez algo contra você, converse com a professora. Você não é autoridade para resolver nada e muito menos tem o direito de apontar os erros dele, seja lá o que for.

— Ele não fez nada comigo, ele fez com o Elijah, eu gosto dele, não podia deixar aquele bobão falar mal dele.

— Nem para proteger alguém, Hope. Não pode, filha.

— Você disse que sou especial.

— Isso não quer dizer que você possa pisar ou diminuir as pessoas, principalmente seus colegas. Achei lindo você defender seu amiguinho, mas já parou pra pensar que todos eles precisam de defesa. O garoto que você acusou de ser assassino está se redimindo.

— O Elijah não é meu amiguinho. — disse olhando para o lado, indiferente. — É meu namorado.

— Ah, pronto! — Fabí se levantou. — Agora arrumou um namorado.

— Que história é essa, Hope?

— Não é história, mãe. O Paco pode ter uma namorada e eu não?

— Chega dessa discussão. Você está de castigo, até minha raiva passar, ok? Fique sabendo que ela se renova toda vez que me lembro daquela professora falando o que você fez...

— Mãe, por favor. Eu peço desculpa ao João.

— Isso você vai fazer de qualquer forma. Mas continua de castigo. — Ângela avisou e acenou para Veronica.

— Hora de jantar, Hope.

— Eu sou sua mãe, você não pode falar comigo assim... — Hope ignorou Veronica e repreendeu Ângela, agindo como se ainda fosse sua mãe, lembrando-se de uma de suas vidas passadas.

— Silêncio, Hope! Jantar e cama. Não quero ouvir um pio seu mais hoje. — disse e olhou para Fabí, que devolveu o olhar e recebeu um abraço e um beijo carinhoso.

Depois do jantar, Hope foi ao quarto das mães onde Felipe dormia, acariciou seu rosto e foi para a cama. Foi vista por Ângela e Fabí que saíam do banheiro.

— É um anjo!

— Ela se acha a última coca gelada do deserto, Anjinho. — disse sorrindo.

No dia seguinte, Fabí estava saindo do Violão Bar com Beatriz Maldonado, uma colega. Discutiam algumas coisas sobre um cliente.

— Eu te ligo, Fabí. — avisou e deu um beijo no rosto, ficando onde seu carro estava estacionado.

— Tudo bem. Se nenhum deles quiser um acordo, não vamos poder fazer muita coisa.

— Briga! — disse sorrindo e entrou no veículo.

Fabí se dirigiu ao seu carro, que estava um pouco mais a frente. Viu a van branca no outro lado da rua, e foi abordada por três homens usando meias-calças na cabeça, estavam escondidos atrás do carro.

A advogada se assustou e sentiu um soco no abdome. Iniciou uma covarde luta corporal contra eles. Acertou o rosto do que lhe bateu primeiro, mas foi atacada ao mesmo tempo pelos outros. Em mais uma tentativa de se defender, ela arrancou a meia do rosto de um deles, olhou em seus olhos, sentiu uma picada no pescoço, e seu corpo desfaleceu.

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