1 - Um Amor Puro

  "Não é preciso entrar para a história para fazer um mundo melhor!" 




Ângela e Fabí se beijavam na piscina de casa, olhavam de soslaio para os filhos na borda oposta.

— A gente podia entrar, né? — propôs Fabí.

— Está mal-intencionada, doutora Fabiana?

— Quando estou com você, eu sempre fico mal-intencionada, doutora Ângela!

A médica riu e a abraçou, aquela não era uma ideia ruim. Olhou o relógio e viu que estava na hora de dar mamadeira para Felipe.

— Paco se vira, mulher! Só venha! — disse carregando no sotaque e entraram na casa.

Fabí entrou no quarto com a esposa no colo enquanto a beijava apaixonada.

Colocou-a na cama e a olhou nos olhos.

— Amo você demais, Anjinho!

— E eu amo você mais ainda, Pretinha! — disse e a puxou para um beijo.

A brisa entrou pela janela e balançou as cortinas, que presenciavam o ato de amor entre as duas.

Depois de tudo o que passaram mereciam aqueles momentos.

Hope pulava com o irmão mais velho na piscina, feliz da vida, enquanto o pequeno Felipe olhava para o céu.

Num espasmo, o menino se assustou. Era aquela sensação horrível voltando, não tinha hora certa. Muitas vezes estava dormindo e acordava gritando com aquela dor aguda e latejante que tomava conta de sua cabeça. Os remédios não eram suficientes a não ser que a dose fosse mais forte a cada administração.

Hope correu e tentou acalmar o irmão, tocou em sua testa, passou uma mão na outra como se quisesse aquecer, concentrou-se e repetiu a ação, tocou a testa do bebê, que passou a soluçar, acalmando-se.

— Shh! Calma! Passou...

Paco levou os irmãos para dentro da casa, o sol começava a ficar muito forte. Ele era cuidadoso, depois de dar mamadeira para Felipe, colocou-o no berço e o viu dormir.

— Banho e roupa seca, Hope! — ordenou e viu a irmã se encaminhar para seu quarto.

O músico tornou-se um homem bonito e generoso, prezava a família acima de tudo. Tinha aquele cuidado com os irmãos, pois sempre precisou cuidar dos novos 'irmãos' do orfanato onde viveu até os onze anos de idade.

Acariciou o rosto de Felipe com a parte externa no dedo indicador e se imaginou fazendo aquilo com o filho. Lembrou-se de quando viu Vanessa pela primeira vez, depois de tanto tempo morando fora do país.


Julho do ano anterior, Paco estava com a irmã e a prima na casa do avô quando a jovem chegou. O músico a viu de longe, já tinha visto outras vezes por fotos, mas aquela era a primeira em que a via sem pressa e sem toda a família junta fazendo perguntas, ocasiões em que ela sempre dava um jeito de fugir.

Hope correu até a tia e pulou no colo dela.

— Vem pra piscina, Emily acha que vai ganhar de mim, mas não vou deixar. Você tem que torcer por mim. Vem...

Paco se aproximou das duas sorrindo e seus olhos encontraram os de Vanessa, que sorriu depois de alguns segundos fitando os dele.

— Tudo bem, Vanessa? Fez boa viagem?

— Tudo sim e você? Fiz sim... — colocou Hope no chão e ela sorriu segurando as mãos dos dois.

— Vem, o Paco está torcendo pra Emily e você vai torcer por mim...

— De babá hoje? — indagou olhando para Paco.

— Eu as adoro, amo a companhia delas. Minha irmã é competitiva até a raiz dos cachos e a Emily é doce.

Emily é doce! — Hope imitou o irmão mudando a voz e correu para pular na piscina onde Emily gritou rindo.

— Você é muito bobão por elas. Ângela não quis que você estudasse fora?

— Morei em Londres por três meses, ela quase morreu... — falou sorrindo e apontou a espreguiçadeira.

Vanessa sentou e ficou conversando com o sobrinho. Desde então não pararam mais, tinham os mesmos gostos para música, livros, filmes... aquele mês foi pouco para os dois.

Paco recusou um beijo de Vanessa no cinema.

— Não podemos, Vanessa!

— Por que não, Paco? Você não me quer? — indagou e umedeceu os lábios olhando para a boca dele.

— Você só tem quinze anos. Tem a família e... — disse e desviou os olhos dos dela.

— Dezesseis. — corrigiu. — Eu quero você, Paco. — foi categórica e o puxou pelo rosto, beijando-o em seguida.

O jovem se deixou envolver e correspondeu ao beijo da menina.

Depois de não conseguir resistir àquela paixão, Paco foi para a cama com Vanessa, que se mostrou bem experiente.

Clovis tratava a filha como se fosse de porcelana, frágil. Ela queria viajar pelo mundo e ele a queria formada.

— Esse é o sentido da vida, pai? — indagou quando bateu de frente com ele pela primeira vez. — Estudar a vida inteira, trabalhar e morrer...

— Filha, não fale assim. Só estou preocupado com o seu futuro.

— Pai, eu tenho dezesseis anos, não aguento mais isso. Sou uma pessoa, não quero perder a minha vida assim. Não quero ser médica, não vou administrar seus hospitais...

O velho Clovis concordou com a cabeça, sentindo uma tristeza profunda. Marejou os olhos e deixou a filha sozinha. Vanessa fechou os olhos e respirou fundo, depois de uns minutos foi procurar o pai.

— Pai, desculpa, eu não queria ter sido tão rude, mas já estou estudando, tiro as melhores notas. Só quero poder escolher o que fazer. Eu tenho pavor de hospital, o cheiro me enjoa, não consigo ver sangue, fico apavorada quando alguém fica doente perto de mim.

— Tudo bem, filha. Não vou obrigá-la a fazer o que não quer. Só ficaria feliz se seguisse a profissão da família.

— Não é da família, só a Ângela é médica. Enfim, vou sair.

— Com quem? Volte logo...

— Tchau, pai! — disse cansada.

Encontrou com Paco longe de casa. Devido ao comportamento possessivo do pai, ela manteve o relacionamento escondido. Descobriu que estava grávida ainda nos Estados Unidos, voltou para falar com Paco.

— O meu pai vai me matar, Paco! Acho melhor ele nem ficar sabendo!

— O quê? — indagou em meio a uma careta — O que quer dizer com isso? Vai ter o filho na América?

— Não... — respirou fundo. — Eu não posso ter esse filho, Paco, por favor, entenda isso. Eu só tenho dezesseis anos, vou acabar com a minha vida!

— Por favor, amor, não faz isso. Peço que...

— Paco, é a minha vida!

— É uma vida que você carrega. Por favor, não impeça o meu filho de nascer.

Vanessa estava nervosa e frustrada com a reação de Paco.

— Eu vou pra casa, mais tarde conversamos. — Deixou o namorado sozinho.

Paco passou as mãos no rosto e se lembrou de que Ângela receberia liberação médica e foi para casa. Sua companhia no carro era um medo que beirava o desespero.

Depois de falar com Fabí, contar tudo o que houve e ouvir sermão da mãe, ele voltou a falar com a namorada, que já parecia decidida a interromper a gravidez.

— Olhe, Vanessa, eu sei bem como é ter os sonhos impedidos. Um filho não é brinquedo, mas estamos dispostos a ajudar. — disse Fabí.

— Eu cuido dele, Vanessa, mas, por favor, não o impeça de nascer.

— Eu sei que você pode estar preso a sua religião, mas...

— Não é só isso, Vanessa. É o nosso filho que está aí. Se quer se prender a religião, que seja, é um espírito que precisa nascer.

— Vanessa, pense bem. Se não quiser criar o bebê, a gente fica com ele. — garantiu Fabí.

— Paco, o grande sonho da minha vida é terminar os meus estudos e viajar com você pelo mundo, como vamos fazer isso se tivermos um filho?

— Como eu vou conseguir ficar em paz sabendo que você impediu o meu filho de nascer?

— Meninos, sem pressão, por favor. Vanessa, só pense, ok? Se decidir ter, estamos ao seu lado, e depois não vão passar o resto da vida viajando, né? Se decidir não ter, vou entender também...

— Obrigada, Fabí. Se eu aceitar ter esse filho, ainda vou precisar passar pelo meu pai. Ele vai me matar, com certeza.

— Foram irresponsáveis. Com o mundo cheio de camisinha, foram fazer filho, agora é arcar com as consequências.

— Eu amo o Paco, Fabí. Não fomos irresponsáveis, tínhamos pouco tempo e aproveitávamos. Meu pai disse que preciso terminar os estudos e, você sabe, a pressão é muito grande.

— Eu conheço o seu pai, minha linda, mas deixe ele comigo, ok? Paco, você vai ter que casar com a moça... — brincou e os deixou sozinhos.

— Você quer casar? — indagou de cenho franzido.

— Só se você quiser. Eu amo você, Vanessa, mas jamais vou fazer algo contra a sua vontade. Só quero esse filho. — disse e a abraçou com força, fazendo a namorada ficar pensativa.

Hope estava se preparando para ir à casa do pai quando Ângela entrou em seu quarto.

— Está pronta, amor?

— Estou. Mamãe, cuida do Felipe, tá? — pediu e a beijou com carinho.

— Claro que sim, minha linda. Vamos que seu pai está esperando.

Deixando milhões de recomendações para a filha e para o amigo, Ângela a entregou para passar o dia com o arquiteto.

— Vamos passar na casa da Melinda para irmos ao cinema, ok?

— Tá bom... — disse olhando para fora.

Caio a observou pelo retrovisor. Notou-a distante.

— Por que você não gosta da Melinda, filha?

— Porque ela é chata, me odeia.

— Ela disse isso a você?

— Não. Mas eu sinto.

— Seja boazinha, tá? Ela está fazendo um trabalho, vamos ficar um pouco com ela e depois vamos ao cinema... saiba que foi ideia dela sairmos nós três juntos.

— Quero uma vaca, pai!

— Você ouviu o que eu falei com você?

— Sim, mas eu quero uma vaca.

— Tá bom, vamos comprar uma vaca pra você. — disse sorrindo e entrou no prédio onde Melinda morava.

Estacionou e andou até o elevador segurando na mão da filha. Notou suas unhas sujas de tinta.

— Hoje eu fiz um prédio grandão, você precisa ver...

— Quero ver agora, papai. Vamos...

— Amanhã. Agora seja boazinha, por favor. — pediu e viu o elevador parar no vigésimo andar.

Foram atendidos por Luísa, a arrumadeira.

— Oi, Luísa, tudo bem? — Hope cumprimentou e abraçou a moça, que sorriu.

— Tudo e você? — indagou se agachando, olhando nos olhos da menina.

— Não queria estar aqui, mas vi você, então, menos mal.

— Hope! — Caio censurou. — E Melinda?

— Quarto. Enxaqueca.

Caio franziu o queixo e acenou para que a jovem ficasse com Hope, que viu o pai indo ao quarto da namorada.

— Íamos ao cinema! — Hope disse frustrada.

— Vem comigo pra cozinha, estou lavando louça, fiz uma sobremesa deliciosa porque eu sabia que você vinha!

— Oba! —Hope correu para a cozinha depois do grito de felicidade.

No quarto, com a porta fechada, Melinda ouviu a voz da filha do namorado:

— Ah, não, Caio, pelo amor de Deus! Olha o meu estado. Você me odeia, né?

— Calma.

— Calma, como vou ficar calma, ela não sossega um minuto, estou morrendo e você traz a sua filha hiperativa para a minha casa.

— Só vim porque achei que fôssemos sair, Melinda! Vou ao cinema com ela e depois passo aqui, ok?

— Por favor, amor, fica comigo.

— Acho que a Hope tem razão, você não gosta dela... — sussurrou com um olhar triste, mesmo no escuro foi visto pela jornalista. — É minha filha, Melinda.

— Amor, isso não é verdade. Ela é implicante, só isso. Coisa da idade. Eu a amo, mas confesso que tenho ciúme, você só tem olhos pra ela... — disse com a voz rouca.

— Você conhece as mães dela, Melinda! Eu só servi pra fazer, não sou pai no papel, estou sempre à sombra. Você está sendo injusta, mas não vou discutir por isso. Vou ao cinema com ela, depois a deixo em casa e volto pra cá, está bem?

— Tudo bem, amor. Fica, só pede pra ela não correr tanto. Amanhã vamos ao cinema!

Melinda gostava muito de Caio, mas gostava mais ainda do que ele proporcionava para ela diante da mídia. Ganhou dez mil seguidores quando foi vista com ele numa festa em São Paulo. Prezava muito aquela fama, aquelas estrelas.

O arquiteto saiu do quarto para falar com a filha, e a mulher saiu da cama, abriu uma gaveta e retirou de dentro um comprimido para dormir.

Naquele dia, Hope dormiu cedo, passava pouco das sete da noite. 



∞              


Música:

Um Amor Puro -  Ivete Sangalo

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