[ 000 ] Prologue

00. PRÓLOGO :
« A  PROPOSTA »

23:00 | 18 de Setembro, 2015
Manhattan ── New York

DIFERENTE DA MAIORIA das pessoas, Dianna Atkins não acreditava em destino. Ela não acreditava que, de alguma forma, tudo em sua vida estaria premeditado para acontecer, destinada a viver aquele momento ou fazer tal escolha. Dianna era o tipo de pessoa que acreditava em cada um fazer a própria sorte e só isso lhe bastava.

Poderiam chama-la de descrente, porém ela preferia enxergar a vida daquela forma. O que conseguiu até ali foi por seu esforço e determinação, graças ao quanto estava disposta a arriscar para conseguir o que queria. Por puro egoísmo, dava o mérito a si mesma e, por pensar que merecia, contentava-se com o que fazia.

Era uma maneira mesquinha de se viver, um tanto ignorante, mas confortável. Foi o que lhe deu o trabalho como repórter para The New York Times, o que lhe proporcionou um apartamento com vista vantajosa em Manhattan e o que pagava todas as suas contas e os tratamentos de sua avó contra o câncer. Sua pura insistência em conseguir o que almejava, mantinha os objetivos da jovem Dianna Atkins, de 13 anos, que sonhava em ser jornalista, girando e progredindo.

Da pior maneira, percebeu que teria que conseguir tudo o que queria sozinha. Poderia contar apenas consigo mesmo, investir em seus sonhos com seu próprio suor e esforço e, claro, algumas trapaças. Jogar limpo nem sempre era o caminho certo, algumas vezes era necessário puxar o tapete das outras pessoas para poder estender o seu próprio. Atkins sabia que atos tinham consequências, porém, enquanto estava se beneficiando, ela não estava reclamando.

Naquela noite em específico, deixou o prédio em que trabalhava muito tarde. Uma chuva torrencial havia começado assim que estacionará seu carro nos estacionamento do complexo de apartamentos em que morava. Recolheu suas coisas do banco do passageiro e subiu de elevador até o seu andar, ansiando por um descanso mais do que merecido.

Dianna morava no último andar, tendo o privilégio de uma cobertura totalmente sua. O prédio era novo, poucas pessoas moravam nele e algumas ainda estava se mudando. Os apartamentos ao lado do seu estavam completamente vazios por enquanto, ainda vagos para venda. Um bônus de se ter um andar ocupado apenas por ela, era o constante silêncio que vinha. Trabalhar em casa era mais fácil quando não havia barulhos para todos os lados.

Abrindo a porta de seu apartamento, ela acendeu as luzes assim que entrou e suspirou em puro contentamento ao retirar seus louboutins apertados, deixando aos lados do batente. Deixa a pasta sobre a mesinha de centro e caminha até a cozinha americana, parando antes para apertar a secretária eletrônica e escutar os recados do dia enquanto ia até a geladeira para se servir de uma boa taça de bourbon para a noite.

Atkins não era o tipo de pessoa viciada em bebidas, mas se dava ao luxo de alguns taças de vinho e whisky quando achava que merecia. Um tapinha nas costas pelo bom trabalho, um copo de vidro em uma mão e alguns chocolates seriam o suficiente para agracia-la por uma semana trabalhosa.

Após o bipe do aparelho eletrônico, a primeira mensagem começa.

── Dianna Mason Atkins. Você está ignorando as minhas ligações novamente. Isso é inadmissível. ── A voz estridente de Meredith Atkins, sua mãe, ressoa pela casa. Dianna revira os olhos com a histeria dela ao telefone, lembrando-se das 26 chamadas perdidas no seu celular. ── Eu sou sua mãe. Eu entendo que você está chateada, mas não conversamos desde o enterro. Me evitar não vai ajudar a melhorar as coisas. Ligue para mim assim que ouvir essa mensagem, Anna. Por favor.

Dianna leva o copo com bourbon aos lábios, bebericando um pouco de trás da mesa da cozinha e mordendo o interior da bochecha enquanto ainda digere o que acabou de ouvir. Ela não desejava ignorar a própria mãe, mas isso se fez necessário. Dianna amava Meredith, realmente amava. Porém as vezes não aguentava ficar no mesmo lugar que ela por muito tempo.

Sua mãe era metódica e altruísta. Tinha uma forma de ver a vida que Dianna não tinha e as duas não tinham tanto em comum, além da aparência. Ela sabia como seria a conversa que teriam, como sua mãe iria querer falar sobre sentimentos, apoio mútuo e tudo mais. Atkins não estava interessada em nada disso. Queria apenas seu tempo e seu espaço.

── Lady Di, que tal você parar de ignorar as ligações da sua mãe? Ela me ligou 15 vezes durante a minha aula de ioga hoje. ── A próxima mensagem pertence a Cleo Duvall, uma amiga de longa data de Dianna. ── Sei que sou a única amiga que você tem e a única que te suporta, mas isso tem que parar. Não quero ter que bloquear ela... de novo! Então peça encarecidamente para a senhora Atkins parar de me ligar ou seja uma garota crescida e enfrente a fera. Vejo você no sábado como combinamos. Beijos.

Soltando uma risada baixa, Dianna deixa o copo vazio sobre a mesa e o enche com bourbon novamente. Ela conhecia Cleo desde a universidade e havia sido a única amiga que Atkins manteve, pois Duvall era insistente demais para deixa-la ir. Dianna não fazia questão de ter ninguém por perto por muito tempo, estava acostumada com pessoas indo e vindo da sua vida. Ela não esperava que sua amizade com a mulher durasse tanto.

── Oi, Dianna. Aqui é a Fonda. Eu moro no apartamento abaixo do seu. Não se você se lembra, mas nos vimos semana passada e eu te falei sobre uma festa para o síndico do prédio que estamos preparando. ── Fonda, sua vizinha, tem uma voz quase melódica, mesmo sendo pelo menos uns 10 anos mais velho que ela. Dianna a acha simpática ao extremo. ── Caso queira participar, me retorne a ligação ou me mande uma mensagem. Adoraremos ter a sua participação nesse evento. Também será ótimo para você conhecer os outros moradores do prédio e o meu filho, Michael, que achou você uma gracinha-

Antes que a ligação continuasse, Dianna passou a mensagem, cansada daquela conversa enfadonha. Ela se dirige novamente a cozinha, revirando os olhos, pegando a garrafa de bebida para retornar para sala e ligar a TV.

── Dianna, aqui é o Everett, seu chefe. Tivemos uma reunião hoje e me esqueci totalmente de te avisar que compartilhei seu contato com um possível cliente. ── Ao som da voz de Everett saindo da secretária eletrônica, Dianna ergue seu olhar, ficando interessada no que ele tem a dizer. ── Ele disse que te enviaria um email antes de te ligar, pois precisava saber se você estava interessada na proposta de trabalho primeiro. Eu não entendi exatamente o que ele quer, falou muito sobre artefato, viagem e gravação. Enfim, em resumo, ele quer que você cubra a última grande viagem de um cara muito rico de Londres, vai pagar muito bem por isso. Isso pode ser vantajoso para o seu novo projeto de desmentir mitos e lendas históricas. Dê uma olhada, pode te interessar. Até segunda, Atkins.

Quando a mensagem terminar, Dianna já está caminhando para a sala com o bourbon em sua mão. Deixa a bebida e o copo de vidro sobre a mesa de centro e depois retira o notebook da pasta. Cruzando as pernas, ela pousa o objeto em seu colo, ligando-o para poder checar seu email. Em sua caixa de entrada, no topo das mensagens recebidas está uma de alguém que Dianna nunca havia conversado antes.

Interessada na proposta, abre o email para poder ler o que está escrito, curiosa para saber o que interessou tanto seu chefe para que achasse essa ideia vantajosa.

Setembro 18, 2015
De: [email protected]
Para: [email protected]
Assunto: Proposta de Trabalho

Prezada senhorita Atkins,

Me chamo Jay Sabarth e sou assistente de pesquisa do Museu de Londres. Trabalho com o senhor Edgar Hawthorne a alguns meses e estamos entrando em contato para uma proposta que possa lhe interessar.

Organizamos uma expedição para a Siria na próxima semana, será a última viagem do senhor Hawthorne, pois ele irá se aposentar do seu posto de historiador e regente do museu. Como um último ato, ele busca encontrar uma relíquia antiga na Siria, para concluir sua jornada e e apresentá-la no seu último evento beneficente envolvendo o Museu de Londres.

Seria de grande interesse do sr. Hawthorne que uma das jornalistas mais renomadas dessa geração fizesse parte da sua expedição, pois planeja documentar todo o processo e, talvez, até mesmo escrever um livro sobre.

Caso esteja interessada, entre em contato comigo para que possamos discutir os termos dessa viagem. Também compartilharei com a senhorita mais detalhes sobre nossa expedição e a busca que faremos. Não se preocupe com despesas, todas serão pagas pelo senhor Edgar, na circunstância de uma possível concordância de sua parte.

Jay Anwar Sarbth
Professor Associado
Museu de Londres, Inglaterra

Normalmente, esse não seria o tipo de proposta que interessaria Dianna, porém já havia um tempo que ela estava conversando com Everett Wagner em começar um programa através da internet, focado em desmentir mitos e lendas. Ela tinha muita liberdade em sua coluna no The New York Times, porém sempre apresentava limitações e Atkins queria inovar.

Desde a sua matéria sobre Richard Croft feita no mês passado, "Loucura e Declínio: A Base da Família Croft", Dianna havia ganhado uma promoção pelo material que disponibilizou e o lucro que rendeu a Everett pelo o que expôs. Mais de 70% das entradas nos sites do The New York Times eram para ler o que Dianna escrevia, as notícias que ela tinha o privilégio de conseguir e compartilhar. Atualmente, ela era a terceira jornalista mais comentada do momento. Seu plano era desbancar quem estava no topo.

Esse novo trabalho não parecia relevante, porém era um começo. Fazendo uma pesquisa rápida sobre Edgar Hawthorne no google, Dianna descobriu que o homem era um historiador famoso de Londres. Ele tinha 75 anos atualmente e as especulações de sua aposentadoria estavam ocorrendo a algum tempo. Vazar isso não lhe renderia a atenção que desejava, pois muitas pessoas já esperavam. Sua alternativa mais válida, era seguir nessa viagem intrigante.

Seus reais objetivos seriam mantidos escondidos do pobre homem e seu assistente, eles não precisavam saber que seu intuito era apenas desmentir tudo o que historiador acreditava fielmente, assim agindo de má fé e o utilizando para benefício próprio. Infelizmente, ela precisava de um começo. O falecido Richard Croft fora quem lhe ajudou a ter o pontapé inicial, Atkins precisava dar continuidade ao o que havia começado. Uma parte dela gostaria de se sentir ressentida, porém Dianna não estava.

Pousa o notebook sobre a mesa novamente e salva o número de Jay no celular. A primeira coisa que Dianna encara são as várias ligações perdidas de sua mãe. Durante um tempo, ela chega a ponderar sobre a possibilidade de retorna-las antes de tomar aquela decisão. Afinal, caso concordasse com a proposta de Sabarth, elas ficariam mais um tempo sem se encontrarem, levando em conta que a viagem seria na próxima semana e Dianna precisaria se preparar para ela.

Seus olhos permanecem focados no número de Meredith sobre a tela por um tempo. Seu polegar pairando sobre o contato dela, até que Dianna encare a foto na moldura ao lado da TV. É uma foto antiga dela e de seu pai, Harrison Atkins. Ela estava vestida com seu uniforme do time de futebol de sua antiga escola na Califórnia, tinha 13 anos na época e havia acabado de ganhar o campeonato.

Ele esteve presente em todos os eventos de sua vida, mesmo depois do divórcio, Harrison se esforçou para estar presente na vida de Dianna. O único em que ele não esteve, fora justamente no dia que os dois deixaram de se falar. Ela podia se lembrar da discussão que tiveram, da forma como ele desaprovava as coisas que ela estava fazendo. Seu pai se recusou a comparecer a festa da promoção dela, desgostoso da forma como ela abordava as pessoas em sua coluna, de como as enganava para ganhar mérito.

Dianna tentou não se incomodar com a reação dele, pensou que no dia seguinte eles se resolveriam e voltariam ao normal. Harrison entenderia que ela fez o que era necessário, não o que era correto. Porém, diferente do esperado, a ligação que recebeu na manhã seguinte não pertencia ao seu pai, mas sim a sua mãe chorando no celular para lhe dar a notícia.

Sabia que ele não gostaria de ver como a relação das duas estava se deteriorando agora que ele partiu. Meredith era o que havia restado a Dianna e, pelo mínimo de consideração, ela deveria lutar por isso. Pelo menos fingir que se importava. Deveria ter aprendido uma lição após tudo o que aconteceu, aprender a priorizar sua família, assim como eles a priorizavam.

Exalando, Dianna mordeu o lábio inferior, pensativa. Ela não acreditava em destino, muito menos em qualquer força superior que a impulsionava para fazer as coisas ou seguir determinado caminho. Ela acreditava em seu próprio instintos e, por conta disso, sabia o que tinha que fazer. Algumas coisas teriam que esperar.

Seus dedos tamborilaram sobre o encosto do sofá, aguardando a ligação enquanto chamava até alguém atender do outro lado da linha após alguns poucos minutos. Um sorriso ladino cresceu em seus lábios conforme Dianna falava.

── Jay Sarbth, aqui é Dianna Atkins do The New York Times. ── Ela anuncia. ── Sabe, não é todo dia que uma garota consegue uma viagem totalmente de graça para a Síria. Você conseguiu chamar minha atenção.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top