Os extremos
⋆
JASPER HALE
Disciplina é uma arte da qual, antigamente, eu tinha orgulho de me gabar por ter. Eu era o melhor nisso. Não havia ninguém mais centrado ou focado do que eu na hora de uma luta ou numa caçada. Eu tinha o controle. Mas algo mudou no meu mundinho e eu não estou gostando nada disso.
O sangue dessa garota me impede de pensar racionalmente. Eu preciso que ela fique longe, mas seu cheiro é tão encantador que eu não quero que ela se afaste, ao mesmo tempo. A droga feita especialmente para mim, meu desejo de cravar os dentes no seu pescoço se torna tão intenso as vezes que eu preciso olhar para o lado para me centralizar. Lembro-me que não estamos sozinhos, que eu não devo ferí-la. Cada vez que eu abro a boca para lhe responder, por menor que seja a sentença, minha garganta queima como se eu estivesse tomando um veneno derivado do ácido.
Eu estou flertando com o perigo nisso. E ela também.
É ruim para mim e para minha família eu ficar perto dela. A exposição é irritante. Todos seguem os passos da novata e estar perto de mim a torna um tanto mais interessante já que ninguém mais nessa escola medíocre chamou nossa atenção.
É ruim para ela porque eu posso matá-la num piscar de olhos, sua vida seria apagada por conta da minha gula. Eu devia lhe falar o quanto é arriscado, excepcionalmente para ela, estar perto de mim. Eu já não possuo o melhor histórico com sangue humano, e até eu estou surpreso por estar aguentando tanto, mas insistir nesse contato é pura teimosia, eu não paro de me testar. Posso esconder minha tensão dela, mas não posso fugir por muito tempo da minha sede. As coisas só pioram quando eu fito aqueles olhos azuis e intensos e vejo um ser humano que não merece tamanha tortura.
Eu sei melhor do que ninguém do medo que ela sentiria em seus últimos segundos de vida. O desespero sufocante, a vontade de viver.
Caterine Swan seria só mais uma refeição, que diferença faria só mais um pouco de sangue em minhas mãos? Mas eu não quero ser fraco. Não quero voltar a ser um monstro que sempre abominei. Por que eu permito que ela se aproxime? Eu devo afastá-la. Isso só pode ter um fim, o qual posso visualizar perfeitamente, a humana mole nos meus braços, meus olhos vermelhos como nos velhos tempos que tudo era fácil para mim, eu tinha quem eu queria a hora que eu queria. Eu fui muito mimado e agora isso não se encaixa mais no meu estilo de vida.
Passo longas horas da noite pensando e repensando na proposta estupida e completamente imprudente que fiz a Caterine de nos falarmos de novo. Não sei o que deu em mim. Além da dor que é estar perto dela, eu senti algo novo. Curiosidade, excitação. Ela me contagiou com suas emoções. Eu lhe mostrei um brinquedo de ultima geração e ela só queria saber mais e mais dele. Enquanto encaro as estrelas por trás das nuvens, deitado no telhado de minha casa, penso no olhar dela de novo e de novo. Arremeço uma bola de tênis para cima e a agarro sem prestar mesmo atenção nos movimentos.
Os olhos dela me agradam, imagino, e eu não sei como processar isso.
Gosto de coisas bonitas como qualquer outro ser, os olhos dela são bonitos, por que isso me incomoda tanto? A noite vira dia e eu não cheguei a nenhuma resposta. Me ocorre que em poucas horas irei ver aqueles olhos vividos de novo e, repetidamente, penso demais no que eu possa estar sentindo com relação a isso.
Eu deveria estar sentindo algo? Eu acho que não. Jogo a bola de tênis com um pouco mais de força que o necessário e reviro os olhos para minha falta de atenção. Eu não sou tão desligado assim. Isso precisa parar. Eu não sou assim.
⋆
Quando chegamos no estacionamento da escola, nem chego a descer do carro de Edward quando ouvimos o motor esguelado da picape velha das gêmeas Swan se aproximando. Meu irmão sai e eu o sigo, nós nos sentamos na parte traseira do carro com Emmett e Sabine tentando conquistar nossa atenção enquanto eu vejo Caterine bater a porta da picape ao descer. Parece com sono, imagino que lhe enchi de informações e ela passou a noite se questionando de todas as realidades que podem estar acontecendo ao seu redor. É compreensível.
Pouco antes que os olhos dela se voltem na minha direção, como em todas as manhãs anteriores, eu viro o rosto para Emmett e finjo prestar atenção no que ele fala. Quando vou verificar de rabo de olho se ela ainda está olhando para mim, é sua vez de desviar o rosto. Por algum motivo que não reconheço, sinto a necessidade de fugir dela e é isso que eu faço, pelo menos nas primeiras aulas. Não consigo prestar atenção em quase nada. Um nervosismo incômodo me deixa curioso sobre toda a situação estranha e eu penso em como aquela garota parece tão inclinada a me arrancar um sorriso. Fico me lembrando de nossas conversas e de como ela me deixa intrigado.
Não gosto de sorrir de graça, mas ela chega quase lá mais vezes do que eu considero tolerável. Talvez porque ela é uma das poucas pessoas com quem eu converso ou sei lá.
A quarta aula se aproxima. As horas passam como um sopro e eu sinto o intervalo se chegando. Encaro o relógio enquanto o professor fala e me mantenho na sombra da sala de aula. Mexo uma caneta nos dedos, mas até esse gesto parece ridículo e ansioso e eu me obrigo a parar.
O que é que está acontecendo comigo?
⋆
A hora tão aguardada de reencontro chega e eu nem tento me esconder. Sento-me na mesma mesa do dia anterior e brinco com uma lata de refrigerante nas mãos, fazendo-me de distraído. A ideia foi minha, não foi? Terei de arcar com as consequências e eu... meio que me divirto com suas perguntas bobas e suaves. Péssima ideia, horrível, jamais repetir, só mais este dia, juro, eu penso. O cheiro dela me entorpece e, infelizmente para todo mundo, sinto que preciso ficar por perto. É um instinto possessivo que o caçador tem sobre sua presa, o mesmo que está abalando Edward neste momento. Meu lado menos humano encara como se Caterine me pertencesse, meu lado racional quer dar um tapa na cara dele e mais uma discussão interna começa. Só mais essa pequena reunião, vou suprir a vontade estranha de estar perto dela e depois irei lhe assustar, coisa que, como já reparei, não é muito difícil. Eu sei que a assusto mesmo sem querer, imagine tentando.
Caterine Swan entra não muito depois que o idiota do Mason Crowley que parece muito emburrado, está de braços dados com Isabella, sorrindo para sua gêmea e meus ouvidos se apuram ao ouvir sua risada. Aposto como Caterine está implicando com alguma coisa besta pela cara emburrada da outra. Ela deve ter um dom para isso e, em pensamento, observo como prefiro mantê-la bem longe de Emmett.
Como se sentisse que eu a olhava, o mar azul veio de encontro a mim e eu baixei o olhar para a latinha em minhas mãos sabendo que ela não demoraria a vir em meu encontro.
Dito e feito. Após pegar seu almoço na cantina, Caterine vem se sentar na minha frente com um sorrisinho meio arrogante e satisfeito. Seu maravilhoso cheiro me ronda e eu queria que o cheiro abominante de cigarro estragasse ele ao menos um pouco. Ela não fumou, mas sei que está com a caixinha na sua mochila. Seria um repelente um tanto eficiente, mas também não me agrada a ideia de vê-la fumando. Isso vai matá-la.
....
Rá.
— Você esqueceu a gravata— ela finge lamentar e balança a cabeça colocando os cabelos atrás das orelhas. Observo seu rosto, pensativo.
— Quer?— empurro suavemente a latinha na sua direção.
— Você não... ah, esquece, quero— ela pega a mesma. Deve ter se lembrado que eu repugno a comida humana.— Então, primeiramente— ela abre a latinha, observo os seus aneis e pulseiras contrariando o seu estilo de roupa. Uma garota meio gótica com bijuterias de uma garota que vai muito a praia. Gostei.— bom dia, senhor Hale.
— Bom dia, senhorita Swan— cruzo as mãos sobre a mesa e olho nos seus olhos hipnotizantes. É bom ver um tom diferente, para variar. Sou cercado por olhos dourados ou pretos e nem me toquei do quanto estava enjoado disso. Não que eu costume reparar nos humanos a minha volta, mas acredito que Caterine é a primeira pessoa que eu vejo com os olhos totalmente azuis, fora as pupilas, obviamente.
— Dormiu bem?— puxou assunto, claro que está pensando ainda em como começar a conversa.
— Eu não durmo— dou de ombros, ela franze o cenho, talvez em duvida se eu estou brincando ou não.— Você?
— Ah, eu durmo, sim— ela ri desacreditada.— E muito.
Ela passou um pouco de maquiagem. Hm. O rímel deu um volume bom nos seus cilios. Gostei. Se bem que eu aprovaria qualquer coisa que desse um destaque aos teus olhos.
— Você não dorme nunca?
— Nunca.
— E o que você faz enquanto a noite reina?
— Leio, assisto televisão ou sou perturbado pelos meus irmãos— olho por cima do ombro dela, na direção de Emmett que já me encarava com um sorrisinho. Ela fica pensativa e abre a embalagem que esconde seu lanche, pão de forma com maionese, mortadela, tomate e alface. Torço o nariz e ela balança a cabeça. Termina de mastigar e ajeita a postura.
— Sério, eu não faço ideia de como viveria sem uma variedade de comidas— afirma ela, evidentemente entendo minha cara de desgosto.
— Você se acostuma— respondo, ela fica tímida por algum motivo que não reconheço e baixa o olhar ao comer. Espero pacientemente— Não trouxe nenhum papelzinho para a entrevista de hoje?
— Acho que já vai ficar gravado na minha mente melhor do que em qualquer papel— ela sorri. Olho para sua boca quando ela passa a língua nos lábios.
— Hm— eu levanto a sobrancelha e ergo o rosto como que para me obrigar a parar de olhar.
— Você pode correr por quanto tempo, Hale?
— Posso correr para sempre.— me exibo.
— Meu Deus— ela se empolga, sem duvidar de minha resposta por um segundo que seja, sua emoção vem como uma onda de calor na minha direção me doando uma sensação prazerosa.— Como? Você não se cansa?
— Nunca.
— Dá para dizer que vocês vivem os extremos.— ela conclui, suspirando e bebericando do refrigerante. A todo momento evitando me olhar.
Você nem faz ideia. Preciso lhe falar. Movo os ombros como se respirasse fundo e deslizo no banco para me aproximar dela. Ouço seu coração se acelerar, mas ainda nem comecei a brincar com seus sentimentos. Ela começa a mastigar devagar até parar sem completar o ato.
— O que foi?— pergunta boca cheia. Quase sorrio.
— Não estou te ouvindo direito— digo com uma suave ironia. Tem um ímã invisível me puxando para perto. Ela termina de mastigar e esconde o sorriso com a mão. Seu olhar se torna malicioso de repente mas são só alguns segundos. Hum.
Não quero ir embora, mas vou precisar. Você vai ficar bem, Caterine. É o único jeito de você ficar bem.
⋆
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top