Irmãozinho

⋆⋆

Ando de um lado para o outro há tanto tempo no meio da sala de estar que fico surpresa que não tenha começado a cavar um buraco sob os meus pés.

Bella está quieta, roendo as unhas e encolhida no sofá. Isso é péssimo, embora útil. Argh, eu nem consigo focar em um só pensamento. Estou tão ansiosa, sem saber se Jasper também voltou.

— Você viu ele mesmo?— pergunto pela milésima vez.

— Eu o reconheceria em qualquer lugar, Caterine! Eu o olhei e ele me olhou de volta daí... eu desmaiei— Bella respondeu pela milésima vez, começando a se estressar.

— Que porra eles querem aqui?— resmungo e enfio as mãos em meus cabelos, cogitando arrancá-los.

— Será que eles voltaram por nós?— Bella perguntou sem me olhar. Parei de andar e me afundei do seu lado no sofá.

— Eles vão embora por nós, voltam por nós. Eles tem que se decidir nessa porra— sibilo. Sinto muita raiva.

Mágoa, ressentimento. Curiosidade. Saudade. São sentimentos de meses se formando como um bolo enorme na minha garganta.

— Talvez Alice tenha visto algo... e eles só querem ajudar— Bella tenta, ela parece um tanto chocada e esperançosa.

— Não teria porque voltarem para a escola nesse caso.— balanço a cabeça— Parece algo mais... fixo. Não sei.

Minha voz vai ficando trêmula conforme eu vou aceitando que talvez, muito provavelmente, Jasper esteja de volta. Penso em tudo o que ele me fez sentir. Bom e ruim. E eu fico com medo, porque não quero passar pelas coisas ruins de novo.

Eu implorei para ele ficar, mas ele me deu as costas. Meu orgulho está ferido demais, mas não mais que meu coração. Eu estava pronta para dizer que o amava, por mais que isso sempre tenha sido difícil para mim. Eu estava pronta para falar para ele, abrir mais espaço em minha vida, querendo que ele se acomodasse em meu peito.

Ele foi embora porque quis.

— Não estou pronta para ver ele de novo— admiti em um sussurro esperando que Bella fosse a única capaz de me ouvir. Meus olhos queriam transbordar, mas eu segurei a onda como pude.

— Eu também não— ela respondeu no mesmo tom e eu me encolhi para perto da minha irmã, deitando a cabeça em seu ombro, encarando fixamente a TV desligada na nossa frente.

Me sinto uma covarde. Estaria disposta a enfrentar uma vampira pronta para me matar agora mesmo, mas não tenho um pingo de coragem de sequer pensar em olhar na cara de Jasper.

Mas, que se dane, ele me deve uma explicação. E me conhecendo como conheço, não vou conseguir descansar até entender todos seus motivos.

Imersas no medo de como nossos corações podem reagir ao termos novamente o contato com nossos primeiros amores, Bella e eu ficamos caladas por uma hora inteira, sem saber o que fazer ou para onde ir. Até pelo menos, o telefone tocar.

Preguiçosamente, tomo coragem de ser a tal a ir atender. Sento-me na bancada e levo o telefone ao ouvido.

— Residência dos Swan, posso ajudar?— sou formal. Me torno formal quando estou irritada.

— Você tem sete dias— diz a voz rouca do outro lado da linha. Apesar do estresse que eu sinto, consigo soltar uma risada breve.

— Bom dia pra você também, Seth.

— Ah, cara!— Seth reclama do outro lado da linha, voltando a falar normalmente— Você pode pelo menos fingir que se assusta uma vez na vida?

— Quando você entrar na puberdade a gente conversa— debocho.

— Eu já estou na puberdade!

— O que você quer, cotoco? Seja breve, eu estou em meio a uma crise.— suspiro e encaro minhas unhas. Bem que seria uma boa ideia passar algum esmalte nelas.

— Eu tinha esperanças de falar com seu pai, na verdade, um tal de Clifford me disse que ele não está na delegacia e eu esperava que ele pelo menos tivesse passado em casa— disse. Rapidamente me levantei da bancada e fui para a porta olhando para Bella sentada no sofá, de costas para mim. Fodeu. Se meu pai estiver vindo para casa, é melhor a gente estar passando muito mal mesmo.— Minha mãe disse que o papai não tomou os remédios ontem a noite e agora ela tá surtando. Não consigo entrar em contato com ninguém que foi caçar pelos ursos.

— Você falou disso com o Clifford?— pergunto.

— Não, eu só perguntei do Charlie, você sabe que eu sou tímido com estranhos— ele sussurrou a última parte como se fosse algum segredo.

— Você vai ter que encarar, cotoco. Se está mesmo na puberdade, é porque vai virar um homem.

— Você é muito chata— ele resmungou e eu sorri meio elétrica. Talvez meu pai esteja só caçando mesmo, então não tem porquê surtar. Uma coisa de cada vez.— Você não devia estar na escola? Que crise é essa?

— Hã, problemas de garota— franzo a testa e dou de ombros, confusa comigo mesma por ir pelo caminho mais fácil que é mentir.

— Eca, sangue. A Leah também fica chata demais nessa fase— ele diz, distraidamente.

— Como se desse para te suportar em qualquer fase da sua vida.

— Pegou pesado, nossa!— ele riu.

— Ah, desculpa! Eu não quis dizer isso.— às vezes me esqueço que Seth é só uma criança. Não gosto de ser rude com ele porque ele é literalmente a única pessoa que não merece ter que lidar com meu mal humor. Sei lá, eu estou muito perdida, sinto como se tivesse entrado em uma montanha russa de emoções e não posso descontar no Seth— Eu tenho que ir, tchau.— falo, apressada.

— Tá bom... tchau, Cat— ele disse em um tom sutilmente curioso e eu bati o telefone, me apoiando com as duas mãos na bancada gelada da cozinha.

Em um ato de impulsividade, eu tenho certeza que ligaria para Jasper agora mesmo se soubesse seu número de telefone.

Não posso ir até ele. Ele que foi embora, ele que voltou, ele que tem que vir falar comigo, se é essa a sua intenção, se ele voltou com Edward já que ainda não sabemos do resto de sua família.

Me resta esperar.... não. Que se foda, eu não tenho que esperar nada. Ele que se foda, ele me chutou, quero que ele vá para o inferno!

.... mas que dê uma passada aqui antes.

Ah, por Deus, eu não consigo me decidir.

⋆⋆

O trabalho pareceu durar uma eternidade. Cometo uma série de deslizes e irrito algumas pessoas, mas deu para sobreviver. Estou destenta, as coisas balançaram e eu tenho certeza de que pareço esquizofrênica ao olhar tantas vezes para os lados. Procuro por alguém, mas nunca tem ninguém procurando por mim. Ele saberia onde me encontrar, a qualquer momento, Alice poderia lhe dizer.

Volto para casa a pé, minha mente é uma tempestade desconcertante mais nublada ainda que o céu de Forks. Um bolo de palavras se misturando causando uma enorme incoerência. Queria dizer exatamente o que estou pensando e sentindo, mas não faço ideia de por onde começar. Acho que preciso dormir para desviar dos meus problemas e evitar todo o estresse. Minha opção favorita e de longe a mais segura. Dormir para sempre, será que tem como me induzir ao coma de propósito?

Dúvidas e mais dúvidas, depois eu pesquiso isso afundo. A rua é deserta, e eu não deveria estar tão distraída, me lembro disso quando um uivo muito alto rompe pela floresta e perturba o silêncio pacífico que eu estava imersa.

Foi estranho, eu congelei imediatamente, um arrepio subiu pela minha espinha porque o som estava próximo demais. Em segundos, enquanto meus tímpanos ainda vibravam por conta do uivo, um rosnado profundo soou vindo do meio das árvores à minha esquerda.

Meus ombros ficaram tensos, não estava pronta para essa experiência de novo, mas também meus músculos não obedeceram meus comandos para ir para frente. Correr adiantaria? Engoli em seco e ouvi passos pesados se aproximando lentamente. Olhei na direção do som e vi um lobo enorme, ainda que menor do que Jacob e Sam. Ele estava agachado e seu focinho tremia relutando em mostrar os dentes.

— Jake?— chamei. Minha voz não passava de um sussurro. A pelagem desse lobo é mais clara, assim como seus olhos. Não acho que seja Jacob. Ele estava em pose de defesa e logo começou a chorar baixinho, o ganido se misturando ao rosnado. Parece instável. Eu não deveria, mas parece que ele quer que eu o veja.

O lobo aos poucos foi se deitando no chão, choramingando. Olhei para os lados, ansiosa. Está ferido? Isso é um pedido de ajuda?

— Quem é você?— eu me voltei para o lobisomem e me aproximei em passos curtos, lentos. Fui me abaixando lentamente, ele baixou as orelhas e esticou suas patas maiores do que minha mão em minha direção. Ele gemia, parece estar sofrendo— O que? O que aconteceu?— me ajoelho na frente do lobo e toco o topo da sua cabeça. Os pelos são sedosos e quentes. Ele se agita com meu toque. Se não é o Jake, nem o Sam...— Embry?— ele se levanta um momento e balança a cabeça enorme em negação. Não acho que Jared ou Paul viriam até mim dessa forma, tão... mansos.

Estamos expostos demais, meu subconsciente me recorda, de repente. Seja quem for esse lobo, está perto demais da estrada, se nos virem, como irei explicar?

— Vamos nos esconder, tá?— eu sugiro abraçando seu pescoço e o puxando para a floresta. Ele é pesado demais, eu não conseguiria fazer isso se ele resistisse. Ele se levanta, o rabo entre as pernas e a postura reprimida. Outro uivo ecoa pela floresta, este bem mais longe. Talvez eles possam se comunicar assim, talvez assim Sam apareça e ajude esse coitado. Adentramos a floresta em passadas lentas, fiquei preocupada tanto por causa da exposição quanto por causa da lentidão e do choro incessante dele. Acariciei seus ombros e sua nuca tentando acalmá-lo, por incrível que pareça, não é estranho, é a mesma coisa que fazer carinho em um cachorro muito, muito grande. Quando já não podíamos ver a estrada atrás de nós, foi quando me sentei no chão cheio de folhas mortas e umidas, encostando-me em uma árvore e o puxando comigo. O lobo de pelagem castanha desmoronou deitando a cabeça em meu colo mais uma vez.

O céu está começando a ficar escuro, mas eu não sei o que fazer, não posso simplesmente deixá-lo aqui. Olho para os lados e agora não vejo nada além de árvores e mais árvores.

— Tá, tá, você tem que voltar para sua forma humana para que eu possa te ajudar— dobrei-me para poder olhar seu rosto— Pode fazer isso?

O lobo estremeceu mais uma vez e lentamente veio se encolhendo para cima de mim, suas patas pesadas subiram em meu colo e eu só tive certeza que não aguentaria seu peso se ele continuasse com isso.

— Espera, espera, para— eu ofego, mas aos poucos o clima vai mudando. O gemido sofrego do animal vai se tornando mais humano.

Ele diminui de tamanho aos poucos, suas patas se tornam mãos e eu vejo seu cabelo escurecer. Cerro olhos, curiosa. Eu vi um homem virar um lobo, agora estou vendo um lobo virar um... garoto!?

— Meu Deus, Seth!— eu arregalo os olhos, surpresa, e abraço o garoto em meu colo, ele começa a chorar e não para. Seth agarra minha cintura e estremece. Luto para ignorar o fato de que ele está nu.— O que aconteceu, querido? Como você....

— Meu pai morreu, Caterine— ele praticamente gritou. Eu senti como se tivesse levado um soco no estômago— Meu pai morreu— ele repetiu, a dor que transmitia em sua voz fez com que meu âmago estremecesse e meus olhos lacrimejaram.

— Meu amor... ah, meu pequeno— eu sussurrei passando a mão em seus cabelos negros, Seth me apertou com uma força surreal e eu ofeguei, tentando não reclamar embora precisasse— Eu sinto muito— digo com um fio de fôlego. É a única coisa que me passa na cabeça— eu sinto muito.

— Meu pai, Caterine, meu pai, meu pai...— ele repetia, talvez em negação. Eu nunca tinha visto Seth chorar, assim como sua alegria, acredito que sua tristeza também se torna minha rapidamente.

De um minuto para o outro, nada mais importa além do meu melhor amigo.

— Eu sinto tanto— sussurrei e beijei o topo da sua cabeça. Seth é minha prioridade agora. Meu irmãozinho...

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