XXV

O tempo passava tão rápido, que Karl assustou-se ao perceber que já era maio e estava completando mais um ano de vida. Havia nascido no dia 24 de maio em uma manhã quente, segundo sua mãe dizia. Não houve problemas no parto, foi rápido e sem sofrimento. Para alívio de todos, inclusive do imperador.

Para sua felicidade, a temperatura estava agradável, aparentemente como no mesmo dia em que nasceu. Aproveitaria para caminhar um pouco, adorava sentir a natureza, parecia uma espécie de terapia; ajudava a pensar menos em seus problemas, mesmo que eles o perseguissem com louvor.

Abotoou os últimos botões da sua camisa, com ajuda do seu valete, vestiu seu casaco e saiu do seu quarto bastante animado. Era seu aniversário, não podia negar sua felicidade.

Desceu as escadas cantarolando uma música de Johan Strauss, uma que o fazia lembrar de Helene quando sentia muita saudade dela.

O pensamento o fez ficar melancólico; pensar nela era sempre bastante complicado. Ela ainda não havia saído das garras da Corte, e nem sabia quando ia poder sair. Enquanto isso não acontecia, se correspondiam por cartas apaixonadas semanalmente.

— Senhor?

A Sra. Goldberg o olhava impaciente.

— Perdoe-me, meus pensamentos estavam longe.

— Perceptível. — comentou baixo para que ele não ouvisse, mas sua audição era bastante boa. — Gostaria de saber se o senhor deseja um cardápio especial para seu aniversário.

— Adoraria que fizesse um schnitzel.

— Mais alguma coisa, senhor?

— O resto a senhora pode escolher.

— Como quiser, senhor.

A mulher fez uma reverência e saiu em direção a sua cozinha que tanto amava. Ela era bastante mórbida e calada, falava apenas o necessário. No entanto, suas mãos eram de fada quando cozinhava. Nunca tinha acertado tanto ao contratar aquela cozinheira. Tinha certeza de que quando voltasse da sua caminhada, teria um enorme banquete para degustar em sua solidão naquele palacete.

Quando saiu, olhou para o céu, estava formando nuvens, provavelmente choveria. Karl gostava da chuva, do som reconfortante que ela podia proporcionar; mesmo que desejasse o sol naquele dia, porque traria um pouco de alegria, ao contrário do clima chuvoso, que era pura melancolia e faria com que pensasse em sua vida.

Colocou sua mão no bolso da calça, procurando seu pequeno estojo de prata. Achou seu pequeno estojo e o puxou, tirando um cigarro. Acendeu seu novo vício com rapidez, dando a primeira tragada com satisfação. Ainda não sabia como tinha demorado tanto tempo para descobrir que o cigarro aliviava seu estresse, era impressionante como uma coisa tão pequena tinha um poder daquele tamanho. O cheiro não era um dos melhores aromas, mesmo assim, de alguma forma, ele gostava.

Não demorou muito para sentir a primeira gota em seu rosto. Não estava muito longe de casa, poderia voltar para evitar tomar um banho de chuva, no entanto, continuou sua caminhada. Jogou o maço de cigarro no chão e pisou em cima; não acenderia outro, pois seria uma tolice.

Outra gota o atingiu. Depois mais outra, e outra, até começar chuviscar.

— Pensei que iria demorar mais um pouco chuva. — falou consigo mesmo. — Mas, já que chegou mais cedo, bem-vinda ao meu aniversário de 31 anos. Durante esses anos fui rejeitado, fiquei apaixonado por alguém que eu não poderia ter, segui minha carreira militar, me casei, quase fui pai, porém perdi minha esposa e meu filho no mesmo dia, reencontrei aquela que eu amava, mas, mais uma vez não posso tê-la. — começou a rir. — Acho que estou ficando maluco, porque simplesmente estou conversando com a chuva, como se ela fosse resolver meus problemas. Santo Deus, que inferno estou vivendo. — caminhou para debaixo de uma árvore, sentando-se na raiz. — Preciso de uma resposta Deus, qualquer uma. Não posso continuar assim. — colocou a cabeça entre as mãos. — Sei que não fui um bom filho esses tempos, perdão.

Como resposta, trovejou.

— Devo considerar esse trovão como uma resposta, Senhor?

Trovejou mais uma vez e ele fechou os olhos.

Podia sentir o cheiro de terra molhada, o vento passando por seu rosto, os pingos d'água percorrendo todo seu rosto até cair em um lugar desconhecido. Estava completamente molhado, provavelmente pegaria algum resfriado.

Em sua distração, não percebeu que um cavalo se aproximava. Veio prestar atenção, quando ouviu seu nome ser chamado.

— Karl! — a voz era feminina, ainda não estava reconhecendo de quem poderia ser. — Karl, pelo amor de Deus, responda!

Karl se levantou e caminhou mais um pouco para identificar quem estava no cavalo.

Os seus olhos arregalaram-se quando reconheceu que a mulher no cavalo era Helene.

— Por Deus, Helene! Estou aqui!

Ela olhou para ele e deu mais impulso no cavalo.

— Deus, o que isso significa? — murmurou. — O que isso significa?

Helene desceu do cavalo e correu em direção a ele.

— Por que está nessa chuva?

Os olhos dela fuzilavam os deles.

Helene parecia estar furiosa.

— Acabei me distraindo em minha caminhada.

— Desde quando se tornou incapaz de sentir uma tempestade caindo sobre você?

— Não deveria estar aqui.

Um brilho assassino surgiu em seus olhos azuis.

— Não, eu não deveria. — tirou as luvas ensopadas. — Deveria estar em casa aquecida, em vez de procurar por você.

Karl quis rir daquela situação. Ainda não acreditava que ela estava ali em sua frente. Parecia uma miragem.

— Não me olhe como se eu fosse uma miragem. Estou aqui, Karl. Simplesmente estou aqui.

— É difícil acreditar que esteja aqui.

— Claro. — colocou as mãos na cintura. — Foi de uma grande estupidez ter vindo.

— Fico feliz que tenha vindo. — aproximou-se dela.

— Primeira frase gentil que disse desde que eu cheguei.

— Perdoe-me, não queria ser grosseiro. — encaixou sua mão na cintura dela, puxando-a para mais perto. — É o melhor presente de aniversário que eu poderia receber.

Todo seu rosto se iluminou, o que fez com que brotasse um sorriso nos lábios dela.

— Encarei essa chuva para encontrá-lo, sabe que sou frágil com resfriados. Fiz uma viagem longa de carruagem até aqui, porque não suportava mais ficar longe de você. Cada adeus que dissemos, doeu demais. Karl, eu simplesmente não quero mais passar por isso. Estou determinada a ficar do seu lado. Não irei embora de Salzburgo até me tornar sua mulher.

Ele estremeceu com aquelas palavras.

Depois sorriu.

— Sabe uma coisa que sempre quis fazer, além de me casar com você?

Helene deu uma pequena risada antes de responder.

— Não, o quê?

— Beijar na chuva.

Karl deu-lhe um beijo apaixonado, deixando a chuva abençoá-los. 

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