X

Era um dia chuvoso em Salzburgo, bom para estar em casa com sua esposa grávida, mas Karl estava em seu escritório no exército revendo alguns relatórios importantes, que não podiam ser deixados para outro dia. Estava cansado, precisa de um tempo longe do seu trabalho, e assim que seu filho nascesse, faria isso. Barbara reclamava da sua constante ausência, porém, nada podia fazer, mesmo sendo um arquiduque, tinha obrigações.

Abriu a gaveta da sua mesa para pegar o tinteiro, e deparou-se com o retrato de Helene. Haviam dez anos sem se comunicar, evitaram qualquer forma de contato para não haver mais dor e sofrimento. Apesar dele ter seguido em frente, ter se apaixonado e se casado, nunca conseguiu esquecer aquela que deixou em Viena. Barbara era uma esposa maravilhosa, mas seu coração nunca foi realmente dela.

Apesar de todos aqueles anos, era capaz de sentir o perfume dela, ouvir o som da sua risada, a maciez dos seus lábios. Gostaria de não pensar tanto nela, mas tinha um retrato dela em seu escritório que podia ser visto toda vez que abrisse a gaveta. Como gostaria de vê-la novamente, saber se estava bem.

Respirou fundo e pegou o tinteiro, fechando a gaveta logo em seguida, para não lembrar ainda mais do passado que tanto desejava esquecer, mas não conseguia.

— Senhor! — um soldado entrou apressado em sua sala.

— O que aconteceu? — levantou-se assustado.

— Sua esposa...

— O que tem a minha esposa? — interrompeu o soldado, andando até ele.

— Sua empregada está esperando o senhor na carruagem.

— Diga-me, Bloch!

— Sua esposa estava entrou em trabalho de parto, mas as coisas não estão ocorrendo muito bem, a criança não quer sair.

Karl saiu apressado pela porta. Desceu todos os lances de escada loucamente, quase caiu duas vezes, mas conseguiu se manter de pé. Seu coração estava acelerado devido a corrida repentina, afinal, não estava mais tão jovem, já tinha trinta anos.

Beatrice estava na porta da carruagem batendo o pé nervosamente. Karl a puxou pelos braços e a colocou dentro da carruagem, para depois entrar, e o cocheiro começar a andar.

— Beatrice, fale-me apenas a verdade. — disse arfando.

— A senhora não está anda bem, Alteza. A criança não está encaixada, a parteira está com muito medo. Estão tentando fazer todo o possível para salvar os dois, mas não sabemos se conseguiremos. Chamamos também o doutor Lemmer, ele deu o mesmo diagnóstico.

Começou a chorar, não aceitava que aquilo estivesse acontecendo. Não conseguiria perder sua esposa e seu filho ao mesmo tempo, seria algo muito cruel, não aguentaria carregar essa dor sozinho.

Para seu grande alívio, sua casa ficava próxima ao exército, não demorando muito para chegar. Mas estava tão angustiado, que os segundos pareceram horas. Nem esperou a carruagem parar, saltou em movimento, e subiu as escadarias correndo até o quarto de Barbara.

Não ouviu nenhum grito, nenhuma correria pelos corredores, aquilo foi deixando seu coração ainda mais acelerado. Começou a andar devagar, estava com medo do que poderia encarar mais em frente. Como era doloroso ter a sensação de perder alguém para a morte.

Uma empregada saiu do quarto chorando, com as toalhas brancas completamente sujas de sangue. Quando ela o viu, começou a chorar mais ainda, e saiu correndo por onde ele tinha vindo.

Correu até o quarto, a porta estava aberta, com o médico colocando as duas mãos de Barbara sobre sua barriga. A parteira chorava juntamente com as outras empregadas.

Seu corpo ficou paralisado, como se tivessem lhe enfiado uma faca nas costas. Seu coração começou a desacelerar, não conseguia aceitar que Barbara não estava mais entre eles. Seus passos estavam tão devagar, que ninguém notou a presença dele inicialmente.

Ajoelhou-se ao lado da cama e pegou a mão gelada da esposa, que antes era morna e cheia de vida. O quão adorava os carinhos que ela fazia com aquela mão em seus cabelos, ou quando apertava suas bochechas para alegrá-lo. Passou a mão pelos longos cabelos loiros, que ela amava deixar soltos, principalmente quando ia caminhar pelo campo. Como sentiria falta daquele belo sorriso todas as manhãs.

Seu choro ganhou mais vida, mais força, ele não conseguia mais se controlar. Tinha perdido sua esposa e seu filho ao mesmo tempo. Como aquilo era doloroso, como estava machucado por dentro. Não conseguia respirar de tão agitado que estava.

Chorou ainda mais quando o doutor colocou a mão sobre seu ombro.

— Lamentamos, Alteza. Sabemos do seu carinho e devoção por sua esposa.

— Como isso pôde acontecer? Como? — murmurou entre soluços.

— Infelizmente isso é muito comum.

— Não deveria ser! — afundou a cabeça na cama. — Não deveria.

— Eu sei, Alteza. É bastante difícil essa situação, nunca é fácil.

Karl não conseguia parar de chorar. Não conseguia sentir suas pernas, nem seus braços, estava praticamente imóvel. Continuava incrédulo com o que estava acontecendo em sua frente. Não conseguia aceitar.

— Por favor, alguém comunique para a família de Barbara o que ocorreu.

— E a sua família? — perguntou, o que ele achou ser a voz de Beatrice.

— Apenas para minha mãe.

E voltou sua atenção para o corpo imóvel de Barbara em cima da cama.

Helene tocava piano em sua sala particular. Depois de todos aqueles anos, conseguiu obter êxito em se manter afastada de Albert. Apesar de várias humilhações, brigas, tinha conseguido manter seu orgulho, merecia isso no mínimo. Achava que conseguiria a anulação do casamento, pois não tinha ocorrido a consumação, mas seus desejos foram todos frustrados; Albert não anularia o casamento.

Constantemente era pressionada para fornecer herdeiros ao império austríaco, mas não cederia jamais a esse tipo de pressão; não seria a égua reprodutora de Albert, tinha prometido a si mesma.

Sua sogra entrou na sala com os olhos marejados. Levantou-se preocupada, e andou até ela. Colocou a mão sobre suas costas e a levou até uma poltrona.

— O que aconteceu, Majestade?

— Oh, Helene. — começou a chorar.

Helene começou a ficar preocupada.

— Diga-me, Seraphine, o que aconteceu?

— A esposa de Karl.

O coração de Helene acelerou ao ouvir aquele nome.

— O que houve com Barbara?

— Faleceu durante o parto.

— Oh meu Deus. — colocou as mãos sobre a boca. — E a criança, está bem?

— Faleceu juntamente com a mãe.

— Karl deve estar péssimo.

— Ele comunicou apenas a mim, Helene.

— A senhora dever ir para Salzburgo imediatamente. Simplesmente não pode deixá-lo sozinho em um momento como esse.

— Poderia vir comigo?

Helene negou com a cabeça, não conseguiria vê-lo naquele momento. Não seria apropriado de forma alguma, seria difícil demais revê-lo depois de dez anos. Porque ela ainda sentia o mesmo por ele, nada havia mudado em seu coração. Guardava a última carta dele em seu porta-joias, com todo amor que tinha.

— Seraphine, eu não conseguiria.

— Entendo. — bateu nas mãos de Helene. — Mandarei arrumar minhas coisas para eu partir. Sei que nunca mais se falaram, nem mesmo por carta. Porém, o momento agora é outro. Escreva algo para ele, Helene. Tenho certeza que ele ficará calmo em meio a essa tempestade.

— Escreverei uma carta e lhe entregarei.

— Certo. Preciso ir. Passo em seu quarto antes de ir.

— A carta estará pronta.

Seraphine passou a mão pelos olhos e saiu da sala.

Helene encostou-se na poltrona e respirou fundo.

— Ah, Karl, parece que o destino realmente brinca conosco.

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