43°
ACORDO mais uma vez no escuro. Tenho estado muito no escuro, preciso reconhecer. Mas agora é diferente. Não sei o que fazer daqui para frente. Esperava que, mesmo tendo uma vida de merda com Oscar, quando encontrasse minha mãe, as coisas seriam um pouco melhores. Mesmo sabendo que estava doente, me dei essa esperança.
Noto uma coisa diferente na cama. A falta de alguém.
Sento-me ereta, olhando para o espaço que Damon estava deitado horas antes. Eu devo ter adormecido enquanto esperava por ele e talvez ele tenha ido embora. Por que iria ficar com alguém que há dois dias atrás o ofendeu e...
Ouço um suspiro do outro lado do quarto e me estico para acender o abajur.
Damon está deitado no sofá. Parece um sofá de boneca comparado ao seu tamanho.
Quase sorrio, ao invés disso, pego uma das cobertas em que ele me embalou e cubro seu corpo grande demais para o meu sofá.
Eu poderia acordá-lo, mas ele parecia tão cansado mais cedo que não tenho coragem de tirar esse momento de tranquilidade, mesmo que ele fique com dor nas costas ao acordar. Isso me faz lembrar que ele ainda não está totalmente recuperado. Suas costelas demorariam quatro semanas, no mínimo, para curar. Mal se passaram duas.
Retiro a coberta e descruzo seus braços, com cuidado. Levanto sua camisa e estreito os olhos para ver o hematoma. Está pior desde a última vez que vi. Com certeza o esforço que ele fez para me carregar teve suas consequências.
Se isso ficar pior...
Vou para a cozinha, onde pego um pacote de ervilhas e volto para o quarto.
Retirando o que eu disse, vou ter que acordá-lo, por isso cutuco seu braço. Ele se mexe e faz uma careta, provavelmente sentindo dor. Seus olhos finalmente se abrem e ele se senta.
— O que foi? Você está bem? — quando ele vai parar de preocupar tanto comigo quando ele mesmo está todo ferrado?
Seguro seu pulso e puxo ele para cama. Ele senta, mas empurro seus ombros para ele deitar.
— Não sabia que gostava tanto assim de dormir comigo — Damon sorri, mas estou concentrada levantando sua camisa de novo e pondo o pacote de ervilhas. — Ah... Eu quem deveria estar cuidando de você.
Eu o ignoro e sento ao seu lado, de frente para ele. Precisa deixar o pacote de ervilhas por pelo menos quinze minutos.
— Posso te contar um segredo?
Pisco duas vezes.
— Nunca deixei ninguém cuidar de mim — Damon diz, olhando para o teto. — Quando Sam me batia, eu não fazia nada para me curar ou deixar que fizessem. Minha mãe sempre estava pior que eu e não podia fazer nada de qualquer jeito e Oscar... Ele também se machucava muito.
Alcanço sua mão e aperto, ele retribui.
Robert ficou para resolver toda a papelada e acompanhar a cremação. O pedido dela para o irmão foi que seu corpo fosse cremado. Ele fez e agora as cinzas da minha mãe estão em uma urna.
Paro de pensar nisso e me concentro no garoto em meu quarto. Ainda estou surpresa que Jason tenha deixado ele ficar. Talvez ainda reste um pouco de senso nele.
Não sei o que pensar sobre isso, na verdade. O que significa Damon estar aqui, cuidando de mim, depois de todas as coisas que disse a ele. Ele é uma pessoa boa e não cansa de me provar isso.
— Você era uma criança fofa. — Damon está dizendo enquanto folheia um álbum que achou embaixo da minha cama. Quase digo a ele que me disse isso da primeira vez que veio ao meu quarto.
Estamos deitados, ele vendo minhas fotos quando criança e eu vendo ele ver minhas fotos quando criança. Não sei como agradecê-lo por estar aqui comigo em um momento tão difícil.
— Sabe, eu também era fofo quando criança. Bem mais fofo que Oscar. — a forma como ele se orgulha disso me faz querer rir.
Damon fecha o álbum e olha para o relógio na minha cômoda.
— Está com fome?
Na verdade não, mas a última vez que comemos foi no almoço e está quase escurecendo.
Pisco duas vezes.
— Vou buscar alguma coisa. Tudo bem?
Pisco de novo e ele sai.
Jason está no meu quarto, parado como se não soubesse direito o que fazer. Está pálido e eu diria que andou chorando se não o conhecesse.
— Vim apenas avisar que estou indo para Carson City e devo voltar apenas em dois dias... E quando eu voltar, espero que o filho de Sam já tenha ido.
Não movo um músculo, não respiro alto demais. Eu não pisco enquanto ele me encara.
Sem conseguir nenhum reação minha, ele me dá as costas, mas para na porta e diz por cima do ombro:
— Eu sinto muito.
Vou até a cozinha depois de já ter passado dez minutos e Damon não ter aparecido. Minha imaginação projetou várias possibilidades de algo ter dado errado. Como por exemplo, ele e Jason terem se encontrado e brigado de novo ou Damon simplesmente ter ido embora.
As duas coisas estavam erradas já que ele está pondo calda na pilha de panquecas.
— Não como panquecas com calda. — é a primeira coisa que digo em quase dois dias. Ele fica imóvel por um momento e depois vira para mim, como se estivesse vendo um fantasma. Bom, talvez eu tenha sido isso nas últimas horas ou até mesmo semanas.
— Certo... — Damon tenta esconder sua surpresa com um sorriso e separa as panquecas de baixo para mim, sem calda.
Sento na ilha da cozinha e ele senta ao meu lado, me passando um prato com panquecas e bacon.
Dispensando os talheres, envolvo o pedaço de bacon na panqueca e como. Ao meu lado, vejo Damon sorrir.
Eu sorrio também.
Ainda estou triste pela minha mãe. Uma parte de mim sempre estará, mas preciso me lembrar de quem ela era e quem quero ser. Não menti quando disse que ela é uma inspiração para mim ou que queria ter sua coragem. Minha mãe foi contra todos para ser feliz e eu pretendo fazer o mesmo daqui para frente.
Voltamos para o quarto em silêncio. Não falei mais e não sei se Damon esperava que eu fizesse. Provavelmente, por isso decido começar por algo que tem me atormentado desde o momento que eu disse.
— Menti para você. — digo a ele. Ambos estamos deitados. Estou aninhada em seus braços mais uma vez.
— Sobre o quê? — ele pergunta calmamente enquanto faz círculos preguiçosos em meu braço.
— Sobre tudo. — consigo ouvir seu coração acelerado mesmo sua voz estando calma.
— Tudo?
Demoro dois segundos para processar sua pergunta e a conversa que tivemos.
Me desvencilho dele e sento na cama, ele também, apoiando o corpo na cabeceira.
— Não menti sobre amar você. — minhas bochechas esquentam, mas sustento seu olhar. Ele precisa saber que estou falando a verdade.
— Você me ama.
— Eu o amo.
Damon me puxa para o seu colo, uma mão em meu quadril e outra na minha bochecha.
— Sabe, eu não teria me declarado se não amasse você também.
— Você me ama.
— Eu a amo.
Faz duas semanas que eu não sorria como estou fazendo agora. Ele sempre vê as melhores partes de mim.
— Isso signifi...
Seu celular toca antes que eu possa terminar a frase. Ele olha para o relógio antes de atender. São 00:02h.
A voz do outro lado da linha diz alguma coisa que não consigo ouvir e ele sorri.
— Você nunca esquece... — Damon fecha os olhos e apoia a cabeça na cabeceira — Não, não estou em uma festa... Se não tivesse ligado, eu com certeza teria esquecido... Não é um dia especial... Não, aniversários não são especiais, tia...
Fico rígida em seu colo. Aniversário? Hoje é aniversário dele? Mas...
— Certo... Podemos ter essa conversa mais tarde? — ele passa a mão no rosto parecendo impaciente, mas dá risada logo depois. — Vou me lembrar disso... Tchau, tia.
— Você não ia me contar que hoje é seu aniversário? — pergunto quando ele desliga. Damon sorri para mim e aperta meu nariz.
— Não e espero que você não me lembre disso a cada minuto.
— Você devia ter me contado! Não tenho um presente para você. — tento me lembrar se ele não mencionou em nenhum momento, mas tenho certeza que não.
— Já disse para você o que eu quero. — Damon dá um meio sorriso, em seus olhos as palavras não ditas.
— Estou falando sério! Queria lhe dar um presente — continuo. Ele suspira, encara meus olhos e lentamente, desce sua atenção para minha boca. Meu coração vai de zero a dez com esse olhar. Mas, pela primeira vez, ele quem desvia os olhos de mim.
— Você precisa descansar.
— Já descansei o suficiente — deixo escapar. Damon ergue as sobrancelhas e eu fico vermelha. — E ainda não falamos sobre seu ani...
— Não tem o que falar. Então vamos dormir... Ou você quer que eu vá...
— Não. Não quero que vá embora. — suspirando, eu saio do seu colo. Se ele for embora... Não quero mais ficar sozinha. Não agora.
Em cinco minutos as luzes já estão apagadas e nós já estamos deitados e cobertos. Estou em seus braços de novo, perguntando-me o que ele acha disso.
— Damon?
— Sim?
— Vamos conversar sobre isso mais tarde. Eu prometo.
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2bjs, môres♥
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