𝐂𝐀𝐏𝐈́𝐓𝐔𝐋𝐎 𝟕 • Alabama
EPISÓDIO 2 — PARTE 2 — TEMP. 1
[ALABAMA]
AS CHAMAS ALTAS DA FOGUEIRA aqueceram o corpo frio de Ira. Entretanto, não era uma fogueira qualquer, mas sim uma espécie de instigação do Thomas para chamar a atenção do Rei.
Não importava o motivo para Ira, ela apenas estava aproveitando a chance de se esquentar e presenciar a queima dos retratos, lembrando dos momentos em que estivera tão perto de uma fogueira como agora, mesmo que da última vez não tenha sido por um motivo assim, mas para fazer traidores de sangue pagar.
Os gritos que ouvira quando os corpos queimaram ainda vivos foram música para ela dormir.
Ira observava enquanto mais e mais pessoas traziam retratos do Rei George, os jogando na grandiosa fogueira que ascenderam. Em suas mãos, uma caneca fumegante de uma de suas muitas receitas de bebidas que aprendeu em suas viagens.
Mesmo com a comoção, ela ouvia Thomas incentivar os homens e jogarem mais quadros na fogueira. Com ele ao seu lado, fumando um cigarro, do seu lado direito estava John, inspirando o delicioso aroma que saía da xícara dela.
— O que é isso aí? — perguntou ele, atraindo a atenção de Tommy enquanto continuavam alimentando o fogo. — O cheiro é bom.
— É um gare du nord — respondeu ela, cheirando a bebida. — É uma dose de Cognac Courvoisier com café expresso, contreau, casca de laranja e anis. Você tem que flambar o conhaque para ele acentuar o gosto da laranja e do anis.
Thomas, novamente, estava perplexo pelas coisas que ele descobria que ela podia fazer, preparar drinks finos e requintados acabara de ser adicionado à lista. Mas ele precisava concordar com John, o cheiro que vinha da bebida era divino.
Nem mesmo ele sabia de onde tinha vindo a ideia, mas quando percebeu já era tarde. Ira nem mesmo reclamou quando ele tirou a xícara das mãos dela e provou do líquido quente. Thomas não mentiria, mas aquilo era uma das melhores bebidas que ele provou em toda a sua vida.
— Supostamente, é um drink que desperta o corpo e restaura a mente — concluiu.
— E a gente bebendo cerveja barata — reclamou Arthur, acompanhando John.
Thomas pousou a xícara delicadamente de volta nas mãos de Ira, passando um dos braços em torno dos ombros dela. Aquilo não foi com malícia ou má intenção, mas sim pela enorme quantidade de pessoas, principalmente homens, que Thomas sabia já estarem bêbados e que pudesse tentar fazer algo contra ela — não que Ira precisasse de proteção, é claro.
— Espero que saiba o que está fazendo — comentou Arthur com Thomas.
Ira não sabia exatamente o que estava fazendo ali com eles, na verdade. Horas antes, Thomas havia perguntado se ela tinha algum quadro do Rei, mas ela disse que não, afinal ela não era dali. Mas isso não a impediu de acompanhar Thomas para Watery Lane.
Ainda, ela falava algo sobre drinks com John, até que uma voz grossa pediu para que abrissem caminho, logo para que se afastassem. Ira, incerta, fez menção de se afastar, mas o aperto suave de Thomas foi o suficiente para que ela ficasse no mesmo lugar. Porém ela não entendia o porquê de John, Arthur e Finn terem se afastado. Eles eram irmãos, era família, e ela não era nada deles.
— É o Sr. Shelby? — perguntou o desconhecido.
— Eu mesmo — afirmou Tommy, tragando o cigarro.
— Podemos conversar à sós?
— Eu estou ouvindo — sibilou Thomas, nem pensando em mandar Ira embora. — Pode falar.
— Disse que eu estaria seguro — sibilou ele, inseguro.
— Está seguro.
O homem balançou a cabeça, como se negasse, mas continuou?
— O que está acontecendo?
— Quero que escreve algumas coisas — mandou, ele correndo para pegar o bloco de anotações. — Em primeiro lugar, não é que as pessoas aqui sejam desleais ao rei. Ao contrário. Não queremos nosso amado rei olhando e vendo o que estão fazendo conosco. Então removemos os retratos.
— Mas por que estão queimando?
— Fomos ao inferno por nosso rei. Caminhamos sobre as chamas da guerra. Anote tudo isso. E agora estamos sendo atacados em nossas próprias casas. Os novos policiais de Belfast estão invadindo nossas casas e mexendo com nossas mulheres. Não achamos que o rei gostaria de ver isso acontecer. Então nossa fogueira é um alerta para o rei.
— Posso perguntar que posição ocupa para falar?
— Nenhuma — respondeu Thomas. — Eu sou um homem comum. Ganhei medalhas por valencia na batalha de Somme. Quero que escreva no seu jornal o que acontece aqui. Já pode ir embora.
O homem não perdeu um segundo para sair dali, assustado demais com o evento que acontecia. As pessoas voltaram a se amontuar em volta da fogueira, distraídas demais em conversas aleatórias para perceber que Thomas e Ira conversavam quase sussurrando, apenas para que os dois ouvissem.
— Por que me manteve por perto? — perguntou ela. — Estava tratando de negócios que não me dizem respeito algum.
— Começamos com o pé errado, eu e você — disse Thomas, jogando o cigarro no final para a fogueira. — Mas acho que algo entre nós é evidente.
— E o que seria?
— Eu não sei — deu de ombros. — Mas estou tentado a descobrir, Ira.
Ira se virou, ficando de frente para ele para poder encará-lo.
— Espero que, por enquanto, possamos nos conhecer melhor, ou como quiser chamar — disse ele. — Quero que conheça exatamente o que te espera entre os Shelby.
— Por quê? — insistiu ela.
— Porque acho que, em breve, vou querer que você seja apresentada oficialmente para a minha família.
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ERA PARA TER sido uma manhã normal para Ira, onde ela iria acordar, regar suas exóticas plantas, preparar uma xícara de café e decidir com que parte do seu trabalho ela lidaria — bruxaria ou... assuntos clandestinos que ainda não seriam citados.
Entretanto, não fora isso o que aconteceu. Em plenas oito da manhã, Ira ouviu batidas em sua porta. Primeiro ela imaginou que poderia ser Thomas, mas não faria muito sentido ele estar ali a essa hora. Logo, talvez pudesse ser um de suas vizinhas, mas aquelas batidas eram apressadas, como se alguém implorasse para ela abrir a porta.
— Podemos entrar? — perguntou Polly assim que Ira abriu a porta.
— Podem, é claro — confirmou, abrindo mais a porta para que Polly e Ada entrassem.
Antes de fechar a porta, Ira olhou pela rua, vendo se tinha alguém ali. Felizmente, a rua estava vazia.
Assim que ela fechou a porta, Ada e Polly a aguardavam na sala. Ada parecia inquieta, enquanto Polly parecia levemente irritada.
— Está tudo bem? — perguntou Ira, intrigada com a repentina visita das duas.
— Preciso que faça um teste de gravidez na Ada — disse Polly, direta. — Precisávamos de discrição, ir ao médico chamaria atenção demais.
Ira abriu a boca e a fechou algumas vezes, surpresa por saber que aquele era o motivo da visita.
— Há quanto tempo está atrasada? — perguntou Ira à Ada.
— Uma semana — respondeu.
— Ada — Polly chamou a atenção da sobrinha.
— Umas cinco semanas, talvez sete — falou, sendo sincera. — Eu achei que fosse falta de ferro. Comprei suplementos.
— Que não funcionaram — afirmou Polly.
Ira assentiu, ainda extasiada.
— Eu vou pegar meu sapo — avisou, indo em direção à cozinha.
— SAPO! — exclamou Ada, assustada.
— Eu sou médica, mas não tenho os instrumentos que eu precisaria para fazer um teste aqui — explicou Ira. — Por isso o sapo. Ou melhor, uma rã.
Antes que Ada pudesse falar algo, Ira já havia desaparecido na cozinha, provavelmente dando para outra área ao ao livre onde a rã estaria.
Polly sabia que Ira era um bruxa, sabia que ela era médica, e logo seria parte da família — de acordo com o que Tommy dissera. Se havia alguém que poderia manter sigilo sobre aquilo, era Ira Lestat.
— Ai, credo! Deixe esse bicho longe de mim! — implorou Ada, assustada ao ver um pote grande com a suposta rã que nadava alegremente ali dentro.
— O nome dela é Alabama — disse Ira, colocando o pote na bancada. — Ela é uma rã-de-unhas africana. O hormônio gonadotrofina coriônica humana é uma das formas de permitir saber se alguém está grávida. Ele está na sua placenta, consequentemente na sua urina.
— Eu vou ter que fazer xixi nesse animal? — perguntou ela, horrorizada.
— Não, claro que não — garantiu Ira. — Mas a sua urina vai ser injetada na rã. Foi comprovado que se injetado a urina de uma pessoa grávida nele, essa espécie irá botar ovos em algumas horas.
— Precisa ser num sapo?
Polly suspirou, ascendendo um cigarro na esperança de afastar a vontade de voar na cabeça de ada pelo drama que ela estava fazendo.
— Também podemos fazer isso com um coelho ou um rato, mas eu precisaria dissecar eles depois para ver se ovularam — disse Ira, traumatizando mais Ada. — E eu não tenho um coelho nem um rato.
Ira estendeu a mão para Ada, indicando para ela pegar o potinho. Ada tremeu, ainda inquieta com a ideia de seu xixi sendo ejetado na chamada Alabama.
— Você vai ir logo fazer xixi ou não? — perguntou Ira, sacudindo levemente o pote. — Alabama tem um grande dia pela frente.
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20.07.21
𝐍𝐎𝐓𝐀𝐒 𝐅𝐈𝐍𝐀𝐈𝐒:
O fato de descobrir se está grávida por meio dessa rã é verídico! Entretanto, usar mamíferos (ratos e coelhos) foi descoberto em 1920. Mesmo que a série Peaky Blinders passe em 1919, foi em 1930, o médico britânico Lancelot Hogben descobriu que o mesmo processo poderia ser feito com anfíbios.
-18 NÃO BEBAM!!!
O drink citado pela Ira, o Gare du Nord, valoriza os sabores em temperaturas mais quentes, em todo o seu preparo. O conhaque é flambado para extrair da casca da laranja e do anis, uma solução com alto teor de seus sabores. Estes sabores são unidos a uma boa dose de café preto e enriquecidos com contreau. É quente sim! Mas seu sabor dever ser apreciado dose a dose.
Receita: 1 oz de Cognac Courvoisier XO, 1 xicara de café expresso (ou solúvel) levemente doce, Contreau, Casca de laranja-de-umbigo e anis.
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