Parte 10
As casas cada vez ficavam mais iguais. Algumas tinham pintura extra, mas a maioria mostrava os tijolos maciços e marrons que as constituíam. Eram simples, mas pareciam bem cuidadas. Tendo em vista a regressão de beleza que os olhos Daisy presenciaram, aquilo era uma surpresa.
O clima entre guia e turista não era dos melhores. Após ela terminar de falar sobre Madeleine, o que fizera durante quase toda a caminhada, Angelo continuava cabisbaixo, o oposto de quando cedeu sua ajuda à garota perdida.
— Aquela é a casa, nº73. Boa sorte — ele falou em tom baixo enquanto apontava para o destino.
Daisy estranhou seu comportamento e expôs o sentimento no rosto. Mas, assim como as outras coisas que não entendeu sobre o garoto, deixou as palavras de dúvida na mente.
"Ele ficou triste quando eu comecei a falar sobre a Madeleine. Por que será? Será que ele não gosta dela? Ou que se sentiu deprimido pelo mesmo motivo que eu?"
Daisy bateu levemente na porta de alumínio veneziana após Angelo despedir-se. Via através dos buraquinhos de entrada de ar uma luz acesa lá dentro. A janela era do mesmo material e estilo, mas não saía luz de si, o esperado do que se cobre com uma cortina.
Depois de pouco mais de um minuto, ouviu o barulho da chave entrando na fechadura e da maçaneta em forma de alavanca. Os sons metálicos foram substituídos por um rangido alto das dobradiças da porta, e esta era atendida por um menino, que aparentava ter dez ou onze anos. Seu cabelo quase inexistente dava ênfase ao tamanho da cabeça, e os olhões que iam de cima abaixo com o sorriso bem aberto completavam o aspecto bobo que ficaria como primeira impressão.
— Esta é a casa de Madeleine? — o sorriso foi refletido, mas este era de nervoso.
— É... Mãe, tem visita! — O berro do menino ainda emitia aquela expressão infantil. — Ela já vem... Pode entrar se quiser.
Ela aceitou, e fez voar a vista no ambiente aconchegante da pequena sala. O garoto a convidou a sentar-se num sofá, um dos dois que ficavam entre um tapete redondo de lã e uma mesinha simples de madeira no meio.
Sentada rente ao braço do móvel, ela massageava as mãos no colo, e ficou ainda mais nervosa quando o garoto quase pulou para ficar ao seu lado, com rosto hipnotizado à menina de aparência cansada e ansiosa.
— Você é uma das amigas da Maddy? — ele perguntava, animado.
— Sim, mais ou menos... Eu me chamo Daisy.
Antes que o menino respondesse com seu nome, uma voz feminina e rouca veio de trás: — Tyler! Saia de cima da garota!
Ele, em desânimo e de maneira lenta, obedeceu e levantou-se, ficando em pé ao lado do sofá. A convidada fez o mesmo, mas abruptamente, encarando a mulher alta, que convertia a rispidez recente num sorriso. O olhar amigável lançado vistoriava a garota de cima a baixo.
— Quer beber alguma coisa, querida?
— Só um copo d'água, por favor.
A mulher virou a cabeça ao menino e ele rapidamente entendeu, indo, ainda emburrado, até a cozinha.
A anfitriã fez sinal com a mão para que ela se sente novamente. As duas o fizeram, em sofás diferentes, uma de frente para a outra.
—Não pude deixar de ouvir... Chama-se Daisy, não? Sou Evelyn, mãe da Madeleine. Ela já falou sobre você. A propósito, já sabe o que ela aprontou dessa vez? — falou a mulher de maneira rápida e relaxada, cruzando as pernas e encarando a mais nova com olhar incitante, como se fosse contar uma fofoca.
Daisy sentiu-se ao mesmo tempo aliviada e confusa. Não seria ela a primeira a tocar no assunto, mas surpreendeu-se que isso tenha sido feito de tal maneira.
— É... Ela fugiu... Por medo de alguém que a perseguia... — a mais nova falou pausadamente em voz leve.
— Menina, se você a conhecesse bem, não se surpreenderia com o tanto de vezes que ela já deu desculpas assim. Quem a perseguiria? Ela não tem muitos conhecidos, e o ex-namorado dela nem mora mais na cidade, e mesmo se morasse, o menino era um bom rapaz, tão prestativo e educado... Papo furado! Ela sempre fez isso durante a adolescência... Cabulava aula, chegava tarde em casa... Era bem criativa com as desculpas, mas nada que colasse pra mim.
A garota viu despertar em si um interesse no assunto, ao mesmo tempo que começava a sentir algo de negativo na mulher. O olhar nervoso para ela pausou quando viu, atrás de Evelyn, o menino caminhando em sua direção, com um copo na mão.
— Eu sei que veio aqui por que se preocupa com Maddy, mas não precisava. Como estão seus pais? Por que eles não vieram?
Mesmo com Tyler surgindo no meio das duas, a mulher não desgrudava aquele olhar em Daisy. Trêmula, pegou o copo d'água e bebeu lentamente alguns goles. Com a mesma velocidade, pôs o copo na mesinha central e levantou a cabeça.
O olhar que a intimidava continuava, como se estivesse empedrada desde o momento da conclusão da pergunta.
— Eu vim só... Eles... Eles estavam cansados e foram dormir cedo.
— Jura? Atravessou a cidade a esta hora sozinha? Por quê? Foi só para falar sobre a Madeleine mesmo ou tem outro motivo? — as perguntas soaram preocupadas.
— Não, é que... Imaginei que não sabiam do ocorrido e quis avisar, assim como perguntar se... se sabem onde ela poderia estar.
— Ah... — E finalmente moveu a expressão e o corpo. Descruzando as pernas e ajeitando o vestido, suspirou forçadamente e respondeu: — Ela já aprontou coisa pior. Os hormônios dessa idade transformam essas crianças em grandes autoras de drama e ficção... Obrigada pela preocupação, mas logo ela aparecerá.
Mesmo não se convencendo dos argumentos da mãe e detectando certo otimismo exagerado na fala, Daisy deu-se por satisfeita. Levantou-se, agradeceu e caminhou até a porta. Mas foi interrompida pela mulher que, ao olhar no relógio de pulso, falou que "isso não era horário para uma moça estar na rua".
— Mas eu... eu tenho que ir. Meus pais ficarão preocupados — e um pouco de realidade recaía em sua cabeça.
— Ligue para eles e os avise que dormirá aqui. Eles deixaram você vir e agora deixarão você ficar — falava em tom de ordem, caminhando para trancar a porta. — Essas ruas são tão perigosas que nem um anjo da guarda seria capaz de te proteger... E já viu como o tempo está doido? E se do nada começar a chover?
Daisy caminhou seu olhar para o menino, sentado no sofá. Ele balançava as pernas e sorria para ela com o mesmo tom que fizera quando os hormônios ainda a colocavam algum ânimo naquela decepcionante visita. E pensava, discando um número inexistente no telefone e fingindo falar com alguém.
"Podia piorar e piorou. Aumentaram as coisas que soarão como más para meus pais. Fui enganada. Devia ter me dado ouvidos quando o lado racional agiu, quando estava sentada naquele banco fedido, a meio quilômetro daqui. Não há bem maior algum para lutar. Pelo que parece, Madeleine está bem, e agora não tenho nada para falar que contrarie a razão de sua mãe. É irônico, não? Evelyn se preocupa comigo, mas está segura com relação a filha. Ela é parecida com meus pais, mesmo que a preocupação que eles têm com Madeleine seja diferente. Essa insistência de sua mãe em não depositar ansiedade na sua fuga exclui um pouco da minha... Será que ela inventou mesmo essa história? Será que o girassol foi pego mesmo com boas intenções? Agora me preocupo com ele. Será que me apegarei nesta preocupação mais tarde para justificar minhas ações? Como outro bem maior?"
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