1. Gohan

Preparar o arroz era uma espécie de terapia. Hada esfregava os grãos ásperos entre as palmas das mãos. Uma, duas, três vezes a água leitosa era trocada, antes de colocá-los na panela. Numa cozinha tradicional japonesa, que ainda não tinha conhecido o advento da eletricidade, a refeição era cozinhada à lenha. Em meio ao verde pantanoso do arrozal centenário, arroz era sua brasa, vida e sustento. Havia sido assim pelas quatro gerações da família de Hada que sobreviveram do cultivo e colheita do grão. Pena que esta estava ameaçada de ser a última. A colheita passada não foi das melhores, e o preço do arroz japonês ficava aquém de seus grandes competidores asiáticos.
Mas Hada sabia que tudo que estava mal ainda podia piorar.
Três batidas à porta tomaram sua atenção. Ela correu até a entrada, onde seu pai já estava de braços cruzados em frente ao visitante: o algoz calvo e detestável que se encarregara da região.
O pai de Hada entregou-lhe um saquinho com todas as economias que a família tinha economizado em um ano.
- Você não soube, velho Sato? - O algoz desdenhou, examinando uma moeda dourada entre dedos calejados - Os impostos subiram este ano.
- Para quanto?
Ele lhe informou o valor. A alma do velho Sato quase saiu do corpo.
- Mas... mas isso é três vezes mais do que no ano passado. Não vamos ter como pagar.
O sorriso do algoz era amarelo e zombeteiro.
- Então sugiro que comece a fazer as malas. - Ele guardou as moedas no bolso - Vou ficar com isso por enquanto, mas estou te dando uma chance. Em duas semanas venho recolher o restante do pagamento. O resto você já sabe: sem pagamento, você arrisca perder suas terras.
E partiu com seu cavalo negro e reluzente.
Sato caiu contra a porta, escorregando até ficar sentado no chão.
- Pai! - Hada gritou, correndo para ajudá-lo - O senhor tem que ter cuidado. Ainda não se recuperou dos ferimentos do acidente.
Mas o velho era teimoso. Levantou-se sem ajuda, sentou-se no tatame do quarto de jantar e pediu uma porção do arroz fumegante na panela. Antes de comer, contemplou-o, os grãos brancos grudados no hashi.
- Hada, eu preciso que você me escute. - Ela segurou as mangas do kimono antes de sentar-se ao lado do pai. Pegou suas mãos nas dele, olhando-o com atenção. - Não queria que chegasse a isso, mas é nossa única chance: A família real precisa de um novo fornecedor. O Palácio fará uma competição e o vencedor será responsável por abastecer o castelo. - Ele voltou sua atenção para ela - Eu vou. Preciso que você fique aqui e cuide da propriedade.
Ela se ajoelhou, tocando o chão com a testa. Hada era franca, perspicaz e com certeza tinha herdado o espírito mercador do pai. Não iria assistir àquilo de braços cruzados.
- Não, pai. Quem vai sou eu. E com certeza vou salvar nossa fazenda.

(487 palavras)

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