Capítulo 01

A bebida forte queima a minha garganta a cada gole que dou, mas a dor ou impressão que sinto não é nada comparada à sensação e o sentimento que trago dentro de mim. Nunca me senti tão triste e vazio como agora.

— Amor, estás ocupado?
— Estou só a tentar dar o nó à esta gravata. Já estou farto disto. Porque é que temos que ir assim vestidos? Só vou conhecer os teus pais.
— Depois de os conheceres vais entender o porquê de teres que ir assim vestido. Deixa-me ajudar-te.

Os seus olhos negros estão fixos na gravata e eu observo-a, enquanto ela me ajuda. Ela não sabe o quanto ela é linda.

— Viste? É fácil. Agora, podes apertar o fecho do meu vestido?
— Claro que sim.

As suas costas estão descobertas por causa do fecho despertado, aproveito para deixar um beijo nas mesmas antes de o apertar e um outro no seu ombro antes de olhar para ela de novo.

— Estás linda.
— Obrigada amor, tu também estás lindo.
— Preciso de me corrigir. Tu és linda.
— Que querido!

Beijo os seus lábios claros que quase se confundem com a sua pele.
Não fazes ideia do quanto me fazes falta. Podes achar egoísta da minha parte, mas queria tanto ter sido eu a morrer no teu lugar e não ter que estar a lidar com este ardor dentro do peito.
Quero acabar com tudo, deixar de sofrer assim, mas sei que não posso. Tenho que continuar a suportar esta dor pelo nosso menino, pelo fruto do nosso grande amor.
Gostava que isto não passasse de um conto de fadas que fosse fazer juz ao teu nome, mas o meu beijo não te irá fazer acordar.
Espero não ficar louco longe de ti. Espero que não tenhas levado toda a minha sanidade mental contigo, pois já levaste grande parte de mim. Já não sou o homem que conheceste, mas não sei se será bom para o nosso menino. Não sei o que fazer agora. O nosso pequeno pergunta por ti e eu não sei o que responder. Não tenho vontade de me levantar da nossa cama que ainda tem o teu cheiro. Há vezes em que penso que ainda estás aqui, mas não passa de uma ilusão.
O teu sorriso está gravado na minha mente e as nossas memórias têm invadido todos os meus pensamentos. Não sei o que vai ser de mim sem ti ao teu lado.

— A massa já está pronta?
— Sim chefe. Só falta a carne.
— Falta a carne? A carne não estava praticamente feita?
— Sim, mas o Miguel saiu daqui já há uns minutos e ainda não voltou.
— Ele disse onde ia?
— Sim, disse que ia à casa de banho.
— Então trabalhem por ele enquanto ele não volta. Não quero as coisas atrasadas ou os clientes à espera.
— Sim, chefe.

O homem já idoso, chama por mim do outro lado da porta e eu apresso-me a responder e a passar água pela cara.

— Miguel!
— Estou aqui senhor Marco.
— Rapaz, há quanto tempo estás aqui?
— Pouco.
— Pouco não é de certeza, se assim fosse não estavam os pedidos atrasados.
— Peço desculpa senhor Marco.
— Eu disse-te que ainda era cedo para voltares.
— Mas assim posso distrair-me.
— Nota-se. Para isto prefiro que não venhas e coloco alguém a substituir-te. Eu assim vou ter que acabar por te despedir.
— Não, por favor. Eu preciso muito deste emprego para poder continuar com o Mateus. Ele é a única pessoa que me resta.
— Eu sei bem que sim e não te quero despedir. Eu entendo o que estás a passar e sei bem que é difícil, então na tua idade é pior porque não se está à espera. Tens que te agarrar ao vosso pequeno Mateus e seguir em frente. Tu continuas aqui vivo e tens que viver a tua vida. Se te deixas ir a baixo será mais difícil de melhorar e podes até desenvolver problemas de depressão e essas coisas todas. Por isso ou te empenha no trabalho ou ficas mais algum tempo em casa.
— Eu irei empenhar-me, não posso ficar em casa, se não dou em maluco. Agradeço imenso a sua compreensão, vou fazer por não o desiludir.
— Espero bem que sim, se não vou ter que te despedir. Agora vai lá continuar o trabalho e ajuda os teus colegas. Não podes fazer pausas tão grandes a uma hora de tanto trabalho como esta.
— Sim senhor.

Não consigo prestar atenção às coisas devido ao que se passou. Do nada entro num transe profundo e deixo de dar atenção a tudo o resto que me rodeia. Deixo de pensar, deixo de ouvir, de cheirar, de ver... deixo todas as sensações e a única coisa que me resta é respirar.

—  Papá! É hoje que a mamã volta?
— Não pequeno. Já fizeste os trabalhos de casa?
— Já, mas houve um exercício que não consegui resolver. Podes ajudar-me?
— Claro que sim. Mostra-me lá esse exercício.

Agora só sei fugir do assunto, mas não sei por quanto tempo. Como é que eu lhe vou dizer que ele nunca mais irá poder ouvir a tua voz, não irá poder voltar a abraçar-te e a receber o teu beijinho de boa noite? Ele ainda é muito pequeno, apesar dos seus 6 aninhos e de andar na escola, como todas as suas responsabilidades. Ele ainda é um bebé, o nosso bebé como tu dizes.

— Mamã, eu já me sei vestir sozinho.
— Mas para mim ainda és o meu bebé, por isso, sempre que poder irei ajudar-te.
— Deixa o garoto vestir-se sozinho, para veres como corre. Ele já é um homenzinho.
— Vês mamã, o papá concorda comigo.
— Mas eu não concordo. Tu és o meu bebé, até nascer o próximo mano ou mana.
— Eu vou ter um mano?
— Ou uma mana.
— Sim!
— Mesmo depois de ele nascer vais continuar a ser o meu bebé, mas o bebé maior.
— Ou ela mamã. Eu quero uma mana.

Estávamos todos tão contentes com a notícia, essencialmente o nosso pequeno que dizia sempre que iria ser uma menina, mas aquela mulher tinha que nos roubar a nossa felicidade, não tinha? Ela nunca concordou com o nosso namoro, e saber que tinha sido avó sem haver casamento e ela não saber de nada, só piorou tudo.      

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