Karen

No dia seguinte...

-Senhor arcebispo, não dá para eu ficar restaurando a benedita gárgula se toda a noite tiram ela do lugar para limpar o local. Vocês têm que parar com isso, uma escultura desse tamanho não foi feita para ficar sendo tirada do lugar todos os dias. Com o perdão da palavra deixa essa porra quieta, vocês vão acabar quebrando a escultura de vez. - Eugène gritava no celular ao perceber que a  gárgula estava 9 cm fora do lugar que  havia deixado na noite anterior.

...

Emma estava  ansiosa em seu último dia na Espanha cumprindo a agenda de compromissos. Mesmo encaixando vários compromissos que não tinha  no começo  da viagem e por vezes almoçando em reuniões ou tomado café em algum compromisso e tendo que comparecer em alguma festa de alguém que nem conhecemos a noite , não acrescentamos mais nada para fazer depois do dia combinado para voltarmos e olha que convite não faltaram.

...

Emma ...

Na festa de ontem Reed levantou a hipótese de transformar meu livro "Quando tudo der errado " em um filme, porém  estava querendo que eu o reescrevesse para transformar em uma comédia romântica natalina e até perguntou qual atriz eu achava melhor para fazer o papel principal: Kat Graham ou Candice king e antes que eu respondesse ele mesmo respondeu que Kat já havia feito alguns filmes de natal e por isso era melhor fazer com a Candice dessa vez.
Reed levantou a hipótese de começarem a gravar o filme o quanto antes para ficar disponível no mês de dezembro e eu  estava adorando tudo aquilo, apesar de muito cansada. Reed queria ter certeza de que era possível fazer o filme até dezembro antes de assinarmos qualquer coisa. Mas o importante é que havia uma negociação e tanto eu quanto ele estávamos bastante empolgado com aquela ideia. Hoje irá acontecer a última festa de divulgação da série e amanhã de tarde já estaremos no aeroporto de Orly, bem a tempo de eu inventar uma desculpa qualquer para ver Pierre.

Fui tirada de meus pensamentos por um telefonema de Jean:

- Buenos dias.

- Bonjour, como vão as coisas  por aí? - Puxei  assunto sem está nem um pouco interessada.

- Amor, as coisas não andam muito bem por aqui, minha mãe comentou sobre ter visto um monstro no quarto de Alís no dia do incêndio. - Jean falou conseguindo verdadeiramente minha atenção.

- Você acha que é o caso de precisar de internar a sua mãe? O que ela realmente viu? - Perguntei sem me preocupar em estar parecendo amedrontada.

- A minha mãe não parece estar louca mas toda vez que pergunto a ela sobre o dia do incêndio ela sempre responde a mesma coisa : Que viu o demónio em chamas diante dela , diz que em seguida desmaiou e quando acordou o quarto  estava pegando fogo perto da lareira e nas curtinhas. Disse que foi até a varanda onde Alís estava e viu o mesmo demónio voando ainda em chamas. Os mais velhos estão falando que foi o gárgula que voltou para se vingar da minha família. A história já está se esperando bem rápido por toda a cidade. Não vai demorar para isso ganhar a internet e você ter mais um tempo com seu livro em evidência .

- Jean , eu não quero ter meu livro em evidência as custas da loucura da sua mãe. - Falei.

- Desculpa meu amor se eu te ofendi , é que eu estou realmente preocupado com o que está acontecendo com a minha família, pois Alís não desmente a minha mãe. Eu liguei para te falar que irei comprar alguma coisa para dar de aniversário a minha grand-mère e darei em seu nome , talvez eu tenha que voltar antes para Paris o capitão não está muito feliz ,  uma ex miss foi assassinada em Paris e acho que ele não vai me dar as duas semanas que prometeu, sorte que o aniversário de Alís é amanhã. Emma  alguns restauradores estão aqui tentando arrumar as coisas para tudo está apresentável amanhã e estão me pedindo um pouco de água, vou atender-los e qualquer coisa ligo mais tarde. Estou com muitas saudade. - Jean falou com a voz  cansada.

- Bon journey. - Falei antes de ouvir Jean desligar o telefone.

Está bem acho que consegui a desculpa que precisava para falar com Pierre.

...

Horas depois ...

O curso já havia acabado e o sol não  demoraria muito a se pôr e como o arcebispo  havia pedido , Eugène  foi até o porão para restaurar a escultura mas teria que se retirar antes do pôr do sol.

Eugène colocou  em seu celular a valsa das flores de Tchaikovsky e começou o trabalho . Quando o sol se pôs o restaurador havia acabado de  terminar a asa  da Gárgula e estava satisfeito por ter conseguido adiantar o serviço pois estava certo de que conseguiria terminar no dia seguinte e finalmente a escultura poderia voltar a ser exposta.

Pierre já havia acordado porém permaneceu em modo estátua até que o restaurador se retirasse  e ele pudesse voltar a ler o diário de Maya .

...

Emma...

No dia seguinte acordei feliz e ansiosa , é maravilhoso viajar e foi fantástico o fato de além de assinar o contrato que transformar  as Crónicas de machado e espada em série ainda conseguirmos desenvolver essa ideia de um  possível filme de natal.

- Que sorriso maravilhoso tudo isso é porque vai voltar para os braços de um certo policial hoje à noite?- Karen perguntou me fazendo parar e pensar.

Não , definitivamente aquele sorriso e aquela ansiedade não eram para ver o Jean; era para ver o Pierre. Ok mon Dieu! 

Naquele momento tive a certeza de que não era apenas uma obsessão por estar escrevendo sobre ele , eu realmente estava gostando de Pierre.  Tinha certeza que  falar isso em voz alta vai parecer um tanto patético mas no momento  meu coração batia forte por Pierre Durand e não por Jean Carlos de Leroy. Respirei fundo e respondi:

- Na verdade Jean está em Nancy, foi por causa de um pequeno incêndio na casa da família e a princípio ficará lá até semana que vem. Estou feliz porque tudo correu melhor do que imaginávamos, estamos indo embora com um contrato assinado e um em fase de negociação. -Menti.

Bom, aquela seria à noite que eu teria que resolver o que eu iria fazer da minha vida. Não poderia passar o resto da minha vida , casada com Jean e pensando em Pierre como Maya fez . Também é fado de quê ninguém conseguiu até hoje trazer Pierre Durand de volta. Sim passou pela minha cabeça por alguns segundos como seria fazer sexo com ele:

- Já meti tanta coisa diferente lá que um pedaço de mármore não faria tanta diferença. - Sussurrei.

Eu estava no meio da sala parada, pensando naquilo enquanto minha amiga estava ligando para pedir o café da manhã no quarto.

- Emma , você também vai querer uma tortilha? - Karen perguntou.

- Sim e suco de laranja por favor, pede 1 litro . - respondi indo até o meu quarto começar a arrumar a mala .

Durante o café da manhã vi Karen por várias vezes sorrindo largamente ao ler mensagens de Eugène.

- Eugène me chamou para ver a gárgula que terminará de restaurar hoje, disse que o arcebispo não está na catedral por motivo de saúde.

- E você vai? - Perguntei com a boca cheia de tortilha.

- Claro que sim, que outra oportunidade terei de ver aquela estátua sem um monte de gente em volta? Depois vamos à Orleans pegar um quadro que Eugène cobrou os dois olhos da cara para restaurar. Acho que iremos passar a noite em Orleans  matando a saudade  e pegaremos o quadro no cu da manhã . - Karen falou com um sorriso  safado no rosto e pôr alguns segundos tive inveja da minha amiga por ela ter para quem voltar e por saber o que queria para sua vida.

...

Horas depois em França...

Foi maravilhoso chegar em casa. Assim que cheguei mandei uma mensagem para Jean avisando  que havia chegado, mas falei que iria dormir para descansar um pouco da viagem para que o mesmo não ligasse. Dei uma lida no último capítulo que havia escrito e era claro que eu estava colocando há algum tempo no livro os sentimentos que eu tinha medo de expressar na realidade.

Aquilo era loucura , Pierre nunca poderia me dar o que eu preciso, eu preciso de um marido que esteja do meu lado, que seja carinhoso, companheiro, que me ame ... Que possa saciar minhas vontades e desejos.

- Acho melhor tomar um banho frio.

...

Algum tempo depois...

-Desculpa só poder vir no final da tarde, é que eu estava verdadeiramente cansada , também  optei por fazer com calma minha "malinha" para ir para Orleans com você, mesmo sendo perto é a primeira vez que viajamos juntos. - Karen falou descendo as escadas vestida com uma camisa branca de seda com à mangas princesa, shorts de couro com cintura alta e  sapatilha  da cor preta.

- Tudo bem meu amor. - Eugène  falou sorrindo ao ver a namorada  descendo a escada.

Karen beijou o namorado que  fazia o máximo possível para não sujar a  morena.

- Devo confessar que achei que a gárgula fosse bem mais assustadora, sabe que olhando direitinha ele é bem sexy. Eugène, você acredita no que dizem sobre a estátua ser amaldiçoada ou que na verdade isso seja tipo um sarcófago muito bem feito que colocaram Pierre Durand ainda vivo? - Karen se distanciou do namorado e ficou olhando  a  gárgula bem de perto.

- Karen , não se diz estátua e sim ,  escultura. Eu tenho certeza que a escultura não é nenhum tipo de sarcófago. Sobre ser amaldiçoada eu já não sei, não entendo sobre essas coisas, mas é estranho, às vezes  tenho a certeza de que a asa estava alguns sentimentos mais alta ou mais baixo, por vezes também acho que o semblante está um pouco diferente, antes tinha a impressão que tinha a famosa cara de paisagem  mas esses dias notei como se tivesse uma feição de quem sente dor. Também tem o mistério de que eu não sei porquê constantemente mudam a escultura de lugar. -  Eugène falou subindo  o escadote para terminar de restaurar a garra no alto da asa.

- Já descobriram quem quebrou a escultura? - a morena falou olhando pacientemente a enorme gárgula.

- Se sabem , não querem falar. - Eugène falou enquanto trabalhava.

O tempo foi passando e por volta das 21:10  Emma desceu a escada com um bloco de A3 especial para desenho e um estojo nas mãos e assim que os viu  falou tentando não parecer nervosa pelos amigos estarem ali a minutos da Gárgula acordar:

- Perdão , não sabia que ainda estavam aqui.

- Eu já acabei, estou apenas guardando alguns materiais que tenho que levar para casa pois irei restaurar um quadro do século 17 para  uma cliente. - Eugène explicou.

- Achei que já tivesse terminado a capa do livro. - Karen falou pegando a maleta menor para ajudar  Eugène.

- Eu terminei, mas é que eu estou pensando em fazer um desenho para cada capítulo, em preto e branco mesmo sabe? - Emma falou beirando ao desespero, pensando que Pierre poderia voltar a vida a qualquer segundo.

Karen colocou a  maleta no chão e foi olhar alguns dos desenhos da amiga.

- Você desenha muito bem, vai ficar ótimo tenho certeza, esse ficou  melhor do que o da capa. - A morena falou enquanto folheava o bloco de papel A3 que pegou da mão da amiga.

- Muito bom mesmo , mas já pensou em tirar uma foto? Se tirasse uma foto seria bem mais fácil, não precisaria vir aqui toda vez que precisasse de desenhar a gárgula . - Eugène falou olhando os desenhos. -  Vamos Karen, que eu ainda vou em casa  tomar um banho, Emma estou muito feliz por tudo que está acontecendo com o seu livro, bonne soirée.

Karen entregou os desenhos a amiga e começou a subir a escada  falando :

- Bonne soirée.

- Bon voyage. -  Emma falou olhando os amigos subindo pela escada e  indo ao lado de um armário e  pegando um antigo cavalete.

Como já havia desenhado a gárgula por diversas vezes rapidamente fez o rascunho . Emma estava concentrada fazendo algumas sombras quando Pierre acordou e sem se mexer muito perguntou:

- Eu posso mexer ou terei que ficar imóvel até terminar o desenho?

- Pode se mexer . - Emma falou sem tirar os olhos do papel.

- Achei que tivesse terminado a capa do seu livro e também achei que tivéssemos combinado que só viria aqui quando tiveres algum  motivo. - Pierre falou vendo  Emma parar de desenhar e  colocar calmamente o  bloco de desenho e o lápis em cima de uma cômoda que estava guardada ali.

- Eu realmente já terminei de desenhar a capa do meu livro, e  tenho algumas coisas realmente importantes para falar com você hoje, e a primeira é: você foi  visto por Alís e Diná de Leroy, pessoas em Nancy estão falando que a gárgula da família Leroy voltou para se vingar; você foi filmado por um drone , fiquei sabendo disso há pouco minutos antes de sair de casa, está viralizando na internet, talvez você não saiba o quanto isso é perigoso , mas isso quer dizer que pessoas no mundo inteiro estão vendo aquele vídeo,  o vídeo já está sendo estudado por pessoa que realmente conseguirão dizer o vídeo é falso ou não. Na velocidade normal não dá para ver você , apenas um  vulto  é visto, mas não sei o que aparecerá diminuindo a velocidade do vídeo. Sei que não estava querendo matar Alís e Diná pois se assim quisesse não teria ninguém capaz  de impedir, mas você não é nenhuma criança sabe que não pode ser visto, qual o seu problema? Se viu que não dava para pegar o diário naquele dia, era só voltar no dia seguinte, não precisava correr tanto risco.

- Emma , Alís ia queimar o diário, Alís está longe de ser a velhinha que vocês pensam: ela tacou fogo em mim e depois me feriu com um atiçador de lareira, ela ainda atirou em mim  , o pior é que dessa vez não saíram  apenas lasquinhas o estrago foi grande eu podia ter perdido uma asa, eu podia ter morrido. Ela sabia muito bem o que estava fazendo.  Se era apenas isso que tinha para me dizer, já disse. - Pierre se virou ficando de costas para  Emma tentando fazer  o que o arcebispo havia pedido.

- Não é só isso que vim te dizer . - Pierre Durand ficou novamente de frente para  Emma que se aproximou e disse ficando a poucos centímetros da Gárgula: - Acho que estou gostando de você.

Nesse momento  Emma  ficou nas pontas dos pés e selou os lábios de Pierre. A Gárgula  abraçou a ruiva trazendo-a para si e beijou-a ardentemente.  Foi então que ouviram  um barulho que  os fizeram parar e travar por alguns segundos;  Eugène estava paralisado no meio da escada e seu celular havia caído de sua mão descendo degrau por degrau da escada até atingir o  chão com a tela trincada.

Eugène

Pierre Durand

Emma

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