Capítulo 9 - parte 2 (não revisado)
– O que ele disse? – perguntou Júlia. – Vocês usam uns códigos tão esquisitos!
– Toma. – Daniela pôs um comunicador no seu ouvido enquanto contava e explicava a conversa. – Assim podes acompanhar a ação.
Curiosa, Júlia escutou o noivo.
– Ei, Mancha, segunda vez que pões a mão em um lugar errado do meu corpo. – Júlia ficou vermelha e Vespa teve vontade de cair na gargalhada. Olhando sua cara, tão rubra, não aguentou mais e riu à vontade. – Toma cuidado.
– Desculpa de novo, mas tu estás atrás de mim e não tenho olhos nas costas. Se não te prenso contra a parede, eras apanhada pela câmera.
– Então como podes saber que eu ia ser apanhada pelas câmeras? – perguntou, curiosa.
– Tenho ouvidos tão treinados que sei exatamente onde estás, mesmo sem te ver. Agora, passa a prestar atenção redobrada, ok?
– "Ei, Mancha" – era a voz do Mateus –, "deixa essa para mim que tô caidinho por ela, tá? Vê lá a mão boba."
– Isso é entre nós dois – Mancha riu –, mas sabes o que uma Viúva Negra faz na noite de núpcias, não sabes, Gavião?
– "Mata o marido." – Mateus caiu na risada. – "Desde que seja de cansaço, não me importarei nem um pouco."
– Vou-te matar mesmo é a tiro, Gavião, seu metido.
– "Igualzinha à Diabinha, meu Deus." – Mateus riu novamente, lembrando-se da Angélica e suas ameaças. – "Me mata do jeito que quiseres, amor... Atenção, tem quatro descendo na vossa direção. Vou deixá-los passar."
– Fica aí, Diabinha, invisível.
Omar afastou-se, escondido pelas sombras. Um minuto depois, quatro homens desciam a ladeira lado a lado, batendo papo descontraidamente quando, do chão, surgiu um vulto negro com duas pistolas nas mãos. Antes que erguessem as armas cada um levou um tiro. O vulto voltou a sumir no chão e surgiu ao lado da Michaela.
– Como consegues fazer isso, Omar? – perguntou a colega, verdadeiramente assombrada.
– Quando tinha nove anos, os meus pais foram para Londrina por quatro anos. Lá, ingressei na academia de Ninjútsu, a primeira do Brasil. O mestre ia com a minha cara e me ensinou muitas coisas... – Omar calou-se repentinamente e empurrou a delegada contra a parede e atirou.
– Mancha, caso ainda não saibas, isso aí chama-se seio e geralmente um homem só o pega em circunstâncias muito diferentes da atual, sem falar que antes de os pegar, rola uns beijinhos e essas coisas mais. Eu sei que é muito gostoso, mas já que és comprometido quem sabe tu...
– Então presta atenção, que droga – afirmou ele, soltando o peito da Michaela, zangado e não entrando na brincadeira. – O pato quase que te vê!
– "Estou com ciúmes, Mancha."
– Tu também, Gavião, havia mais um, então presta atenção que quase nos pega.
– "Não veio daqui, Mancha, tenho certeza."
Michaela ergueu a arma e disparou, matando outro.
– Saiu daquela ruela – apontou ela.
– Fica aí e abate quem aparecer, mas toma cuidado comigo para não me confundires com eles. – Omar sumiu nas sombras e penetrou na ruela. Andou dez metros e abateu mais um criminoso. O segundo saía de uma casa e ele apagou-o. – Achei um pequeno QG escondido. Vou penetrar, obter informações, limpar e sair.
Sem esperar resposta, Mancha Negra entrou na casa. Havia dois homens no térreo que ele abateu facilmente. Subiu para o piso superior e encontrou mais dez homens. Antes que se refizessem da surpresa, Omar matou nove e atirou na mão do décimo, que perdeu o fuzil.
– Quietinho aí – ameaçou, apontado para a sua cabeça –, senão vais servir de alimento para os urubus e ratos do esgoto. Onde está a minha filha que vocês raptaram?
O meliante nada disse e Mancha Negra disparou no seu joelho. Com um grito estridente de dor e pavor, o bandido caiu no chão.
– Tenho pressa. Onde está a minha filha? – perguntou, atirando no outro joelho.
– Na mansão, com o Cobra – respondeu gemendo muito.
– Obrigado e adeus. – Omar atirou no meio da testa do criminoso, matando-o instantaneamente. Voltou e encostou-se na parede, ao lado da Michaela.
– Vamos, Diabinha, que faltam uns trezentos metros.
A delegada notou a extrema ansiedade no colega, que aumenta à medida que se aproximavam da convergência. Mataram mais alguns criminosos no caminho e chegaram ao local onde as trilhas se encontravam.
– Ainda bem que esses bandidos impõem um toque de recolher, senão jamais teríamos uma chance razoável – disse ela. Pegou na sua mão e parou-o. – Olha ali, tem quatro escondidos. Mancha, estás tremendo muito!
– Estou com muito medo, Diabinha. – A sua voz era ofegante, demonstrando temor e muita ansiedade. – Trata-se da minha filha e não de um desconhecido qualquer! Tenho medo de errar e perdê-la.
– Se continuares tremendo desse jeito, vais mesmo errar. Acalma-te e respira fundo.
– "Que é isso, Mancha." – Gavião tentou acalmá-lo. – "És o único da equipe que a pode salvar com total segurança. Não ponhas tudo a perder, tchê."
– E se eu errar, Gavião? – perguntou, amargurado. – Jamais conseguirei olhar na cara da Júlia.
– "Bah, Mancha, quando foi que erraste um tiro?" – perguntou Lobo Mau. – "Jamais vi isso acontecer!"
– Nunca – respondeu.
– "Então para com isso" – ralhou o amigo.
– Sempre há uma primeira vez, Lobo Mau – comentou muito preocupado.
– "Não para ti, Mancha Negra. Tem fé, meu irmãozinho, que estamos prontos a te ajudar" – voltou a dizer Lobo Mau. – "Sabemos que é tua filha, mas só tu e o fator surpresa podem eliminar os riscos. Lembras da mosca na cantina? O pato é muito maior que ela, então para com isso."
– Mesmo assim – insistiu Omar, tremendo de preocupação – estou morrendo de medo, tchê.
― ☼ ―
Júlia vinha acompanhando a ação, preocupada com o noivo e mais ainda com a filha. Tinha ouvido todas as conversas da equipe, ficando bem vermelha com os comentários da delegada em relação às mãos de Omar e aos seus seios, ao mesmo tempo que escutava as risadinhas debochadas da Vespa e dos demais, especialmente os comentários do Gavião.
Quando viu que o noivo estava desesperado e morto de medo de falhar, pediu para Daniela se podia falar com ele.
Vespa, vendo que isso poderia ajudar muito, ligou o microfone dela.
– Omar – principiou a noiva –, tens que te acalmar. Se algo der errado jamais te culparei, meu amor, porque sei que terás tentado. A nossa filha só tem uma chance e, pelo que todos falam, essa chande depende exclusivamente de ti. Então vai e faz o que deve ser feito. Só te culparei se não tentares.
Júlia ouviu o noivo respirar fundo.
– "Obrigado, gatinha..."
― ☼ ―
Omar respirou fundo e ergueu a arma, dando quatro disparos rápidos.
– Obrigado, gatinha, só tu mesmo para me acalmares. Eu te amo demais. Vamos Diabinha?
– "Mancha Negra." – Ele ouviu a voz da Júlia. – "Muito cuidado com essas mãos que eu estou escutando tudo, ouviste?"
– Sim, minha princesa, se ouviste tudo, sabes perfeitamente os motivos.
– "Eu te amo. Traz a nossa filha, viva."
– Trarei. Também te amo.
Andaram mais um pouco até chegarem ao perímetro da mansão.
– Estamos no ponto, em frente ao ninho e a cinquenta metros. A partir de agora não é mais possível o fator surpresa. Lobo Mau, qual a contagem do teu lado?
– "Vinte patos, Mancha."
– Gavião?
– "Não chega a trinta, mas há mais uns dez pelo flanco que não são visíveis da tua posição e estão isolados do resto."
– Quem de vocês tem visão livre da outra trilha?
– "Eu" – respondeu Lobo Mau. – "Livre e desimpedida."
– Nesse caso, olho duplo, ok? – ordenou Mancha. – Tenho vinte à minha frente. Diabinha, recarregar. Gavião mata os dez de surpresa. Com a metralha não deverão ter tempo de avisar. Informa ao terminar.
– "Feito, Mancha. A casa só tem luz no primeiro andar. O térreo e o terraço estão sem ninguém. Daqui eu vejo bem."
– Pronta, Diabinha? – perguntou Omar. – Quando Adriana estiver solta, tu cuidas dela, anjo, que eu vou precisar de dar apoio para a equipe e acabar com aquele diabo. Pode ser?
– Sim, Mancha, não te preocupes com a tua filha.
– Snipers, fiquem de prontidão mas aguardem as ordens. Aos patos, gente. – Bem protegidos, todos começaram a atirar, matando os guardas do perímetro, que caíam como moscas.
Alguns deles atiraram a esmo e, como não usavam silenciadores, o alarme estava dado. Dois holofotes acenderam, iluminando profusamente toda a área e expondo Mancha Negra mais Diabinha que se encontravam no meio do caminho, agachados.
Enquanto Michaela e Omar rolavam pelo chão para fugirem a possíveis tiros que quase os acertaram por estarem totalmente visíveis, o delegado ordenou, gritando:
– Snipers, os holofotes. – Dois segundos depois, não havia mais qualquer iluminação que não a penumbra das janelas.
– "Feito, Mancha Negra" – afirmou um deles. – "Por favor, não deixe nada acontecer com nossa Diabinha."
– Combinado, Snipers. Olho vivo.
Omar e Michaela trocaram de lugar rapidamente, quando a porta da mansão abriu-se.
– Mancha Negra. – O grito com a voz grave do homem na porta fez o delegado arrepiar-se, como se ouvisse um fantasma. Omar afastou o pensamento e prestou atenção, vendo que ele carregava a filha na frente, segurando-a pelo pescoço com a mão esquerda, como se a fosse enforcar. A outra mão apontava a pistola para a cabeça da moça. O olhar da Adriana era de puro terror. – Esta é a tua filha. Se não pararem de atirar imediatamente, mato-a na tua frente.
Todos param de atirar, embora sobrassem apenas três homens de pé. Apesar disso, junto com o sequestrador, apareceram mais vinte criminosos.
Omar começou a tremer sem parar e Michaela, ao seu lado, sentiu isso.
– Não vai vacilar agora, Mancha. – Pelo amor de Deus. – Senão tu perdes a tua filha.
Omar suspirou e controlou-se, lembrando do que a noiva disse. Levantou-se do chão, encarando o inimigo a mais de cinquenta metros de distância.
Cobra, ao ver Omar levantando-se, mais uma sombra que qualquer outra coisa, gritou:
– Esse é meu, ninguém atire nele, mas matem os outros. Apesar da ordem, não encontravam mais ninguém em quem atirar.
O sequestrador avançou vinte metros e Omar gritou:
– A minha vida pela dela, Cobra. Eu me entrego, mas devolve a minha filha para sua mãe.
– Não. Eu quero ver a tua cara quando a matar. A vingança é o prazer dos Deuses, já ouviste falar?
– Eu matei o Cobra há dezessete anos...
– E eu ressuscitei dos mortos. Sou imortal. – O bandido tirou o capuz e Omar viu o ex-chefe da federal de Santo Agostinho.
– Isso é impossível. Eu te matei e sei que jamais te safarias. Provavelmente, tu não passas de um irmão gêmeo daquele diabo.
– És esperto, delegado. Cobra era formado por duas pessoas, como uma hidra em que se corta uma cabeça e outra aparece. Sem falar que há mais um, um que jamais saberás quem é, pois nunca sairás daqui vivo. Larga essas armas agora ou mato tua filha neste momento.
– Por que motivo tudo isto? – Omar soltou as duas pistolas no chão e tentava ganhar tempo dialogando, pois esperava que ele se descuidasse. – Só pelo poder, apenas isso?
– Sim, pelo poder, mas também pela vingança. Mataste o meu irmão e desejo o troco.
– Ele assassinou os meus pais e o irmão da minha ex-mulher, Cobra. Não achas que foi mais que justo?
– "Está na minha mira, Mancha" – disse um Sniper. – "É só ordenar o tiro e furo ele no meio dos olhos."
– "Na minha, também" – confirmou Gavião.
– "E na minha" – arrematou Lobo Mau.
– Não – Omar murmurou no microfone – voltem aos alvos primários e deixem ele comigo. O risco é demasiado alto, mas fiquem de olho, caso eu falhe.
– "Confirmado."
– Não me importa a justiça, Mancha Negra, porque ela é cega, surda e muda. Mas a vingança não. E a vingança é um prato que deve ser servido frio, para não cometermos erros. Assim, eu esperei alguns anos e me fortaleci. O primeiro passo, foi a morte da tua mulher. Foi divertido ver a tua cara e saber que te tirei a esposa e o filho não nascido. Infelizmente, não contava com a tua audácia e determinação, muito menos com a ajuda do EN do Rio. Ninguém sabia sobre a família dela e foi um erro tático grave. Por isso, precisei fujir da Maré. Então, esperei mais doze longos anos e fui ao deleite em saber que reataste com a tua primeira namorada. Sim, eu conheço toda a história da tua vida, tchê.
– Não me parece que ela venha a ter utilidade para ti, Cobra, especialmente depois que tudo acabar. – Omar fervia de raiva ao saber que o assassinato da Angélica foi premeditado e isso acabou completamente com o medo que vinha sentindo. – Eu jamais deixo o trabalho por acabar, jamais aparto. Não devias ter morto a minha mulher e o meu filho, cara.
– Estás encurralado, Mancha Negra. O famoso herói anônimo nada poderá fazer para salvar a filha nem a si mesmo.
― ☼ ―
Júlia ouvia atentamente, sentindo as lágrimas aflorando.
– Salva nossa filha, meu amor – sussurrava para si mesma em meio a pequenos soluços. – Pelo amor de Deus, salva-a.
– Ele salvará, Júlia – tranquilizou-a Vespa, que desligou o microfone antes de falar, para não distrair os demais colegas. – Lembra da mosca?
– Estou com muito medo, Daniela.
– Todos estão, especialmente o Mancha. O medo é importante, desde que na dose certa. É ele que nos impede de cometer erros. Esse Cobra está demasiado confiante e isso será o fim dele, principalmente agora que Mancha sabe que a morte da ex e do filho não foram um crime comum. Tenho certeza que isso lhe deu uma raiva tão grande que dissipou o medo de errar, pois o que ele mais queria no mundo era aquele filho. Mancha Negra está dando um jeito de o deixar cada vez mais despreocupado. Não te dou dois minutos para ser alvejado.
– Deus te ouça.
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