Capítulo 5 - parte 3 (não revisado)


Ambos rodavam no carro do Omar e pararam em frente a uma casa de dois andares. Era uma residência de classe alta e Angélica comentou:

– Civil não ganha para isto!

– Óbvio, nem mesmo federal. Vamos a isso. – O policial pegou a arma e verificou a carga, voltando a guardá-la. – Tu ficas na direção e vou fazer uma visita.

– Tenha cuidado, gato.

Omar sorriu e saiu do carro. Mal fechou a porta, desapareceu nas sombras, deixando a garota intrigada com a sua capacidade de camuflagem. Sorrindo, ela pensou que seu apelido era mesmo bem adequado.

O delegado caminhou agachado e pulou o muro da casa, aproximando-se de uma janela iluminada. Discretamente, olhou para dentro e viu um homem em frente à televisão. No andar de cima havia outra janela, aberta e perto de uma árvore, por onde subiu e deu um grande salto para a janela, agarrando-se ao parapeito e içando o corpo para dentro. Vasculhou o andar e descobriu que o policial morava sozinho. Melhor assim, pois a família não tinha culpa dos seus atos e Omar sabia que não o mataria nessas circunstâncias. Desceu a escada em silêncio e aproximou-se da sala, que estava vazia. Entrou e escondeu-se atrás dos cortinados, aguardando o homem retornar do banheiro. Pouco tempo depois, sua espera foi coroada de êxito e ele voltou para a poltrona, pegando uma cerveja que estava na mesinha ao lado e continuando a ver o jogo. Caminhando por trás, Omar aproximou-se do criminoso e apontou a arma à sua cabeça, engatilhando-a. Ao ouvir o ruido, o policial empertigou-se e foi virando o rosto bem devagar, muito pálido. Omar caminhou de lado, até ficar em frente ao civil.

– Q... q... que deseja? – perguntou o outro, lívido. – P... p... p... por favor...

– Oi, quanto tá o jogo? – questionou, com se fossem velhos amigos. – Espero que o meu time esteja vencendo. Tu és gremista?

– O s... s... senhor não veio discutir futebol, né?

– Óbvio que não, mas não custa unir o útil ao agradável. Na verdade, eu decidi matar todos os que trabalharam para o Alemão. Infelizmente para ti, tu és o primeiro da lista dele – explicou o federal.

– P... p... pelo amor de Deus.

– Adeus. – Omar não se abalou ou mesmo hesitar; simplesmente puxou o gatilho. Na sala, nada se ouviu por causa do silenciador, mas o policial escutou um estampido seco e sentiu um clarão enorme na sua mente, tão intenso que caiu morto instantaneamente.

Sem qualquer remorso, o delegado olhou o corpo morto com uma bala no meio da testa, pôs a arma na cintura e saiu pelo mesmo método, tendo o cuidado de não deixar digitais em lugar algum. Ele não sentia prazer em matar, mas também não tinha pena ou compaixão pelas vidas que tirava, pois eram todos criminosos do pior tipo, na sua opinião. Entretanto, jamais teria coragem de matar um inocente. Tranquilamente entrou no carro e voltaram para o bar, bebendo bastante e divertindo-se, até que foram para casa dele namorar e dormir.

No sexto dia, Omar entrou sorrateiramente na casa do alvo e descobriu que o homem tinha família. Incapaz de o eliminar desse jeito, preparou uma armadilha. Quando notou que a esposa e filha dormiam, bateu à porta. Inocentemente, o policial abriu e viu-se de frente a um homem de preto com capuz e uma pistola apontada à sua cabeça. Conhecendo o calibre da arma, sabia que, mesmo que fechasse a porta, a bala de uma ponto cinquenta o alcançaria. Assim, ficou bem quieto, ouvindo a ordem seca e lacônica:

– Sai agora da tua casa, se queres ficar vivo, e caminha na minha frente.

Ele obedeceu e Omar fê-lo entrar no carro, no banco de trás, sentando-se ao seu lado. Imediatamente, Angélica começou a rodar.

– O que desejam de mim?

– Eu ia-te matar, tchê, mas a tua família salvou-te a vida. Agora, para não morreres, terás de me dar informações bem precisas. Quem entregou a última operação para o Alemão?

– Eu não conheço o...

– Resposta errada, meu velho. Tu eras da folha de pagamento dele. Fui eu que matei a gangue toda e peguei as informações a vosso respeito. Tu não me enganas, tchê. Agora desembucha, se queres viver.

– Juro que não sei – respondeu, tremendo de medo. – Minha função era fazer vista grossa para alguns pontos de venda de entorpecentes perto da universidade federal.

– Quem é o Cobra?

– Ninguém sabe. Dizem que ele é o verdadeiro mandachuva do pedaço. Uma vez vi o sujeito no morro.

– Como ele é?

– Ele se vestia todo de preto, exatamente como o senhor, com o capuz e tudo. Não deu para ver o seu rosto. Na cintura, usava duas nove milímetros, uma de cada lado como se fosse um cowboy. Tem cerca de um metro e oitenta e cinco, a minha altura, e olhos bem azuis. Como a sobrancelha é loira, imagino que ele seja loiro. É um homem anormalmente forte e de ombros largos. Juro que é só o que sei.

– E a voz?

– É grave, ameaçadora, e inspira medo.

– Muito bem. Gatinha, volta para a casa dele. Cara, por enquanto vou deixar-te vivo, mas ai de ti que te pegue na marginalidade novamente. – O carro parou e Omar saiu, puxando o inspetor consigo. – Lembra-te de uma coisa: eu jamais erro um tiro. Estás vendo aquele arame segurando o vaso?

Omar ergueu a arma e disparou sem mirar, cortando o arame e fazendo o vaso cair no chão.

– Deu pra entender? – perguntou para o investigador que ficou ainda mais assustado. – Anda na linha e agradece à tua família por ficares vivo.

Omar virou as costas sem medo de uma reação e entrou no carro ao lado da garota. Ambos seguiram o seu rumo.

– Anjo, Cobra é esquadrão negro, exatamente como o meu chefe disse. – Omar contou a história da lenda para Angélica.

– Ia dizer isso. Mesmas roupas, mascara e armas! Há um traidor na federal. E eu que pensava que não tínhamos corruptos lá dentro.

– Ele não é corrupto. É bandido, corruptor. Ele não se vendeu... ele comprou estes policiais.

– E agora?

– Agora, acho que posso virar alvo em breve. Faltam seis e o Cobra. Talvez fosse bom te afastares de mim.

– Nem pensar, meu gatinho, justo agora que tomei o seu gostinho! – sorriu sedutora. – E sou boa atiradora, esqueceu?

– Boa como poucas – afirmou Omar rindo e pondo a mão entre suas pernas, por baixo da saia muito curta –, mas prefiro esta outra parte boa.

Apertou mais a mão e ela gemeu um pouco. Omar continuou, safado e convidativo:

– Já que o capítulo do dia encerrou, vamos para a minha casa conferir novamente essa gostosura toda?

– Vamos sim, mas tire essa mão daí que eu acabo batendo o carro, seu tarado!

Ambos riram e Omar tirou a mão das suas pernas subindo pela cintura acima até aos seios, apertando-os malicioso e fazendo a garota dar um mais um gemido e um tapa na sua mão. Quando chegaram à casa dele, viram lanternas dentro. Angélica não parou senão trinta metros depois e ambos correram para a residência. Ela cobriu a porta da frente e ele foi pelos fundos. Em silêncio entrou em casa e foi para a sala, onde uma das luzes se movia. Aproximou-se do homem e bateu com o dedo no seu ombro.

Porra, tchê – sussurrou o invasor, dando um pulo. – Tu quase me matou de susto.

– Não, meu caro – respondeu o delegado tranquilamente e no mesmo tom de voz. – Vou mesmo é te matar de bala.

Omar disparou e o criminoso caiu que nem um saco de batatas. Sentou-se no sofá e aguardou o outro, que teria forçosamente de passar ali, não demorando nem um minuto.

– Beto? – perguntou, entrando na sala. – Não achei nada, e tu? O Cobra não vai gostar se voltarmos sem as informações e as pastas.

– Beto morreu, meu filho – disparou a pistola acertando na mão do criminoso que deixou sua arma cair. Com um grito ele tentou fugir e, mesmo no escuro, Omar atingiu seu joelho. – Calma aí, tchê, pra quê a pressa? Precisamos levar um lero bem longo e especial!

Omar acendeu a luz e olhou para o par. Eram dois dos policiais, casualmente os próximos alvos. Abriu a porta da rua e Angélica entrou. O ferido ainda tentava afastar-se, arrastando-se desesperado.

– Se tu não parares imediatamente e responderes o que desejo saber, levarás mais uma azeitona, tchê, e essa vai doer pra caralho, entendeste? – O homem parou e virou-se, ficando quieto e aguardando. – O que vocês queriam aqui?

– Recebemos ordens de procurar umas pastas.

– Quem é o Cobra?

– Ninguém sabe. As ordens vêm por telefone.

– És casado?

– Céus, não! – Ele riu, nervoso. – Imagina, casar prá mulher torrar nosso saco toda hora. Capaiz!

– Uma pena, pois ela salvaria a tua vida. Como não te casaste, vou-te matar. Adeus. – Omar disparou. Virou-se para Angélica e disse. – Agora só faltam quatro, mas acho que vamos precisar de chamar a homicídios.

– Não, vou chamar uns açougueiros. – Angélica ligou e a equipe de limpeza apareceu em dez minutos, levando os corpos e as provas. Omar pegou uns instrumentos minúsculos e colocou em locais estratégicos da casa. – O que é isso, amor?

– Sensores de movimento. Se alguém entrar, o meu relógio bipa. Não tenho a menor vontade de ser surpreendido no meio da noite, especialmente se nós dois estivermos na melhor parte. – Puxou a garota e voltou a meter a mão em baixo da sua saia, acariciando-a enquanto a beijava. – Vamos subir?

― ☼ ―

– Quem você acha que pode ser o Cobra? – perguntou a moça, após terminarem. Encostou a cabeça no seu peito enquanto ele acariciava seus cabelos. Angélica ia pensando alto e mostrando que fazia jus ao seu cargo. – Uma coisa é certa, ele sabe que você tem a lista. Além disso, ficou nervoso ou preocupado, o que nos dá certeza que é um dos nossos.

– Exato. Agora, sou definitivamente um alvo. Mas ele pode ter concluído que tenho a lista porque venho matando um por um. A questão não é a lista, e sim descobrir como ele sabe que sou eu o matador. Afinal, disso poucos sabem, amor, pois jamais espalhei para alguém que os ia caçar, exceto pro meu chefe. Contudo, sei que ele está fora de qualquer desconfiança.

– Uma das probabilidades mais fortes é o policial que você poupou. Talvez tenha sido um erro, amor.

– É uma forte probabilidade mas não me arrependo de o ter poupado, Angie. Contudo, muita gente dentro da federal também o sabe. Aquele policial ficou todo cagado e acho que não foi ele. Vamos dormir?

– Vamos, amor. Adorei esse apelido: Angie. Me lembra aquela música dos Stones, tão linda.

– É verdade, falei sem pensar e a música é bela demais...

― ☼ ―

No dia seguinte, Omar estava sentado no bar aguardando Angélica, quando Júlia apareceu.

– Omar. – Ele ergueu os olhos e viu sua grande paixão, ficando lívido. – Eu...

– Júlia, pelo amor de Deus, fica o mais longe possível de mim. Há uma turma grande querendo me matar e podes ser ferida.

– Mas...

– Júlia, eu matei mais de duas centenas de bandidos só nestas duas semanas, e policiais também. Matei todos os corruptos que estavam envolvidos na morte dos meus pais e agora eles sabem que fui eu e não quero que te matem. Viste as mortes no jornal? Quando um deles for delegado federal, terá acabado e poderás me procurar, ok? Agora vai, anjo. Vai embora, meu amor, por favor que eu morro se te acontecer algo.

– Tudo bem, amor – disse ela. – Te amo e te cuida, pelo amor de Deus.

Triste a moça retirou-se bem na hora que Angélica chegou. Ela não viu Júlia, mas Júlia viu a delegada abraçar e beijar Omar nos lábios. Chorando muito, foi para a sua casa, amaldiçoando o dia em que ficou com Moacir para se vingar, amaldiçoando-se a si mesma e ao fato de ter aceite o pedido de casamento. Amaldiçoou tudo o que pôde, para cair na sua cama em um pranto triste e longo.

No bar, ambos preparavam a próxima ação, a ser executada na hora seguinte. Enquanto bebiam uma cerveja, Omar verificava o endereço do alvo e possíveis riscos. Quando ambos se levantaram para sair, uma moto passou na rua, parando a vinte metros. Ao ver o motoqueiro erguendo a arma, Omar empurrou Angélica para o lado e atirou-se ao chão justamente no momento em que o criminoso disparou. A bala passou rente ao delegado e acertou um dos fregueses no braço. Antes que o criminoso pudesse dar um segundo disparo, com um forte estrondo Omar e Angélica atiraram simultaneamente, provocando a morte do criminoso e um susto infernal em todos os presentes.

– Chama a federal, Angie – gritou e saiu correndo para o motoqueiro, verificando os sinais vitais e constatando que estava morto. Voltou para o bar e viu o freguês caído sobre a mesa.

– Peçam uma ambulância – gritou para o garçom. Aproximou-se dele e viu que apenas estava ferido no braço. – Calma, meu amigo, que não é grave. Bem sei que dói muito, mas tu vais ficar bom, te garanto isso.

– O criminoso fez o favor de vir até nós, amor. – Angélica foi à rua ver o homem. Mostrou os documentos que pegou do seu bolso. – Era ele que você ia visitar hoje.

– É, mas o filho da mãe acertou um inocente. Felizmente não é grave e vai ficar bom.

Quando a equipe da federal levou o criminoso morto e a ambulância o ferido, o casal foi para casa, uma vez que Omar decidiu que ia matar apenas um por noite.

― ☼ ―

No último dia, deitados na cama, Omar olhou para a garota com quem passou os últimos dias e disse:

– Amanhã, vou matar o Cobra e a missão estará completa, Angie.

– Então você sabe quem é! – comentou, espantada. – Caraca, você podia ter-me contado, seu safado. Quem é?

– Faz tempo que sei quem é, desde aquele policial que poupamos. Por isso conclui que não foi ele quem me entregou – explicou. Deu uma risadinha e continuou. – Eu quis fazer suspense e ver se tu adivinhavas quem era o diabo. Espera até amanhã, que verás.

– Você não confia em mim, Manchinha? – perguntou para logo depois dar uma risada da sua cara matreira. – Tudo bem, eu espero, mas fiquei pra lá de curiosa. Como vai fazer, amor?

– Espera e verás, mas será da forma mais terrível, infernal, cruel e dolorosa que eu conheço – disse, muito sério e preocupado por ela. – Desta vez não podes ficar envolvida com isso, Angie. Eu ficarei impune, mas tu não. Poderás ver, só não te envolvas.

– Tá bom. – Ela riu. – Bem sei que matar um federal pode ser complicado. E depois, o que você pretende fazer?

– Depois volto para Porto Alegre – afirmou com um suspiro triste. – É lá que fica a minha base.

– E nós, gato? – perguntou a moça, também suspirando, enquanto se aninhava nos seus braços.

– O que queres dizer?

– Nós, amor. Afinal passamos vinte dias juntos, na mesma cama e tudo. Eu gosto de você. Gosto muito mais do que gostaria de admitir.

– Também gosto...

– Mas ama outra mulher – interrompeu, Angélica. – Eu vi-a saindo do bar no dia do atentado, mas fingi que não. O que aconteceu?

– Ela tentou falar, mas mandei-a embora com medo que se tornasse um alvo – respondeu. – Logo, não faço ideia do que ela queria.

– Eu gostaria de continuar vendo você, Omar.

– Vejamos o que o tempo dirá, Angélica. Eu terei de vir várias vezes aqui até acertar tudo com os meus bens, ok?

– Estes dias recebi uma proposta para ir trabalhar na inteligência de Porto Alegre. Se eu aceitasse, você faria o quê?

– Bem, a minha cama tem espaço para dois... – feliz, ela interrompeu com um beijo, mas ele insistiu – entretanto, vamos ver as próximas semanas. Preciso definitivamente de pôr a minha cabeça no lugar, ok?

– Claro, Manchinha – sorriu e beijou-o novamente. – Eu adoro você.

Na manhã seguinte foram juntos para a delegacia e Omar, como já era bem conhecido, não foi barrado em lugar algum. A maior parte do que precisava para o seu ato final, ele já possuía porque fazia parte do seu equipamento pessoal e o pouco que faltava sabia muito bem onde encontrar. Foi a uma sala de provas e depois um laboratório, obtendo facilmente o que precisava.

Cronometrou cuidadosamente o tempo e entrou em um gabinete, fechando as persianas da janela que davam para a sala grande, onde ficavam dezenas de policiais e sentou-se. Mal passaram trinta segundos um homem entrou e Omar disse, enquanto se levantou e pegou dois copos, servindo café da térmica e estendendo um para ele, que agradeceu e começou a bebericar:

– Como vais, Cobra?

– Estás alucinando, jovem? – O chefe de polícia olhou para o delegado mais famoso da cidade. – Que raio de besteira é essa?

– Melhor poupares o teu tempo, cara – disse Omar, bem taxativo. – Tu és o Cobra e tenho certeza disso.

– Pois então explica para mim – pediu o chefe, falando com a maior calma e tranquilidade, olhando para o jovem delegado como um garotinho da escola que foi apanhado em erro. Com o mesmo ar tranquilo sentou-se e aguardou. Omar, contudo, não se abalou com o seu comportamento, antes pelo contrário. Estava em máxima prontidão.

– Um dos policiais comprados pela gangue era casado e eu tive pena da família. Assim, raptei-o e meti-lhe um tremendo cagaço. Ele negou saber quem era o Cobra, mas descreveu como este aparecia no morro. Imediatamente identifiquei hábitos de um esquadrão negro e meu chefe me falou de um lendário Cobra, que sempre trabalhava sozinho e que se retirou para nunca mais ser visto. Fiz as contas e concluí que o Cobra deveria ter entre quarenta e quarenta e seis anos. O policial disse que ele é loiro, por causa das sobrancelhas, e que tem olhos muito azuis. Também calculou uma altura de um metro e oitenta e cinco com ombros largos e fortes. Bem, há poucos homens assim aqui dentro. Não os loiros, porque esta cidade tem loiros até demais, mas o teu porte físico é atípico, da mesma forma que o meu.

O chefe de polícia estava fascinado com a exposição, preso a ela, enquanto continuava sorvendo o café. Levantou-se e pôs mais açúcar, fazendo uma careta.

– Desculpe, eu gosto sem açúcar e às vezes esqueço de colocar. Além disso – continuou Omar após um gole – dois homens invadiram a minha casa e, quando os peguei, disseram que o Cobra queria uma pasta de documentos. Apenas tu e Angélica sabiam dela. Já que eu e ela dormimos juntos e, sendo ela mulher, por sinal muito gostosa e fogosa, pôde ser excluída dos suspeitos. Agora vejamos: tu sabias da pasta, tens a voz grave, olhos azuis, cabelos loiros e muita força física, provavelmente quase tanta quanto eu. Sem falar na tua idade e altura... tudo encaixa, Cobra.

Rápido como um raio, o chefe fez menção de puxar a arma, mas quanto tocou nela Omar já apontava a sua para o rosto do chefe. Falando com a voz baixa e terrivelmente intimidadora, o delegado ameaçou:

– Em Porto Alegre, dizem que eu sou capaz de matar moscas com tiros de fuzil. Desejas experimentar, babaca?

– Achas que alguém vai acreditar que sou o Cobra?

– Desabotoa a camisa e mostra o ombro... JÁ. – Omar engatilhou a pistola.

Vendo-se acuado, apenas pôde obedecer e o delegado viu a tatuagem.

– Por quê? – perguntou, muito abatido. – Traíste e mataste os teus próprios homens, os meus pais!

– Poder e fortuna, meu jovem – respondeu o chefe bastante preocupado. – Podíamos dividir...

– Improvável – interrompeu. – Eu jamais compactuaria com o homem que matou os meus pais. – Omar pegou o telefone e discou o ramal da Angélica. – Angie, vem agora para a sala do chefe, rápido.

– O que tem ela?

– Mataste o irmão dela, Cobra.

– Ele era um elemento perigoso – comentou o chefe –, demasiado perigoso e bom como poucos, um grande risco para mim.

– Perigoso eras tu – afirmou Omar, mantendo a arma apontada para a cabeça do Cobra. – Estou gravando tudo com o telefone, Cobra.

– Não viverás para ver o teu triunfo – comentou o interlocutor aguardando uma oportunidade para atacar. – Eu cometi o erro de te subestimar, mas jamais erro duas vezes.

– Nem penses que me podes vencer, tolo. – Omar não o perdeu de vista, pois notou a velocidade dele ao tentar pegar a pistola. Sabia perfeitamente que a menor distração e Cobra conseguiria levar o seu intento avante. – Eu sei exatamente como lidar com gente da tua laia.

Angélica entrou e viu Omar apontando a pistola para a cabeça do chefe, arregalando os olhos.

– Aqui está, Angie, o filho da puta que matou os meus pais e o teu irmão. – Omar apontou a cadeira ao lado para a namorada sentar-se. O que vamos fazer com ele?

– Eu queria vê-lo morto, amor.

– Então senta aí e aguarda quatro minutos, anjo.

– Quatro minutos? – perguntou o chefe incrédulo. – Por acaso queres matar-me em quatro minutos?

– Sim, Cobra, eu sou muito eficiente como matador. Afinal, já deves ter notado isso, uma vez que acabei com toda a tua gangue praticamente sozinho. Sabes, matar é muito fácil e sempre me dá um prazer enorme quando mato gente como tu. Claro que nem sempre uso armas. Venenos de um tipo muito especial também têm o seu atrativo, principalmente esse que tu ingeriste. Não achaste o café amargo, tchê?

– Seu filho da puta – gritou Cobra com a voz aguda e atirando-se a Omar por sobre a mesa. O delegado não teve a menor dificuldade em se desviar e deu-lhe um forte soco no rosto, tão violento que Cobra viu estrelas e caiu atordoado de volta na sua cadeira, muito ofegante.

– Pelo jeito, como a lenda que és não vales porra nenhuma, tchê, e penso que o Mancha Negra é que é a verdadeira lenda, isso sim. Não achas melhor fazer uma prece e pedir perdão pelos teus pecados, Cobra? Ainda tens trinta segundos. Olha que vais ter uma morte horrorosa e muito, muito dolorosa. Esse composto que pus no teu café é terrível, conhecido entre nós como o Beijo da Morte, pois vem de mansinho, como um simples beijo, mas quando começa a agir, meu caro, dói pra caralho. Infelizmente, nem isso é tão doloroso quanto o que me fizeste, matando os meus pais.

– Vai-te foder, desgraçado.

– Dez segundos, nove, oito sete... – Cobra começou a sentir uma dor violenta no abdômen –, seis, cinco, quatro três, dois... – e após, dificuldade em respirar. A dor de barriga acentuou-se terrivelmente em cólicas assustadoras e incontroláveis – um, zero.

O urro de dor que ele deu, coincidiu exatamente com o momento zero. Após o berro, por mais que tentasse, não conseguiu inalar ar, ao mesmo tempo que soltou uma forte diarreia e mijou-se todo.

– Adeus, Cobra, manda um oi para o inferno e o diabo. Dá-lhe um beijo na boca por mim e um recado: se ele tentar essas façanhas por aqui, terá o mesmo fim.

– Que veneno é esse, amor? – Angélica estava impressionada com a ação do composto. – Faz um estrago e tanto. O cara tá todo mijado e cagado... e que fedor!

– Uma combinação de arsênico com cicuta e mais duas substâncias. – Omar sorriu e pegou sua mão. – Na dose certa dura exatos seis minutos para fazer efeito e é terrivelmente cruel. Acho que vingamos nossos familiares e limpamos a cidade de todo o crime organizado.

O casal, sádico, olhava o chefe morrendo lenta e dolorosamente. Após sessenta segundos de agonia, estremeceu todo e o coração parou. Omar pegou o copo com o veneno e substituiu por um com um fundo de café, guardando o outro no bolso.

– Acabou, Angie.

– Acabou sim. Vou para a minha sala trabalhar.

– E eu pretendo tomar algo bem forte para esquecer tudo isto, bem forte mesmo – afirmou, ainda sério. – Não gosto nada de matar.

– Encontro você lá, amor.

Beijaram-se e o delegado foi para o bar. Bebeu algo, mas desistiu de encher a cara e foi para casa. Passou-se uma hora e bateram na porta. Ele abriu e viu Júlia.

– Omar...

– Oi, Jú, podes entrar que já estão todos mortos. – Ela entrou e ele fechou a porta. – Acabei de eliminar o último.

– Omar. Não está mais dando pra aguentar esta vida – disse a garota com a voz chorosa. – Eu preciso de ti...

– Já discutimos isso, Júlia. – Omar interrompeu, mas ela pôs o dedo nos seus lábios e continuou.

– Eu estou grávida – disparou à queima-roupa. – Acho que me descuidei. Fiquei enjoada e comprei um teste que deu positivo.

Omar ficou aturdido com a notícia, sentindo-se tonto. permaneceu calado por alguns segundos e, mais tranquilo, acrescentou:

– Mais um motivo para pensares no que falamos, anjo. Ainda mais se vocês vão ter um bebê.

– Mas o bebê não é dele, Omar, esse é o detalhe. Faz mais de um mês que eu não transo com ele. Não sinto a menor vontade dele, Omar. Só penso em ti. Eu te amo demais!

Arrepiado com a notícia, Omar sentiu uma coisa forte no coração. Um filho; tudo o que ele queira era casar com ela e ter um filho, viver uma vida de paz e tranquilidade. Voltando à realidade e pensando nas consequências disso, afirmou de forma enfática:

– O melhor que tu tens a fazer, Júlia, é dar um jeito para que esse bebê seja dele. Vai para casa e consuma isso esta noite.

– Não dá, meu amor. – Ela começou a chorar. – Eu não o quero mais, não aguento mais...

– Júlia. – Um pouco brusco, Omar levou-a para a porta de um armário e abriu, tirando um colete à prova de balas. – Eu sou da elite da polícia federal. Quando entro em ação, geralmente estou enfrentando uma centena de criminosos sozinho.

Ela pensava em dizer algo, mas ele continuou:

– Eu e Mateus subimos aquele morro e matamos pelo menos duzentos e trinta malditos bandidos. Olha. – Mostrou a marca das balas. – Levei dois tiros, dois. Um deles não me pegou na garganta por cinco centímetros. Tu queres viver essa vida? Queres que nosso filho seja órfão? Sabes o que aconteceu naquele bar pouco depois que tu saíste? Um bandido quase me acertou um tiro, ferindo um freguês. Essa criança precisa de uma vida estável e de um pai presente.

– Mas...

– Já te disse. Escolhe o que é bom para ti e depois veremos o que é bom para nós. Eu te amo muito, Júlia, mas nós estragamos tudo, sempre estragamos.

Ela abraçou Omar, chorando muito, e ele apertou-a contra si, acariciando-a delicadamente até que se acalmou. Ele sentia um grande nó na garganta, mas precisava de ser racional, controlando-se o mais possível para não ceder. Ainda agarrada a ele e com a cabeça enterrada no seu peito, Júlia disse:

– Ela é bonita, Omar.

– É sim, mas nem se compara contigo.

– E tu dormes com ela.

– Eu sou solteiro, livre e desimpedido, Julinha.

– E não tens medo que ela sofra, se morreres?

– Em primeiro lugar, guriazinha, não é ela quem eu amo; em segundo, ela é como eu, uma delegada federal que corre tantos riscos quanto eu. Mas o mais importante é que aquela que eu realmente amo escolheu outro caminho e agora quer estragar ainda mais as coisas.

A garota levantou o rosto e olhou nos seus olhos. Devagar, ergueu ambas as mãos e pegou nas faces do Omar, puxando-o em direção a si, enquanto se aproximava. Beijou-o nos lábios, primeiro com calma e depois cada vez mais intensamente. Desesperado, Omar não conseguiu se conter, entregando-se cada vez mais e, quando notou, estavam ambos na cama, abraçados e ofegantes.

– Que coisa, Júlia, tu tens o dom de fazer as coisas todas erradas... e de me levar junto.

– Omar, eu preciso muito de ti.

– Eu também, Júlia, assim como o teu marido e o bebê. Ele tem mais condições de vos dar uma vida calma e estável. É por isso que tens de fazer Moacir pensar que a criança lhe pertence, e é exatamente por tudo isso que abro mão da minha felicidade.

– Amor, eu preferia viver um ano ao teu lado, repleto de felicidade, do que vinte com ele...

– O bebê precisa de um pai presente, Júlia. Faz isso por mim, se me amas. Eu estou abrindo mão do que mais desejo e quero justamente por isso, pelo vosso bem, Julinha. Agora, vamos tomar banho e esquecer que isto aconteceu.

– Pelo menos – disse ela, já na sala –, eu tive um último momento de prazer verdadeiro. Deve ser a nossa química, pois ele nem chega perto disso. É como se eu o repelisse. Por isso não consigo fazer amor com ele há mais de um mês.

Beijaram-se ternamente pela última vez e ela foi-se embora. Quando saiu do seu alcance visual, Omar fechou a porta, sentou-se na cadeira da sala e cobriu o rosto, chorando. Chorou como um bebê, sabendo que sacrificou tudo o que ele mais queria na vida.

Não ousou contar para Júlia o verdadeiro motivo de tudo, pois um grande sentimento de lealdade o impedia de fazer isso, mas sofria demasiado cada vez que pensava nela. Quando se acalmou, lavou o rosto e saiu a pé para caminhar um pouco. Uma hora depois, sentou-se no bar e aguardou Angélica enquanto bebia algo. A delegada chegou e viu que ele não estava bem nem muito sóbrio e logo adivinhou.

– Vocês se encontraram, Manchinha...

– Sim – respondeu Omar, ainda abatido. – Ela veio falar comigo, querendo se divorciar e voltar para mim, mas não permiti.

– Olhe, amor – a moça suspirou, triste e preocupada –, eu sou perdidamente apaixonada por você, mas desejo sua felicidade e vejo que você só poderá ser totalmente feliz se ficar com essa mulher.

– Não posso, Angélica, não posso. E se voltarem as brigas? E se eu for morto em ação? Além disso, ela está grávida; descobriu estes dias.

– E de quem é a criança?

– Minha. – Ele encolheu os ombros. – Lembras o que te contei, então sabes que é óbvio.

– Omar, mais um motivo para assumir isso. Sei que é amigo dele e os reais motivos disso tudo, mas todos vão sofrer com os fatos.

– Não, Angélica. Ele é o principal motivo de não querer isso. Ele não é tão forte quanto eu. Sei que vai morrer por dentro e não vai aguentar a separação. Conheço-o tão bem que estou certo que se suicidaria. Se ele tomasse a iniciativa, eu repensaria e arriscaria. Ele teria de decidir pelo divórcio e duvido que tenha força para isso. A verdade, é que nós estragamos as nossas vidas e temos de sofrer as consequências dos nossos atos.

– Você ainda me tem, Manchinha. – Ela aproximou-se e beijou-o com intensidade.

Quando terminaram Omar tomou um gole e viu o amigo e a esposa entrando no bar de mãos dadas. Júlia fuzilava Angélica com o olhar, pois vira ambos se beijando. Já a delegada fazia-se de desentendida.

Beberam e conversaram como dois casais harmoniosos. Júlia também abusou um pouco, de modo criar coragem para a noite que viria. Omar tentou manter as aparências e, para não sucumbir à dor, acabou abusando muito da bebida. Despediram-se e cada um seguiu o seu rumo.

De noite, Júlia fez o que Omar lhe pediu, mas não sentiu prazer algum. Quando terminaram e Moacir pareceu dormir, ela chorou baixinho e por muito tempo. Ele ouviu, mas não fez nada, não teve coragem de enfrentar a realidade. O amor que sentia por ela era tão egoísta que desistiu de qualquer ato, mesmo sabendo que todos sofreriam, inclusive ele.

Omar e Angélica foram para casa e ela levou-o para baixo do chuveiro, de modo a ficar mais sóbrio. Deitaram-se e o delegado voltou a agarrá-la selvaticamente, até que se aclamou e tornou a ser o sujeito carinhoso de sempre. Quando terminaram, Angie disse:

– Você está bebendo demais, amor, muito mesmo. Tem que parar com isso.

– Eu sei. É uma fuga, mas ela vai acabar a partir de agora, eu espero.

– Então, Manchinha – Angélica mostrou um cabelo castanho-claro no travesseiro e olhou para ele –, vejo que esse diálogo foi mais do que uma simples conversa. Que tal me falar a respeito, meu amor.

– Sinto muito, anjo. Não temos qualquer compromisso para eu ter que dar explicações, mas confesso que ela me seduziu enquanto falávamos. Todavia, acabou nesse momento.

– Tudo bem, Omar. Eu compreendo, mas gosto de você, amo você. – Olhou séria para o colega e continuou. – Se está decidido a romper com o passado, que tal conversarmos sobre o futuro?

– Eu gosto de ti, Angie. Não te amo, mas és o que mais se aproximou disso. Se tu estiveres disposta a arriscar comigo e me dares uma chance de recomeçar e aprender a sentir algo por ti, eu estou aqui.

– Eu aceito, gatinho, mas não deverão aparecer outros cabelos no travesseiro que não os meus.

– De acordo, Angie.

– Então eu vou aceitar a transferência para Porto Alegre. Vai demorar um tempo, talvez um mês.

– Amanhã voltarei a Porto, mas deverei vir muitas vezes aqui, por causa do meu patrimônio.

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