17
Minha maior surpresa não foi ela estar no nosso quarto, porque isso não era assim tão estranho (não era normal, mas era aceitável). A surpresa foi Natale estar com feições felizes, e não bravas. Ela parecia querer conversar sobre algo sério, não brigar com a gente. Talvez só ali eu entenderia porque ela nunca havia gostado de mim, um mistério que existia desde que cheguei à república.
— Podem ser sinceras: Estou atrapalhando alguma coisa? — ela perguntou, simpática.
— Ãhn, não... A gente estava só se maquiando, arrumando cabelo, essas coisas — falei, ainda sem saber se eu deveria abaixar a guarda com ela.
Natale suspirou.
— Bem, estou aqui me desculpando com vocês. Agora que estou namorando Juliano, ele me disse que vocês ficaram sentidas por eu agir daquele modo arrogante e, bem, eu concordo: Eu sempre fui totalmente estúpida com as duas.
Am e eu nos entreolhamos, sem reação.
— Eu não gostava de você, Amanda, porque já tinha namorado Juliano, e você, Rebecca, porque eu sabia que ele a curtia demais. Como deu para ver, vou confessar: Eu sempre fui apaixonada por ele, de amar de verdade.
Eu continuava sem saber o que fazer. Primeiro, o pedido de desculpas, depois essa confissão tão íntima...
— Não imaginava que você sentia algo além de amizade por ele — Am comentou, parecendo mais normalizada do que eu.
— É, eu não gosto muito de deixar na cara, mas é verdade... Sempre fui a melhor amiga de Juliano, nunca a garota de quem ele estava a fim. Eu invejava vocês.
Soltei uma risadinha.
— Se algum dia eu havia imaginado motivos para você me destratar, não era esse, com certeza. — Consegui soltar a única frase que meu cérebro estupefato conseguiu montar.
— Era um motivo bem secreto, mesmo... — Natale riu. — Eu fui injusta. Deveria ter falado com vocês ao invés de me afastar, seria muito mais fácil. Sem falar que, se Juliano não tivesse esse relacionamento com você, Rê, ele nunca teria aprendido a virar um homem, né? Que entende uma mulher e os sentimentos dela... Além de me desculpar, preciso também é agradecer.
Enruguei o cenho.
— Desculpas aceitas e, bem, sobre o agradecimento... Não acho que precise, mas obrigada.
— Será que agora podemos ser amigas, já que só resta a gente e Maria Elisa de mulher nessa república? — brincou Amanda, fingindo que estava bravinha.
Todas nós rimos, nos abraçando depois.
A noite começou e terminou muito rápido. Comemos bastante, dançamos para valer e tudo mais (típico de noitadas). Foi legal ver todos os casais se oficializando de vez — com exceção de Maria Elisa e Pedro que, bem, nunca namoravam mesmo.
Apesar de muita coisa ter mudado, tinham coisas que não mudavam nunca.
Minha vida continuava parecendo um seriado para as garotas na fase da adolescência: Eu (ainda) moro em uma república, com mais seis pessoas (não mais oito, já que Rafael engravidou Teresa e eles foram morar juntos em outro lugar). Duas delas são meus melhores amigos, Am e João. Duas pessoas são bem gaiteiras (para sempre), Pê e Maria. Eu só não tenho mais uma inimiga "mortal", que antes era Natale. E Juliano a namora, relacionamento recente. Moro em uma cidade diferente das dos meus pais. Namoro um garoto tão perfeito que só podia ser de mentira.
Não era mais tão complicado morar com essa gente, o que me deixava cada vez mais feliz.
Pela primeira vez em séculos, eu estava tão confortável que não esperava que nada acontecesse; não aguardava nenhum ataque externo à minha barreira de conforto que pudesse virar tudo de pernas por ar. Eu pensei realmente que minha vida ia finalmente se estabilizar.
E, como acontecia sempre que eu me aquietava demais, eu estava errada.
Com uma ligação, minha mãe conseguiu me deixar preocupada — não comigo ou com meu estado civil, mas com minha prima Elisabete.
Ela tinha se dirigido ao hospital quinze minutos antes da Dra. Caroline me ligar. Victor Hugo estava nascendo, antes da data marcada, da data ideal.
Não era exatamente a situação mais lindinha do mundo.
— Pego um avião para o Rio de Janeiro em vinte minutos — mamãe me avisou, provavelmente dirigindo para o aeroporto. (Não era nada certo dirigir falando no celular, mas quem ia discutir isso naquele momento? Só ia deixá-la mais desesperada, como se ela já não fosse assim em seu estado normal!)
— Eu vou checar a programação aqui em Ribeirão. Vou pegar o voo mais próximo para lá — falei também, fazendo sinais para Amanda começar a arrumar minha mala. Bem, melhor amiga é para todas as horas, certo?
— Ok. Estou desligando aqui. Assim que chegar, me ligue.
— Pode deixar, mãe.
— O que está acontecendo? — Am já estava jogando minhas lingeries na minha maior mala, parecendo tão eufórica quanto minha mãe.
— Elisabete tendo neném mais cedo. Está no hospital. É de se ver que vou ter que ir voando para lá, literalmente — brinquei, um pouco séria, terminando de arrumar minhas coisas. — Faz um favor, Am? Confere o próximo horário para o Rio?
Com muita eficiência, Amanda pesquisou e viu um horário em quatro horas.
— O quê? — Fiz uma careta. — Desse jeito, minha mãe vai dar o parto no lugar da Bete.
Minha melhor amiga revirou os olhos.
— Não seja assim tão exagerada, Becca. A culpa não é exatamente sua. Aproveite esse tempo para tomar um banho, comer, cuidar de tudo... E levar o celular dessa vez, por favor.
Soltei uma risadinha.
— Será que sua mãe não vai se incomodar? — perguntei. — Não sei quando volto... Talvez demore mais do que quinze dias.
— Até parece que minha mãe se importaria... Ela a ama, você sabe.
É, eu sabia.
Aproveitando o tempo, fui mesmo tomar um banho. Com tanta pressão em cima da hora sobre mim, era o melhor a se fazer.
Ao abrir a porta do banheiro para me trocar no quarto, me deparei com Sam sentado na minha cama.
— Sam? — Enruguei o cenho, segurando a toalha no meu corpo. Ainda bem que eu não tinha saído pelada! — Não esperava você aqui.
— Amanda me ligou avisando sobre a sua viagem e tudo mais... Sua prima está em trabalho de parto, né? — Ele me abraçou, não se incomodando em eu estar ali praticamente seminua. Quer dizer, não que fosse um incômodo.
— É... Eu preciso ir. Você vai entender, não vai? — murmurei, encarando seus olhos. — Afinal, na minha última viagem desse tipo, você decidiu me largar.
— Para ver como as coisas estão começando a mudar, eu vou com você.
Suas palavras me surpreenderam tanto que quase soltei as mãos da toalha. Quase.
— Ãhn? Como assim?
— Bem, a ideia foi de Am... Já falei com meu chefe, ele vai me liberar por um tempo. — Sam sorriu, muito fofo e incrivelmente feliz. — Você quer que eu vá? Porque se quiser, não há nada que me impedirá.
Naquele momento, eu não sabia o que falar. Minha resposta era óbvia e fácil de sair, mas minha garganta se fechou com a intensidade da alegria que senti. Ele estava indo por mim! Sam nem mesmo gostava de viajar assim em cima da hora...
Então um beijo respondeu no meu lugar.
— Acho que foi um sim — ele disse, depois de pararmos para respirar.
— Foi. — Eu ri, começando a ficar vermelha.
— Hmm, desculpa, vou sair para você se trocar — falou como se só aí tivesse reparado no meu estado pós-banho.
— Obrigada.
Amanda não parecia se importar de ter cedido seu lugar para Sam viajar comigo, o que me fez perguntar a mim mesma o quanto esses dois estavam amiguinhos nas minhas costas...
Sam nunca havia andado de avião, de modo que era sua primeira vez (er, logicamente) e sua "expectativa" era engraçada.
— Nunca vi você com medo antes... Posso afirmar que é algo que vai me marcar. Eu deveria tirar uma foto da sua cara nesse momento — provoquei, mordendo o lábio.
— Quando você estava namorando firme Juliano, eu ficava com medo constante de perdê-la. Você não viu, mas pode perguntar para João... Ele até estressava comigo — comentou.
— Foi bem feito. Quem mandou arrumar coisa para a cabeça? Ficou longe de mim por sete meses!
Ele me abraçou como se para me segurar ali para sempre. Ou talvez porque o avião decolou, mas tanto faz, o fato é que ficamos abraçados quietinhos até pousarmos.
— Como foi sua primeira viagem desse porte? — brinquei.
Sam revirou os olhos.
— Poderia ter sido mais emocionante.
— Turbulências deixam o voo bem mais emocionante, mesmo. — Dei de ombros, puxando minha mala de carrinho até a frente da cafeteria que alguém viria nos buscar.
— Para falar a verdade, o voo foi ótimo do jeito que foi... Quem precisa de emoção?
Foi impossível segurar o riso.
Eu estava me sentindo a guia turística, apesar de não conhecer muito da cidade. Afinal, eu conhecia mais do que Sam.
— Sempre me buscam aqui — comentei, sentando no balcão. — Um cappuccino, por favor — pedi para a atendente.
— Para mim, também — completou Sam.
— Sabe, Sammy... Você nunca viu meus pais. Como está sendo para você pensar no grande encontro? — perguntei.
Ele engoliu em seco.
— Se já era ruim na primeira vez que namoramos, imagina agora, depois que eu te abandonei e te fiz sofrer... Seus pais devem me amar — ironizou.
Torci a boca.
— Eles não são exatamente seus fãs, mas não vai ser tão ruim assim. Acredite em mim — falei, agradecendo quando meu café chegou.
— Você diz isso porque são seus pais!
Revirei os olhos, bebericando meu cappuccino. Ri internamente do desespero dele.
Meu tio apareceu meia hora depois, com minha mãe. Aposto que se Bete não estivesse tendo um filho, Dra. Caroline teria se sentado na cafeteria para interrogar Sam naquele momento mesmo.
Enquanto tio Jorge colocava as malas no bagageiro, com a ajuda de Sam, mamãe veio cochichar comigo.
— Hmm, esse é o Samuel então?
Concordei com a cabeça, sorrindo.
Ela levantou as sobrancelhas, examinando-o. Ele estava conversando com meu tio, todo cuidadoso perguntando sobre a situação da Bete e do bebê.
— Como alguém parecendo tão bonzinho largaria você daquele jeito? — ela indagou, balançando a cabeça negativamente.
— Às vezes a gente comete erros. Ele teve a dignidade de reconhecer e se desculpar. — Dei de ombros. Nem sempre as coisas eram simples de se explicar.
Mamãe me abraçou.
— Gostei mesmo dele, apesar de tudo. Além do mais, ele te faz feliz, né?
Suspirei, desgrudando dela para ir até Sam e entrar no carro em seguida, pensando nas palavras dela. Não era novidade.
O clima a caminho do hospital não estava um dos melhores, parecia meio mórbido.
— Hmm, e a Bete? — perguntei.
— Provavelmente está no final. — Minha mãe deu de ombros. — Partos normais não são muito fáceis para a grávida.
— Então quando chegarmos já será permitido ver o bebê? — Tenho certeza que meus olhos brilharam.
Tio Jorge deu uma risada.
— Bem, temos que ver com as enfermeiras se podemos vê-lo pelo vidro. Sabe como é, incubadora...
Sam apertou minha mão, me deixando compartilhar a felicidade com ele. Era um ponto ótimo do nosso relacionamento: Éramos interligados, quase conectados. Era como se pudéssemos compartilhar nossos sentimentos e momentos, bons e ruins.
Chegamos ao hospital em meia hora, de modo que o médico estava conversando com minha tia.
— Pensei que Ricardo estaria aqui — comentei.
— Parece que ele não pode deixar os Estados Unidos hoje. — Tio Jorge sorriu agradavelmente para mim, chegando perto de sua esposa.
— Ai, minha querida! — Tia Ana me abraçou. — Que bom que pode vir... E ainda trouxe o namorado! Olá, querido.
— Prazer, sou o Sam — ele se apresentou, parecendo um pouco intimidado.
— Agradeço que você tenha vindo fazer companhia para a Rebecca... Elisabete não será a melhor das anfitriãs por esses dias.
— Eu que tenho que agradecer por vocês me receberem. — Meu namorado sorriu para todos nós, colocando as mãos em volta de minha cintura e me segurando junto a ele.
— Enfim, como está a situação? — falei.
— Tudo ocorreu muito bem — respondeu o médico, um homem grisalho de rosto simpático. — O marido está com Elisabete nesse momento e daqui a pouco a mãe poderá ir também.
— E nós? — Minha mãe apontou para o resto da família: para mim, Tio Jorge e Sam.
— É melhor deixá-la descansar. Por hoje, só Ana e Allan. Vocês podem vir amanhã. O bebê já está na incubadora, vou liberá-lo de acordo com seu desenvolvimento... Mas estará pronto para visualização através do vidro em poucas horas.
— Vou dormir aqui no hospital essa noite — titia disse. — Quando Allan sair, vocês podem ir para casa. Jorge, ajeita tudo lá, e, Carol, o ajude também.
— Fique tranquila, irmã.
Quando fomos para a casa dos meus tios, Sam e eu decidimos sair. Ninguém quis ir com a gente; estavam querendo ficar quietinhos, cada um em seu canto.
Eu tinha certeza que Dra. Caroline estava só esperando para encurralar meu namorado de vez. Não que ele estivesse ciente disso.
No fim, enquanto os adultos descansavam, eu carreguei Sam para a noite comigo. Fomos assistir a um filme, andar pelo calçadão e comer um pastel ótimo.
— Rio de Janeiro não é aquele bicho de sete cabeças que você imaginava, viu? — falei para ele quando voltávamos para casa.
— É... Nem é tão assustadora assim — concordou, sorrindo para mim.
— Não se empolgue. Você não viu quase nada daqui ainda — provoquei, abrindo o portão. Adorava ser a guia dele.
Todos ali já estavam no último sono quando voltamos, mas eu não precisava das instruções da minha mãe para saber que Sam ia ficar no quarto de hóspedes.
— Então eu realmente quero conhecer mais da cidade.
— Você vai, eu prometo. — Dei um selinho nele. — Agora é só descansarmos. Aquele é o seu quarto, este, o meu. Boa noite!
Antes de me deixar ir, Sam me puxou pela cintura e me beijou de tirar o fôlego.
— Eu te amo — disse.
— Eu sei — falei, rindo. — Eu te amo também.
Entrei no quarto, controlando meus batimentos cardíacos, coisa que eu fazia desde que voltei a namorar aquele garoto.
Em dois dias, Bete recebeu alta do hospital. Ela estava muito bem, o que me deixou feliz, mas surpresa. (Eu nunca havia visto uma mulher pós-parto, então eu imaginava que elas ficassem mais derrubadas.)
O bebê só foi liberado uma semana depois, em ótimos cuidados e com mil recomendações, afinal, não era fácil ter um parto fora de hora.
Tia Ana marcou o batizado para quinze dias a frente, o que deu tempo o bastante para Sam e eu curtirmos a cidade. Pensei sobre meu namorado não estar se sentindo muito à vontade — sem falar que ele precisava voltar para o trabalho —, mas ele não reclamou nem comentou sobre nada, então imaginei que estava tudo certo.
— Rê linda minha, o nosso pequeno quer seu colinho — Elisabete me disse, sorrindo. Ela estava muito diferente, com uma expressão no rosto que só podia ser de... mãe.
Eram nove horas da manhã de uma quinta-feira, a dois dias do batizado. Tio Jorge estava no trabalho, Ana e mamãe haviam saído para fazer pequenas compras (de frutas ou presentes para o bebê, tanto faz). Sam, Bete, Allan, o pequeno e eu estávamos "descansando" na varanda. Descansando entre aspas porque não tinha do que descansar, visto que não fazíamos nada o dia inteiro.
— Ai, meu Victor Hugo mais lindo, vem cá com a titia — murmurei, parecendo uma idiota, mas tudo bem. — Ei, eu sou o que dele? Tia ou prima?
Elisabete franziu o cenho.
— Ah, não sei... Não importa. Ele vai chamá-la de madrinha de qualquer jeito — disse, dando as mãos com Allan depois de me passar o bebê.
— Como assim? Vocês nem me avisam nada? — Arregalei os olhos diante do convite implícito. — É sério?
— Super sério. — Bete deu de ombros.
Fiz um beicinho para Sam quando ele acariciou meu joelho, mais uma vez sentindo a minha felicidade.
— Ouviu, Victor? A madrinha vai sair hoje para comprar seu presentinho. — Eu dei uma risadinha, já fazendo mil planos. Eu compraria presente de todas as datas comemorativas para ele, Natal, aniversário, dia das crianças... Eu o levaria para passear, para viajar, para passar uns dias em Ribeirão Preto comigo. — Ãhn, mas você tem certeza, né? Quando se escolhe padrinhos para seu filho, é para sempre! — reforcei.
— Eu sei. Estou certa da minha escola. Serão os melhores padrinhos do mundo! — Bete me passou a chupeta fofa do meu afilhado.
— É, tenho certeza que Sam e eu vamos nos esforçar bastante.
Ficou um silêncio. Minha prima e o marido se entreolharam, parecendo constrangidos.
— É que, bem, estou muito sem graça agora, mas escolhemos Ricardo para padrinho — ela explicou, torcendo a boca. — Sabe... Ele é meu irmão, é da família. E caso Samuel e você venham a terminar o namoro, Victor ainda terá um padrinho, sabe?
— Eu... Eu entendo. — Dei uma risadinha constrangida. — É o que normalmente acontece, né? Não sei por que achei que seria madrinha com Sam, me desculpe!
— Não, tudo bem...
Allan puxou meu namorado para fazerem um lanche da manhã para nós duas, o que acabou com o clima estranho.
Mas isso não significava que minha vergonha tinha passado.
No dia seguinte, a casa ficou lotada com a chegada de Ricardo, Camile e papai. Ainda bem que arrumar espaço para todo mundo não era problema.
O complicado era a convivência durante esses dois dias de superpopulação, principalmente se levando em conta que, além do meu namorado, meu pai era um hóspede também.
Assim que chegou, o Dr. Marcos já olhou Sam de cima a baixo, observando cada detalhe de sua aparência.
Suspirei, revirando os olhos.
— Bem-vindo, pai.
Ele me abraçou, me dando um beijo na testa.
— Ei, querida... Então esse é o rapaz? — perguntou, voltando a encarar Sam.
— Sim, senhor. Sou o Samuel, namorado de Becca. — Sam estendeu a mão para cumprimentá-lo, gesto que foi retribuído no ato.
— Vamos adiar essa conversa para depois do batizado, ok? Voltamos para São Paulo na manhã de domingo. — Direto como a profissão lhe exigia, Dr. Marcos disse simplesmente e saiu para papear com meu tio Jorge.
Sam me olhou como se pedisse socorro.
— Não fica assim, bobinho... Não vai ser tão ruim — falei, rindo e fazendo carinho no seu rosto. — Vem, me ajuda a embrulhar o presente do Victor.
Ele levantou a sobrancelha, me acompanhando para o quarto.
— Rebecca Morgan tendo que "colocar a mão na massa"? — provocou. — Não estou entendendo.
Fiz cara de deboche.
— Você pode achar que eu sou uma burguesinha, mas eu gosto de fazer meu próprio embrulho, ok? — Peguei o móbile que havia comprado e coloquei na cama, junto com uma tesoura, laços e papel de presente. — Eu gosto de coisas simples também.
— Gosta, é? — Sam se sentou ao meu lado.
— Sim. Principalmente de você.
Ele revirou os olhos.
— Que engraçadinha.
Distraindo-me completamente, meu namorado começou a me atacar com cócegas, um dos meus pontos fracos mais óbvio.
— Para, bobinho! A gente tem que embrulhar o móbile — pedi, unhando o braço forte dele.
— Ah, tudo bem. Eu posso esperar você terminar isso aí.
Pelo menos ele me deu esse tempo para eu abusar da criatividade, pois o embrulho ficou muito, muito, fofo. Eu ia fazer Bete tirar uma foto antes de abri-lo.
— Pronto? — Sam me perguntou quando me viu guardando o presente.
— Agora sim.
— Então já era. — Foi o que disse antes de me atacar novamente.
Só percebi que Sammy e eu havíamos adormecido após a guerra de cócegas e arranhões quando bateram na porta (logicamente).
Levantei da cama em um pulo. Por sorte, era minha prima que veio nos chamar para jantar.
— Hmm, imaginei que Sam estaria aqui — ela comentou, segurando a risada.
— A gente acabou caindo no sono, não é algo que meus pais precisem se preocupar, mas... Eu adoraria se não contasse a eles — pedi, piscando para ela.
— Você sabe, Rê linda. Nossos segredos sempre serão segredos. — Bete me deu um beijo na bochecha e desceu as escadas, indo em direção à sala de jantar.
— Vamos comer, Sammy! — Eu o chamei, pulando nele. — Acorda.
— Assim você me mata — reclamou, se levantando. — Becca...
Dei um sorrisinho, beijando-o por um instante.
A reunião da família facilitou muito as coisas para Sam, que já estava sendo visto como um de nós. Lógico que todos consideravam mais Allan, modelo da França, e Camile, filha de um banqueiro hiper conhecido, não só por essas características como por estarem há mais tempo ali.
Mesmo assim, eu tinha certeza que meus pais ainda iriam querer uma conversinha em particular.
Todos, inclusive eu, dormiram cedo, tendo em vista que o batizado estava marcado para 9h do dia seguinte. Depois que acabasse, ainda iríamos comemorar no clube do meu tio, com campos de golfe, quadras de tênis, piscinas, SPA, sauna e um brunch super agradável.
Como Sam diria: "Totalmente VIP".
Antes das 10h, a cerimônia já tinha acabado, para provar que eu estava errada ao achar que iria durar horas. Então pudemos aproveitar um delicioso brunch no clube.
— Me sinto estranho de camisa social em um clube — Sam cochichou no meu ouvido enquanto nos servíamos na parte das frutas.
Soltei uma risadinha discreta.
— Bobo. É nessas horas que é bom ser mulher. Meu vestido não é formal demais para o clube, nem informal para o batizado. — Estiquei a ponta do meu vestido de cetim rosa claro, que combinava perfeitamente com o meu ankle boot nude.
— Que ótimo.
— Mas, para a sua salvação, eu sou muito fofa e tenho um presente para você — avisei, dando de ombros.
— É uma camiseta?
— Uma camisa polo.
— Serve também — brincou, me dando um beijo na bochecha e me guiando de volta à mesa.
Depois de ganhar dele no xadrez e tentar fazê-lo jogar golfe (o que Sam recusou firmemente), desistimos e resolvemos só caminhar pelo clube.
— Às vezes penso como consegui sobreviver a todo aquele tempo sem você — comentou, do nada, enquanto somente observávamos as árvores, sentindo o clima agradável...
— Como assim? — perguntei.
— Todo dia eu pensava que nunca mais teria isso. — Sam levantou nossas mãos dadas, beijando a minha. — Não pensava que teria você de novo.
— Faça o favor de não me jogar fora dessa vez, por favor — provoquei.
— Nunca mais, minha linda.
Aproveitamos que estávamos fora da visão dos meus familiares e nos beijamos.
Incrivelmente, meu pai veio nos procurar dez minutos depois para avisar que iríamos voltar para São Paulo após o almoço.
— Mas a gente não ia só amanhã de manhã? — questionei, não sabendo o porquê da mudança de planos.
— Não tem necessidade de ficar mais. O batizado já acabou. Além do mais, agora é a nossa família que precisa resolver uma questão. — A voz firme do Dr. Marcos saiu tranquila, porém decidida.
Eu sorri para ele.
— Pode ser, então.
Assim que papai saiu, Sam começou a ficar preocupado do modo dele: Silêncio absoluto.
— Fala sério, Sammy! Não tem pelo que ficar com medo. É só uma conversa, não uma tortura — falei, rindo.
Ele revirou os olhos.
— Eu sei, mas é mais difícil quando se está no lugar do réu. Você vai sentir isso quando conhecer os meus pais.
Engoli em seco.
— Acho que já estou começando a entender o que você está sentindo.
Sam jogou a cabeça para trás e deu aquela risada gostosa e verdadeira que me fazia rir também.
Por fim, o almoço nem demorou tanto a ser servido e em menos de algumas horas estávamos na cidade de meus pais.
Do aeroporto até a casa, minha mãe conversou bastante com Sam, aprofundando os assuntos. Posso dizer que ela o havia aprovado de fato.
Ao chegarmos, como boa anfitriã que era, eu levei Sam para o quarto em que ele iria passar a noite e para dar um tour na casa. Mais uma vez, ele ficou meio pasmo pela sofisticação.
— Ok, é humilhante — comentou.
Eu dei uma risadinha, apertando a mão dele.
— Eu sei. Até para mim é.
Minha mãe já havia encomendado comida japonesa para nós todos de jantar (a pedido do meu pai) e Lila, a governanta, estava arrumando a mesa, apesar de faltar algum tempo para anoitecer. Lila havia praticamente me criado e adorou conhecer Sam. Disse que ele era muito lindo, perfeito para mim.
E ele decidiu me fazer uma surpresa.
— Acabei de ligar para meus pais. Estarão nos esperando para almoçar amanhã — me avisou, sorrindo daquele jeito como se pudesse me dizer: Não tem volta. Essa é a minha vingança.
— Ah, que bom que você me avisou antes — murmurei, entrando em desespero. A mãe dele ia me achar uma patricinha!
— Queria pegá-la desprevenida para ver sua reação — provocou.
Revirei os olhos.
— Conseguiu.
Separamo-nos por aproximadamente uma hora, cada um no seu quarto, se arrumando para jantar. Ele provavelmente estava indeciso sobre como se vestir, então pedi para Lila ir avisá-lo para colocar calça jeans e camisa social com dois botões abertos.
Eu coloquei um vestidinho e umas jóias, um visual totalmente normal para se usar naquela ocasião. Depois de arrumar meu cabelo, fui buscar meu namorado no quarto. Foi quando descobri que ele já havia descido as escadas.
— Droga — resmunguei. Meu pai provavelmente o havia encurralado.
Quando cheguei lá embaixo, me deparei com dois homens conversando e tomando umas bebidas, à vontade. Com muita surpresa, observei Marcos e Samuel se dando bem.
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