Alone with the wolf

"Você não tem sido muito amável com ela, que, afinal, não deixou de ser um lobo. E todos sabem que os lobos são, por natureza, cruéis, malvados e dissimulados."

Delia Sherman

Quatorze de novembro de 1888, quarta, (...?) Inglaterra.

Maldito Cain, me obrigando a fazer suas vontades idiotas. Paro no umbral, Caleb está parado, esperando por mim.

- É melhor chamar Meredianna para abrir a porta, às vezes, ela falha na localização. – Dou risada. – A porta. – Acrescento.

- Tudo bem.

Viro-me em direção a cozinha, escuto os passos de Caleb atrás de mim, eu não sei o que Cain está tramando, mas ele disse ao investigador sobre esse Clarence, e saltou da carruagem quando achou que o tinha encontrado, só espero que ele não seja como Áster.

Paro na cozinha, está vazia, olho para os lados, nem ao menos Chevonne, suspiro e me viro para Caleb.

- Ela deve estar no quarto dela, temos que subir.

- Certo Lilith. – Pisco isso é estranho.

- Não me chame de Lilith. – Resmungo me virando de costas. – Parece que está brigando comigo.

- Cain te chama assim.

- Cain está sempre brigando comigo. – Sussurro quando subimos a escada. – Os outros me chamam de "little lady".

- Certo. – Giro nos calcanhares e apoio as mãos no quadril. – O que foi?

- Você só sabe responder assim? – Ergo as sobrancelhas. – Não estou te dando ordens, não aja como se eu estivesse.

- Cer... – Ele para sua frase. – Ok, obrigado por me ajudar a sair da casa, Little lady.

- Ainda está agindo do mesmo jeito. – Me viro e subo as escadas.

Caleb segue em silêncio, será que ele não conversa com a velha Helena? Ou nunca teve alguém para conversar? Até nos meus tempos da mansão Maurêveilles tinham mais conversas do que agora. Chego ao primeiro andar e olho para os lados, agora é só achar Meredianna.

- Bem... – Seguro a maçaneta da primeira porta que encontro. – Me leve a Meredianna.

Abro a porta e não me surpreendo ao ver a cabeleira rosa de Meddi espalhada pelo chão, ela espeta agulhas em um boneco costurado e ri dengosamente, deve estar sozinha, Chess não voltou ainda.

- Meddi... – Ela me encara. – Vamos abrir a porta? – Sorrio.

- A porta! – Meddi sorri e se levanta, passando correndo por nós.

Dou risada e me viro, Caleb ri também.

- Ela é sempre assim? – Ele aponta por onde Meddi foi.

- Sempre. – Passo por ele e desço as escadas. – Chess diz que Meddi tem um jeito louco de ser adorável. – Sorrio. – E também diz para não tocarmos nela quando não é necessário.

- Por que não? – Suspiro.

- Ela faz previsões do futuro. – Salto o último degrau. – E Marcel diz para não brincarmos com o futuro. A não ser que seja necessário e que nós estejamos prontos para arcar com as consequências.

- Estranho. – Caleb ri, encaro-o. – A velha Helena diz para temer o futuro, porque pode sempre piorar.

- Bem otimista... – Caminho até o umbral e encaro Meddi. – Ele precisa ir para... Er...

- Fleet Street. – Caleb espera, Meddi abre a porta, seu rosto ficando sério. – Até mais.

- Até. – Aceno e quando a porta se fecha sorrio.

- Parece que a nossa Lady está gostando de alguém... – Viro-me para trás e sorrio. Chess abre os braços para mim.

- Chess!!! – Corro até ele.

Chess me envolve em seu abraço, o melhor abraço que eu conheço. Enterro meu rosto em seu peito e sorrio. Ele me levanta e caminha até a escada me soltando, encaro-o com raiva, mas entendo o porquê, Meddi corre até ele e se joga. Gosto de Meddi, mas não posso nunca tocá-la. Chess ronrona e passa os braços ao redor dela, Marcel deve morrer de ciúmes quando isso acontece, Chess se afasta de Meddi e dá uma batidinha em seu nariz, Meddi sorri e sobe as escadas correndo.

- O que você fez? – Sussurro me aproximando.

- Nada. – Chess me estende sua mão. – Estou bem cansado e fraco minha lady, parte disso é culpa sua... – Encolho os ombros. – Mas vamos esquecer isso e, por favor, leve-me até Scorpio.

- Não quer ver Marcel? – Indago levando Chess pela mão.

- Essa é sua segunda tarefa. – Ele ri. – Ir atrás de Marcel, quando eu estiver com Scorpio.

- Tudo bem... – Resmungo. Paro um segundo e me encosto ao seu peito, Chess ri e passa um braço ao meu redor, voltando a andar. – Senti sua falta e fiquei com medo de te perder.

- Não te deixaria tão fácil... – Ele murmura.

- Assim espero. – Sorrio e o abraço mais forte.

XXX

Cain está sentado à minha frente com um livro grosso sobre o colo, ele ri e vira o livro para mim:

- Isso é uma besta! – Ele aponta uma gravura de um arco.

- Um arco e flecha...? – Sussurro.

- Aparentemente, mas ele é diferente, "automatizado", bem, não entendo de armas e não sei onde posso conseguir essa.

Yue se aproxima devagar, ela se apoia no braço da poltrona de Cain e sorri de um modo irritante, reviro os olhos.

- O que você quer? – Disparo.

- Estava passando por aqui e ouvi que precisam de uma arma. – Cain se vira para ela e ergue as sobrancelhas. – Sabiam que a Casa Nonsense tem um pequeno arsenal?

- Tem? – Digo em uníssono com Cain.

- Claro que tem, e eu posso levar vocês até ele...

- E quanto isso vai custar? – Cain resmunga.

Yue sorri e tamborila os dedos na borda do sofá, ela balança a cabeça e se levanta.

- Yue! – Cain aperta o livro contra o colo. – É algo que só eu posso resolver?

- Eu diria a Lilith... – Ergo as sobrancelhas, Cain se vira e me encara intrigado. – Mas sei que ela não vai cooperar mesmo.

- Ela vai. – Cain diz firme. – Nem que seja obrigada a isso.

- Nem que me paguem. – Cruzo os braços, as pupilas de Cain se afinam. – Depende...

- É fácil, só preciso que venha comigo. – Yue ri e seus olhos brilham em dourado. – A sala de armas fica no porão.

- Eu não posso ir? – Cain diz lentamente.

- Não. – Yue sorri mais, engulo em seco. – Só eu e a pequena lady...

Encaro Cain, seu rosto está mais pálido, deve estar pensando na proposta e nas consequências, ele já se arriscou muito por mim e ir ao porão com Yue não é de fato um risco tão grande.

- Eu vou. – Me levanto e caminho até Yue. – Vamos logo, precisamos dessa arma o quanto antes.

- Que bom que topou... – Yue ri e caminha na minha frente.

Encaro Cain e sorrio, suas pupilas continuam finas e ele não sorri, me viro de costas e sigo Yue.

XXX

Yue vai até a cozinha e abre uma porta velha no fundo dela, as escadas rangem com nosso peso ao descer e ela não diz uma palavra sequer, a escuridão vai aumentando a cada degrau que descemos.

- Aqui em baixo não tem luz...? – Sussurro.

- Uhn... Não. – Yue ri. – Eu enxergo muito bem no escuro.

- Mas eu não.

Yue ri, piso em um degrau em falso e meu coração gela, consigo me estabilizar antes de cair no chão, respiro fundo e tento me acalmar, os passos de Yue se distanciam... Sigo-a. Se eu precisar fugir não sei se consigo... Estar com Abel gerava um medo horrível, mas estar com Yue é diferente, é como temer o que se esconde no escuro, não o que está diante dos meus olhos, estanco, seus passos desapareceram.

- Yue...? – Sussurro.

- Já tentou conversar com ele? – Engulo em seco. – Você poderia chamá-lo à noite garotinha burra... – Um frio desce por minha espinha. – Ele vai respondê-la se você chamar, ele também a quer... – Vejo os olhos dourados de Yue brilharem e recuo um passo, um grito de pavor preso na garganta. – Chame-o... – Uma luz repentina chama minha atenção. – Vamos.

Yue abre uma porta, a luz cai sobre seu rosto e seu sorriso debochado faz meu rosto esquentar. Ela entra na sala de armas rindo, sigo-a e encaro a sala, é como a sala de bonecas, mas com armas, espadas, facas, armas que nem sei nomear... Deslizo minha mão pelo cabo de uma adaga prateada... Aqui Yue não me atacaria, não com chances de poder revidar.

- Aqui. – Yue empurra uma arma grande em minha direção. – Aguenta?

Encaro o arco e mordo o lábio negando.

- Muito bem. – Yue se vira e saí da sala, com o arco apoiado nos ombros. – Pegue a aljava.

- Aljava? – Olho para o lado e vejo uma bolsa com flechas. – Ah...

Passo a bolsa pelos ombros e sigo Yue novamente em silêncio... "Fale com ele". Jaguadarte...

Se eu chamá-lo ele vai realmente responder? Cain disse que ele contou coisas a Yue, Jaguadarte também atacou Caleb, ele ria enquanto ia para cima do outro, ele consegue assumir o corpo de Cain, isso eu tenho certeza, mas o que ele ia querer comigo? Aperto a tira de couro entre minhas mãos. Eu não posso chamá-lo, seria como trair o Cain.

Chego ao topo da escada e Yue abre a porta, Cain recua e arregala os olhos... Ele nos seguiu.

Yue afaga os cabelos de Cain, jogando a besta em seus braços, ela ri e se afasta. Cain me encara intrigado.

- Não se preocupe, ela não fez nada. – Passo por ele e suspiro.

Não vou chamar o Jaguadarte, a não ser que precise muito disso, no momento só confio no bom e velho Cain.


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