Capítulo 31 - Um novo recomeço!

O tempo era relativo e inconstante. Não se sabia ao certo se haviam passado minutos, horas ou dias desde que Frank caíra ao chão. Os acontecimentos eram confusos e desordenados na jovem mente do rapaz. Foi essa a sensação que o garoto sentiu ao acordar no hospital geral de sua cidade, após alguns dias em coma. A primeira pessoa que reconheceu foi Barbara, que havia dormido ao seu lado em uma cadeira bem desconfortável durante todos os dias em que o garoto esteve hospitalizado.

Foi uma alegria imensa ao acordar ver seu grande amigo desperto daquele sono profundo, induzido pelos médicos para extraírem o veneno que havia penetrado por sua corrente sanguínea. Se a intervenção dos médicos e a resposta ao medicamento não fosse tão rápida, a história poderia ser completamente diferente, mas não com Frank Payne, eram o que contavam os médicos que o operaram.

— Como você está se sentindo, Frank?

— Parece que um trator passou por cima de mim — respondeu o jovem rapaz automaticamente. — Peraí, onde estamos?

— No hospital Geral.

— Não me diga que estamos em...

— Franklin Payne! Que bom te ver acordado — disse um médico, entrando no quarto em que estava repousando.

— Er... oi?

— Parece que sua amiga aqui não descansou enquanto você estava tirando uma sonequinha de três dias — falou o médico, dando tapinhas no ombro de Barbara.

— Três dias?

— Sim — respondeu o médico. — Extrair o veneno de sua corrente sanguínea não foi uma tarefa simples, mas seu corpo, estranhamente, respondeu rapidamente ao medicamento.

— Veneno? Daquele polvo-humano? Mas não era veneno, foram tentáculos. Peraí! Do que você está falando? — perguntou o garoto atordoado.

— Os pescadores que te trouxeram aqui nos falaram que você esteve com eles, ajudando-os a puxar a rede há três dias. Então você, curioso que é, começou a analisar os peixes retirados do mar até que, por mera ingenuidade, encostou sua mão em um peixe extremamente venenoso, conhecido por muitos por peixe-aranha, e seu veneno penetrou em seu corpo pela corrente sanguínea. Bem, pelo menos é isso o que me disseram — respondeu Barbara com propriedade.

— Peixe-aranha? Mas a pescaria já faz muito tempo. E a caverna? O vovô, Jason, Emmy e os outros?

— Quem?

— Você sabe muito bem do que estou falando. Estávamos lá e eu tentei te salvar. Depois não sei mais o que aconteceu — replicou o garoto.

— Desculpe, Frank. Mas não sei do que você está falando — retrucou Barbara, dando um tapa de leve na cabeça do garoto. — Você devia estar sonhando.

— Daremos tempo a ele, Barbara. Franklin precisa se recuperar. Isso pode ser reflexo dos medicamentos e das três noites de sono. Nosso cérebro é uma ferramenta muito poderosa e, quando estamos nessa situação, fantasiamos para que nosso corpo se recupere de algum tipo de trauma. Pode ser que, mais para frente, seu amigo precise de algumas consultas com um psiquiatra — disse o médico, saindo pela porta do quarto.

— Eu não estou louco. Você estava lá também, Barbara. Não se lembra?

A garota, vendo seu amigo naquele estado, mudou drasticamente seu humor, deixando escapar algumas lágrimas de seus olhos, virando-se rapidamente para que Frank não percebesse, mas não deu tempo, o garoto já conhecia há muito tempo sua amiga para saber quando algo estava mal.

— Nunca houve nenhuma caverna, não é, Bah? — perguntou Frank incrédulo.

— Não! — respondeu Barbara com a voz engasgada. — Sempre estivemos aqui, desde que a ambulância te trouxe.

Um longo tempo se passou sem que alguém falasse algo. Frank tentava compreender o que se passava em sua cabeça e Barbara queria deixar seu amigo o mais confortável possível para reorganizar suas ideias, sendo surpreendida por Walter, que entrou correndo no quarto, perdendo o fôlego.

— Frank! Graças a Deus você está vivo. Já consegue falar?

— Oi, vovô. Você não sabe o quanto estou feliz em vê-lo vivo.

— Vivo? Mas quem quase morreu foi você, garoto. Eu quem deveria dizer isso.

— É, parece que eu espetei meu dedo em um peixe-aranha.

— O dedo nada, você agarrou o peixe com sua mão e pressionou os espinhos venenosos dele. Parece que uma enorme quantidade do veneno entrou em sua corrente sanguínea e você caiu duro. Foi um milagre você estar vivo! Não tem ideia do quanto eu rezei para não perdê-lo também. Não suportaria mais nenhuma perda, já basta sua avó, sua mãe e seu pai.

O coração de Frank bateu mais acelerado com as palavras de seu avô, principalmente quando citou a morte de seu pai. Queria dizer a Walter sobre o "sonho" que teve, mas não quis dar falsas esperanças, até porque mesmo em seu sonho maluco, ele não conseguiu resgatar seu pai desaparecido, os colocando também em perigo extremo.

— Quando vou poder voltar pra casa?

— Logo o médico deve voltar pra verificar se está tudo bem com você e então lhe dará alta. Acredito que ainda hoje comeremos aquele macarrão com camarão que você tanto gosta — disse seu avô.

— E também o famoso bolo de frutas dos Bell que minha mãe fez hoje pela manhã.

— Esse bolo é muito valioso. O velho Artmeck que o diga.

— Quem? — perguntou a garota.

Frank sacudiu a cabeça para que ela esquecesse do assunto, enquanto se perdia em sorrisos.

Naquela mesma noite, o médico lhe passou alta e foram para casa comer o merecido jantar, enquanto o garoto bebia seu refrigerante preferido.

Frank acordou cedo em uma manhã quente e ensolarada, como era de costume naquela época do ano. O garoto achou estranho, pois nem eram 09h00 da manhã e o termômetro de sua casa já atingia os trinta e três graus. A temperatura não parava de subir, chegando aos trinta e oito graus antes do meio-dia. Resolveu sair de casa para ver a praia e se refrescar em suas águas geladas e cristalinas. Marcou com Barbara de se encontrarem no mesmo lugar de sempre, na pedra do Devaneio, de onde costumavam saltar e mergulhar naquele lindo mar, além de passarem horas conversando e refletindo sobre a vida.

O jovem foi o primeiro a chegar e seus olhos se encheram de lágrimas ao ver a beleza do lugar. Não se conformava com o sonho que teve, ainda no dia anterior estava em uma caverna mágica no fundo do oceano combatendo inimigos fantásticos, meio homem meio peixe, além de outras criaturas horrendas e naquele dia estava lá, sofrendo de possíveis alucinações, não sabendo o que era real e o que fora apenas um sonho.

Viu Barbara se aproximando e tentou esquecer sobre as aventuras na caverna. A garota parecia ainda mais linda do que se lembrava, com seus cabelos esvoaçantes pelo vento que vinha do mar. Seu coração pulsou novamente como no dia em que tocaram suas mãos e dormiram juntos naquele hotel em Guam, "Mas, espera, isso foi apenas um sonho e nunca aconteceu", lembrou-se Frank, deixando-o entristecido.

— Bom dia, Franklinzinho! — brincou a menina com um sorriso no rosto que deixou o garoto enrubescido.

— Olá, Bah. Bom dia.

— Como você se sentiu essa noite?

— Muito bem, e um pouco confuso pra falar a verdade.

— Você ficou inconsciente alguns dias, é normal estar um pouco confuso. Mas me conte mais desse sonho maluco que você teve.

— Nossa, Bah. Foram tantas coisas que nem sei por onde começar. Pra falar a verdade, tem uma coisa que queria lhe contar — disse Frank, se enchendo de coragem. — Nesse sonho eu, aliás, nós, começamos a namorar.

— Como? Hahaha. Sério isso? Eu e você namorando?

— Sim — confirmou Frank, ficando com as bochechas quentes.

— Hahaha, que sonho mais doido mesmo! Nunca iríamos namorar. Você é como um irmão pra mim. Não é?

— Claro que sim. Grandes amigos como irmãos e isso nunca me passou pela cabeça — concordou o garoto, angustiado com a reação inesperada de Barbara.

— Além do mais, você sabe que estou apaixonada pelo nosso novo vizinho.

— Pois é, como eu iria me esquecer? — disse Frank desapontado.

De fato, o rapaz não se lembrava do vizinho, pois só vira algumas vezes. Sabia que tinha a idade próxima a deles, mas não sabia seu nome, de onde se mudara e o que fazia quando não estava estudando, aliás, nem sabia se ele estudava.

— Barbara, acho melhor eu ir. Não estou me sentindo muito bem com esse calor. Ainda não me recuperei por completo, então prefiro descansar um pouco.

— Mas eu acabei de chegar!

— Sim, eu sei. Achei que seria legal entrar no mar e passarmos um tempo juntos, mas podemos tentar marcar amanhã. O que você acha?

— Por mim, ok. Está muito quente mesmo. Acho que vou ficar um pouco mais aqui então, dar uns mergulhos.

— Sem problemas. Nos falamos depois e cuidado com o mar, ele pode ser traiçoeiro as vezes.

Frank virou-se, sem olhar para trás. Seus olhos encheram-se de lágrimas, relembrando dos momentos felizes com a garota em seu sonho. Caminhou até chegar à areia da praia e se dirigiu até sua casa, que ficava bem próxima. Decerto, não mentira para Barbara, estava se sentindo um pouco mal, atordoado, para falar bem a verdade. Esse calor estava o cozinhando por dentro. Avistou o termômetro da rua e se deu conta de que já passara dos 42°C. Até onde essa temperatura iria chegar?

Chegou em casa e, ao abrir a porta, um bafo impiedoso nocauteou-o, quase jogando o garoto para trás. Parecia que Frank havia aberto a porta do inferno, tamanho o mormaço que vinha daquele lugar. Avistou seu avô Walter sentado em uma poltrona de costas para a porta, sem camiseta e com os pés dentro de uma bacia com água, que uma vez esteve gelada, mas que agora deveria parecer um chá.

— Oi, vovô. Tá conseguindo se refrescar aí nessa onda de calor?

Walter não respondeu. O menino, indiferente, foi até o controle do ar condicionado, verificar se estava configurado na temperatura mais baixa e na função de esfriamento, quando percebeu que o aparelho tinha quebrado.

— É, vovô, parece que o ar condicionado pifou de vez — disse Frank sem receber nenhuma resposta de Walter.

Voltou-se para seu avô e caminhou em sua direção. Foi então que percebeu que deveria ter pego no sono enquanto lia suas correspondências, pois segurava uma carta em sua mão, enquanto havia deixado as outras caírem ao chão próximas a poltrona.

— Vovô... Como o senhor consegue dormir em uma tarde tão quente como essa? — questionou Frank, se abaixando para recolher as correspondências do chão, quando, sem querer, esbarrou no braço de Walter, que tombou para frente, caindo por cima do garoto. O menino sentiu seu coração bater em um ritmo acelerado, enquanto os braços gelados de Walter se entrelaçavam em seu pescoço. Em um movimento rápido, Frank realocou seu avô de volta na poltrona enquanto examinava o idoso.

— Não, vovô... Não faça isso comigo, por favor! Já te perdi duas vezes e até agora não superei tamanha dor e, então, assim que eu acordo do pesadelo em que estive, o perco novamente. Acorde! Por favor, acorde! — gritou Frank.

Mas Walter Payne não esboçava nenhuma reação. Seu corpo estava rígido e gelado, principalmente para aquele maldito dia infernal. Os olhos do idoso continuavam fixos como se tivesse morrido enquanto lia algo. Foi então que Frank se deu conta que seu avô ainda segurava uma folha de papel entre seus dedos retorcidos. Parecia um laudo pericial de algum órgão federal, com o símbolo da Secretaria de Estado de Segurança Pública. O rapaz, ainda aos prantos, retirou com o maior cuidado o documento das mãos de seu avô, deixando seu braço falecido descansar por sobre suas pernas geladas.

Ao percorrer algumas linhas em uma leitura rápida, caiu ao chão perplexo, abatido e totalmente desacreditado da vida. Uma tontura se apoderou de seu corpo, tentou respirar fundo, mas não tinha energia suficiente para responder aos seus sentidos. Tudo começou a girar, perdeu completamente o olfato, não sentindo mais o cheiro de nada, nem o som do mar, tampouco o calor que tanto o importunou. A visão começou a falhar e sem tentar se segurar, caiu desmaiado ao chão.

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