Capítulo 29 - A ambição fala mais alto
O general urrava de dor enquanto retirava a adaga de sua panturrilha. Thomas empunhou sua submetralhadora, que já estava carregada com as balas, e sentou o dedo no gatilho acertando, pelo que pôde ver, pelo menos um cinco daqueles monstros asquerosos. George se levantou com a perna sangrando, virou-se e disparou também com sua arma de fogo para todos os lados, literalmente no escuro, mas não acertou nenhuma criatura.
As balas chicoteavam nas pedras da galeria zunindo forte aos ouvidos dos dois homens que tentavam de todas as maneiras salvar suas vidas. Thomas Wolf, ouvindo mais algumas vozes bem próximas, apontou para onde acreditava estarem e novamente atirou contra o grupo de seres das trevas, ouvindo mais urros e gritos antes do silêncio que seguiu. O contra-almirante, que tinha gasto todo seu cartucho naquela disparada desenfreada, mas aliviado por ter acabado com o bando, levantou sua vestimenta para procurar mais um pente de balas para recarregar a arma de fogo, quando recebeu uma trombada de um deles que havia sobrevivido à intensa ofensiva, correndo para um ataque corpo a corpo, acertando no ar a facada que daria na altura do peito do almirante.
Os dois iniciaram uma luta, entre socos no rosto, chutes na barriga e no quadril, arrancando sangue de cada um dos adversários. Parecia uma briga de rua e não uma luta pela sobrevivência. O general Nelson, que havia descarregado sua submetralhadora, não teve tempo de recarregá-la, retirando do coldre de suas costas uma pistola calibre 38, apontando-a na direção do contra-almirante na tentativa de acertar o monstro que se atracara com ele.
Respirou fundo e fez o ritual como sempre fazia antes de atirar com qualquer revólver de disparo único, imaginou o alvo ser atingido antes mesmo do projétil sair da pistola e então o fez. Apertou o gatilho e ouviu o estampido do tiro, rezando para que o alvo tivesse sido acertado. Thomas virou-se e encarou George, como que agradecendo com um gesto imperceptível com a cabeça o ato heroico do oficial, que acabara de salvar sua vida.
O contra-almirante se levantou, dando um chute bem forte na barriga do monstro, para garantir que estivesse morto, e teve mais do que certeza, pois sequer abriu sua boca. Virou-se e foi recolher sua arma que estava jogada ao chão após ter recebido o encontrão da criatura. Percebeu que não havia mais munições para a metralhadora, tampouco em sua pistola, se sentindo vulnerável e impotente. Pensou em perguntar se George Nelson tinha ainda alguma bala para lhe dar, mas achou mais prudente não deixá-lo saber que estava desarmado, caso ele tentasse algo contra ele. Enquanto isso, ainda com a perna escorrendo sangue, mas com um fluxo bem menor, o general voltou a cortar o restante das plantas que envolviam a única passagem para continuarem a jornada.
Ainda faltavam alguns bons cortes a serem feitos para liberar o acesso, enquanto Thomas, ainda recolhendo as coisas jogadas no chão, começou a refletir sobre sua perversa atitude, querendo acabar a todo custo com o honrado general que, quando teve a oportunidade de vê-lo morto naquela luta, em que o monstro estava quase vencendo, o salvou sem pensar duas vezes. Não sabia o que realmente fazer, seus valores diziam uma coisa, enquanto seus desejos outra.
Essa era a grande oportunidade de se tornar um dos homens mais poderosos do mundo e ele não podia perdê-la, enquanto que matar um herói, a quem lhe devia sua vida, era o maior golpe pelas costas que alguém poderia dar. E em falar em ataque pelas costas, o atual contra-almirante da marinha, futuro general de quatro estrelas do exército olhou para George, que continuava com sua atividade em cortar o mais rápido possível o restante dos matos venenosos para saírem dali. Enfim, depois de pensar um pouco chegou à solução do impasse que se deparara. Saiu correndo em direção ao general e, ao chegar próximo, o empurrou com todas as suas forças contra a parede de plantas espinhosas, batendo seu rosto, mãos e outros membros em contato com a planta mortal. Nunca havia visto alguém urrar de tanta dor, se atirando ao chão para se desgrudar dos talos cheios de venenos.
George Nelson começou a ficar vermelho e inchar nos locais que encostou nos espinhos, quase que deformando-o por inteiro. Não conseguia abrir sua boca para proferir palavra alguma, tamanho o sofrimento que a dor o causara.
Thomas, por fim, encontrou a solução de seus problemas, não iria matar o oficial com suas mãos, portanto, sua "consciência" ficaria tranquila em assassinar o homem que o salvou da morte certa, deixando-o ali para sofrer a própria dor. Decerto, ele morreria em poucas horas devido à enorme quantidade de veneno que seu corpo absorvera, fosse por alguma dificuldade respiratória ou até mesmo parada cardíaca.
— Se eu fosse você, teria pensado duas vezes antes de zombar com a minha cara, general moribundo — disse Thomas antes de cuspir no rosto de seu ex-superior. — Aqui se faz, aqui se paga!
Virou-se pegando a faca que o general havia soltado no chão e voltou a cortar o restante, abrindo completamente o portão após uns dez minutos de trabalho, ainda com sua mão em carne viva por conta do veneno que penetrara quando tocou a planta pela primeira vez. Atravessou, deixando George abandonado naquele salão horripilante.
Do outro lado era muito diferente, as pedras que rodeavam as paredes pareciam ser alocadas perfeitamente em sincronia. Não havia estalactites, estalagmites ou qualquer tipo de precipitação rochosa, um largo corredor se mostrava à frente, como se fosse a entrada do hall principal de um castelo, e o mais importante de tudo, havia um tipo de lâmpada invisível iluminando muito bem o ambiente, algo que não presenciava já há um bom tempo.
Lembrou que não havia mais munições em seus revólveres e resolveu voltar à outra galeria para roubar as munições do general, que ainda se encontrava no mesmo local, se perguntando se já havia morrido. Mas, para o azar do próprio Nelson, ele ainda não havia passado para o outro lado, mudo por conta dos efeitos do veneno, apenas o seguiu com os olhos.
O contra-almirante pegou do chão a arma que George usara para matar o monstro e viu que tinha apenas mais uma bala no pente. Era melhor do que nada, pelo menos teria ainda uma oportunidade de se manter vivo, então conferiu o restante das facas e alguns alimentos que sobraram e partiu novamente para o corredor, não sem antes se dirigir a George:
— Boa sorte e longa vida ao general — zombou Thomas, que entrou novamente deixando o oficial morrer com o tempo.
Quando George não enxergou mais seu rival, tentou com todas as forças que lhe sobraram virar-se para alcançar o bolso interno de sua farda. Com um movimento cansado, conseguiu colocar dois dedos dentro do bolso e retirou um papel grosso dobrado em quatro e uma caneta azul, que por sorte ainda estava escrevendo. Abriu a foto com grande dificuldade, beijando o rosto de seu neto com o maior carinho do mundo, e tratou de escrever, com um esforço para que sua letra não ficasse ilegível, na parte de trás em branco:
— Meu neto querido, infelizmente não estarei presente em seu primeiro aniversário, tampouco nos outros que seguirão. Minha maior tristeza é não poder ver o seu crescimento e o homem que se tornará, mas se houver de fato uma vida após a morte, decerto, eu olharei por você todos os dias e lhe guiarei para o caminho do bem. Queria poder lhe passar alguns valores que aprendi com a vida, ensinar sobre artes, história, como degustar uma boa cerveja e, principalmente, algo que aprendi somente depois de velho com o seu nascimento, que a família deve ficar sempre em primeiro lugar, pois do que levamos dessa vida nada é maior do que o amor das pessoas que estão ao nosso lado. Te amo do fundo do meu coração, assim como seu pai, seu tio e sua avó. Seja feliz! Dê seu avô babão, - George Nelson.
"PS: O contra-almirante de Guam foi o grande responsável por minha morte, do general Erik Morgan e dos demais oficiais.".
O general então largou a caneta e a foto de seu neto ao lado de seu corpo, que já não tinha mais forças nem para encher seus pulmões de oxigênio, dormindo seu sono mais do que merecido.
E assim foi a morte de George Nelson, um grande homem que lutou bravamente com todas as forças para tornar o mundo um lugar melhor. Pelo menos foi o que disseram em seu enterro de caixão fechado, semanas depois após não encontrarem nenhum corpo.
Thomas acelerava os passos para chegar ao fim daquele comprido corredor. Tinha certeza que era a reta final daquele local macabro, e dependendo de onde saísse, jamais contaria para alguém, dificultando assim as buscas pelo corpo do general e seus homens. Quem quisesse se aventurar para fazer as buscas, teria que passar por tudo o que passou e, se tivessem sorte, descobririam o cadáver já apodrecido, sem jamais saber o que realmente ocorreu.
Cada minuto que se passava acelerava seus batimentos cardíacos, sua pressão arterial devia estar altíssima por conta da excitação que sentia, imaginando que logo se tornaria, com honras, o maior general da história e que, em vez de receber ordens, todos deveriam se curvar aos seus pés, inclusive os outros membros da ONU.
Um estrondo muito alto ouviu, sem saber de onde vinha, se jogando ao chão, tamanho foi o susto que tomou seu corpo. Era como se um meteoro tivesse caído próximo a ele, ou um raio, ou até mesmo o barulho de uma fusão nuclear. Não ouviu desde então mais nenhum ruído ou um estampido. Perdeu-se em pensamentos e não reparou que já devia ter caminhado por umas duas horas, algumas vezes correndo sem sequer respirar direito, outras a passos lentos para recuperar o fôlego.
Nesse tempo, pensou em sua promoção, no que falaria e, principalmente, como faria para voltar a Guam, já que seu celular estava quebrado. Então lembrou-se que guardara em sua mochila o celular de Mark, que estava no submarino de seu arquirrival. Quando já não tinha mais no que pensar e a paisagem não ajudava no processo de criatividade, já que era tudo a mesma coisa, se deparou com o fim daquele corredor que lhe parecia interminável, deixando-o confuso e atordoado.
O caminho acabara em uma parede sólida, fechando completamente a saída, se é que houvesse alguma. Não entendia o que estava acontecendo e o porquê daquelas plantas protegerem o local se nada ali havia. E de onde eram aquelas luzes que iluminavam todo o percurso, já que não havia nada preso às paredes e ao teto? Parecia que um brilho surgira no ar flutuando acima de sua cabeça. A excitação que sentira se tornou ódio e raiva, tateando e chutando todos os cantos das paredes, a fim de achar algum dispositivo que a fizesse se abrir, como nos filmes de aventura que seu filho assistia quando pequeno, mas nada encontrou, apenas uma dor insuportável que causara a si próprio com todos os chutes e socos que dera.
Exausto, por ter caminhado tanto tempo sem ao menos parar para descansar sentou-se no chão, com suas costas contra a parede que selava a passagem para o outro lado e pegou seu cantil para matar a sede que resolveu enfim aparecer, juntamente de um sono, forçando seu corpo a escorregar e se esticar naquele chão estranhamente limpo, sem um resquício de poeira. Não havendo mais nada a fazer, o futuro general das forças armadas americanas adormeceu.
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