Capítulo 22 - Um adeus inesperado

— Pessoal, estou começando a me lembrar de algumas coisas e preciso contar antes de iniciarmos essa batalha. Assim que cheguei nessa galeria, ouvi alguns desses seres dizerem que o cavaleiro elemental estava próximo de conseguir a outra parte da pedra da água. Então tudo o que o Delver nos contou faz sentido e esse tal de Bhaltazar...

— É Bhaltair — interrompeu Barbara.

— Certo, esse tal de Bhaltair Arasgain deve estar querendo juntar as quatro pedras elementares.

— Isso seria o fim do mundo — disse Emmy com uma cara de pavor.

— Sim, não podemos deixar que isso aconteça de jeito nenhum — expressou-se Frank. — Vamos mandar aquele general e o maldito druida de volta para o inferno.

— O que pretende fazer? — perguntou Walter.

— Agora, somente acabar com esses desgraçados e livrar todos os garotos.

— Aí estão somente a metade dos meus amigos. Ainda tem mais seis em outra galeria — argumentou Luiz.

— Vamos então salvá-los, pode ter certeza. Quem está comigo? — perguntou Jason.

Então, ouviu-se mais um grito desesperado de dor e sofrimento vindo de um dos garotos. Luiz olhou sem aguentar mais um segundo, explodindo em uma corrida contra o monstro que atacara o garoto, lançando um berro estridente:

— Pedro! Larga o Pedro, seu maldito! — bradou Luiz, retirando uma adaga que, assim como Frank, arrancou de um dos animais mortos.

O garoto pulou em cima do agressor, desferindo diversos golpes com sua faca no pescoço do animal, acertando uma importante veia e o apagando na hora. Vendo a cena, outros seres começaram a correr em direção ao ataque, assim como Frank e os outros que vinham no encalço de Luiz. Eram por volta de doze animais asquerosos, muito parecidos uns com os outros, mudando somente alguma coloração da pele escorregadia e a musculatura em seus braços e peitoral, assim como também em diferentes estaturas, mas nada muito desigual.

Luiz agarrou seu amigo Pedro e o trouxe próximo do grupo, enquanto os outros encaravam o pequeno exército animalesco, se é que podiam chamá-los de animais. Estava mais para exército bizarro. Ficaram por algum tempo se encarando e prevendo o próximo movimento do adversário quando ouviram mais gritos, vindo ao longe e passos apressados cada vez mais distantes. Alguns dos monstros que tinham ficado para atrás do nojento grupo estavam batendo em retirada levando com eles os meninos sequestrados, enquanto faziam um bloqueio evitando a passagem dos outros humanos.

— Não podemos deixar levá-los! — gritou Luiz, se pondo a correr em direção aos monstros.

Uma luta então se travou, chicotes foram atirados com força contra Jason, já que era o maior do grupo e ponto de referência, sendo enrolados em seus braços, mas não segurando a força do soco que desferiu em um dos Peixomens que tentava se proteger sem sucesso. Jason acertou o maxilar do oponente com tanta força que deve ter deslocado-o para a direita. Em seguida, retirou um punhal por detrás de suas costas, cravando no peito da aberração, fazendo-o cair aos seus pés. Retirou a faca presa à caixa torácica do monstro com uma força sobre-humana, acertando em seguida um segundo Skum, que pensou se aproveitar da pequena distração do humano para ataca-lo pelas costas, não sabendo que Jason já havia previsto seus movimentos assim que se aproximou. Já eram menos dois daquele amontoado de seres horripilantes.

Barbara se apoderou do chicote que a criatura derrubou e acertou em um outro que chegava próximo, o jogando com tudo para trás. A menina apontou para o alto e rodou com toda a força que possuía, produzindo um zunido e um vento bem forte. Esse movimento, mesmo que feito sem querer, atordoou os cinco Grimlocks que vinham na direção deles atacá-los com seus machados, se trombando uns nos outros.

— Continue! — prosseguiu Walter. — Esses seres, por serem cegos, se orientam por eco localização assim como os morcegos. E com esse movimento que fez com o chicote para cima, de alguma forma está agitando as partículas do ar. Por conta desse agito, são criadas ondas que colidem com as outras emitidas pelos monstros cegos, confundindo-os e mudando a trajetória deles.

Emmy se apoderou de mais um chicote e, junto de sua amiga, começou a girá-los, fazendo com que aquelas criaturas se debatessem mais e mais, derrubando-se uns aos outros. Aproveitando a ridícula cena, Frank e Luiz se jogaram para cima deles, derrotando-os facilmente enquanto Walter e Jason enfrentavam dificuldades para acertar os Peixomens que, com sua pele escorregadia, desviavam de seus golpes e se aproximavam cada vez mais da dupla. O grandalhão já havia levado diversos golpes, mas não caía por nada, parecia que seu corpo era de aço, pois algumas vezes os próprios monstrengos reclamavam de dor nos punhos. Acertou mais um em cheio, derrubando-o com um golpe bem dado. Frank e Luiz se juntaram à dupla mais experiente e igualaram o duelo. Barbara e Emily também se envolveram na luta, ambas segurando os chicotes bem firmes e, assim que se aproximavam das criaturas, desferiam chibatadas atordoando-os. Não demorou muito para que todos os meio-humanos estivessem estirados ao chão. Luiz correu de volta ao seu amigo Pedro, que a essa altura estava descansando e recuperando suas forças. O garoto estava faminto e Emmy sem pensar duas vezes deu-lhe um pouco da comida que havia reservado para depois.

— Luiz, como é bom te ver, meu amigo. Você conseguiu fugir deles e arranjou algumas pessoas para nos ajudar? — indagou Pedro, com a voz cansada e todo dolorido.

— Sim, Pedro. Eles me salvaram e prometeram ajudar-nos contra os seres malignos.

— Mas a gente nunca vai conseguir, Luiz. Já tentamos de tudo e são em um grande número.

— Eu boto fé nesse pessoal, meu amigo. Quando estão reunidos, eles parecem exalar uma energia reconfortante e, de certa forma, acredito fazer parte desse time. Vamos, que te ajudo a levantar.

— Obrigado — agradeceu Pedro, se equilibrando sozinho com as pernas cansadas.

— Está vendo aquele grandão ali? Ele é descendente direto do grande Gadao.

— Sim! — respondeu uma voz doce vindo por detrás dos garotos.

— Pedro, quero que você conheça Emily, filha do chefe Jason, herdeira do trono do grande Gadao.

— Trono? Hahaha, corta essa, Lú — disse Emmy já com certa intimidade.

Pedro olhou para a garota, encantado com tamanha beleza, mesmo debaixo de uma caverna repleta de perigos. Voltou seus olhos para Luiz, depois de novo para Emily e compreendeu que ali estava ocorrendo algum flerte entre os jovens. Ainda que todo dolorido, arranjou forças para dar um sorriso feliz, por seu amigo ter conhecido alguém legal, apesar da pouquíssima chance de saírem dali com vida.

— É um prazer conhecer todos vocês — disse Pedro, agradecendo a ajuda.

Jason, que estava um pouco afastado conversando com Walter, veio ao encontro do novo rapaz para perguntá-lo se conhecia o caminho que os bichos haviam feito com os outros rapazes.

— Acredito estarem voltando para a base, onde fica o general e seus capangas mais próximos, "de confiança" — disse Luiz, fazendo o sinal de aspas com as mãos, insinuando que entre essas criaturas mágicas não existia honra, apenas o mais forte sobrevivia.

— Você consegue caminhar? — questionou Jason.

— Acredito que sim.

— Pode nos levar até essa base?

— Claro — disse Pedro, meio contrariado por ter que ir novamente até o covil, sabendo que dessa vez não teria chances de sobreviver — Mas vocês não têm ideia do tamanho do exército que esse general está criando. A essa altura, ele já deve estar sabendo desse ataque e estará pronto nos aguardando.

— Ótimo! Estaremos prontos para acabar com eles — interveio Frank, demonstrando sua coragem e determinação.

Pedro caminhou por alguns metros, se apoiando no ombro de seu amigo Luiz, este que era seu parceiro nas empreitadas e descobertas nos fundos das cavernas de Guam. A vida dos garotos antes se baseava em ir à escola, jogar futebol e suas expedições às cavernas, seu maior e mais intenso amor. Mas não era isso o que esperavam quando acordaram amarrados nessa parte da caverna, aliás, nem sabiam se ainda estavam em Marbo. Andou por mais alguns metros até atravessarem a galeria em que estavam. O local era iluminado por tochas presas nas paredes. Até o momento, não haviam encontrado nenhum tronco de árvore ou qualquer haste de tamanho suficiente para acender uma tocha, apenas alguns pedaços de madeira desgastadas que Jason usou para algo improvisado. O chefe arrancou duas entregando uma para Frank que iria à frente, junto de Luiz e Pedro, e segurou a outra, caminhando mais atrás, cobrindo a retaguarda junto de Walter.

Barbara visualizou inscrições escritas em algumas rochas mais à frente e se pôs a tentar decifrá-las, mas não conseguia. Era uma língua jamais vista, se é que aquilo era uma língua humana. O pessoal foi se juntando e tentando traduzir o que estava escrito, mais por uma questão de descanso e diversão do que por necessidade. Walter disse para Barbara não mexer com aquilo, já que haviam alguns desenhos de caveira e poderia ser perigoso. Ela, sem dar atenção ao que o senhor lhe aconselhava, já que dentre os três do esquadrão fantástico se sentia a especialista nesse tipo de enigma, continuou a tentar traduzir o que estava escrito.

Frank, vendo que não daria em nada entrar nessa discussão, disse que iria "ali atrás" rapidinho para aliviar a bexiga que estava para estourar, sendo caçoado pelos demais dizendo que dessa vez não era para ele tirar um cochilo debaixo de umas pedras.

Enquanto aguardavam o retorno de Frank, que atravessara para a outra galeria para ter mais privacidade, Barbara continuava com a tarefa árdua, imposta por ela mesma, em tentar traduzir aquelas palavras. Abriu seu dicionário de símbolos, que ainda não havia utilizado desde que colocou em sua mochila antes de partir de casa. Começou a caçar respostas para alguns tipos de hieróglifos ou caracteres desconhecidos, mas não encontrou nada parecido com o que estava entalhado nas paredes, até que, por fim, chegou a descobrir que se tratava de um sistema de runas.

Então, com a ajuda do dicionário, começou a tentar traduzir, enquanto Walter se pôs a conferir se Frank estava bem, com receio de que algo ruim voltasse a acontecer com o garoto.

— Isso começa com um "amar, ou amador". Esse último aqui deve ser algo como "exaustão", enquanto esse deve significar "cair" — disse a garota.

— Olha, — prosseguiu Pedro querendo se enturmar — esse símbolo aqui tá parecendo com "agilidade, rapidez, alguma coisa assim" e esse outro com "enquanto".

— Mas tá faltando algo, porque ainda não faz muito sentido — disse Barbara, cada vez mais empolgada com o desafio. — Ah, já sei. Esse que está faltando aqui acho que significa "destino", ou melhor, "destinados" e este acredito que é "treinar" enquanto este que tem o formato de uma caveira ou cabeça deve representar isso mesmo, uma cabeça. E, por último, essa palavra deve ser "inquietos".

Barbara juntou então todas as palavras na ordem correta, prestando maior atenção à gramática e ao sentido que se fazia a frase até que chegou a uma conclusão:

— Então, — fez uma pausa de suspense — a frase deve ser algo assim: "amadores cairão rapidamente, enquanto destinados inquietos treinarão exaustivamente".

Dito isso, sentiram o chão estremecer como que por encanto, pós de pedras caíram do teto e infestaram o ar, fazendo com que o oxigênio daquele lugar começasse a diminuir, ficando ainda mais rarefeito. Então, ouviram gritos vindos lá de trás, de onde estavam os dois: Frank e Walter, e saíram correndo para tentar ajudá-los, mas não conseguiam enxergar um palmo à frente por causa da sujeira e poeira que se espalharam. Tentavam de todas as maneiras chegar o mais rápido possível, mas o caminho estava lotado de obstáculos. Antes não haviam prestado atenção, pois caminharam com as luzes das tochas, mas, como se encontravam em uma escuridão total, já que o fogo das tochas havia apagado por conta do desmoronamento, demoraram mais do que gostariam.

— Vai logo, Frank. Atravessa para o outro lado enquanto eu seguro essa rocha — disse Walter.

— Não sem você, vovô. Logo eles estarão aqui para nos ajudar.

— Não dá, garoto. Essa pedra é pesada demais para segurarmos por muito tempo. Vai logo. Eu vou estar bem do outro lado.

— Já disse que não. Então ficamos nós dois do outro lado e daremos um jeito de sairmos juntos — respondeu Frank.

Então começaram a ouvir gritos vindo do lado de onde estavam. Eram mais criaturas, que, pela conta rápida, deviam ser por volta de umas dez ou quinze. O desespero foi tomando conta deles, pois os seres começaram a puxá-los pelos braços e cintura tentando trazê-los para o lado perigoso. Fixaram seus pés no chão ao mesmo tempo que seguravam aquela pesada rocha que quase os esmagaram.

Cada vez ficava mais difícil de suportar tanto os puxões das criaturas quanto o peso da rocha. Sem esperar, Frank recebeu um puxão do lado contrário, igualando assim as forças. Jason, Barbara e os outros tentavam de todas as maneiras trazerem seus amigos, mas não tinham força suficiente. Precisavam juntar todos e puxarem um de cada vez, mesmo que a pedra que estava suspensa fosse pesada demais para apenas uma pessoa segurar. Tinham que agir rápido ou então quem não fosse escolhido primeiro poderia ser esmagado ou levado pelos monstros.

— Levem Frank primeiro. Eu aguento segurar por mais tempo do que ele.

— Não, meu avô ainda está se recuperando. Deixem-me aqui e levem ele primeiro.

— Jason, por tudo o que é mais sagrado. Leve ele que ainda é jovem e tem uma vida pela frente. Essa é a minha decisão, não me desobedeça, por favor.

Com o apelo de Walter, Jason decidiu rapidamente trazer primeiro Frank, que era mais leve, assim ganhavam tempo para trazer em seguida Walter, mas a estratégia falhou assim que retiraram o garoto, pois o senhor não tendo nenhuma força que o puxasse ao contrário, foi rapidamente arrastado para o outro lado, sendo cercado pelas asquerosas criaturas. Assim que ambos saíram debaixo daquela rocha, ela caiu ao chão com extrema força selando o acesso dos aventureiros por ambos os lados.

Um grito de dor ecoou por todos os cantos da caverna, atravessando até a grande rocha, podendo ser ouvido por todos. Walter, pelo jeito não suportou lutar contra todos aqueles seres e então não se ouviu mais nada, apenas os berros de angústia e lamentação de Frank, por ter perdido para sempre seu grande e fiel amigo, companheiro e avô, Walter Payne.

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