Kêtlos (Conselheiros)
Quando Diaz acordou, foi surpreendido pela luz de vinte velas acesas e distribuídas em forma de um círculo ao seu redor, criando assim uma atmosfera mais sombria para o ambiente extremamente escuro em que se encontrava. Ele se levantou com um pouco de dificuldade por causa das mãos ainda amarradas e tentou sair de dentro daquele círculo de velas. O ambiente estava tão escuro e sua mente ainda estava tão lenta por causa do apagão, que ele só percebeu o grilhão preso em sua perna quando o mesmo travou seu movimento, o impedindo de sair daquele ponto.
— Pode parecer um pouco de exagero, mas essa corrente é tão somente para a sua proteção. – uma voz vaga mas com um tom masculino surgiu no breu.
— Quem está aí? – Diaz movimentou sua cabeça na direção da voz, mas seus olhos não enxergaram ninguém na escuridão.
— Nós somos os klêtos do rei. Já ouviu falar? – uma segunda voz surgiu, dessa vez vinda de uma mulher, porém a mesma também se manteve oculta.
— Já ouvi alguns boatos. Mas também conheço algumas histórias onde vocês são chamados por outro nome. – Diaz não conseguia ver, mas sentiu como se diversos pares de olhos estivessem o observando com atenção.
— Os carrascos. Estou certo? – uma terceira voz com um timbre envelhecido surgiu.
— Exato. Mas, como eu disse, são boatos e histórias que ouvi.
— E já que você trabalha no porto, você ouve muita coisa. – a quarta voz que surgiu mais parecia vinda de um adolescente.
— Quem exatamente são vocês?
— Em qual desses boatos você mais acredita, Diaz? – dessa vez era certo que uma criança havia falado com ele.
— Se eu pudesse vê-los, talvez eu teria uma opinião mais correta.
— Se você prefere assim, então que assim seja. – a primeira voz foi quem respondeu a Diaz.
Passos ressoaram na escuridão e um a um surgiram figuras com mantos brancos que cobriam seus rostos e corpos por completo. Assim como Diaz havia imaginado pelo timbre de cada uma das vozes, as cinco primeiras pessoas a surgir e assumirem seus lugares atrás de uma vela eram exatamente um homem, uma mulher, um velho, um jovem e uma criança. Após eles também surgiram mais quinze figuras que se organizaram envolta do círculo, cada um com sua respectiva vela.
— E agora? Você finalmente possui uma informação mais correta? – foi a criança quem se pronunciou, e a voz dela pareceu debochar um pouco de Diaz.
— Julgue-me Hades, pois creio que vocês sejam algum tipo de seita.
— Muitos disseram o mesmo. – uma garota se pronunciou, e esta estava ao lado da criança, sendo assim a sexta pessoa do círculo.
— Todos sempre se assustam na primeira vez. – uma senhora declarou com certa empatia, e esta era a sétima pessoa do círculo.
— Se você viver tempo o suficiente, talvez teremos outra chance de nos encontrarmos. – a oitava pessoa se manifestou, com uma voz infantil mas com um corpo de homem.
— Vocês vão mesmo continuar falando desse jeito esquisito? – Diaz interrompeu antes que a próxima pessoa pudesse falar algo.
— Por que a impaciência? Saindo daqui você vai direto para as mãos da lua vermelha. – o idoso que ocupava o terceiro lugar do círculo foi quem se pronunciou.
— Lua vermelha? – Diaz não conseguia acreditar que a cada segundo que se passava, ele ficava cada vez mais confuso.
— Logo você vai entender. – a resposta veio do mesmo senhor.
— E quando vou poder sair daqui?
— Depois de responder três perguntas nossas. – o décimo segundo se manifestou, com uma voz forte e autoritária.
— Então façam essas perguntas logo. – Diaz permitiu que sua frustração transparecesse na sua voz.
— Quem são seus pais? – uma mulher, na décima posição, perguntou.
— Não sei. – Diaz respondeu seco, incomodado com a pergunta.
— Qual é a sua estrela de nascimento? – um jovem na décima sétima posição perguntou.
— Não sei. — mais uma vez Diaz não escondeu o incômodo que sentia com aquelas perguntas – Apenas meus pais verdadeiros sabem.
— Qual deus te abençoou no seu nascimento? – a vigésima pessoa perguntou, mas sua voz não parecia pertencer nem a homem e nem a uma mulher.
— Que merda! Vocês não entenderam que eu sou a merda de um órfão desde as minhas primeiras memórias? – Diaz quase gritou, mas aquelas pessoas o intimidavam demais para que reagisse dessa forma.
— Nos desculpe, mas essas perguntas são necessárias. – a primeira voz respondeu.
— E que diabos vai acontecer comigo agora?
— Vai depender de você mesmo. – a mulher na segunda posição respondeu – Se você conseguir sair vivo desse círculo, você é um homem livre, e teremos o prazer de te entregar dez moedas de ouro como compensação por todo esse incômodo.
Diaz não respondeu, e também não se moveu um centímetro.
— Você acha que estamos mentindo? – o senhor na terceira posição perguntou.
— Ou ficou muito impressionado com a quantia de moedas mencionadas? – a criança na quinta posição debochou.
— Que brincadeira é essa? Por que eu não conseguiria sair daqui?
— Você está sendo acusado de algo extremamente sério. Se for inocente, você conseguirá sair. – um homem na décima terceira posição declarou.
— Se for culpado, morre. – o décimo quarto completou.
— Como eu posso ter certeza de que vocês estão falando a verdade?
— Não saberá até testar. – o primeiro declarou pacientemente.
Diaz ficou indeciso. Ele sabia de sua inocência melhor que qualquer outra pessoa, mas, ao olhar mais uma vez para sua mão esquerda, lembrou que aquela tatuagem o acusava como culpado de um crime que não havia cometido.
— E se eu disser a vocês que eu nunca fiz nada para ter essa tatuagem esquisita? – o prisioneiro estava tentando pensar em uma saída, e decidiu apelar para a piedade daquelas pessoas.
— Impossível! – uma mulher na décima nona posição esbravejou.
— Nenhum benção é recebida por acaso. – o décimo oitavo declarou.
— Mas vocês têm que acreditar em mim! Até mesmos os pzaris da minha mente eu já os recebia mortos. – Ele não estava mentindo e tinha a certeza que aquelas pessoas acreditam.
— Nós sabemos disso. – o primeiro tornou a falar – Mas por que você acha que matar alguém te concederia essa benção?
— Merda! Thanatos é o deus que personifica a morte, certo? Que outra porcaria levaria a todos esses problemas?
— Vênus te contou que você está sendo acusado como o autor de alguns assassinatos? – o primeiro continuou sendo o único a falar com Diaz.
— Não. Ele não falou nada.
— Tem certeza?
— Mas que merda, é claro que sim! – Diaz não sabia mais se estava confuso, com medo ou ansioso com tudo aquilo – E mudaria alguma coisa se ele tivesse falado?
— Vênus é uma pedra que tem incomodado bastante nas últimas estações. – o senhor na terceira posição explicou.
— E precisamos nos livrar dele logo. – o vigésimo se manifestou.
— O que exatamente ele fez? – Diaz ficou curioso, apesar de ainda estar com medo.
— Você não precisa saber. – o primeiro tornou a falar – Saia logo desse círculo se você for inocente!
— E essas correntes? ‐ Diaz levantou o pé indicando aquilo que o incapacitava.
Sem qualquer ordem, som ou aviso, as correntes que o prendiam se partiram em pedaços, e Diaz se viu livre para movimentar-se.
— Algum outro impedimento? – a segunda mulher perguntou.
— Não.
— Então saía do círculo! – todas falaram em uníssono, causando um forte arrepio em Diaz.
Ele não tinha mais nenhuma opção, e, obviamente, sabia que nenhuma pergunta que fizesse seria respondida. Sua mente ainda estava confusa, mas pelo menos agora ele tinha uma direção para seguir.
Diaz deu o primeiro passo na direção de uma das extremidades do círculo e pretendia sair passando por entre a quinta e sexta vela, mas, uma sensação estranha o impediu de dar o último passo. Seu corpo havia perdido parcialmente o seu calor e apesar de não entender muito o porquê, ele entendeu que aquele caminho o levaria até a morte.
Quer fosse seu subconsciente movendo-se sob influência do medo, ou quem sabe até mesmo o aviso de algum deus que estivesse o observando com olhos piedosos, mas Diaz agiu conforme aquela sensação ordenava, e retornou para o centro do círculo.
— Algum problema? – o primeiro homem perguntou.
— Nenhum. – ele respondeu seco.
Diaz realmente não sabia o que fazer. Ao que tudo indicava, ele era o único que havia tido aquela sensação, já que todas aquelas pessoas ao seu redor continuaram imóveis e em silêncio. Ele pensou que talvez estivesse ficando louco, mas quando se virou na direção da décima vela e deu um passo, a mesma sensação se intensificou.
De volta ao centro do círculo, Diaz suplicou mentalmente para que algum deus o ajudasse, e, pela primeira vez em toda a sua vida, recebeu uma resposta ao seu pedido. Não era como se ele soubesse qual deus havia atendido suas preces ou se era apenas o acaso do destino, mas, a mesma sensação de morte eminente retornou, agora vindo de todas as direções em que as velas estavam posicionadas, com exceção da número vinte.
Guiado por aquele fio de esperança, Diaz caminhou na direção da última pessoa do círculo. Quando estava prestes a passar ao lado da vigésima vela, o seu respectivo dono deu alguns passos para trás, se escondendo novamente na escuridão, e apenas a sua voz alcançou o prisioneiro.
— A morte talvez tivesse sido melhor pra você. – aquela voz que não pertencia a nenhum gênero pareceu debochar da escolha de Diaz.
— Por quê? – Diaz perguntou enquanto atravessava os limites dos círculo em segurança.
— Agora eu tenho total certeza de que você possui uma benção.
Um a um, todas as pessoas encapuzadas voltaram para a escuridão e, da mesma forma, suas velas também começaram a apagar, até que restou apenas a vigésima vela acesa.
— Vocês prometeram que eu seria livre! – dessa vez ele gritou, irritado.
— Se você fosse inocente, teria morrido ao atravessar pelo caminho errado. – aquela mesma voz sem gênero continuava falando.
— Vocês me enganaram!
— Isso era um teste para provar a sua inocência, mas, como já era esperado, você se mostrou culpado de todas as acusações!
— Merda! Me deixa ir embora daqui!
— Infelizmente, você vai ser tratado como o pior dos enklis até o dia de sua morte!
— Filha da pu... – Antes que pudesse completar a frase, a última vela se apagou, e Diaz sentiu a dor em sua nuca retornar com muita força, como se estivesse levando outro golpe no mesmo lugar.
— Se você tiver sorte, um dia nós nos veremos novamente, Diaz!
Essas foram as últimas palavras que Diaz conseguiu escutar antes de desmaiar novamente.
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