Ele sabe
☼
— Não está com fome, Bella?— meu pai pergunta. Balanço a cabeça, sorrindo.
— Não, papai, eu comi mais cedo com Jas.... Jacob— me corrijo. Nós dois olhamos para Jacob, o mesmo repetindo seu terceiro prato— Ele é um brutamonte— dou risada, balançando a cabeça.
— Sim.— ele se senta do meu lado, de frente a lareira— Acho que lobisomens comem bastante— ele arregala os olhos. Eu o encaro com um sorriso.
— Ah, me desculpa pela sua maçaneta, eu vou mandar Edward arrumá-la— falo gesticulando para a porta aberta.
— Está tudo bem, não preciso dele aqui.
— Não, claro que não— balanço a cabeça, me censurando. Meu pai é ainda mais rancoroso que eu.
Ele me encara cerrando os olhos, parece desconfiado, merda, minhas lentes? Elas ainda estão incomodando meus olhos, o que há? O que ele está vendo?
— Parece diferente da última vez que eu a vi, querida— ele coça a barba rala.
Merda, merda, merda, puta merda! A última vez que ele viu Bella? Quando foi a última vez que ele a viu? Eu não esperava passar por nada do tipo, nada de relembrar dias passados.
— Deve estar imaginando coisas, papai— sorrio— O que? Eu cortei o cabelo— coloco uma mecha atrás da orelha, tomando cuidado de expor apenas o lado não raspado da minha cabeça.
Pensei em fazer piadinha com: Eu estou mais bonita, não estou? Mas sei que isso não é algo que Isabella diria.
— É a oitava vez que me chama de papai— ele fala, há seriedade no seu rosto. Eu não entendo, não justifica eu estar tendo um dia bom? Bella já o chamou de papai várias vezes— E, ainda há pouco, foi a terceira vez que você insultou Jacob. Não quis brigar quando eu falei que não quero Edward aqui...
— Talvez porque eu não queira brigar com você— rebato, o interrompendo— Hoje é um dia bom, não podemos só curtir?
Ele sorri, mas este sorriso falha, ele está estudando meu rosto. Não sei se quero que ele ache qualquer coisa.
— Você nunca quebrou nada aqui em casa.
— Para tudo tem uma primeira vez— argumento com um sorriso.
— Não. Você é cuidadosa— ele arfa, a voz vai ficando mais para dentro.
— Pai...
— Você não mente bem, Bella— ele fala— Não sorri quando está desconfortável, não se mexe tanto no sofá como se tivesse que ajeitar a coluna, não implica com Jacob, não quebra as coisas sem querer, Renesmee não fica fora de sua vista, você não me interrompe, você sempre rebate quando eu falo de Edward— sua voz falha e ele leva a mão a boca, esfregando o rosto, sem nunca desviar o olhar de mim, eu baixo o olhar para as minhas mãos. Não sei o que falar— Você só me chama de papai quando me pede desculpas.
Ele se levanta bruscamente, saindo da sala. As nossas visitas humanas não devem ter ouvido, mas Jacob e Nessie olham para mim, preocupados.
Arregalo os olhos e vou atrás de meu pai na cozinha. Ele chora, de costas para mim.
— Pai— eu chamo.
— Não— ele geme— Não— ele se vira para me olhar— É você...
— Sim, pai, sou eu, Bella.
— Não!— ele sibila— É você, Rebecca?— ele me encara com o olhar vidrado. Eu tento, mas não consigo controlar minhas feições e acho que isso, fora tudo que ele notou, entregam tudo— Você não é a Bella— ele chora, os ombros tremem— Eu conheço minhas filhas!
Como que eu vou desmentir isso? Como vou continuar mentindo na cara dele? Mas eu também não sei como contar a verdade. Permaneço quieta. Ele dá dois passos na minha direção e levanta meu cabelo, expondo a lateral raspada.
— Bella nunca faria esse corte.— meu pai acusa e me abraça com força. Sinto que ele está sem forças para se manter de pé, então nos ajoelhamos no chão da cozinha. O ar sai de mim, como se tivesse acabado de emergir da água. Eu estou respirando de novo— Rebecca, Rebecca— ele passa a mão pelos meus cabelos, eu sinto que poderia chorar horrores nesse momento e nós nos encaramos com um misto de tristeza, confusão e alegria. Ele tateia meu rosto como se quisesse provar que é real, como se estivesse cego.
Vê-lo chorar parte meu coração mais um pouco e eu quero te contar tudo.
— Becca— ele treme.
— Eu estou aqui— Sussurro, como uma promessa. Ele me abraça de novo. Ele beija meu rosto, e chora mais um pouco.
— Por que tiraram você de mim? Por onde esteve? Por que....— ele balança a cabeça. Sua voz não passa de um gemido rouco e torturado.
— Você não podia saber, pai, não...
— Só o necessário?— ele pergunta com certa amargura— Vocês não tinham o direito de fazer isso comigo, com a sua mãe.
— Se soubesse da história toda, não pensaria assim— eu falo, fraca.
— Então me conte a história toda.
— Não posso, se não terei que partir de vez— falo. Principalmente porque se Charlie soubesse de toda a verdade, eu faria questão de matar os Volturi só por precaução antes que eles soubessem, sequer imaginassem, sobre o conhecimento dele.
— Você já não vai ficar?— ele pergunta, agoniado.
— Não, pai... esse lugar não é mais meu— admito, balançando a cabeça— Mas há coisas que eu posso te contar— me aproximo dele, ansiosa e sorrio— Eu estou conhecendo o mundo— lhe falei.
É tão bom poder falar isso com ele, sem ser dentro da minha cabeça. Acabo me embolando nas novidades.
— Eu me casei, fui a Paris, estava em Nova Orleans, eu... estava morrendo de saudade de você e da mamãe, mas eu não podia porque isso é perigoso para vocês, ainda mais naquele tempo...— deixo a voz morrer, balançando a cabeça.
— Você se casou?— ele perguntou, secando as lágrimas e fungando. Eu ri e balancei a cabeça.
Nunca senti tanto alívio em toda minha vida. Não sei como processar a alegria.
— Com o amor da minha vida— afirmo— Foi uma cerimônia linda, mas eu queria que você tivesse me levado ao altar...
— Quem te levou ao altar?— ele pergunta com a voz embargada.
— Carlisle... e, pai, eu preciso que você entenda os Cullen, eles não são os vilões, desde o começo, sempre foram as decisões necessárias que nós tomamos. Desde o começo eles me protegeram, protegeram nossa família como puderam. Eu tive que forjar minha morte, você precisava passar pelo luto! Eu sei, foi cruel, eu senti também!— Eu peguei suas mãos— Mas eu estou aqui agora!— arregalo os olhos, desesperada para também ter certeza que isso é real.
A sala está quieta. Eles sabem o que está acontecendo. Todo mundo sabia menos meu pai.
— Por quanto tempo?— ele chora, sem conseguir se conter.
— Para sempre— eu falo baixinho. Ele não faz ideia do quanto isso é verdade. Ele me puxa para o seu peito e me aperta.
Minha garganta queima para um caralho, mas isso não importa.
— Para sempre— ele repete, como se quisesse tornar minha fala sua verdade. Fecho os olhos aninhando-me em seu peito. Seus batimentos ecoam pelo cômodo como uma canção de ninar. Ele sabe. Agora meu pai sabe. Hoje é um dos dias mais felizes da minha vida.
Eu decido, numa batida de coração, que nada vai me tirar isso, ninguém vai me tirar isso. Eu vou ter toda minha família e ninguém vai ameaçar tirá-la de mim, ninguém vai nos separar de novo. Porque eu vou matar qualquer um que se meta no meu caminho. Abro os olhos e encaro o vazio. A guerra se tornou mais do que pessoal.
Eu vou matar os Volturi.
☼
Eu tenho que ir embora quando meu pai adormece chorando e querendo ouvir minha voz. Já está escuro lá fora, a neve se intensificou, Renesmee está dormindo nos braços de Sue Clearwater e Jacob encarava a lareira com seu pai, sem falar nada.
Charlie ocupa todo o sofá e eu passo a mão na sua cabeça, sorrindo, admirando-o dormir.
Ele havia me pedido para ficar e eu ficarei apenas para protegê-lo mas como já disse, essa não é mais minha casa e eu tenho que ir embora um momento, com Jasper.
Respiro fundo e me levanto, pedi para que meu pai não fosse atrás de mim na casa dos Cullen, porque lá é o último lugar que eu preciso que ele esteja.
Eu prometo voltar, eu fico cantarolando até ele dormir segurando meu pulso, tentando me impedir de ir embora.
— Vamos, Jake— eu sussurro e me levanto. Jake faz o mesmo, mas acho que mais porque ele quer tomar Nessie para si.
Pego meu telefone e ligo para minha gêmea, mas por uma incrível coincidência, enquanto eu a espero atender, seu carro estaciona na frente da casa.
Eu tenho que falar com ela, falar que Charlie sabe, que não precisaremos mais fingir para ele, que ele não vai perguntar nada se puder me ter por perto, mas quando nós entramos no carro não é com ela que eu tenho vontade de dividir isso.
Por eu não falar nada, Jacob também não fala nada. A viagem é silenciosa. Eu não pergunto onde ela foi, Jacob tampouco.
Está escuro quando chegamos em casa. Há um bando de vampiros do lado de fora, imóveis e imunes ao frio que deve estar fazendo.
A neve cai sobre nós como uma chuva suave. Jacob e Bella não se demoram expostos a neve por conta de Nessie, e eu fico do lado de fora encarando o céu, vendo os flocos fazendo uma dança suave e lenta até tocar minha pele e se desmanchar sem jamais perder a beleza.
Jazz me encontra na frente da garagem, escondida do olhar dos outros e brincando sozinha como uma criança.
É para ele que eu quero contar tudo. Ele sorri quando me vê e eu corro para abraçá-lo.
— Boa noite, mon amour— ele beija meu pescoço, eu sorrio e me lembro do ótimo momento que a verdade saiu do meu peito me deixando mais leve do que nunca.
Jasper franziu a testa, sorrindo curioso com a minha alegria.
Pego sua mão e o puxo para longe dali. Não quero ser importunada por Stefan ou Vladimir tão cedo, toda vez que me encontraram falam alguma merda como se a responsabilidade fosse ser em maior parte minha.
Ainda me pergunto se não fui grossa o suficiente, mas não vejo como mudar isso.
Corremos por mais tempo que o necessário e eu me pego fazendo caminho para a cabana. Paramos diante dela e eu me jogo no chão, Jasper se deita do meu lado.
— E então?— ele pergunta.
— Ele conhece as filhas dele, Jasper— olho na direção de meu marido que franze a testa, sem entender. Sorrio— Meu pai sabe que sou eu.
Jasper arregalou os olhos, surpreso.
— Charlie soube? Como?
— Ele me estudou o tempo todo, me diferenciou de Bella, descobriu tudo. Só me restou concordar— sussurro— Ele me chamou pelo meu nome, Jazz. Meu pai sabe que eu estou viva.
Respiro fundo e solto todo o ar novamente. Jasper sorri, enlaça minha cintura e me puxando para si, as terceiras lentes de contato enfim se dissolvem.
— Como ele reagiu?
— Choro. Descrença. Mais choro. Eu contei a ele o que podia sobre você, nosso casamento, as viagens que estamos fazendo e como senti falta dele e da mamãe— faço bico me acomodando no peito de Jasper. Ele me abraça com força.
— Não preciso perguntar como você se sente, mas... como você se sente?
Sua fala me faz rir.
— Aliviada, em paz, mas também... angustiada?
— Por que da angustia?— ele pergunta, passando a mão no meu cabelo. A neve vai se amontoando sobre nossos corpos, mas eu não sinto frio nem incômodo.
— Porque em breve vamos brigar com os Volturi, e eu terei que matar todos eles para proteger minha família— dou de ombros.
— Não vai chegar a esse ponto, meu amor— ele dá uma leve puxada em meu cabelo— Eu os matarei antes que cheguem até você— ele argumenta. Apoio o queixo em seu peito para o encarar, mostrar que revirava os olhos.
— Eu posso fazer isso sem levantar um dedo, cachinhos— zombo, ele ri.
— Você ainda fala que os outros são exibidos!— me acusa. Eu bufo e Jasper segura meu rosto com uma mão— Eu estou muito orgulhoso de você, mulher— ele me puxa para perto, tenho que ficar de quatro para o alcançar do jeito que ele pede— E muito feliz por você, devo acrescentar— ele sorri, falando baixo embora se tivesse alguém nos ouvindo, nós os ouviriamos também.
— Eu também— falo, subindo em seu colo.
Jasper me beija e nós rolamos na neve, cada vez mais disputando por quem vai ficar por cima. Eu dou risada quando ele teima em me fazer desistir.
— Trapaceiro!— acuso.
— Você que é fraca— ele argumenta, convencido demais para o meu gosto.
Eu o encaro, adorando seu rosto, a beleza que só ele tem.
— Eu te amo— falo, mais uma vez, porque talvez nunca vai ser o bastante.
Jasper rosna suavemente para mim, reviro os olhos, rindo.
— Isso continua sendo ridículo!— falo, abraçando seu pescoço.
— Eu gosto e não vou parar— ele levanta as sobrancelhas, desafiador.
— Permita-me uma correção, você é ridículo.
— Fala que me ama, Rebecca— ele pede, sério. Eu sorrio, resistindo— Becca— ele me chama— Becca, Becca, Becca!
Eu rio como uma otária.
— Mas eu acabei de dizer!
— Eu quero ouvir de novo— ele me encara com intensidade.
— Eu te amo, Jasper— falo.
— De novo— ele pede me dando um beijo.
— Eu te amo— ele me beija mais uma vez.
— De novo— ele sussurra, mas toma meus lábios antes que eu repita.
Seguro seu rosto e o impeço de me roubar mais um beijo.
— Sua vez— falo, o riso sendo segurado é audível em meu tom.
— Eu te amo, Rebecca.
— De novo— sussurro, ele abaixa a cabeça e beija meu pescoço.
— Em quantas línguas você quer que eu te diga?— ele murmura, suas mãos passeiam pelo meu corpo e embaçam meus pensamentos.
Sorrio encarando o céu escuro, porque mesmo com os problemas vindo bater direto na nossa porta, eu estou tendo ótimas horas.
É sempre assim.
— Me diga na nossa favorita— peço, Jasper ergue o rosto para me encarar e seu sorriso se torna malicioso.
Nos perdemos no olhar um do outro por um momento. Eu cedi e rosnei para ele de leve. Jasper riu, me pegou no colo e arrombou a cabana comigo nos braços.
— Só por umas horinhas?— pergunto perversa. Ele ri, me pousando no sofá e deitando sobre mim, enchendo-me de beijos.
— Eles nem vão sentir nossa falta— ele fala, puxando minha calça abruptamente para baixo.
Carinhoso, não? Esse eu vou apresentar pro meu pai.
A neve se intensifica do lado de fora enquanto o amor de Jasper aquece meu âmago.
☼
NOTA DA AUTORA:
Reta final, vadias, o que estão achando?
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