Capítulo 22 - Parte I

Há 4 anos

Por que o chão do meu quarto parece tão bagunçado? tão bagunçado, quanto... quanto eu.

Vejo pincéis de maquiagem que nem uso, jogados. Creme de cabelo, roupas, pentes, etc.

Achava que era puro drama quando nas novelas as pessoas se rebelavam e por pura raiva, frustação ou magoa, jogava tudo no chão.

Achava que era drama quando as pessoas sentavam no chão e ficavam ali encarando o nada.

Achava que era drama quando jogavam algo de vidro na parede para quebrar em milhares de pedaços. Não que eu tenha ousado fazer isso, mas morria de vontade de fazer.

Queria pegar meu abajur, um vaso estranho que minha mãe deixa no canto do quarto, ou até mesmo meu celular, e jogar com tudo na parede para ver os pedaços voando e por fim encontrando a bagunçada do meu chão.

Essa bagunça parece eu e meu coração. Principalmente o meu coração.

- Emma - minha mãe chama. Minha mãe, pensar isso me faz sentir um gosto amargo.

E eu começo a chorar, o desespero sai pela minha garganta em forma de gemido abafado. Por que isso está acontecendo comigo?

Abraço minhas pernas. Eu quero que isso acabe. Por favor, eu quero que isso acabe. Só faz um mês, apenas um mês.

Como posso aguentar pelo resto da minha vida?

Eu sinto raiva. Magoa. Tristeza. Dor. Muita, muita dor.

O que me desespera mais são os sentimentos raivosos, eu odeio sentir raiva. Não combina comigo, não sou eu. Meu deus, preciso de ajuda.

- Dave está aqui - Minha mãe entra pela porta do meu quarto e cruza os braços quando me vê chorando no chão - Pare com isso. Enxugue essas lágrimas e vai logo contar pra ele. Já faz um mês, daqui a pouco não tem como esconder.

Neguei com a cabeça. Fazia duas semanas que estava praticamente ignorando Dave, pelo celular, por mensagens, e no Colégio, inventando qualquer desculpa para não sair com ele ou nossos amigos.

Eu preciso ficar sozinha. Eu preciso assimilar tudo isso.

Eu preciso sentir que essa dor, essa agonia, está passando de alguma forma.

Mas não está.

- Fale que não estou.

- Chega, Emma! - Exclama irritada - Você já chorou demais, sei que é difícil mas está na hora de você aceitar e lidar com tudo isso de agora diante. Foi decisão sua, agora você que arque com ela!

- Decisão minha? - pergunto perplexa

- Quem inventou de transar aqui foi você! Agora já foi, não tem pra que chorar pelo leite derramado. Aceite de uma vez!

- Mas eu não quero! Não quero aceitar, não quero ter!

- Você não tem que querer nada! Aceite as coisas como elas são, porque pra começo de conversa você não estaria passando por isso se tivesse mais juízo!

Fiquei em silêncio, chorando. Eu me sinto tão... tão... destruída que por um segundo achei ridículo comparar o chão bagunçado do meu quarto com a bagunça que tem dentro de mim. Ridículo porque não tem comparação.

Não consigo mais nem ao menos comparar algo com seja la o quê  estou sentindo.

- Do que vocês tanta estão falando? - Perguntou Bruno com uma expressão de furioso. Aposto que estava no celular com alguma garota ou com seus amigos. Quando Bruno viu o estado do meu quarto, e o meu estado catastrófico, sua expressão amenizou um pouco, atraindo sua completa atenção a mim.

- Nada, Bruno.

- Por que você está chorando? - Bruno perguntou ignorando nossa mãe e observando mais uma vez a zona em meu quarto

Limpei as lágrimas, pensando em realmente falar.

Querendo ou não, minha mãe está certa. Não tem como adiar a verdade, porque uma hora essa verdade vai aparecer.

Mas por que é tão ruim? tão ruim pensar em falar, pensar em aceitar, pensar em viver isso de agora em diante.

Eu não tenho nada contra quem quer ter filhos, mas eu... eu nunca quis.

- Eu estou... estou... - eu não conseguia. Não conseguia falar essa palavra. Meu corpo rejeita de todas as formas possíveis.

- O que, Emma?

apertei os lábios, incapaz por um momento.

- Sua irmã está grávida, Bruno - minha mãe disse, seria, então olhou pra mim - Grávida aos dezessete anos.

Bruno arregalou os olhos, ficando petrificados em mim por um segundo.

- Por isso que o seu namorado está lá embaixo te esperando? mas que filho da... - se impediu de terminar - Como você deixou isso acontecer, Emma? caramba!

As lágrimas voltaram a descer, mais rápido, mais grossas, mais quentes.

Se eu soubesse que isso iria acontecer, eu nunca teria deixado, como nas palavras dele.

Bruno começou a andar de um lado para o outro com passando as mãos em seus fios nervosamente. Minha mãe estava calma olhando de mim pra ele.

Tão calma que nem parece a mulher que há poucas semanas quando descobriu por conta própria, me bateu pela primeira vez na vida.

Tão calma que nem parece a mulher que concordou que eu não deveria ter esse filho.

Tão calma que nem parece a mulher que foi correndo pedir ajuda para o padre e ele disse para não me deixar abortar.

O que ela não sabe é que não era ela que precisava de ajuda sobre o que fazer. Quem precisava e precisa, sou eu.

- Ele já sabe? - Bruno perguntou

Eu neguei com a cabeça. Não conseguia nem olhar na cara de Dave.

Me sinto tão mal. Eu não quero ter um filho. Não quero, não quero. Eu nunca me vi como mãe, de nenhuma forma.

Desde quando era pequena e todas as meninas tinham bonecas que chamavam de filhas. Eu sempre as chamei de amigas, mas nunca de filhas.

Nunca consegui me imaginar como mãe, nem por brincadeira de criança. A ideia de algo ou alguém dependendo a todo momento de mim me aterroriza.

Quando os professores no colégio nos perguntam como nos imaginamos daqui dez anos, a maioria das respostas da turma é;

Casado, com uma carreira de sucesso e dois filhos.

Eu sempre falei as duas primeiras partes, mas nunca quis a última. Acho que é algo que vem comigo desde o berço, não queria crescer para ter filhos.

Queria crescer para viver minha vida, ganhar o mundo e ser feliz do meu modo.

O que mais me envergonha de sequer querer olhar pra Dave novamente é pensar que meus planos era abortar e nunca deixar ele saber dessa gravidez. Esse era o meu plano.

Nem ele e nem ninguém preguisava saber.

Mas minha mãe tomou a decisão dela. Pois segundo ela, ela pensa que futuramente talvez eu me arrependa.

Como posso me arrepender de fazer o necessário para não ter algo que nunca quis, desejei ou imaginei?

- Escuta, Emma - Bruno se agachou do meu lado no chão - Vai ficar tudo bem. Vai dar tudo certo.

E pela primeira vez, eu vi algo que nunca imaginei ver em Bruno. Ele tinha lá seu espírito irmão protetor as vezes, mas agora eu vejo mais que proteção.

Eu vejo o que ele quer que eu veja. Amor.

Então ele me abraçou, e quando olhei para trás dele, eu vi Dave na porta com as mãos no bolso. Pela sua expressão eu soube que ele ouviu tudo, pela sua expressão eu soube que ele estava um tanto chocado, pela sua expressão eu soube que ele ficou incerto sobre o que fazer a seguir.

Pela sua expressão eu soube que ele estaria sempre aqui comigo.

____________

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top