27 de maio de 2017

O sábado passou a mil.
Meu braço já está bem melhor, por isso estou indo ao hospital para uma reavaliação.
Não dormi muito na noite passada. E acho que Caiã também não. Nós ainda não tivemos uma conversa entre irmãos sobre Rebecca e algo me diz que ambos estamos adiando isso.
Ele não é um imbecil, tenho certeza que minha cena ontem devorando um bolo - quase inteiro - às 19:30h deu-lhe espaço para interpretações.
Não compreendo o que está acontecendo comigo, mas não gosto da ideia de estar afim da mesma mulher que o meu mano.
Isso nunca aconteceu em vinte e dois anos. É um ultraje acontecer agora.
Ao chegar dentro do consultório a doutora rapidamente me examinou e concluiu que posso ser 'desenfaixado' - o que é um grande alívio, porque já não aguento mais depender do Caiã. Ainda mais na atual situação.
Saio do consultório como se fosse outro homem - um que não tem um braço enfaixado, no caso.
Confesso que estou chateado por não capturar os olhares preocupados das minas gatas, porém posso ir a qualquer lugar sem precisar de ajuda até para colocar a comida no prato.
A primeira coisa que faço é ir à oficina procurar por minha Susy. Ao chegar percebo que ela está parada em um canto - provavelmente já consertada.
- E aí cara?! Vim ver como está minha moto. - Digo ao jovem cheio de graxa pela roupa.
- Terminei o conserto ontem à tarde. Ia te contatar, mas já era tarde, por isso deixei pra hoje. Seu irmão já passou aqui e acertou o pagamento. - Ele respondeu enquanto limpava as mãos sujas em uma toalha amarela.
- Valeu cara. Vou levá-la então.
A sensação de estar novamente em minha Susy é fantástica. Ela é a melhor coisa que tenho na vida.
Acelero um pouco - quando a sinalização permite, pois não quero ser enquadrado novamente - e sinto a adrenalina percorrendo todo o meu corpo.
E isso é muito bom.
Por algum motivo que eu desconheço, acabo em frente à escola.
PUTA QUE PARIU! POR QUE ESTOU AQUI?
A escola já está praticamente vazia, uma vez que as atividades educacionais voltarão na segunda. Os sem-teto tiveram que se transferir para uma quadra em outra rua.
Entrei e Celly logo veio me receber.
- Tio! - Ela meio que abraça minhas pernas - Veio trabalhar? Mas hoje é sábado.
- E aí mocinha! - Eu a pego no colo e a abraço e em seguida a coloco no chão novamente - Não, não vim trabalhar. Só vim te visitar.
Seus olhos se encheram de um brilho indescritível.
- Tio, seu braço melhorou? - Ela disse apontando para meu braço.
- Sim! O tio agora está forte feito um Touro. - Faço a pose do Popay e ela ri - Você está sozinha? - Olho ao redor e não vejo ninguém.
- Não, tia Rebecca também está aqui. - Meu corpo tem uma leve alteração quando ela menciona o nome da demônia - Vou lá falar com ela que o senhor tá aqui.
Antes que eu a impedisse, Celly saiu correndo.
Bem, já que o leite foi derramado, resolvi sentar em uma espécie de banco - porém é de cimento - e esperar. Não demorou muito para que Rebecca aparecesse, com uma expressão curiosa.
- Uai, pensei que passasse o sábado todo dormindo. - Disparou antes de me cumprimentar.
- Boa tarde para a senhorita também. E sim, estou muito bem, obrigada por perguntar.
- Você está com olheiras às - ela olha no relógio de pulso dela - 16h. Acho que não está tão bem assim. - Touché!
- Apenas não dormi muito bem. - Tentei disfarçar.
- Mas o que te trouxe aqui?
Você! - coração idiota.
- Só quis saber se a transferência correu bem.
Ela cruza os braços e me olha desconfiada.
- Está correndo tudo como planejado. Só estou preocupada com a questão logística mesmo.
- Por quê? O espaço é pequeno?
- Apenas dois vestiários e um bebedouro.
- Entendo. - Deve ser nojento dividir o banheiro com outras pessoas, mas não irei comentar para não levar porrada.
- O braço sarou? - Ela aponta para meu braço.
- Oh, sim. Fui visitar o hospital hoje.
- Então você pode me ajudar a carregar algumas coisas para meu carro.
Não foi uma pergunta, então não posso negar...
Fomos para a sala dela e começamos a separar as caixas que cada um iria levar. Após empilhar três caixas, Rebecca levantou-as e as carregou.
CARALHO!
Fiquei sozinho na sala.
Ao olhar para a mesa onde estava um computador eu vi uma ficha com um crachá. Me aproximei. É de Rebecca. Abaixo estavam algumas informações pessoais. E lá estava... Seu número de celular.
Não entendo muito de moral e ética, então não sou obrigado a cumpri-las.
Pego meu IPhone no bolso - Tive que comprar outro e jogar o antigo no lixo - e salvo o número dela: Demônia Gostosa.
Algo me diz que não é uma boa ideia ter o número dela, mas foda-se.
Antes que Rebecca voltasse eu desci com as caixas. Ao chegar ao estacionamento eu vi dois carros: Um fusca branco e uma Hilux preta.
Ora, analisando o jeito de Rebecca o dela provavelmente é o fusca.
Me aproximo para ver se ela ainda está e...
- O que você está tentando fazer com o carro dos outros? - Rebecca fala por trás de mim.
- Nãooo! - Digo perplexo.
- Não o quê Caio?
- Não é possível que o seu carro não seja o fusca!
- Ai, ai hein! Eu gosto bastante de fusca, porém prefiro minha Hilux 4x4.
- Não é você que vive falando de humanização?
- O que tem haver eu ter um carro que não seja um fusca com humanização? - Ela me encara - Eu tenho minhas ideologias, mas ainda sou capitalista, seu babaca. - O riso ao final da fala deixou claro que ela não está brava.
- Só pensei que não faria seu tipo.
- Há muita coisa que não sabe sobre mim. Vamos, anda logo. Põe essas caixas aqui dentro. - Ela apontou para a Hilux - Ou vai querer levar esse peso todo até a Boa Esperança?
Coloquei as caixas e me virei para Rebecca. Só não esperava que ela estivesse tão perto, fazendo com que ficássemos cara a cara.
Consegui sentir sua respiração - antes dela se virar e quebrar o contato visual - e isso faz meu coração tremer.
PORRA!
Por que isso está acontecendo?
- Então... Acho que já vou indo. - Falo apressadamente.
- Ah sim, claro. Vá com cuidado. Até segunda.
Ou eu estou vendo coisas, ou ela realmente ficou nervosa com o nosso contato visual.
🙈🙊🙉
Confesso que ultrapassei o limite de velocidade e tudo porque não consegui tirar os grandes olhos verdes de Rebecca da cabeça.
Chego em casa e percebo que o sol já está se pondo.
CARALHO, até o vermelho do pôr-do-sol está me fazendo lembrar Rebecca.
Estou enlouquecendo. Só pode!
Olho para meu celular e sinto a necessidade - tanto física quanto emocional - de abrir os contatos.
"Alô."
A voz feminina e calma ativou todos os nervos e sentidos do meu corpo. Então percebo que minha ansiedade clicou antes de mim.
Desligar seria muito imaturo.
Foda-se, eu sou imaturo.
Me arrependo no minuto seguinte que pressionei o botão vermelho.
Foda-se novamente. Quero ouvir a voz dela. Aliás, eu necessito disso.
Vou até o contato - de novo - e decido falar algo dessa vez.
"Alô"
A voz já não é tão calma, o que me faz sorrir imaginando sua expressão irritada.
- Sou eu...
"Caio?!" - O tom era totalmente de surpresa - "Aconteceu alguma coisa?" - O tom mudou para preocupado, o que fez (por algum motivo) eu me sentir bem.
- Eu liguei por engano na primeira vez. Desliguei por não saber o que falar.
"Então por que ligou de novo?"
É incrível como consigo fazê-la mudar de humor tão rápido.
- Me senti mal por desligar antes de me esclarecer.
Posso imaginar ela revirando os olhos do outro lado da linha.
"Cara, você tem problemas..." - sua voz falha um pouco - "Nada melhor para fazer não?"
- Não me diga que estava dormindo?
"Talvez eu tenha cochilado." - Ela faz uma pequena pausa antes de disparar - "Caio, seja honesto, o que você quer?"
"Você" - Gritou meu subconsciente...
- Sério Rebecca, eu liguei por engano.
"Ok, se não é nada então vou desligar..."
- Não! Espere! Eu tenho algo a dizer. - Percebo que ela não responde, mas pelo menos não desliga - Eu queria ouvir sua voz.
Puta merda, a frase saiu sem eu nem perceber.
Meu coração bate tão alto que o ouço. Sinto um arrepio percorrer meu corpo e um calor em meu rosto.
PORRA só posso estar doente.
Eu nunca tive problemas em falar com mulheres, mas Rebecca consegue me fazer ser como um adolescente sem experiências tentando flertar.
Apesar de eu parecer uma marica, é até divertido.
"Caio, você não é normal!"
Por fim ela dá uma risada. Uma verdadeira risada e desliga.
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