Epílogo
"I belive there is another world waiting for us... A better world. And I'll be waiting for you there"
- Robert Frobisher, Cloud Atlas
O carro prateado parou na borda da calçada lentamente, os pneus deslizando sobre o asfalto de maneira graciosa. Assim que o motor se silenciou, a porta do motorista se abriu, revelando uma jovem e belíssima mulher.
Ela tinha o longo e loiro cabelo preso em um coque frouxo e vestia um terninho de cor rosa bebê, este acompanhado de uma sapatilha quase de mesmo tom. Pôs-se de pé na calçada, arrumou o seu uniforme de trabalho e então seguiu para a porta de traseira do carro, abrindo-a. Estendeu as mãos para o interior do veículo e entrelaçou seus dedos com os do velho homem sentado no banco de trás, ajudando-o a sair do carro.
O homem segurou-se nela até se firmar em pé e então a mulher deu-lhe a bengala. O objeto era ordenado com detalhes pintados de ouro, cuidadosamente entalhados na madeira, uma verdadeira obra de arte feita por encomenda.
- O senhor tem certeza que não quer que eu vá junto? - A loira perguntou, retirando um gigantesco buquê de flores silvestres do interior do carro.
- Não é necessário, minha querida. - O senhor respondeu, estendendo o braço livre para que a mulher pudesse pousar as flores sobre ele. - É algo que sempre faço sozinho. Você me espera no carro, está bem, Minerva?
- Se precisar, basta me chamar, senhor. - Minerva insistiu, temendo deixar o velho homem perambular sozinho.
O dia estava encoberto e, vez ou outra, chuviscos pingavam do céu, molhando ligeiramente o chão. Aquele era a primeira semana da loira trabalhando para aquele homem idoso e gentil e ela, com toda a certeza, não queria ser a culpada caso algo acontecesse a ele. Porém, o homem lhe deu um sorriso confiante, ajeitou o chapéu que cobria seu cabelo curto e branco e começou a se afastar.
O idoso parou de andar pela calçada quando finalmente chegou diante do grande portão de ferro, o qual dividia a rua da vastidão grama que seguia em diante. O sol foi mais uma vez escondido por uma nuvem escura, o que combinava bem com o local na qual o homem estava. Ele passou sob o magnífico arco que circundava o portão e afundou suas botas de couro na grama molhada e lamacenta.
Harry Styles soltou o ar de seus pulmões devagar e passou a caminhar com cuidado para não escorregar na grama úmida, um dos lados de seu corpo apoiado na bengala, o outro lado equilibrando o grande e pesado buquê. Ele, com seus 97 anos de vida, sentia o peso do tempo sobre seus ombros, entretanto, ainda não seria vencido por ele. Ainda não.
Continuou andando pela grama, vez ou outra sendo acariciado no rosto por alguns raios fujões do sol, que conseguiam passar entre as nuvens. Ao longo do tão conhecido caminho, Harry parou três vezes para descansar, observando o vasto campo aberto diante de si, pontilhado por centenas de grandes placas de pedra, cada qual carregando um ou mais nomes. A visão, que deveria ser triste, já havia se tornado quase natural para o homem que visitara aquele lugar semanalmente pelos últimos dois anos.
Longos minutos de passos lentos se passaram antes que Harry finalmente chegasse diante da lápide que tanto conhecia. Ela era simples, não passando de uma placa de mármore branco de meio metro de altura com detalhes de lindos cristais azuis perto da borda, formando um quadro para as palavras entalhadas no centro da pedra.
Louis William Tomlinson-Styles
Amado amigo, marido e pai.
• 24 de dezembro de 1991
• 14 de julho de 2088
- Oi, Lou. - Harry sussurrou, sorrindo para a lápide. Com dificuldade, abaixou o corpo até estar com um dos joelhos sobre a grama e pousou o lindo e colorido buquê de flores encostado na pedra, ao lado de um outro, murcho por ter ficado uma semana ali. - Hoje trouxe um pouco de tudo e você nem vai acreditar onde colhi essas flores dessa vez!
O homem de cabelo branco deixou-se escorregar até estar sentado na grama, lado a lado com a lápide e os dois buquês de flores - um lindo e vivo, o outro já desfalecendo e com pétalas ressecadas. Prendeu a bengala entre as pernas e recomeçou a falar:
- Ontem fui visitar nossa casinha na árvore com Violet e ela me ajudou a colher as flores. Claro, estamos quase no outono e elas estão começando a ficar escassas, mas o que um esforço de pai e filha não consegue. - Ele riu sozinho, erguendo o rosto para o céu e vendo as nuvens se afastarem para o sol retornar novamente. - Ela me prometeu que estava cuidado para que a casa ficasse bem conservada e que todas as nossas antigas tralhas continuam exatamente no mesmo lugar. Obviamente, não pude subrir para ver com meus próprios olhos, mas confio que nossa filha está cuidado de tudo muito bem.
Harry, então, fechou os olhos e deixou o vento frio deslizar sobre sua pele, que logo foi ligeiramente aquecida pelo sol que retornava. O silêncio ali era cortado somente pelo som do vento tocando as folhas de uma árvore não muito distante e pelo pio dos poucos pássaros que ainda se aventuravam a ficarem na cidade em época tão próxima ao inverno.
Harry e Louis tiveram uma vida longa e feliz juntos desde o começo. O início oficial do namoro deles não foi surpresa para ninguém da família dos dois e, doze anos depois, quando resolveram que era a hora de se casarem, foram perseguidos pela mesma pergunta onde quer que anunciassem: "por que demoraram tanto?" Sim, apesar dos muitos olhares tortos que ainda recebiam das pessoas, a união deles fora o motivo de festa de muitas outras.
Claro, nada era apenas flores. Como qualquer outro casal, eles brigavam com certa frequência - a mania de largar as roupas pela casa e nunca lavar a louça de Louis realmente tirava Harry do sério - porém, sempre conseguiam resolver tudo ao final. O Styles estudou Artes e se tornou um pintor conhecido mundialmente poucos anos depois, ao mesmo tempo que a carreira no futebol de Louis estava em seu clímax. O Tomlinson, ainda mais, havia formado uma banda como hobbie oficial e lançado dois álbuns - Harry até mesmo cantava junto com o marido em algumas das canções.
Entretanto, o crescimento da vida profissional dos dois levou ao colapso do casamento. As brigas se tornaram tão frequentes e intensas que, em uma manhã fria de domingo, Harry havia pedido pelo divórcio. Naquele mesmo dia, Louis saiu de casa com nada mais que uma pequena mala, palavrões engasgados na garganta e a certeza que o belo conto de fadas dos dois havia chegado ao fim de uma vez por todas. A reunião para assinar o divórcio fora marcada para um mês depois e, durante todo esse tempo, os dois não se falaram nenhuma vez. O silêncio entre Harry e Louis logo se tornou corrosivo e triste demais.
Harry passou a sentir falta das roupas de Louis jogadas pela casa, de suas panquecas queimadas e até mesmo da louça que se acumulava na pia da cozinha. Sozinho em um hotel, Louis havia passado a desprezar qualquer flor que via, morrido de saudade da infinidade de botas coloridas em seu guarda-roupas e dos diversos potes de cremes perfumados espalhados pelo quarto. E foi assim que, na noite anterior ao julgamento que determinaria o divórcio, Harry se pegou andando desesperadamente pelo apartamento, repuxando seus cachos e com lágrimas nos olhos. Ele não queria se separar de Louis e tomou conciência disso enquanto corria em direção ao quarto para se trocar e ir em busca do seu marido.
No entanto, Harry não teve nem tempo de chegar no quarto naquela noite. A campainha tocou antes disso e ele sentiu que iria desmaiar ao abrir a porta e se deparar com um Louis ao choro do lado de fora. Nenhuma palavra fora necessária e logo ambos se jogaram nos braços um do outro. Naquela noite fria, os dois tinham feito amor por horas e, no dia seguinte, nenhum dos dois apareceu no Tribunal.
Dois anos depois, eles estavam adotando a pequena Violet que, com sua pele cor de chocolate e seus raros olhos violetas havia conquistado os corações de Harry e Louis. Fora difícil conseguir a adoção da menina, mas tudo valeu a pena quando os três entraram juntos em casa pela primeira vez. Com seus seis anos de idade, Violet trouxe ainda mais vida e cor para a vida do casal, completando a família. Meses depois, no aniversário de Harry, Louis surgiu com a pequena gatinha Dusty em casa e tudo se tornou perfeito.
O velho homem reabriu os olhos, deparando-se com o céu. Sua linha de memórias foi quebrada e ele se viu sorrindo para o vazio, os olhos guardando algumas lágrimas.
- Eu sinto sua falta, Lou. - Sussurrou essas palavras pela primeira vez em dois anos. Nunca permitira dizê-las em voz alta. - Sinto tanto, tanto a sua falta que dói. Violet também sente. Ela gostaria de ter vindo te visitar hoje, junto comigo, mas não tinha ninguém para cuidar dos meninos. Oh, Louis, eu queria tanto que você pudesse ver como os nossos netos estão grandes. Quase não reconheci os dois ontem!
Uma lágriama teimosa escapuliu, escorrendo pela pele enrugada de Harry. Seu rosto carregava marcas dos anos que havia vivido, entretanto, suas covinhas nunca desapareceram. Ele havia prometido para Louis que jamais deixaria de exibir suas covinhas para o mundo porque elas "são muito preciosas, Hazza", então Harry buscava todos os dias motivos para sorrir. E ele nunca deixara de cumprir sua promessa naqueles dois longos anos, por isso sorriu para o céu, agora sem nuvens.
Deslizou a mão pela corrente de ouro que tinha ao redor do pescoço até alcançar o pingente preso nela. Era uma pequenina garrafa de vidro e, dentro dela, haviam sementes de dente de leão, uma flor famosa por conseguir sobreviver até quase o inverno, permanecendo viva o máximo possível. Harry fechou uma mão ao redor da garrafinha e a outra pousou sobre a lápide de Louis.
O homem sabia que não tinha mais tanto tempo de vida pela frente e não tinha medo disso. Entretanto, tinha certeza de que encontraria Louis novamente - fosse em algum paraíso ou em uma vida futura - então, sempre carregava aquelas sementes de dente de leão consigo. Dessa forma, onde quer que Harry encontrasse com Louis, sempre teria como plantar flores e dá-las a ele.
Como Louis gostava de reforçar em todos os anos que viveram juntos, eles eram infinitos.
E sempre haverão flores no infinito.
•Fim•
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Me perdoem qualquer erro, não revisei o capítulo ainda. Vejo vocês nos Agradecimentos.
Kyv❤
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