Armas à Postos, Uma Disputa se Inicia
EU NÃO CONSEGUIA nem ao menos pensar direito. Era absurda a ideia de não ser mais Comandante. Eu havia treinado para isso a minha vida toda, colecionando cicatrizes com o mesmo orgulho que um Oficial carregava medalhas no peito. E por um capricho de minha mãe, eu estava fora. Não era mais nada. Nada além de um rosto bonito criado para sustentar uma coroa sobre a cabeça.
Enquanto eu passava como uma flecha pelos corredores do Castelo, a cabeça tão cheia com tudo o que havia acontecido em questão de minutos em minha vida, quase não me dei conta de que uma fileira de guardas ia na direção oposta à minha, caminhando tão rápido que suas espadas sacudiam em um alto tilintar metálico junto ao uniforme.
Sem me preocupar em parar nenhum deles para perguntar o porquê de tamanho alvoroço, continuei o meu caminho para a Torre Leste, tentando pensar em qualquer coisa, menos no fato de que eu acabara de ser destituída de um cargo para o qual eu precisei ralar toda a minha vida para ocupar.
Mas ao ouvir o soar das trombetas de Arasdil, meu coração parou por um segundo.
Aquele som só podia significar uma coisa: meu pai havia retornado. E com ele, minha Legião.
Dei meia volta imediatamente, atravessando os corredores feito louca, correndo entre os guardas sem pedir desculpa pelos encontrões e o empurra empurra para passar na frente deles. Ao chegar na escadaria principal, desci os degraus de três em três, quase tropeçando duas vezes ao fazê-lo.
Meus pulmões ardiam quando alcancei as portas de saída do Castelo, o vento me recebendo com um tapa gelado contra meu rosto.
Vários soldados já estavam do lado de fora, tentando manter a postura solene para disfarçar a emoção de rever os seus companheiros de novo, de volta de um conflito que era de longe um dos mais importantes que eu me lembrava de ter presenciado em Arasdil.
Tentei localizar Kevin entre a multidão reunida, mas minha preocupação em saber onde ele estava foi substituída por uma ansiedade latente ao ver os portões do Castelo serem abertos, homens com expressões sérias e orgulhosas atravessando o pátio de pedra central, carregando a bandeira verde de Arasdil com o escudo e a espada bordados em fios de prata, a cor se destacando contra o tom cinzento do céu.
Todos nós ficamos estáticos por segundos que pareceram intermináveis, até que, finalmente, dois homens foram avistados entre os outros, se destacando por estarem montados em majestosos e raros cavalos arasdilanos de raça pura, honra reservada apenas aos homens que eram levados em mais alta conta pelo rei.
Privilégio esse que era dado à mim, ao próprio rei e ao segundo no comando de minha Legião, que estava neste exato momento atravessando os portões de ferro ao lado de meu pai, o rosto que costumava ser pálido agora bronzeado pelo tempo que havia passado Hawye.
Logan era conhecido por diversos nomes: Guardião da Morte, Capitão da Destruição, Soldado de Sangue e - esse era de longe o meu favorito, - Imediato da Princesa.
Na verdade ele era meu noivo, mas isso não importava muito.
Assim que o meu olhar encontrou com o dele, balancei a cabeça em um cumprimento silencioso. Ele sorriu, puxando as rédeas do garanhão negro que montava, vindo na minha direção imediatamente.
Ergui o queixo para poder encará-lo diretamente no rosto, minha voz se sobressaindo ao trotar de seu cavalo quando eu disse:
- Me diga que você deu uma boa surra naquele príncipe de merda.
Seu sorriso se alargou mais um pouco enquanto ele desmontava do lindo cavalo arasdilano, os olhos azuis cor de gelo de Logan encontrando o violeta dos meus assim que seus pés tocaram o chão, apenas um metro e meio nos separando.
- Eu quebrei a mão dele quando o filho da mãe tentou socar a minha cara. - ele disse, vindo até mim.
Segurei a risada.
- Ele tentou socar você? Que estupidez! - falei, de modo afetado, fechando o espaço que havia entre nós dois logo depois com um abraço apertado.
Logan retribuiu o gesto na mesma intensidade, com uma força de esmagar os ossos, me erguendo do chão. Inspirei seu cheiro, sentindo o aroma amadeirado com um toque de hortelã, fechando os olhos ao tocar seus cabelos negros.
Era muito bom tê-lo de volta.
- Também senti saudade. - ele sussurrou, me segurando com mais força.
Me permiti a sensação de seus braços por apenas um segundo a mais do que o necessário, me afastando logo depois.
- Você não vive sem mim. - debochei.
Ele gargalhou, afastando uma mecha de cabelo que o vento insistia em trazer para o meu rosto.
- Não vivo mesmo. - concordou, seu tom rouco provocando arrepios em minha pele.
Logan era filho de um homem chamado Liam Priestly, o antigo chefe dos mensageiros de meu pai. Ele vivia fazendo viagens, trazendo notícias sobre as fronteiras de Arasdil e sobre os novos reinos que se formavam além de nossas terras. Apesar de ser uma relação iniciada em acordos estritamente profissionais, o seu pai e o meu sempre foram muito amigos, e foi por esse motivo que papai aceitou Logan em nosso Exército quando o pai dele morreu.
Eu não queria fazer amizade com ele. Não queria nem sequer falar com ele. Para mim, era apenas mais um novato com quem eu teria que conviver, com sorte sem ter ligação alguma fora dos campos de treinamento. Mas quando Logan Priestly queria ser notado, ele conseguia.
Era um rapaz muito forte e ágil com a espada. Além disso, ele sempre fora muito bonito, e esse atributo ajudou bastante a despertar meu interesse.
Então um dia, ele me beijou. Eu gostei, então fizemos de novo. Começamos a nos encontrar escondidos depois dos treinos e para mim estava bom se continuasse assim. Mas Logan não pensava dessa forma. Ele nunca foi de gostar de metades: para ele era sempre tudo ou nada, e essa característica era uma das coisas que eu mais admirava nele. Então quando Logan pediu a minha mão em casamento e recebeu a aprovação do meu pai, eu disse sim.
Ele era uma das poucas pessoas capazes de me fazer sorrir. Tê-lo ao meu lado era tudo.
- Podemos ir embora daqui, se quiser. - ele disse, me trazendo de volta à realidade. - Os novos recrutas devem ter chegado hoje, eu sei que você adora estar lá para dar as boas vindas.
Ao ouvi-lo dizer isso, toda a indignação e raiva pela minha expulsão do Exército voltou com força total.
Cerrei os punhos.
- Esther, está tudo bem? - Logan perguntou, encostando em meu ombro, seu toque de repente parecendo ser tão estranho que eu me desvencilhei no ato.
Não respondi de imediato, meu olhar sendo atraído para as portas de entrada do Castelo, pelas quais a Rainha e suas damas saíam para receber o rei, o Capitão Loeztern vindo logo atrás, com um Kevin parecendo desconfortável ao seu lado.
- Muita coisa mudou enquanto você estava fora, Logan. - eu disse, observando meu pai ir de encontro à minha mãe, beijando-a com carinho no rosto.
- O que você está querendo dizer? - ele indagou, franzindo a testa.
- Que minha mãe está finalmente pondo as garras para fora. - afirmei, encarando-a de maneira que fosse impossível que ela não percebesse. - A Rainha está planejando alguma coisa, e eu tenho certeza de que não vou gostar do que é.
- E desde quando a Comandante se rende à Rainha? - Logan perguntou, seguindo meu olhar até minha mãe.
- É interessante você dizer isso, meu noivo. - inclinei a cabeça em sua direção, um sorriso ardiloso surgindo inesperadamente em meus lábios. - Porquê eu não me lembro de ter me rendido alguma vez na vida.
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