• CAPÍTULO 06: Steve Moore
Na casa 22 da Rua Georgetown morava um das únicas famílias ruivas - talvez a única original de fato - de Axel.
Os Moore moravam numa casa branca, bem simples, a sexta antes do término da rua e logo no topo, na junção com a Barrigan.
Murray Moore era um professor de história aposentado. Um homem de pouco mais de 1,80, acima do peso e já careca. Carregava consigo um longo bigode alaranjado desde sua adolescência, sendo marca registrada em todas as escolas em que trabalhou, sendo chamado de "Cenoura" pelos amigos.
Karen Moore era mais uma das milhares de donas de casa de Iowa e formavam um núcleo familiar comum norte-americano.
Steve é o menor dos amigos e dificilmente tira a touca preta da cabeça, sempre protegendo seu cabelo cor de fogo. Por ser ruivo, havia muitas sardas no rosto e por isso sofria muito bullying nos primeiros anos de escola, além de um nariz um tanto quanto pontudo.
O comportamento recluso e fechado de Steve se deu devido ao tratamento dos pais. O casal perdeu o primeiro de seus filhos e por isso minaram Steve de muitas coisas, fazendo com que vivesse numa realidade completamente oposta a dos outros meninos.
Quando não estava na escola, Steve ou estava na biblioteca de Axel ou estava trancado no quarto escutando música, lendo quadrinhos ou livros. — Praticamente viajo no espaço quando leio. - pensou ele, ao vasculhar uma de suas mesas com revistas de super-heróis. Estava procurando uma edição do Pantera Negra.
Seu quarto era estreito, com carpete marrom, e muitos pôsteres colados na parede, como uma imagem do filme "O Enigma de Outro Mundo", de 1982, uma foto enorme do Michael Jackson atrás da porta e muitas outras figurinhas de personagens de quadrinhos espalhadas pelas paredes.
A família era bem humilde, mas não pobre. Murray, que já estava aposentado, ainda fazia alguns bicos e ajudava alguns alunos com aulas particulares e Karen era muito trabalhadora e esforçada, em que pese não ter um trabalho fixo há dois anos.
Ambos se dedicavam exaustivamente para darem uma vida boa e digna para Steve e isso aumentou desde que perderam o primeiro bebê, as batalhas se tornaram mais difíceis e uma resistência foi criada sobre a família.
— Mãe, você viu uma das minhas revistas? — Seu pai estava lendo uma delas no sofá nessa manhã.
— Eu não acho em lugar algum.
— Pai, você pegou uma do Pantera Negra?
— Não. Você sabe que eu não gosto, eu peguei uma que estava na sua cama, do cara que usa um martelo.
Steve subiu de novo para seu quarto, tirou todas as revistas da gaveta, revirou o guarda-roupa, mas não encontrou a revista que queria.
Karen e Murray aproveitaram que Steve havia subido mais uma vez e foram a matar uma aranha que havia aparecido em cima da tv. Era pequena, não aparentava perigo, mas o casal a tirou.
— Dizem que matar uma aranha atrai chuva, você sabe, né? - disse Karen. — Tudo bem, eu só vou jogá-la no mato.
A revista estava ao lado da casinha do cachorro. De cabeça para baixo, mas não rasgada ou suja. Steve levantou-a, olhou para ver se não faltava alguma página. Estava inteira.
Murray e Karen já não estavam na sala. Havia saído para o quintal para conversar com a senhora Hills, uma velha solitária que morava na casa da frente.
— A polícia deve descobrir em breve quem fez isso. - comentou a velha segurando uma sacola plástica.
— Sim, não devem demorar muito e prenderão o responsável.
Estavam conversando sobre o assassinato do fazendeiro Bill, que havia acontecido dias atrás.
— O Will é muito competente. Ele vai até o fim. - Murray havia estudado com o xerife Will, mas já não eram próximos.
— Ele deve estar em pedaços...
Steve chegou perto, mas sequer cumprimentou a vizinha.
— Que educação, Steve. Diga oi para a senhora. — Boa tarde. – Steve queria algumas moedas para completar e comprar algo que seu pai ainda nem sabia.
Murray bateu com as mãos na calça verde, mas havia se esquecido que ainda estava de pijama. Não havia bolso.
— Vai lá na sala, tem algumas moedas no bolso da direita daquela calça jogada. Pode pegar.
Steve foi e voltou em segundos. Já no canto da casa, quando montava na bicicleta, viu Calvin passar direto, ele até tentou cumprimentá-lo, mas o amigo sequer olhou. Estava apressado por algum motivo. Assim, Steve colocou as moedas no bolso e foi direto ao centro da cidade.
O centro de Axel estava quieto, o sol brilhava lá em cima e haviam poucas pessoas pelas principais ruas.
Steve parou numa das calçadas, mas estava tudo fechado. Nenhuma loja aberta para onde olhava.
— Que saco. - pensou, precisava encontrar uma banca de jornal.
Steve passou por várias tiras de lojas, estavam todas fechadas. Todos os portões devidamente abaixados e trancados.
Quando virou o guidão da bicicleta para ir embora, viu um senhor bem baixo com um pacote nas mãos atravessando a rua e indo para uma pequena banca. — Tem que estar ali. - pensou quando voltou a pedalar incessantemente.
— Ei, espera aí.
O senhor estava guardando os pacotes numa caixa. — Estamos fechados.
— Chegou a nova edição do Capitão América?
— Menino, somente amanhã.
— Só me diz se ela está aí.
— Olha, se saiu ontem ou hoje, ela está aqui dentro.
Seus olhos abriram na hora, brilharam. Ele insistiu tanto, que o dono da banca decidiu abrir o pacote.
Quando o moço tirou as fitas, havia centenas de revistas. Até mesmo adultas, mas fora tapadas pelo senhor.
Havia de tudo, Super-Homem, Hulk, as novas do Doutor Estranho e algumas outras do Homem-Aranha. No fundo da caixa, o sujeito puxou uma de capa amarela, com o Primeiro Vingador estampado.
— É essa, é essa!
— Só amanhã na parte da manhã, garoto. Não enche.
Steve praticamente implorou para o vendedor, que no final das contas acabou cedendo ao menino a revista que tanto queria.
A revista foi para direto dentro do casaquinho preto que Steve usava. Ele saiu caminhando segurando a bicicleta, não montando direto.
Poucos metros a frente, Steve deixou uma das moedas cair próxima a um bueiro, bem perto a um meio-fio. Era apenas semicírculo preto.
Steve ficou paralisado, sentiu algo pequeno subindo pela sua mão direita quando colocou a mão perto da entrada para pegar a moeda de volta.
E o que era foi subindo, subindo e saindo da escuridão do bueiro, ficando mais visível. Steve começou a suar sem parar, estático quando percebeu do que se tratava. Havia uma aranha. Digo, uma não, havia duas, até três quando Steve percebeu.
Algumas menores, outras maiores. A pulsação acelerada fez com que Steve ficasse trêmulo, inquieto logo mais.
Steve morria de medo de aranhas. Era seu pior medo, sua pedra no sapato.
— Por que aranhas? Por que...
Os animais não paravam de sair pelo bueiro e uma delas já estava subindo pelo seu braço. Seus lábios tremiam, seu corpo voltou novamente a ficar sem reação.
Havia muitas e ainda outras saíam pelo buraco indo para as ruas. Era como uma manifestação, milhares de aranhas caminhando em torno de Steve.
Steve evitava se mexer, sem movimentos bruscos. Não sabia o que poderia acontecer e enquanto isso, suas gotas de suor desciam pela sua testa, passavam pelas suas sardas calmamente. Ele não movia um músculo sequer.
A primeira reação de Steve só aconteceu quando alguém o pegou por trás, pela cintura, o levantando do chão e o tirando do meio da rua. — Você está maluco?!
Quando Steve se ligou, estava sentado na calçada. Alguém havia o tirado da rua. Era o dono da banca de novo.
— Vai morrer se ficar parado no meio da rua desse jeito.
Steve olhou seus braços, pernas, tirou a touca, conferiu absolutamente tudo e não havia aranha alguma. O dono da banca voltou falando pelos cotovelos.
A moeda ainda estava próxima a entrada do bueiro, mas Steve apenas olhou. Olhou novamente e subiu na bicicleta, pedalando devagar e ainda olhando de lado para aquele maldito bueiro.
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