Capítulo 1

Oh, Ophelia
Você está em minha mente, menina, desde o dilúvio
Oh, Ophelia
Que o paraíso ajude o tolo que se apaixona
Ophelia - The Lumineers

Violet Sun Stuart - Dias atuais

"Jean serra os seus olhos ao olhar Louise em seu vestido de veludo esmeralda." É o que está escrito no livro em minhas mãos, o que me obriga a automaticamente apertar os meus olhos para que eu possa acompanhar o personagem.

Escuto um coçar de garganta próximo a mim, mas ignoro o som desconfortável e irritante para que eu possa continuar a minha agradável leitura. Será que Jean finalmente irá deixar o orgulho de lado para elogiar a Louise?

"Era estranho vê-la tão arrumada, pensou ele. Mas Jean estava realmente impressionado com..." O som irritante da garganta coçando volta a se fazer presente, atrapalhando a melhor parte daquele capítulo.

- O que foi agora? - Murmuro, levemente irritada. Abaixo o livro em meu colo e suspiro ao erguer os meus olhos. Um homem, com a minha idade, está me olhando fixamente.

Abro os meus lábios por um momento, completamente deslumbrada com a sua aparência. Ele poderia facilmente ser o personagem principal de algum romance. Um romance no qual a autora o descreve de maneira irreal e ilógica, porque a sua beleza não pode ser traduzida por simples e tolas palavras, o que nos faz suspirar e pensar: Deus, por que não existem homens assim no mundo real?

Alguns fios do seu cabelo escuro e rebelde recaem sobre o seu rosto, próximo aos seus grandes e penetrantes olhos castanhos. Um sorriso de canto é desenhado em seus lábios rosados e injustamente desenhados, esculpidos. Próximo ao seu atraente maxilar, encontram-se três pequenas e delicadas pintinhas marrons, que decoram a sua bochecha.

- Vai me deixar sentar ali ou você também pagou a passagem do banco vazio ao seu lado?

E todo o meu precipitado encanto sobre o garoto simplesmente evapora quando escuto as suas palavras próximas ao meu ouvido. Retiro absolutamente todas as frases que, infelizmente, foram usadas para o descrever.

Observo o ônibus por um momento, analisando todos os bancos ao meu redor. Aparentemente, todos eles estão ocupados, o que me faz bufar em resposta. Então, completamente a contragosto, viro-me levemente para o lado, dando passagem ao garoto grosso e ignorante.

- Viu como não é difícil fingir ser educada de vez em quando, lindinha? - Ele questiona no exato segundo que termina de se acomodar no banco ao meu lado.

- Eu agradeceria tanto se você simplesmente ficasse quieto. - Forço um sorriso enquanto as palavras saem como meras murmurações pelos meus lábios.

Ele sorri e finalmente direciona a sua atenção completa para a janela do ônibus, na direção contrária ao meu rosto. E eu aproveito para soltar o ar pelo nariz, demoradamente.

Agora eu posso voltar a minha relaxante leitura. Abro exatamente na página 64, onde eu havia parado. Preciso urgentemente saber o que deixou o Jean tão impressionado. Mas, assim que os meus olhos correm pelas linhas iniciais do parágrafo, ouço uma melodia ressoar próxima ao meu ouvido. The Lumineers.

Ao olhar para o lado, percebo que alguns sons da música Ophelia escapam dos seus fones de ouvido, que muito provavelmente estão no volume máximo. Por mais irritante e desagradável que seja, o garoto tem bom gosto.

Toco em seu ombro, impacientemente. Ele, então, se vira e, no mesmo momento, retira um dos fones para me ouvir.

- Que tal você também fingir ser educado e abaixar a sua música? - Sorrio sem ao menos mostrar os dentes.

Ele parece pensar por um momento e, por fim, balança a cabeça em negação.

- Não, obrigado. - Ele franze o nariz.

- O quê? - Indago um pouco alto demais, o que chama a atenção dos demais passageiros ao meu redor. Mas eu estou tão nervosa, tão brava, que ao menos consigo me importar. Por que o homem mais insuportável de todo aquele ônibus resolveu sentar justo ao meu lado?

- É que eu acho realmente muito atraente quando garotas com menos de... - Percebo que os seus olhos atravessam toda a extensão do meu corpo, demoradamente, enquanto ele me analisa minuciosamente. - Um e sessenta e cinco ficam irritadas. Elas parecem pequenas chihuahuas.

Ergo as minhas sobrancelhas, sem ao menos conseguir acreditar no que os meus ouvidos acabaram de captar.

- Não acredito que um playboyzinho acabou de me comparar a um cachorro. - Bufo em descontentamento. - Inacreditável.

- Playboyzinho? - É a sua vez de erguer a sua sobrancelha em surpresa.

Cruzo os meus braços e respiro profundamente, analisando-o exatamente da mesma maneira que ele fez a segundos atrás.

- Tênis branco e limpo. - Começo a dizer.

- Que culpa eu tenho se você não limpa o seu tênis? - Ele também cruza os seus braços, copiando os meus movimentos.

- Você não os usa na rua, muito menos no ônibus. E eles são de marca. No mínimo três dígitos. Fone de ouvido sem fio. Também de marca. - Aponto com a cabeça para o fone branco em sua mão. - Relógio da Cartier.

- Herança de família. - Ele, agora, puxa a manga da sua blusa para esconder o seu relógio que vale muito mais do que toda a minha casa... mobiliada.

- E por último mas não menos importante, a sua cara de playboyzinho. - Encerro a minha fala e, então, ergo a minha sobrancelha para ele.

- O que tem de errado com a minha cara, lindinha? - Ele se aproxima do meu rosto, provocando-me.

Idiota, ele sabe que é bonito. Sabe que é estupidamente bonito.

- Nada. - Dou de ombros. - Mas, me conta, ficou arrasado quando deixou a sua Porsche no mecânico?

- Oh, partiu meu coração. - Ele apoia uma de suas mãos sobre o próprio peito, fingindo sentir dor. - Problemas no motor.

Reviro os meus olhos da maneira mais lenta que consigo. Em seguida, agradeço mentalmente aos céus quando noto estar próxima do meu ponto. Então, simplesmente guardo o livro em minha bolsa, levanto-me e dou o sinal ao motorista, sem ao menos me importar em me despedir do homem mais mal-educado que já encontrei.

Finalmente solto o ar preso em meu peito quando desço do ônibus. Estou irritada por ser impedida de ler o restante do capítulo, mas feliz por sair daquele lugar e daquele acento.

Mas, então, escuto passos ecoando atrás de mim quando atravesso a rua em direção ao hospital Lemoine. Ao me virar para trás, encontro o mesmo homem a alguns poucos metros de distância.

- Você está me seguindo? - Pergunto, aborrecida ao notar que eu ainda não havia me livrado da sua presença irritante.

- Não se ache tão importante, lindinha. - Ele coloca as suas mãos dentro do bolso da calça.

Meu Deus, e se ele for algum novo paciente da minha área do hospital? Será que eu ficarei encarregada de administrar o seu tratamento e medicamento? Será que eu serei obrigada a aturá-lo por mais tempo?

- A propósito... - Ele se aproxima de mim. Posso sentir o seu hálito quente no pé do meu ouvido, o que involuntariamente me causa onda de arrepios. - O Jean não fica com a Louise no fim do livro.

- Ora, seu... - Começo a reclamar em alto e bom tom. O segurança do hospital nos olha de maneira curiosa, e novamente eu não dou a mínima.

Ele realmente me deu um spoiler do fim do meu livro? E não apenas um spoiler, mas O spoiler. A coisa que mais odeio no mundo é saber o fim de alguma história antes de sequer terminá-la.

E o homem simplesmente sorri preguiçosamente antes de finalmente entrar no hospital e seguir na direção contrária à minha. Amém, agora eu tenho a plena certeza de que não nos encontraremos de novo.

Dirijo-me apressadamente em direção à sala dos armários dos funcionários. Lá eu me troco e coloco o meu uniforme do hospital, juntamente com a minha identificação. Em seguida, vou à sala ao lado para buscar o prontuário dos pacientes de hoje.

- Enfermeira Sun. - Escuto a cansada voz da cirurgiã chefe da área oncológica me chamar enquanto os meus olhos correm de maneira rápida pelas fichas. - Gostaria de lhe apresentar os novos residentes de cirurgia do Lemoine.

Viro a próxima página do prontuário, determinada a ler a última folha de informações antes de finalmente depositar toda a minha atenção na cirurgiã a minha frente.

- Temos a senhorita Fortier e o senhor Scott.

Ergo os meus olhos em direção aos novos residentes enquanto abaixo o prontuário. Fortier é uma garota loira, alta, e, caso não seguisse na medicina, aposto todas as minhas fichas que ela poderia ser uma modelo de prestígio. É injusto existir garotas assim, com uma beleza tão natural.

E ao seu lado está o senhor Scott. Assim que a minha atenção é direcionada ao homem, os meus lábios se abrem involuntariamente. Eu simplesmente não posso acreditar que estou diante de ninguém mais e ninguém menos que: o playboyzinho do ônibus.

- É um grande prazer conhecê-la, enfermeira Sun. - O desgraçado sorri largamente.

Isso não pode ser real.

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