9 - Carnaval
E quem me vê apanhando da vida duvida que eu vá revidar. Tô me guardando pra quando o carnaval chegar.
Quando o Carnaval Chegar - Chico Buarque
Os dias continuavam passando tão rápido que Diana mal conseguia acompanhar o calendário, mas ela adorava essa sensação. Com a chegada do Carnaval ela pode respirar aliviada por finalmente ter quatro dias de folga e Maurício já havia agendado uma viagem até a casa de campo de seus avós no interior de São Paulo na companhia da noiva para fugir da bagunça que se tornava o centro da cidade durante a folia.
Os avós de Maurício já tinham seus oitenta e tantos anos e Diana os amava como se fossem da própria família. O casal de idosos era totalmente diferente dos filhos, genros e netos, levando uma vida simples e sem tantas mordomias como os demais Monteiro adoravam. Viviam confortáveis na casa de campo com piscina e uma vasta área verde, mas não faziam questão de nada daquilo.
Sempre que Maurício chegava acompanhado dos pais e da noiva era uma festa, pois o neto mais novo sempre foi o mais mimado e isso continuava mesmo ele estando com seus 35 anos. Diana se sentia minimamente à vontade junto aos idosos, mas somente quando estavam só os três. Bastava o noivo ou os sogros se aproximarem para ela voltar a se retrair.
O feriado de Carnaval passou lentamente, pois o marasmo do lugar fazia o tempo seguir diferente do que na capital. Maurício passou a maior parte de sua estadia na casa dos avós seguindo o pai para onde quer que ele fosse. Sua mãe decidiu matar a saudade dos pais e fez companhia para os dois o quanto podia, pois não era sempre que podia escapar de São Paulo. Era estranho para Diana ver os seus sogros sendo gentis e amorosos com alguém que não fosse o filho, mas era impossível não ser apaixonado por aqueles velhinhos gentis e de riso frouxo.
Enquanto cada um aproveitou o feriado de uma maneira diferente dentro daquele lugar, Diana desfrutou de sua própria companhia. Seus dias se revezavam entre ficar deitada na rede lendo um livro e ficar sentada na beira da piscina apreciando a vista magnífica do lugar. Foi deitada na rede enquanto assistia ao pôr-do-sol e passava entre um story e outro no Instagram que viu as fotos e vídeos de Gael aproveitando o carnaval de rua de São Paulo.
Há pouco mais de duas semanas Diana estava no escritório sem muita coisa para fazer e ficou surpresa quando entrou em suas redes sociais e viu a solicitação de amizade do rapaz. O tempo em que deveria estar trabalhando, passou vendo as fotos e compartilhamentos do tatuador. Gael tinha mais fotografias de seus trabalhos do que de si mesmo, mas todas as selfies e fotos em que aparecia eram despojadas e alegres – e em todas havia pelo menos um comentário de dona Cida exaltando o filho. A linha do tempo a fez rir, pois ele só compartilhava memes e vídeos engraçados. Ter alguma pessoa divertida em sua rede de amigos não seria ruim, então o aceitou na mesma hora. Duas semanas depois estava deitada na rede sorrindo para a tela do celular ao vê-lo fantasiado de homem das cavernas durante o Carnaval.
Os avós de Maurício como sempre se emocionaram durante as despedidas ao final do feriado prolongado. Fizeram o neto prometer que voltaria logo para mais uma visita e afirmaram que Diana deveria estar junto, pois sua noiva era parte da família. Ela de fato se sentia acolhida, mas somente pelos dois e pelo noivo, pois por mais que seus sogros a tratassem bem, ela sentia que eles não a aprovavam para o único filho.
O caminho de volta foi mais longo do que eles gostariam, mas por ser o último dia de um feriado e muitas pessoas estarem voltando de viagem, eles já esperavam por isso. Maurício ouvia alguma rádio de notícias chiada num volume desconfortável para Diana, mas ela se manteve em silêncio como sempre fazia.
Os dois nunca foram aquele casal completamente loucos um pelo outro, nunca sentiram uma paixão avassaladora tomá-los e Diana sequer acreditava nesse tipo de relação, já que nunca viu um amor desses dignos de filmes de perto. Ela o amava, mas daquela forma contida que lidava com todos os seus sentimentos que envolviam terceiros. Nunca amava demais ou odiava demais. Estava sempre morna como deveria ser.
Maurício sempre afirmou amá-la como nunca amou ninguém, mas sentia falta daquela Diana que conheceu ainda na faculdade há mais de oito anos. Aquela Diana que sorria sem jeito a cada elogio que recebia, que o beijava sem que ele precisasse pedir, que aceitava segui-lo onde quer que fosse, que o ouvia contar sobre seu primeiro estágio por horas a fio sem se cansar. Mas aquela Diana já parecia não existir – e ele não percebia que tinha uma grande parcela de culpa nisso.
A rotina do relacionamento não era ruim, mas era rotina. Por mais que trabalhassem juntos todos os dias, dormissem juntos várias vezes por semana, agissem como o casal que eram, era tudo sempre igual. Maurício matava suas vontades e virava para o canto para dormir, Diana fingia dor de cabeça para poder ter um tempo só para si. Durante a estadia na casa de campo eles mal passaram tempo juntos, apesar de dividirem a mesma cama todas as noites. Para Diana estava morno como tudo deveria ser, mas Maurício sempre esperava mais.
– Você quer subir? – Diana perguntou assim que o noivo estacionou em frente ao seu prédio.
– Hoje não, estou cansado demais, quatro horas de estrada me deixou exausto.
Diana achou estranho, pois Maurício subia até seu apartamento mesmo quando não era convidado. Seu noivo parecia apressado em ir embora e ela não tirava sua razão, já que o trânsito intenso esgotou a paciência dos dois. Após se despedirem com um selinho rápido, ela entrou em sua casa e se jogou no sofá sem nem mesmo tirar a roupa. Só se levantou quando sentiu a barriga roncar.
Abriu a geladeira e ao tentar escolher entre iogurtes light, marmitas fitness congeladas e frios que estavam ali há praticamente seis dias e ela não tinha coragem de comer, Diana optou pelo aplicativo de delivery. Por mais que tivesse uma infinidade de pratos e restaurantes diferentes, ela sabia exatamente o que queria. Procurou pelo bar que fazia o melhor hambúrguer de gorgonzola do mundo e fez seu pedido.
O bar estava lotado de pessoas fantasiadas que decidiram prolongar a folia no último dia de carnaval. Gael não costumava trabalhar ali de terça-feira, mas a situação o obrigou. Todos os funcionários estavam fantasiados de piratas e Bento era o único que carregava um papagaio de pelúcia no ombro, deixando claro que era o capitão daquele navio.
– Qual é o endereço da sua advogada? – Bento se aproximou de Gael, que flertava com uma moça fantasiada de fada enquanto servia bebidas no balcão.
– Que advogada? – Gael se afastou da moça e foi até seu amigo – A Diana?
– Quem mais seria? – Bento sorriu – Esse aqui é o endereço dela? – virou o celular para Gael, que confirmou – Ela realmente gostou do lanche que você levou pra ela.
– Como a gente tá de motoboy hoje?
– Gael, olha o movimento... não dá pra ir namorar hoje.
– Namorar, Bento?! Não viaja, ela é praticamente casada!
– Eu adoro como você pega pilha – sorriu – Agora me dá licença que vou cumprimentar um amigo que não vejo há anos! Ei, Jonathan!
Bento foi até o grupo e cumprimentou o amigo que não via há pelos menos cinco anos, quando o rapaz se mudou para o interior de Minas Gerais ao se casar com a moça fantasiada ao seu lado. Junto de Jonathan estavam um gringo fantasiado de anjo que falava sem parar seu português enrolado com uma loira vestida de diabinha. Ele também reconheceu Duda, a irmã do rapaz, que estava abraçada ao namorado.
Gael atendia aos pedidos do balcão um tanto desanimado, mas tinha certeza que era o cansaço depois de dias e mais dias trabalhando sem parar. O pedido de Diana ficou pronto e ele escreveu algo no saco de papel antes de entregar para o motoboy, que saiu apressado pela quantidade de entregas naquela noite.
Diana estava cochilando no sofá quando seu interfone tocou. Calçou os chinelos e dessa vez se certificou que não estava de pijamas antes de apertar o botão do elevador. Chegou na portaria e seu quase-sorriso se desfez ao ver que o entregador não era Gael. Não que contasse com isso, mas a companhia do rapaz era agradável mesmo que só por alguns minutos. O motoboy apressado desejou uma boa noite ao entregar o lanche e saiu para mais uma entrega.
Assim que voltou para seu apartamento, Diana sentou-se à mesa e sorriu ao ver um bonequinho dançando Hula desenhado no papel pardo seguido da frase "Que o seu Carnaval tenha sido tão bom quanto esse hambúrguer. Bom apetite e aproveite os presentes". O nome de Gael estava assinado abaixo do desenho. Ao abrir o pacote, viu uma lata de refrigerante, uma porção de batatas e um chocolate de brinde.
Com a fome que estava, Diana devorou o hambúrguer sem a menor classe. Estava sozinha e então poderia ser ela mesma, afinal. A Coca-Cola de brinde foi totalmente bem-vinda, assim como o chocolate. Após empanturrar-se com aquela refeição praticamente completa, deitou no sofá e decidiu enviar uma mensagem em agradecimento para Gael.
– Boa noite, Gael. Obrigada pelo cuidado com o meu pedido e pelos brindes, foi muito atencioso de sua parte.
– Não precisa agradecer. Pelo menos você se livrou da comida chinesa hoje – ele não demorou a responder.
– Hoje eu estou sozinha e sem comida chinesa, graças a Deus!
– Sozinha?! Ninguém deveria passar o Carnaval sozinho.
– Eu estou acostumada, acabo sendo a minha melhor companhia. Mas vi os seus stories no Instagram vestido de homem das cavernas, companhia não te faltou no bloquinho – ela riu na mensagem e enquanto digitava ao se lembrar da fantasia do rapaz.
– Eu nunca, NUNCA mais vou no bloquinho e trabalhar em seguida, eu juro! Tô quase morrendo aqui no bar, isso aqui tá LOTADO.
Gael enviou um curto vídeo do bar cheio de pessoas fantasiadas e cobertas de glitter e finalizou sorrindo para a câmera com sua fantasia de pirata. Diana o conhecia há um mês, mas nunca havia parado para prestar atenção em sua beleza. O rapaz tatuado poderia parecer todo mal-encarado, mas bastava sorrir como naquele frame pausado por ela para fazer as primeiras impressões caírem por terra. Ele não tinha um só pré-requisito que costumava a atrair, seu cabelo era longo demais, sua barba era espessa e seu corpo tinha mais tatuagens do que ela poderia contar, mas era incrível como ela o achou totalmente atraente naquele vídeo.
Diana odiava tirar fotos, rejeitava ainda mais a ideia de aparecer em uma gravação, mas de alguma forma ele a deixava à vontade. Então ela fez o mesmo que ele, filmou todo o vazio de sua sala iluminada apenas pela televisão e terminou gravando seu sorriso acanhado à meia luz. Gael estava atendendo um cliente quando seu celular vibrou. Ele se apressou em entregar a bebida e sorriu quando finalmente deu play no vídeo. A moça estava bonita mesmo com a expressão cansada e introvertida, e seus olhos grandes de cores diferentes se destacavam timidamente através da tela. Diana era a detentora dos olhos mais lindos que ele já havia visto.
– Sem fantasia, sem pessoas, somente eu – ela enviou logo após o vídeo.
– E o meu bonequinho dançando Hula! – ele a lembrou.
– Verdade! Como poderia me esquecer? Obrigada por me proporcionar a companhia dele. Está ficando tarde e acredito que você ainda tenha muito trabalho pela frente, então não te atrapalharei mais. Tenha uma boa noite e obrigada mais uma vez pelos brindes.
Gael estava prestes a digitar que ele não se incomodava em conversar com ela quando Bento o chamou para atender a mesa de seus amigos. Diana tinha razão, a noite dele ainda não estava nem perto de terminar e havia muito trabalho pela frente, então ele decidiu deixar o celular de lado e voltar às suas obrigações – mas não sem antes assistir ao vídeo dela mais uma vez.
Olá meus amores! Como estão?!
Gostaram do pequeno e rápido crossover com a duo Sete Bilhões?! (pra quem não conhece, entre no meu perfil e comece por Imperfeitos, vocês farão uma autora muito feliz! ♥)
E Diana finalmente vendo o Gael com outros olhos... eu amo! kk
Enfim, o capítulo é curto, me desculpem por isso. Nos vemos em breve!
Feliz Ano Novo! ♥
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