21 - Princesa

Eu sei a verdade agora, eu sei quem você é e eu não te amo mais. De alguma forma, você engana todo mundo.
Everybody's Fool - Evanescence

Diana passou a terça-feira inteira pensando não só em como faria para terminar seu noivado, mas também em como deixaria claro que sabia daquela traição horrível que sofreu. Gael afirmou que a ajudaria e pediu desculpas por não poder passar mais tempo com ela, pois ainda precisava ir até sua casa para um banho antes de ir trabalhar. No fim da tarde, quando continuava sem ideias, seu interfone tocou e a floricultura a entregou os dois buquês que Rita havia encomendado ao se passar pela secretária de Maurício. Isso fez com que o início de um plano surgisse imediatamente em sua mente. Ela já tinha o que precisava.

Para seu plano dar certo, Diana precisava ser totalmente fria. Então ao ir trabalhar na quarta-feira, encontrou com Maurício na recepção e o cumprimentou com um beijo estalado nos lábios. Ele estranhou aquele comportamento na mulher que no dia anterior havia justificado sua falta com uma enxaqueca fortíssima, mas não negou a boca da noiva. Márcia até comentou que eles formavam um casal lindo.

Ainda naquela tarde Rita agiu conforme o combinado e ligou na recepção do escritório fingindo trabalhar no edifício. Em meio a todo um teatro, falou para Márcia que o automóvel preto novíssimo do advogado do décimo andar estava com os quatro pneus furados no estacionamento. A mulher acelerou o passo até o escritório do chefe para dar a notícia e Maurício largou tudo o que estava fazendo para correr até seu carro no subsolo.

Com tudo correndo exatamente como o planejado, Diana se apressou até o escritório do noivo e pegou seu celular. Demorou mais do que gostaria para lembrar a senha e assim que conseguiu desbloquear, espelhou o WhatsApp dele em seu computador. Foi o tempo de colocar o aparelho sobre a mesa de Maurício para ele entrar de volta na sala.

Ele questionou o que a noiva fazia ali e ela mentiu que o viu sair correndo e se preocupou. Maurício agradeceu pela preocupação e disse que foi um engano, pois seu carro seguia intocado. Diana fingiu alívio e voltou apressada para sua sala. Trancou a porta e se se sentou de frente para o computador. Agora ele não teria como esconder mais nada.

Diana deixou de se preocupar com a privacidade de Maurício no momento em que o viu beijando sua irmã. Se ele não tinha um pingo de respeito por ela, o desrespeito seria recíproco. Ela não se importava com qualquer outra conversa, apenas digitou na busca o nome de Fernanda e abriu a conversa que estava arquivada.


"Hoje a Diana pediu para usar meu celular, é melhor voltarmos a nos comunicar somente por e-mail a partir de agora"
foi a última mensagem enviada por Maurício. Sua noiva começou a subir as conversas para ver até onde ia, das mais recentes até as mais antigas.


"Isso aqui está um tédio. Depois da festa eu deixo a Diana em casa e nós podemos ir para onde você quiser",
ele enviou no dia do casamento. "Mal posso esperar", ela finalizou com um emoji de fogo. Pelo horário informado, eles trocavam mensagens na frente dela.


"Falei que vou jantar com os meus pais. Já deixei o porteiro avisado para te deixar subir",
Maurício falou há pouco mais de duas semanas.


"Já estou com saudades do seu beijo",
Fernanda havia mandado há cerca de um mês.


"Hoje a Diana vai jantar com alguma amiga. Minha casa está livre para nós",
Maurício enviou no dia do aniversário de Rita. "Amiga imaginária, só se for. Vou falar para o Fábio que vou sair com a minha mãe, chego aí às oito", Fernanda respondeu.


"Hoje eu não vou trabalhar, vem aqui em casa",
ele enviou na sexta-feira após o Carnaval, quando ele e Diana revezaram os dias após a quarta-feira de cinzas. "Não dá, o Fábio está em casa", ela respondeu com uma carinha triste.


"Espero que ninguém tenha reparado",
Maurício enviou no dia do aniversário de Lucca no final do mês de janeiro. "Eu duvido, nós somos discretos há tanto tempo e ninguém nunca desconfiou", Fernanda respondeu logo em seguida.


"O Fábio vai trabalhar até tarde e eu vou mandar as crianças pra casa dos pais dele. O que acha de vir aqui?",
Fernanda enviou na antevéspera de Natal. "Preciso comprar o presente da Diana", ele respondeu e logo em seguida a mulher mandou "Ah, compra qualquer coisa". Essa tal "qualquer coisa" era o vestido azul marinho que ela tanto odiava.


A cada mensagem lida por Diana, mais o seu ódio aumentava. Ela subiu até a primeira conversa dos dois há pouco mais de três anos e viu onde tudo provavelmente começou: "Você não vale nada, Mau", Fernanda mandou seguido de uma risada. "Você sabe que sempre foi a minha Andrade preferida", ele respondeu. Aqueles dois desgraçados tinham um caso de anos. Anos traindo e rindo de Diana pelas costas. Anos de fingimento, de "princesa" pra cá, "irmãzinha" pra lá.

Diana acertou o punho fechado no teclado, o que fez algumas teclas voarem pelo cômodo. Sua vontade era de sair daquela sala, invadir o escritório de Maurício e estapeá-lo até suas mãos não aguentarem mais. Um tapa por dia de traição. Mas se lembrou de Gael e de como ele havia dito que ela era inteligente demais para reagir àquilo com um barraco. Então ela vestiu sua máscara fria e impenetrável e voltou a focar apenas em seu plano, mas agora com uma carta a mais na manga.


Na quinta-feira Diana chegou com duas horas de atraso no escritório, com a desculpa de que sairia mais tarde para cumprir todo o seu horário. Passou o dia em sua sala adiantando todo o seu serviço para que pudesse dar continuidade em seu plano assim que Maurício fosse embora.

No momento em que o relógio apontou seis horas Maurício foi até a sala da noiva e perguntou inúmeras vezes se ela realmente achava necessário ficar até mais tarde. Diante de todas as afirmativas da mulher, ele se despediu com um beijo rápido e apertou o botão do elevador. Diana estava ansiosa, mas precisava agir com calma. Aguardou meia-hora até ter certeza de que o noivo realmente tinha ido embora e foi até seu escritório.

A sala de Maurício sempre ficava trancada, mas ela sabia do fundo falso de segurança na gaveta onde Márcia guardava as chaves reservas. Pegou a chave que continha a letra M escrita em um pedaço de fita crepe e destrancou a porta torcendo para encontrar tudo o que precisava.

A sala como sempre estava muito bem organizada e ao ligar o computador, não esperava que pedisse por uma senha. Tentou a data de seu próprio aniversário, mas riu em seguida ao se dar conta de que ele pouco se importava com ela. Egocêntrico como era, só podia ser a data de nascimento dele. Digitou os números "09011986" e não se surpreendeu quando apertou o Enter e o Windows a desejou boas-vindas.

Entrar no e-mail de Maurício não foi difícil, pois a senha ficava salva no navegador. Em meio a muitas mensagens de clientes e propagandas de marketing, lá estava o nome de Fernanda. Antes de abrir aquela mensagem ela decidiu procurar pela irmã na busca da caixa de entrada. Eram muitos e-mails trocados nos últimos anos, muito mais do que ela poderia imaginar.

Diana leu um por um e não sabia se sentia mais nojo do noivo ou da irmã. As fotos que trocavam, as mensagens baixas, todo o deboche acerca dela e de Fábio sequer desconfiarem. O e-mail mais recente havia sido enviado por Maurício naquela manhã e já tinha uma resposta de Fernanda.


"Bom dia, minha princesa. Estou com saudades de te ver, o que acha de ir lá em casa amanhã? Podemos pedir comida japonesa, e ter uma sobremesa picante e bem deliciosa. O que acha? Eu vou falar para a Diana que vou assistir futebol com o meu pai, diga ao Fábio que você vai sair com suas amigas, assim como toda semana. Um enorme beijo"


"Boa tarde, Mau. Desculpe a demora em responder, tive que levar meu carro no mecânico. Fugir do Fábio seria uma boa, ele anda insuportável essa semana. Adorei a ideia da comida japonesa e ainda mais da sobremesa rs

Estarei sem carro até segunda, você consegue me buscar no consultório? O que devo vestir pra você tirar? Um beijo"


Diana já havia lido tantas coisas que já não se chocava mais com nada do que veria dali em diante. Nem mesmo ficou nervosa, pois já não esperava mais nada dos dois. Sem esboçar reação alguma, limpou o histórico do navegador, desligou o computador e trancou a sala após sair carregando uma grande quantidade de papéis.

Depois de esconder a chave de volta na gaveta e trancar o escritório, carregou todas as suas pastas até o carro e seguiu até o shopping mais próximo antes de ir para casa. A noite seria longa e toda a adrenalina que sentia não a permitiria dormir tão cedo. Era madrugada quando decidiu descansar, mas não sem antes informar ao noivo que não iria trabalhar no dia seguinte por conta de uma audiência que havia esquecido de avisar.


Durante a sexta-feira Diana ignorou todas as ligações do noivo, apenas enviou uma mensagem dizendo que estava no Fórum. Na verdade estava conversando com Gael ao telefone, que aproveitou o horário do almoço para ir até a floricultura com Rita, que se passava pela nova secretária de Maurício mais uma vez ao encomendar três arranjos de cravos coloridos. Todos na conta do homem, é claro.


– Você tem certeza do que tá fazendo? – Gael perguntou ao telefone.

– Eu não faria se não tivesse certeza. Você conseguiu o que eu te pedi?

– Claro, eu não brinco em serviço – riu – Depois me diz se deu certo.

– Você é quem vai me dizer.

***

Maurício buzinou em frente ao consultório e Fernanda saiu com o semblante sério, mas bastou entrar no automóvel para abrir um sorriso e dar um longo beijo no homem. Os dois seguiram até o condomínio no bairro de Pinheiros trocando carinhos no carro e não pouparam as carícias nem mesmo no elevador. Ele abriu a porta de seu apartamento e ao acender a luz, viu a mesa de jantar preparada com muito luxo e um cheiro delicioso tomando todo o ambiente. Ao olhar para o lado oposto, encontrou Diana com sua melhor roupa para os recepcionar.


– Diana! O que você tá fazendo aqui?! – Maurício praticamente gritou ao soltar a mão da cunhada.

– Por favor, sentem-se – Diana abriu um sorriso e trancou a porta em seguida. Fernanda tentou dar meia volta, mas a irmã a impediu – Eu mandei vocês se sentarem, irmãzinha.

– O que tá acontecendo aqui? – Fernanda perguntou nervosa, mas obedeceu a irmã e se sentou. Maurício fez o mesmo.

– Antes de mais nada quero dizer que eu sei que vocês esperavam comer comida japonesa hoje, mas eu tinha outros planos – deu de ombros – Então, para recordá-los da semana passada, eu encomendei o mesmo que vocês pediram lá naquela cantina italiana do Morumbi: Nhoque à Putanesca. Eu diria que o molho combina com o que você é, Fernanda – sorriu – Ah, o vinho eu não pedi o mesmo, vocês não merecem que eu pague quase duzentos reais em um vinho. Peguei qualquer um da sua adega, Maurício.

– Diana, por favor, me explica que palhaçada é essa! – ele exigiu ao se levantar.

– Eu não terminei, Maurício. Sente-se.


O homem obedeceu contrariado. Fernanda já tinha os olhos cheios de lágrimas e Diana tremia, mas não deixava transparecer uma falha sequer. Gael tinha razão quando disse que ela era inteligente demais para fazer um barraco, então agiria com classe do início ao fim. Foi até a cozinha e voltou com um arranjo de cravos coloridos.


– Aqui, irmãzinha, esse é pra você – entregou o buquê para Fernanda – Eu ia dizer "espero que goste", mas eu sei que você vai gostar, afinal é igual a todos os outros que o Maurício nos dá, não é mesmo? Aliás, Mau, como você é previsível.

– Diana, por que você tá fazendo isso comigo... – Fernanda deixou uma lágrima escorrer.

– Se eu fosse você, leria o cartão – ignorou o choro da irmã.


Assim que Fernanda abriu o envelope, sentiu um amargo em sua garganta. Era uma foto dela e de Maurício de mãos dadas na semana anterior.


– Isso não quer dizer nada, princesa – Maurício estava desesperado – Não é nada do que você está pensando!

– Eu já estou com uma vontade imensa de dar um soco na sua cara, então mechama de princesa de novo que eu te faço engolir letra por letra – ela falou entredentes – Mas realmente, essa foto não quer dizer nada. Que tal a gente assistir a um filminho?


Com os movimentos completamente pensados, mas com o coração tão acelerado que parecia que rasgaria seu peito a qualquer momento, Diana se sentou no sofá, ligou a televisão de 60 polegadas previamente preparada e deu o play no vídeo gravado por Gael. Fernanda escondeu o rosto nas mãos ao se ver beijando o cunhado naquela enorme tela e Maurício ficou tão fora de si que praticamente pulou para fora da mesa e arrancou o controle das mãos da noiva.


– Mas que merda, Diana! Como você teve acesso a isso?! Você pagou alguém pra me seguir?! – ele gritava.

– Eu não precisei pagar ninguém, Maurício – ela sorriu – Você é tão previsível que eu te segui e cheguei naquela cantina antes de você. Inclusive jantei no mesmo restaurante que vocês, tirei essas fotos e vocês sequer perceberam.

– Você não seria capaz de fazer tudo isso sozinha! – falou exasperado.

– Você não faz ideia do que eu sou capaz. Mas tem razão, eu não estava sozinha. Ao contrário do que a Fernanda disse em uma das mensagens que vocês trocaram pelo WhatsApp, eu tenho amigos.

– Por que você tá fazendo isso, Diana?! – Fernanda chorava sem nenhuma vergonha – Você é minha irmã!

– Agora eu sou sua irmã! – Diana riu sem acreditar na audácia de Fernanda – Agora eu sou sua irmã, mas na hora de você sair pra transar com o meu noivo você não pensou nisso! Na hora de perguntar que roupa você deveria colocar pra ele tirar, você não pensou nisso! – aumentou o tom de voz.

– Diana, vamos conversar – Maurício tentou tocá-la, mas ela se esquivou.

– Claro, vamos conversar. Somos todos adultos aqui, não?! Me digam, há quanto tempo estão juntos?

– Um mês... foi um erro, meu amor... – agora era Maurício que começava a chorar.

– Resposta errada – Diana foi até sua bolsa e voltou com alguns papéis – Como podem ver, eu tenho conversas de pelo menos três anos – começou a colocar folha a folha em cima da mesa – Essa aqui foi do dia do casamento, inclusive eu sei que vocês foram pro karaokê do outro lado da rua – colocou mais uma – Essa aqui, do aniversário do Lucca. Essa é do dia que eu fui jantar com a minha amiga imaginária, né Fernanda? Pois eu quero que saibam que naquele dia eu dancei a noite inteira e me diverti mais em algumas horas do que em sete anos com você, Maurício – começou a expor os e-mails – Irmãzinha, essa pose não te favoreceu. Na próxima tenta tirar em outro ângulo, seus peitos ficariam melhores. Ah, Maurício, nessa aqui eu tenho certeza que você usou o Photoshop.

– Chega, pelo amor de Deus! – Fernanda implorou em meio a lágrimas ao agarrar as mãos da irmã – Você vai destruir a minha vida, Diana!

– Não, eu não vou destruir nada. Você vai destruir a sua vida – jogou os papéis restantes sobre a mesa.

– Você não vai contar isso pro Fábio, vai?! Pensa nas crianças, por favor – Fernanda continuava agarrada à Diana.

– Acho que é tarde demais – estalou a língua – Sabe esse buquê que eu te dei? O Fábio provavelmente já recebeu um igualzinho, mas no dele foi uma foto de vocês se beijando com o dia e o horário anotados. Ah, eu mandei um também para a casa dos nossos pais – sorriu – Eles precisam saber que a filha perfeita talvez não seja tão perfeita assim.

– Você é um monstro! – Fernanda tentou dar um tapa na irmã, mas Maurício a segurou – Se o meu casamento acabar a culpa é sua! – gritou.

– Essa culpa eu não carrego – Diana deu de ombros e pegou sua bolsa – Sabe que vocês formam um belo casal? Pessoas dissimuladas e traidoras como vocês se merecem.

– Diana, por favor... eu... – Maurício não sabia mais o que dizer – Eu te amo!

– Guarde esse seu amor para alguém que se importe com ele – foi até a porta, mas se virou mais uma vez antes de sair – Ah, e antes que eu me esqueça, o pior de tudo isso é que por mais que eu tenha ficado desapontada, eu não posso dizer que fiquei surpresa. Eu já esperava o pior de vocês. Agora aproveitem o jantar que já deve estar esfriando, porque eu sei que o Maurício prometeu uma "sobremesa picante" que eu já experimentei mais do que gostaria e posso afirmar que é péssima. Boa noite.

Olá meus amores! Como estão?!

Só tenho uma coisa a dizer: EITA!
Diana não brincou quando planejou uma vingancinha né? Como sempre digo, os personagens se escrevem sozinhos e ela que planejou tudo isso, eu só fui escrevendo kk

E não sei vocês, mas a cada parágrafo o meu ódio pela Fernanda e pelo Maurício só cresceu, principalmente nas mensagens trocadas.

Enfim, agora que a merda já foi jogada no ventilador, o que esperar? Palpites das reações dos pais da Diana e do marido da Fernanda ao receberem os buquês?

É isso, vejo vocês semana que vem! Bom Carnaval a todos!

Beijinhos ♥

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