Capítulo 04

Não tinha ouvido sua voz, sequer uma palavra.

Ainda assim eles falam sobre como éramos, mas eu não sei as coisas que você ouviu.

♡ I'm Not Her – Clara Mae


  As risadas se espalhavam pela pequena cozinha. Uma senhora na casa dos cinquenta ria alegremente ao ver os dois jovens implica­rem um com o outro como se tivessem voltado ser as crianças traves­sas de anos antes. Sendo sincera, ela ainda os via como os pequenos que corriam ao seu redor brincando de serem super-heróis.

  — Acho que abobrinha fica melhor — disse Hannah erguendo o tempero com uma das mãos, enquanto posicionava a outra na cintu­ra.

  — Pois eu acho que salsa fica melhor — disse Mateus imitando a pose da "rival". — Abobrinha é tão sem graça quanto aquela sopa que você tentou fazer ontem — alfinetou. Infelizmente, Hannah Mc­Cleary não possuía nenhum dote culinário.

  — Salsa é tão ruim quanto o bolo que você tentou assar ontem — rebateu a mais nova. Mateus Terry também não tinha tais dotes.

  — Mãe!

  — Tia!

  — Duas crianças — disse a senhora em um suspiro com o sorri­so firme em seus lábios.

  Ela deu as costas para as panelas do almoço e encarou as duas crianças crescidas que faziam baderna em sua cozinha. Lembrava bem que aqueles dois sempre competiam por alguma coisa boba, mas logo depois estavam correndo grudados um ao outro.

  — Eu vou colocar ambos — disse achando graça da careta que fizeram.

  — Obrigada, Tia Sara — disse Hannah se aproximando e enla­çando os ombros dela. Sara enlaçou carinhosamente a cintura da mais nova.

  Sara Mackenzie era a mãe de Mateus. Ela era uma senhora bai­xinha e rechonchuda, que tinha cabelos lisos pretos que iam até um pouco abaixo dos ombros. Seus olhos eram meio esverdeados, suas bochechas geralmente estavam coradas e um sorriso doce sempre es­tava presente em seus lábios.

  — Mas a senhora prefere abobrinha, não é, Tia Sara? — pergun­tou Hannah fingindo sussurrar.

  — Mãe! — protestou Mateus e a mais velha riu.

  Desde que Hannah havia voltado, Sara estava se sentindo nas nuvens. Quando reencontrou a jovem, chorou de felicidade e ficou mais radiante ainda quando viu suas duas crianças agindo como os melhores amigos que eram desde pequenos. Além disso, poder ver o filho rir abertamente e ter o olhar iluminado novamente aquecia o co­ração de Sara.

  — Hannah, pode escorrer o macarrão? — pediu Sara e a mais nova concordou deixando de lado a brincadeira com Mateus.

  A antiga modelo também se sentia nas nuvens. Fazia um pouco mais de um mês que havia se reencontrado com Mateus e desde en­tão foram se aproximando tímida e cautelosamente. Mas, após uma semana, retornaram ao relacionamento que possuíam antes de parti­rem para Nova York. Apesar de estar feliz por poder ter novamente uma amizade que para si era tão preciosa, ela sabia que estava apenas protelando o momento de encarar os problemas.

  — Matt — Hannah chamou ao escutar a campainha tocar. — Mateus. — Ele lhe encarava com um sorriso bobo nos lábios.

  Mateus estava radiante. Para ele, poder resgatar a amizade que possuía com Hannah lhe causava um formigamento e um calorzinho no peito. Nunca imaginou que poderia voltar a conversar daquela forma com ela e que poderiam dividir novamente risadas e trocarem olhares e sorrisos cúmplices. Aquilo era um sonho, do qual ele não desejava acordar.

  — A campainha — disse Hannah emburrada o estapeando com um pano de prato.

  — Estou indo — disse Mateus apertando a bochecha dela e saiu sorridente da cozinha.

  — Ele está mais feliz — comentou Sara.

  — Eu também estou — sussurrou Hannah atenta às expressões do mais velho. O amigo abriu a porta sorridente, mas o sorriso se des­fez gradativamente. Parecia que a visita não o agradava.

  Ela começou a caminhar em direção a ele a passos lentos e escu­tou uma voz feminina animada dizer:

  — Eu não deveria ter vindo sem avisar, mas queria fazer uma surpresa!

  A antiga modelo reconhecia aquela voz, havia a escutado em uma das ligações que Mateus recebia diariamente. Era Summer Car­ver, a namorada dele. Hannah só sabia da existência dela devido a uma breve explicação que Mateus deu quando precisou pausar um dos filmes da maratona de Velozes & Furiosos que estavam fazendo para atender a uma das ligações da namorada.

  Hannah nunca gostou de dividir a atenção de Mateus e tê-la ex­clusivamente para si durante tantos anos não colaborava em seu aprendizado de "compartilhamento". De certa forma, ele tinha certa culpa nisso, pois Mateus sempre a tinha como prioridade, estando em um relacionamento ou não.

  — Matt, por que está demorando tanto? — perguntou Hannah se aproximando lentamente do amigo e quase desatou a rir ao ver a expressão de desespero dele. — Não pense que vai se livrar de lavar a louça e... — Sua voz morreu teatralmente ao parar ao lado dele e ver a loira parada na soleira da porta.

  Summer era uma mulher bonita, essa foi a primeira conclusão de Hannah. Ela possuía cabelos loiros, olhos castanhos, boca carnuda, rosto simétrico com uma pele muito bem cuidada e sabia se vestir bem. Uma beleza natural que cativava justamente por não ser exage­rada ou excêntrica.

  — Olá — cumprimentou sorrindo. — Me chamo Hannah Mc­Cleary e é um prazer finalmente conhecê-la. — Estendeu a mão.

  — Sou Summer Carver — disse a outra. Mesmo nitidamente desconfiada, ela apertou a mão de Hannah. — O prazer é meu.

  — Mateus fala tanto de você — mentiu e puxou a recém-chega­da para dentro da casa. — Faz tempo que quero te conhecer.

  Hannah continuou a tagarelar sobre a suposta propaganda que Mateus fazia da namorada e puxou Summer para a cozinha. Enquan­to isso, ele estava mortificado, seus pés pareciam ter criado raízes em frente à porta aberta. Summer e Hannah juntas era como ver diante dos seus olhos seu presente e seu passado colidindo fortemente e ele temia por não ter noção alguma de qual dos dois seria despedaçado primeiro.

  Após deixar Summer ajudando Sara na cozinha, Hannah voltou para onde Mateus estava e fechou a porta. Pelo olhar dele, concluiu que o mais velho estava tão perdido quanto ela.

  — Você não contou para ela — sussurrou apoiando as costas na porta e encarou o homem à sua frente.

  Mateus abriu a boca para falar, mas logo a fechou comprimindo os lábios. Estava apreensivo.

  — Ela não sabe quem eu sou. — Hannah se aproximou e er­gueu a face dele com a ponta de seu indicador para que ele lhe enca­rasse nos olhos. — Por quê?

  — Hannah. E-eu não...

  Mateus olhou de relance e viu que Summer estava entretida com sua mãe, só então permitiu se perder naqueles olhos verdes ama­dos por si.

— Eu de-deveria ter dito. Mas eu não sa-sabia como dizer. Como explicar. — Ele encarou o chão.

  O antigo modelo não estava se referindo apenas a situação com Summer. Queria explicar para Hannah todas as decisões que tomou, mas temia trazer à tona todo a tempestade que dominava a vida que construíram em Nova York. Estava sendo egoísta, mas não queria perder nem Hannah, nem Summer.

  — Nós somos amigos — disse e segurou as mãos dela. — Vou falar tudo o que precisa ser di-dito. — Respirou fundo para acalmar seu coração. — Eu só preciso de um pouco mais de tempo.

  — Mateus. — Hannah apertou suas mãos. — Fale a verdade para ela.

  — Não quero perdê-la. Muito menos perder você. — Voltou a encará-la nos olhos.

  Hannah também não queria perdê-lo, não depois de perceber que podiam resgatar a amizade que tinham. Mesmo que no fundo soubesse que precisava de mais do que fingir que nada havia aconte­cido e que tudo aquilo era uma verdadeira prova de fogo para o seu emocional. Naquele momento, aquilo bastava. Tinha que bastar.

  — Sempre estarei aqui — confessou baixinho. — Sempre sere­mos eu e você contra o mundo, lembra? — Ela sentiu uma pontada em seu coração ao relembrar aquela promessa frágil.

  — Agora e para sempre. Por toda a eternidade.

  Ele a encarou por um momento antes de puxá-la para um abra­ço, que prontamente foi retribuído.

  — Eu preciso de você — murmurou.

  Na cozinha, Summer os encarava curiosa. Estava intrigada so­bre o que conversaram entre sussurros e percebeu a forma como Han­nah afetava Mateus. Estava tentando entender porquê Mateus nunca lhe contou nada sobre aquela amiga que parecia ser tão importante.

  — Eles são amigos de infância — disse Sara. Summer corou ao ser flagrada espiando. — Mateus e Hannah se conhecem há mais de uma década. Foram criados basicamente juntos. Eles só tiveram um pequeno desentendimento há alguns anos. — Summer assentiu.

  Mateus e Hannah pareciam ser bons amigos, mas havia algo na forma como eles agiam um com o outro que a incomodava. Todavia, não tiraria conclusões precipitadas, primeiro sondaria o terreno ao qual estava adentrando.

  — Mateus — chamou Sara. — O Felipe chega hoje, não esqueça.

  — Felipe? — perguntou Hannah se apoiando no lado externo da bancada. — Felipe Parker? — Fazia anos que não o via.

  Hannah conheceu Felipe quando tinha oito anos. Ele havia se mudado com a mãe para Gumberry e se tornado vizinho de Mateus. Sara logo investiu em uma amizade entre Mateus e o filho da nova vi­zinha, o que por consequência fez com que Hannah também se tor­nasse amiga dele. Infelizmente, três anos depois, Felipe se mudou para morar com o pai em Boston, mantendo contato através dos cur­tos períodos que passava as férias na casa da mãe e de algumas men­sagens em datas comemorativas.

  — Sim —confirmou Mateus sorridente. — Ele está voltando para a casa da Tia Liana.

  — Podemos sair para comemorar a volta dele — opinou Sum­mer. — Nós quatro. — Enfatizou abraçando Mateus pela cintura.

  — Vai ser divertido — sussurrou Hannah.

  Seria interessante ver o desenrolar daquela situação.

  Hannah se jogou no sofá. Passou a tarde inteira tentando se es­quivar dos questionamentos pouco disfarçados de Summer e evitan­do ser grosseira. Entendia a desconfiança dela, também estaria des­confiada caso encontrasse outra mulher, que nem sabia da existência, na casa do namorado. Mas, mesmo compreendendo, aquilo não dei­xava de ser cansativo e desconfortável.

  — Já jantou? — perguntou Rafael.

  — Ainda não — respondeu Hannah e se sentou cruzando as pernas. — O que temos para o jantar?

  — Bife acebolado, salada verde e arroz integral.

  Rafael sentou ao lado da mais nova, que foi atingida pelo refres­cante aroma de sabonete de rosas. O mais velho trajava um confortá­vel roupão de banho e enxugava os cabelos ruivos, o que fez o corpo de Hannah clamar desesperadamente por um banho quente, roupas macias e uma cama aconchegante.

  — Você sabe que vou viajar na próxima semana, não sabe, pe­quena? — disse Rafael a tirando de seus devaneios.

  O mais velho era um coreógrafo reconhecido e acompanhava duas equipes que competiam a nível estadual. Uma delas passou para a última fase de um concurso de street dance em Nova York. Assim sendo, Rafael passaria cerca de três semanas longe.

  — Antes de ir, eu ficaria extremamente feliz se você e seu irmão conversassem decentemente como os dois adultos que são — disse o coreógrafo sorridente.

  Mesmo que ele sorrisse de forma angelical, Hannah sentia a or­dem implícita naquela frase e ela não era louca de contrariar Rafael K. Holder. Ele era a pessoa mais calma que ela conhecia, mas se tornava alguém incrivelmente aterrorizante quando estava irritado, o que ela só viu acontecer uma vez em todos aqueles anos e, com certeza, não queria ver de novo.

  — Ele é o seu irmão, Hannah — disse Rafael sério. Ele bagun­çou os cabelos dela de forma fraternal. — Samuel se preocupa com você mais do que qualquer um pode imaginar e ele sentiu a sua au­sência profundamente.

  Samuel e Hannah trocaram breves cumprimentos educados du­rante aquele mês de convivência. Mas aquilo não chegava nem perto do relacionamento fraternal que tinham anos antes.

  Hannah sabia o quanto o irmão estava ressentido por seu dis­tanciamento e sabia que, de certa forma, ele tinha razão. Além disso, o mais velho não sabia nem metade de toda a história e sempre que tentava se aproximar se esforçando para entendê-la, Hannah o afasta­va e dava respostas superficiais ou desculpas esfarrapadas para os seus questionamentos.

  — As panelas estão no fogão, coloque na geladeira quando ter­minar de comer. — O ruivo foi em direção às escadas, mas parou an­tes de começar a subi-las. — Ele está no estúdio, pequena.

  Hannah segurou o colar militar que sempre levava escondido sob as vestes e sorriu sentindo a textura do nome gravado ali. Havia sido um presente de Samuel. Ele dividiu o colar do pai em dois e gra­vou nas duas partes o seu nome e o de Hannah, representado o jura­mento de que para sempre ele seria seu irmão mais velho e sem­pre a protegeria, porque Hannah era a sua preciosa irmãzinha.

  Quando ela partiu para Nova York, Samuel foi aquele que de­fendeu até o fim que deixá-la ir não era uma boa ideia, porque, se­gundo ele, Hannah ainda era nova demais para enfrentar o mundo. Na época, ela ficou brava com o irmão, pois acreditava que já estava grande o bastante para entender como o mundo funcionava. Entre­tanto, com os anos e o amadurecimento, ela entendeu o porquê de seu irmão ter sido tão contra aquilo. Samuel sabia que sua pequena irmã de espírito voraz ainda era ingênua demais para enxergar o mundo como ele era e que seu espírito poderia ser facilmente destruí­do, o que de fato aconteceu.

  — Está na hora de crescer, Hannah McCleary.

  Samuel escutava alguns arranjos que deveriam ser agregados à melodia final que estava produzindo. Todavia, sentia que aquelas no­tas não encaixavam com os sentimentos que a música deveria trans­mitir e já estava com o prazo limite para a entrega pairando sobre o seu pescoço como a afiada lâmina de uma guilhotina. Todavia, quan­do colocava na cabeça que algo faltava em uma de suas composições, não a concluía até encontrar aquilo que faltava.

  O compositor largou o fone de ouvido sobre o pequeno teclado e se apoiou no espaldar da cadeira com um suspiro resignado. Samu­el acreditava que a música estava intrinsecamente ligada aos senti­mentos daqueles que a compunham, porém, naquele momento, os seus sentimentos estavam uma verdadeira bagunça, o que acreditava se refletir diretamente em suas falhas tentativas de produção.

  Quando Jackson lhe ligou meses antes, ficou surpreso e incré­dulo. O cantor havia planejado a estadia de cinco meses de Hannah em Seaboard e ela havia concordado com aquela ideia. Depois do tor­por inicial, Samuel deixou uma pontinha de esperança e otimismo se instalar em seu coração, pensando que talvez seu relacionamento com a irmã melhorasse. Mas, infelizmente, Hannah ergueu um muro tão alto que ele não conseguia pular nem mesmo usando os melhores equipamentos de alpinismo.

  Isso o magoava, porque queria entendê-la e ajudá-la, mas a ir­mã sempre o repelia.

  Samuel suspirou e tentou voltar a se concentrar no trabalho, mas a escassa concentração que tentava manter evaporou quando a porta do estúdio foi aberta discretamente.

  — É uma bela melodia — disse Hannah sondando o terreno.

  — Precisa de alguma coisa? — Fingiu estar concentrado.

  — De uma conversa. — Ela se sentou no pequeno sofá-cama.

  O estúdio de Samuel era bem confortável já que o mais velho passava grande parte do tempo ali. Sua produtora concordou que tra­balhasse boa parte do tempo em casa, contanto que participasse das reuniões presenciais e fosse até a empresa pelo menos duas vezes por semana.

  — Oh, então você pode procurar o Jackson ou alguns dos seus outros amigos — disse Samuel ácido.

  — Nós precisamos conversar.

  — Precisamos? — retrucou sarcástico. Ele a encarou com os bra­ços cruzados. — Acha mesmo? — Sorriu irônico.

  Hannah segurou a vontade de revirar os olhos. Às vezes, era di­fícil lidar com todo o sarcasmo e ironia encrustados no irmão. Ela acreditava piamente que Rafael deveria ser canonizado pelo abençoa­do dom que o ajudava a se manter são enquanto lidava com Samuel L. McCleary diariamente.

  — Passamos um mês nos tratando como completos estranhos, sendo que somos irmãos e estamos vivendo debaixo do mesmo teto. Então, sim, precisamos conversar — rebateu.

  — Esqueceu de adicionar os últimos sete anos nos cálculos, Hannah — disse a encarando magoado. — Sete anos sem uma con­versa decente ou ao menos alguma explicação plausível! Sete anos com você me afastando continuamente! — Hannah engoliu em seco.

  Desde que a mídia ficou mais sedenta por informações pessoais e por escândalos que envolviam Hannah, ela se afastou da família. Mesmo triste, seu pai compreendia a situação e sempre falava que, quando a filha quisesse deixar tudo aquilo para trás, ele a protegeria. Sua madrasta também entendia, mas com Samuel as coisas nunca eram fáceis. E Hannah não podia culpá-lo, porque sabia que também usou aquilo como uma desculpa para que eles não conhecessem a mulher fútil que havia se tornado.

  — A única coisa que eu queria era entender você, Hannah. Era ajudar de alguma forma. De qualquer forma.

  Samuel desejava que sua irmã confiasse em si para dividir o peso das feridas que carregava. Sabia que não tinha nenhum direito de se envolver na vida dela sem que ela quisesse, mas queria, pelo menos, compreender parte do que a afligia e ajudá-la a amenizar a sua dor.

  Sentia-se impotente vendo duas das pessoas que amava sofre­rem sozinhas sem poder ajudá-las. Só podia continuar ali encarando enquanto Hannah e Rafael seguiam seus caminhos carregados de fe­ridas e cicatrizes.

  — Uma explicação — murmurou Hannah. Ela encarou o teto.

  Questionava-se se também precisava de explicações. Na verda­de, se as queria. No último mês, as coisas pareciam ser tão mais fáceis quando ignorava todas as feridas sangrentas.

  — Me faça as perguntas que quer — disse encarando o irmão com um sorriso pequeno. — Vou responder as que conseguir.

  — Mesmo? — Samuel perguntou desconfiado. Ela assentiu. — Por que não voltou para casa nos últimos cinco anos?

  — Seaboard fica ao lado de Gumberry. Mateus poderia estar lá e eu não estava pronta para enfrentar esse reencontro e tudo o que ele implicaria — respondeu sincera. — Além disso, se eu voltasse, seria acompanhada de problemas.

  — Por que você estava evitando se encontrar com o Mateus? De que problemas está falando?

  — Nos últimos dois anos que vivemos juntos em Nova York, as brigas estavam quase virando rotina. Às vezes, por opiniões contrá­rias ou por fofocas sem cabimento. — Sorriu melancólica. — Na últi­ma vez que nos vimos, tivemos a briga mais séria de nossas vidas e ele foi embora.

  — Aquele cretino abandonou você? — O mais velho estava in­crédulo.

  — Pode-se dizer que sim — respondeu Hannah e deu de om­bros como se aquilo ainda não lhe causasse uma dor latente. — De­pois que ele partiu, tentei me adaptar à vida que construímos e aos personagens que criamos, mas não deu muito certo.

  — Por quê?

  — O primeiro ano sozinha foi um verdadeiro inferno. Paparazzi onde quer que eu fosse. Entrevistadores que insistiam em perguntar sobre as fofocas que rondavam nossa separação. Colegas que adora­vam xeretar buscando algo que pudessem vender para os tabloides. Acabei tendo algumas crises de ansiedade. — Suspirou cansada. — No final do ano, vieram os ataques de pânico. Mesmo assim, tentei continuar com a minha carreira. Eu gostava de desfilar, provar roupas e dar entrevistas sérias sobre o meu trabalho e o mundo da moda. Mas a minha saúde piorou e eu tive que me afastar de vez.

  — Por que não voltou para casa? Certo que o Mateus poderia aparecer, mas que se foda ele! — disse Samuel irritado e ficou em pé.

  Hannah sorriu encarando o irmão. Samuel não era a pessoa mais hábil do mundo para verbalizar os próprios sentimentos. Então, quando não conseguia colocar em palavras tudo o que sentia, levan­tava e ficava andando de um lado para o outro enquanto gesticulava exageradamente com as mãos.

  — Samuel, eu estava despedaçada — disse calmamente. — A Hannah que desfilava nas passarelas era apenas uma personagem cria­da para sobreviver às câmeras e alimentar o mercado. Ela era a pessoa que o mundo queria ver. — Encarou o irmão. — Eu precisava ficar longe de tudo. Precisava de tempo. Se eu voltasse, traria uma to­nelada de preocupações que o papai, a tia Elisa e você não mereciam.

  — Somos a sua família — retrucou o mais velho inconformado. — Poderíamos ajudá-la. Eu poderia ajudar!

  — Poderia. — Ela segurou as mãos dele e o fez sentar ao seu lado. — Mas aquilo era um problema meu, algo que eu deveria en­frentar sozinha. A última coisa que eu desejava era puxar minha fa­mília para aquela areia movediça.

  Havia feito a sua decisão e não se arrependia. Não achava justo arrastá-los para toda a confusão que sua vida havia se tornado. Além disso, não queria que eles sofressem vendo todo a tempestade que sua mente era e que, nos seus dias mais sombrios, ameaçava a engo­lir.

  Havia partes de si mesma que eram muito difíceis de aceitar e de reconhecer. Hannah não estava pronta para compartilhar isso.

  — Sinto muito por não ter contado antes — disse sincera. — Mas, acredite, foi o melhor para mim e, na minha cabeça, eu estava os protegendo. — Relutantemente, Samuel assentiu.

  — Ainda estou chateado com você e tem muitas coisas que eu quero tentar entender — disse ele. — Mas você tinha seus motivos e já é adulta o bastante para tomar as próprias decisões e arcar com as consequências. — Os olhares se encontraram e os irmãos sorriram.

  As explicações não tinham tranquilizado por completo o coração dele, mas eram um começo. Samuel se manteria ao lado da irmã e, quando ela precisasse, estaria ao seu lado. Mesmo que Hannah relutasse, dessa vez não a deixaria sozinha.

  — Não me afaste, peste. — Ele a puxou para um abraço. Hannah sorriu. — Ah, eu ainda quero saber o porquê de Jackson ter participado da sua vida nos últimos cinco anos e eu não.

  — Você participou, sim — falou Hannah fazendo uma careta com o aperto do abraço. Ela tentou se soltar, mas o irmão não cedeu.

  — Você chama mensagens e ligações escassas de participar da vida de alguém, peste? — Samuel se levantou e enlaçou o pescoço dela com um dos braços fingindo um mata leão. — Você tem muito o que falar sobre isso, pestinha. — Hannah riu vendo que o bom humor dele estava de volta.

  — Você também tem muito o que explicar, Samy — provocou.

  Hannah escutou aquele apelido em uma de suas noites de insô­nia e estava se segurando diariamente para não provocar o mais ve­lho quando ainda não haviam voltado a se falar direito. Mas ele havia lhe dado de bandeja a oportunidade perfeita.

  Samuel afrouxou o aperto ao redor da irmã e o rubor se espa­lhou por suas bochechas até as pontas das orelhas. Hannah não con­seguiu conter a gargalhada. Com certeza agradeceria Rafael por pro­porcionar indiretamente aquela rara reação de Samuel.

Olá, docinhos.

O que vocês acham que vai acontecer agora que a Summer chegou? 

O que estão achando da atitude do Mateus e da Hannah diante dessa situação?

Espero que estejam gostando e que continuem acompanhando

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