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Luan nasceu e eu posso dizer, com total certeza, de que ele foi a melhor coisa que me aconteceu nesses meus 27 anos de vida.
Eu não poderia imaginar como aquele pequeno ser humaninho tinha tanto poder sobre mim. Descobri isso assim que olhei o seu rostinho pela primeira vez.
Ele não tinha nada de mim. Bom, com exceção dos olhos. Em todo o resto parecia uma cópia perfeitamente imprimida de Hugo.
Não vou romantizar o parto, não como a maioria das mães que conheci romantizaram quando tive dúvidas sobre; afinal, estou sendo sincera aqui. O parto é, até o momento, a pior experiência que eu já tive na vida. Algo que espero nunca mais sentir novamente.
A dor era terrível; as contrações e o longo processo de empurra, respira e empurra. Às vezes sentia tantas dores que precisei lutar contra mim mesma para não desmaiar.
Mas no final tudo valeu a pena. Quando ouvi a tosse de Luan, seguida pelo brado retumbante de seu choro, comecei a sorrir. Em meio aos parabéns das enfermeiras e a confirmação da médica de que era mesmo um menino, eu me encontrava gargalhando e chorando ao mesmo tempo.
Hugo estava na sala comigo, no canto, assistindo tudo em completo silêncio, ele também estava chorando e foi o primeiro a ver o rostinho de Luan. Quando ele se aproximou do bebê, ainda nos braços da enfermeira, meu coração parou por um instante e as risadas cessaram.
Fui atingida por um medo estrangulador de vê-lo pegando o bebê no colo e fugindo para longe de mim. O medo de perder Luan para sempre.
Mas, apesar de Hugo ter esticado o braço para segurar o meu bebê, a enfermeira o trouxe para mim, pois, segundo ela, o primeiro contato pele-com-pele do bebê deveria vir da mãe.
Aqueles foram os melhores 15 minutos de toda a minha vida; sentir a sua pele, tocando a minha, pela primeira vez, depois de longos oito meses e três semanas imaginando como ele seria, foi mágico.
Voltei a chorar e rir no mesmo instante, com o rostinho dele grudado na minha bochecha enquanto Hugo sentava-se ao nosso lado e sorria com os olhos molhados para ele.
Cheguei a conclusão de que não sabia o que era amor verdadeiro até aquele momento. A conexão que tive com Luan existia desde o útero, quando ele sentia o que eu estava sentindo e se debatia para se proteger.
Eu o amava, verdadeiramente, e nunca mais iria amar outra pessoa da mesma forma.
Faria de tudo para protegê-lo, tenho certeza disso; pularia na frente de um caminhão sem pensar duas vezes, lutaria contra um leão e, acima de tudo isso, mataria para ver Luan feliz.
Nada deveria machucar o meu filho. Nada.
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Os próximos três meses foram desesperadores. Cuidar de um bebê requer bem mais trabalho do que Hugo e eu, pais de primeira viagem, jamais poderia imaginar.
Mas estávamos indo bem.
Hugo ainda evitava falar comigo e eu também não fazia tanta questão de trocar palavras com ele. Não tínhamos muitos assuntos além dos cuidados com Luan, do que faltava na geladeira e de quem era a vez de acordar para conter os choros do bebê.
A paternidade havia deixado Hugo radiante, ele sempre foi bom com crianças, o seu sonho sempre foi ser pai. Mas isso, infelizmente, não foi o suficiente para torná-lo um companheiro melhor.
A ameaça de morte feita a mim ainda pairava pelo ar dentro daquela casa; o ciúme havia se tornado cada vez mais excessivo. Ele queria saber onde eu estava, com quem estava indo e o motivo por ter demorado tanto lá.
Quando me recusava a responder algumas de suas perguntas, ele me encarava com um olhar furioso, cerrava as mãos e começava a ranger os dentes de forma assustadora. Então, rendida ao medo de levar um soco ou coisa pior, eu contava tudo.
Imaginar que nosso filho iria crescer num lar assim, assistindo a sua mãe com muito medo de mentir para o seu pai, me deixava triste. O bastante para temer que Luan acabe achando tudo aquilo normal e tome Hugo como exemplo.
Além do mais, não queria ser uma refém em minha própria casa.
Decidi que deveria dar um basta nos abusos quando Hugo voltou a apertar o meu braço e me chamar de imprestável. Tudo começou quando lhe contei sobre os meus planos para começar a introduzir fórmula na alimentação de Luan, pois eu não estava produzindo a quantidade de leite suficiente para nutri-lo.
Estávamos sentados na mesa, com ele trabalhando no notebook, ele simplesmente tirou os olhos do computador e lançou-me uma risada maldosa.
- Bem que meu pai avisou que você não servia para isso - disse numa naturalidade assustadora - Se não presta para ser mãe, acho melhor eu começar os preparativos para tirar a guarda dele de você, o que acha?
Fui consumida pela raiva assim que ouvi aquilo. O comentário deu início a uma nova onda de discussões, comigo tomando o notebook de sua mão e o espatifando no chão enquanto ele devolvia todos os xingamentos que eu lançava.
Por fim, lembrou-me que preferia me ver morta a me perder.
Aquela briga foi a apenas três dias. Me assustava o fato de Hugo conseguir agir normalmente depois de me insultar tantas vezes e ameaçar de morte.
Simplesmente acordou no dia seguinte, tomou o seu suplemento diária antes de sair para treinar, voltou para casa, tomou banho e se vestiu para trabalhar. Antes de sair, me procurou na cozinha e perguntou se Luan precisava de fraldas ou leite.
Passei o resto do dia elaborando um plano para fugir com Luan, até cheguei a arrumar uma das malas, mas lembrei do sufoco que passei pulando de hotel em hotel da última vez que fugi de casa, se já foi difícil me esconder de Hugo sozinha, estando com um bebê nos braços seria impossível.
A verdade é que era impossível fugir de Hugo. Eu não tinha escapatória. Para que Luan e eu pudéssemos ser felizes, eu teria que dar um jeito de me livrar de Hugo, de uma vez por todas.
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Enquanto Hugo trabalhava fui visitar Nicole. A certeza de que ele estava me vigiando só se concretizou quando ele me ligou assim que saí de casa, perguntando para onde eu estava indo.
Não duvido que tenha instalado em meu celular algum aplicativo de rastreio, ele tinha a minha senha e acesso livre as minhas coisas.
Hugo não gostava de Nicole e Nicole não gostava dele, mas tinha que aturar o fato dela ser madrinha do nosso filho e gostar de visitá-lo periodicamente ao longo da semana. Então, quando ouviu aquilo, fez um som com a boca e desligou a ligação.
Cheguei na casa de Nicole e ela logo foi abraçar Luan, mas não fui ali para conversar com ela. Usei-a como desculpa para poder bater na casa de Joseph.
Deixei Luan com Nicole e atravessei a cerca viva que dividia o quintal de Nicole do dele. Bati na porta e o vi aproximando-se.
- Oi - suspirei.
- Oi - Joseph não entendeu o motivo de eu estar ali, aquilo estava estampado em seu rosto.
- Eu... - Aponto para o interior de sua casa - Posso entrar?
E então Joseph sai da frente, permitindo a minha entrada.
A sua casa estava mais vazia do que eu me lembrava. Não consegui encontrar a mesa de vidro redonda que transamos a alguns meses e nem alguns armários pendurados na parede. Caixas enormes e pequenas encontravam-se espalhadas por todo o lugar.
- Está se mudando? - deduzir aquilo me deixou triste.
Volto o rosto para Joseph logo depois de ter passado os olhos pela sala de estar e de jantar de sua casa. A planta da casa dele era quase semelhante à da minha, com pequenas alterações. A minha cozinha, por exemplo, era maior.
- Sim, é melhor assim - ele responde.
Joseph fecha a porta e caminha até a sala de estar. Na televisão passava a reprise de algum jogo de futebol, ele baixa o volume e senta-se no sofá.
Estava vestido de forma despojada, como quem não estivesse esperando visitas. Sem camiseta e com um calção de futebol laranja da Nike.; seus cabelos loiros encontravam-se perfeitamente ondulados em sua cabeça, mas a barba não fora penteada.
- Tem muitas lembranças ruins nessa casa - Joseph murmura no sofá, os olhos estão fixos em mim - Agora que Spike morreu e sou só eu e eu mesmo, achei melhor colocá-la à venda.
Eu me aproximo e sento do seu lado no sofá, ainda estou digerindo aquela informação e o gosto é amargo demais.
- Vai para muito longe? - perguntei.
Joseph ajeita a sua posição no sofá, respira e espreme o maxilar.
- Gosto do conforto que um apartamento trás, era de Cecília o sonho de ter uma casa - ele disse - Pensei em me mudar daqui várias vezes depois que ela se foi. Comprar um AP. Mas Spike era bagunceiro demais para isso. Agora que ele se foi, comprei um no centro, perto de Sarah e do hospital.
Estou brincando com uma mecha dos meus cabelos enquanto escuto aquilo, ainda desacreditada que ele estava indo embora.
- A sua filha... - eu suspiro - Como anda o processo de aguarda?
- Lento - respondeu Joseph - Mas Selma concordou em deixar eu vê-la mais vezes ao longo da semana. O meu advogado disse que pode conseguir uma autorização com a juíza para ela passar alguns fins de semana comigo. Estou bem animado quanto a isso.
Eu dou-lhe um sorriso gentil, estava genuinamente feliz por ele.
- Então, Laura - Joseph aproximou-se de mim, acariciou o meu cabelo com as pontas dos dedos de uma de suas mãos e depois envolveu a minha mão que brincava ansiosamente com a mecha dos meus cabelos - Por que está aqui? - Joseph está sorrindo - Acredito que não seja para vir comigo. Mesmo que a proposta ainda esteja em pé.
A minha boca está seca, por um segundo esqueço o motivo de ter vindo aqui.
- Eu só... - limpo a garganta - Lembra da nossa última conversa na farmácia?
Ele confirma com um movimento de cabeça.
- De ser negado por você depois da minha declaração? - murmurou - É claro que lembro.
- Então deve se lembrar da outra proposta que fez - ainda estou incrédula com o que vou dizer, precisava de muita coragem para pedir aquilo, então pensei em Luan e em sua segurança - Sobre se livrar de Hugo. Sobre ter contatos que podem fazer tudo parecer um acidente.
Joseph me encara por alguns segundos, não consigo identificar o que ele está pensando. Se afastou de mim e encolheu os ombros de maneira inquieta.
- Olha Laura - ele começou a dizer - Eu realmente sinto muito por isso. Não quis te assustar. Fui guiado pelo momento e pela paixão que sinto por você. Foi tudo da boca para fora.
Eu pouso a mão em sua coxa, meus olhos estão fixos nele, para que ele saiba a seriedade do que estou pedindo.
- Hugo ameaçou me matar - eu digo - Varias vezes.
Joseph suspira de forma incrédula.
- Eu... eu estou sem nenhuma saída.
Ele põe a mão sobre a minha em sua coxa e aperta meus dedos. Estou prestes a chorar quando ele me trás para si e me dá um abraço.
- Tudo bem, Laura - ele diz - Tudo bem. Vai... Vai ficar tudo bem.
Eu tirei a cabeça de seus ombros e beijei os seus lábios.
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