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Hugo encontrou o hotel onde eu estava hospedada no terceiro dia.

Não sei exatamente como, eu não havia exposto a minha localização nem para a minha equipe de marketing ou os amigos mais próximos. Mas lá estava ele, no terceiro dia depois do natal, plantado do outro lado da pista, me ligando sem parar.

Reconheci o seu carro imediatamente quando surgi na janela. Hugo saltou do veículo segurando um buquê de flores e caminhou alguns metros até a sombra da árvore mais próxima, o celular estava grudado na orelha e os olhos lançados na direção do hotel.

Estou desaparecida da internet desde o natal, as pessoas tem começado a fazer perguntas, mesmo assim, não estava pronta para aparecer nem nos meus stories do instagram.

O inchaço em meu rosto, provindo do tapa dado por Hugo, também desapareceu no terceiro dia. O que me deixou mais calma. Podia, finalmente, voltar a sair em público sem medo do que os outros perguntariam.

Eu poderia simplesmente contar tudo, dizer o que Hugo fizera a mim na noite de natal, colocá-lo como o vilão de toda a história. Alguns da internet iriam duvidar, Hugo era gentil e bondoso demais para levantar suspeitas, mas o caso certamente iria repercutir.

Mesmo assim eu não conseguia. Era incompetente demais para fazer o inferno na vida de Hugo.

Dentro de mim, uma voz de arrependimento dizia que ele não merecia isso; começava a pensar em todas as coisas boas que ele fez a mim durante o nosso relacionamento. Tinha pena do seu choro e pensava o quanto era injusto para ele, depois de ter me apoiado tanto durante meu pior momento, receber a chuva de haters que eu moveria na sua direção.

É tolice dizer que ainda gostava dele, mas era a verdade. Não é fácil abandonar os sentimentos por alguém que esteve ao seu lado durante tanto tempo, por pior que fosse essa pessoa. Nem tudo era um caos.

Era complicado demais pensar sobre isso, eu não sabia se era amor, medo da solidão ou apenas pena, mas aquele sentimento estava lá, proliferado e infectando tudo dentro de mim.

Quando ele me encontrou no terceiro dia, senti um pingo de felicidade. Era doentio, eu sei, não estava disposta a voltar para Hugo mas nesse mesmo terceiro dia acabei criando uma conta fake para acompanhá-lo na internet, notando então que ele havia apagado todas as suas redes sociais.

No twitter, algumas pessoas começaram a perceber a nossa ausência, fazendo teorias e marcando os nossos agentes para ter respostas.

Enquanto pesquisava por Hugo, senti uma pontada no coração, querendo saber como ele estava. Eu havia ignorado as suas ligações durante todos esses dias, bloqueado o seu número e todos os outros que ele comprou para me ligar; deveria manter-me rígida quanto ao sentimento que ameaçava surgir.

Quando notou que eu não pretendia descer ou atender o telefone, Hugo atravessou a pista, desaparecendo do meu campo de visão quando entrou no hotel. Segundos depois o interfone tocou, a portaria perguntava se eu conhecia Hugo e se o queria em meu quarto. Obviamente eu neguei a sua visita, mesmo assim ouvi os murmurinhos e ele brigando com alguém.

Não sei o que aconteceu depois de eu ter desligado o interfone, mas minutos depois Hugo estava voltando para a sua sombra do outro lado da pista, sentando num dos bancos virados para a praia e observando, por bastante tempo, as ondas numa distância de cem metros dele.

Da janela, no meu quarto de hotel, não conseguia ver o seu rosto, mas pelo movimento de seus ombros e pela necessidade dele esfregar o seu rosto a cada cinco segundos, eu imaginei que estivesse chorando.

A batida na porta me fez tirar os olhos de Hugo. Fui atender, perguntando antes quem era. Abri quando recebi a resposta, uma das funcionárias do hotel segurava o buquê de flores com um envelope branco, estendeu em minha direção, explicando que o rapaz praticamente implorou para que aquelas flores fossem entregues.

Rosas vermelhas. Vermelho era a minha cor favorita e Hugo sabia disso. Deixei as flores sobre a cama e abri o envelope. Havia um bilhete pequeno e a chave de nossa casa no Paraíso Parque, o bilhete avisava que Hugo estava na casa de seus pais até tudo ser resolvido, por enquanto a nossa casa no condomínio estava vazia e, eu poderia voltar.

No bilhete Hugo informava que não iria aparecer sem ser convidado, terminando-o pedindo, mais uma vez, desculpas pelos seus atos.

Passei um bom tempo observando a chave, me perguntando se deveria ou não acreditar no que foi lido. De certa forma eu já estava cansada de hotéis.

Depois que fui embora na noite de natal, pensei em retornar para o nosso antigo apartamento, mas Cirlene morava no prédio da frente e notaria a movimentação estranha no nosso andar. Se Hugo demorou três dias para me encontrar num hotel, levaria apenas minutos para ele surgir no apartamento.

A ideia de voltar para casa me alegrava, mesmo assim não estava pronta. Não me senti segura. Hugo ficou sentado naquele banco, virado para a praia, durante um dia inteiro. O relógio estava prestes a marcar nove da noite quando ele levantou-se, entrou no carro e partiu. Eu fiquei na janela, durante todo o dia, observando-o. Era mais forte do que eu.

O lado bom daquilo é que ele não retornou no dia seguinte, também parou de ligar. A ausência de Hugo começou a deixar um buraco em meu peito, mesmo assim, me segurei.

Quase uma semana depois, perto do ano novo, recebi a visita de Nicole. Ela atravessou a porta do meu pequeno quarto de hotel com uma carranca em seu rosto, tirou os óculos de sol e deslizou os olhos pelas paredes brancas do quarto.

- Modesto - ela balbuciou, caminhando até a janela enorme que dava vista a praia de Boa Viagem - Ao menos tem uma visão bonita.

- Foi o melhor que consegui encontrar - eu disse - Ainda assim fui descoberta.

- Hugo veio aqui?

Eu apontei com o rosto na direção das flores murchas sobre a cômoda.

- Você deixou ele entrar? - Nicole caminhou até as flores, estudou-as e depois às voltou para a cômoda.

- Não - eu respondi - Ele tentou, mas não passou da portaria. Ficou sentado ali o dia inteiro, olhando para o mar. Depois foi embora.

- Tiveram contato? - Nicole sentou na cama. Vestia uma calça viscose preta e uma blusa de algodão branca que fazia contraste com o seu batom vermelho e os óculos escuros.

- Não - eu murmurei.

Nicole suspirou.

- Pelo que as madames comentam no grupo, a casa de vocês está vazia desde o natal - ela comentou - Hugo também não foi visto perambulando pelo condomínio depois disso.

- Ele também trouxe a chave - eu revelei - Disse que ficaria na casa de seus pais até tudo se resolver. Eu estou livre para voltar.

Nicole sorriu, intrigada.

- Vai voltar?

- Eu não sei.

- Ora, menina, eu não pensaria duas vezes antes de voltar para casa - ela murmurou - Qualquer coisa é melhor do que esse cubículo que você chama de quarto.

Senti um comichão subir o meu braço.

- Ainda não estou pronta - murmurei - Não quero voltar. Não para aquela casa.

Nicole me olhou por bastante tempo, tentava pescar, por meio da minha reação, o motivo de todo o meu medo.

- A briga de vocês foi tão feia assim?

É óbvio que eu não contei sobre o tapa, o surto de Hugo e as marcas de dedos que ele deixou quando me arrastou do carro para dentro de casa. Nicole achava que nossa briga havia sido apenas por ele ter tirado dinheiro sem permissão de nossa conta conjunta.

Eu balanço a cabeça em confirmação. Ela era uma mulher esperta, sabia que havia muito mais além do que eu tinha lhe revelado, também sabia que eu não estava confortável para entrar em detalhes.

Nicole encolheu os ombros.

- E até quando pretende ficar aqui? - ela perguntou.

- Não sei ao certo - eu disse - Não tenho para onde ir. Não conheço ninguém.

Eu poderia ir para a casa do meu pai, conhecer finalmente as minhas outras irmãs, mas meu pai era um sangue-suga e, estar perto dele, me fazia lembrar do quanto a minha mãe sofreu em suas mãos. Minhas meia-irmãs eram apenas adolescentes, jovens demais para entender o ódio que eu sentia por ele.

Nicole indignou-se com a minha resposta.

- Pretende passar o réveillon nesse quarto minúsculo? - ela ergueu-se da cama.

Eu não me importava. Não seria o primeiro réveillon passado num quarto minúsculo e branco; inclusive, o meu último fora num quarto, chapada demais para ouvir os fogos de artifício.

- As madames irão dar uma festa, para todos os moradores do condomínio, irei passar a virada do ano com elas - disse Nicole - E você vem comigo.

- Nicole... Eu não...

- E sem desculpas - ela foi incisiva - arruma as suas malas, vai morar comigo até tudo se resolver entre você e Hugo, entendeu?

Eu estava inclinada a dizer não, mas Nicole lançou-me um olhar aterrorizante, então eu confirmei.

- E não se preocupe com Hugo, se ele aparecer, eu o expulso na base da vassourada!

Eu gargalhei com aquilo, não havia motivo para me preocupar com Hugo, pelo menos não na primeira semana do novo ano.

Os Cassius tinham o costume de passar o ano novo num de seus casarões numa cidade praiana aqui do litoral, eram horas de viagem e Hugo sempre os acompanhava. Mesmo nesse caos, duvido muito que ele diria não ao seu pai.

Eu vou até a comoda com as minhas roupas, separando-as e dobrando. Nicole já havia pego a mala do lado da porta e a colocado sobre a cama.

Demora um tempo até eu organizar tudo, mas quando termino me sinto feliz. Nicole está à porta, aguardando a minha saída.

Dou-lhe uma mala e arrasto outra, chegamos no elevador, mas antes de eu apertar o botão para chamá-lo para o nosso andar, Nicole põe a mão em meu ombro e me força a encará-lá.

- Você não está só, querida - ela murmura para mim - Agora que entrou em minha vida, vai ter que batalhar muito para sair dela.

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