Capítulo 24
No dia seguinte tivemos tempo de dormir até tardee arrumamos maneiras de contar aos outros o que havia acontecido no encontro danoite passada. Todos tiveram que controlar suas reações sobre o "Número Onze", que na verdade eram os fundadores de Fantasy. Originalmente eram doze, mas a Rainha dos Vampiros agora era do time inimigo e foi retirada da conta.
O dia passou depressa e tirando algumas indiretas do Ethan sobre não ter pagado a aposta ainda, tudo correu estranhamente bem. Estava voltando para o meu quarto, um pouco depois de falar com Cameron e Camilla (que haviam saído para a reunião de hoje), quando alguém segurou meu ombro e quase me matou de susto.
— Senhorita Alessia, tenho uma convocação para você. — Leslie falou antes mesmo de me virar para olhá-la.
— Que tipo de convocação? — virei-me tentando controlar os ner-
vos.
— Seu mestre de doação está reclamando que você o está evitando e que não o deixa se aproximar para poder beber seu sangue. — meu coração acelerou de forma anormalmente rápida. Tentei não expressar o pavor que estava sentindo.
— Estou doando sangue regularmente ao Ethan. Qual seria o problema? — fingi esquecer o Mestre das Sombras.
— Não me refiro a esse mestre. — e sorriu maliciosamente.
— Ah. Não mesmo? Não me recordo de outro... — segurou meu antebraço com força e me fuzilou com o olhar.
— Acho melhor você ir até onde ele está no momento e permitir que beba do seu sangue, do contrário creio que não resistirá muito mais tempo e infelizmente você será culpada por sua morte. — então, soltou meu braço bruscamente e saiu caminhando pelo corredor.
Fiquei parada tentando captar a mensagem e comecei a ter certeza de que ela era louca. Não poderia estar falando sério! Era o brinquedinho dela! Precisava dele! Ou do poder dele! Jamais o deixaria sem sangue para que morresse. Estava blefando! Com toda certeza era mentira!
Voltei para o meu quarto sem me importar com o que Leslie disse e entrei no chuveiro para lavar de vez suas palavras da minha mente. Após o banho, deitei na cama e peguei o livrinho de Ária para voltar a aprender sobre as coisas aqui em Fantasy. Deixei a cortina da janela aberta para que a luz do luar iluminasse o livro e me permitisse ler. Depois de um tempo comecei a me sentir sonolenta e fechei o livro.
Ao olhar para o quarto, tudo que podia ver era a escuridão, menos sobre minha cama, onde o luar iluminava. Era agradável dormir sobre a luz do luar, no silêncio da noite... então vi no canto do quarto, algo que não era normal, era a escuridão assumindo uma forma. A coisa começou a serpentear até minha cama e tive que segurar o impulso de gritar e sair correndo pela porta como uma louca. Fiquei encolhida o mais perto da janela e da luz da lua que consegui. Lembrei que as trevas odiavam qualquer tipo de luz, porém dessa vez não funcionou. A escura névoa serpenteante começou a subir na minha cama e avançar em minha direção.
"Ele precisa de você...", uma voz sibilou na escuridão. "Precisa de seu
sangue."
— Quem está aí? Do que estão falando? — queria chorar, gritar e sair correndo dali, mas não podia.
"O nosso mestre... Leslie e a Rainha não o alimentaram por não ter te matado antes. Não quis se aproximar porque seria perigoso e poderia te matar..., mas precisa de você agora, senão vai morrer", meu coração batia em um ritmo frenético e enlouquecido, estava com medo, mas as trevas não estavam me machucando como fizeram antes. Estavam pedindo a minha ajuda! "Por favor... ele sente muito pelo que fez! Não foi culpa dele! Foi nossa! Nós o fizemos se descontrolar!"
— Não posso deixá-lo morrer... — disse mais para mim do que para elas. — Não sou como a Rainha ou Leslie. Por mais que saiba que não faria isso por mim, não posso deixá-lo morrer por minha causa.
"Ele está assim porque se recusou a procurá-la para pedir seu sangue", isso me pegou de surpresa.
— Ele se recusou? — afastei-me um pouco da janela.
"Sim. Leslie mandou que te atacasse e matasse aos poucos, mas ele
não quis."
— Por que não? — afastei-me completamente da luz e cheguei mais
perto da escuridão.
"Porque não queria te machucar."
— Tudo bem. Eu vou, mas como chego até ele?
"Nós a levaremos.", a névoa começou a se enroscar em minhas per-
nas e senti seu toque frio e eletrizante.
— Esperem! Não posso ir assim! — lembrei que estava vestindo apenas uma camisola branca de alças finas e tecido realmente leve, quase transparente.
"Não se preocupe, no escuro nada se vê", senti um arrepio correr minha coluna quando me embalou por completo. Ao voltar a enxergar, reconheci que estava no quarto do Mestre das Sombras e havia algumas velas vermelhas acesas, iluminando parcialmente o quarto.
"Gostou da iluminação? Quando descobriu que a traríamos aqui, preparou para que não sentisse medo."
— Vocês retornaram... — ouvi uma voz fraca sussurrar de algum canto do quarto. Olhei para a cama e o vi. Estava muito pálido e havia bolsas escuras sobre seus olhos cor de mel, suas presas estavam projetadas e reluziam na luz das velas, seu cabelo escuro estava completamente bagunçado e suas vestes eram leves como se estivesse com febre. Um lençol estava dobrado na beirada da cama.
— Elas me disseram que precisava de ajuda. — tentando controlar a tremedeira em que meu corpo estava. O quarto dele era frio como as sombras que me trouxeram aqui.
— Estava rezando para que não a encontrassem, ou não a persuadissem. — sussurrou e as sombras me encorajaram a dar um passo à frente.
— Por que não queria que me encontrassem? — mas não teve muito
tempo para responder. Assim que perguntei as sombras me empurraram em direção à cama e arranharam minha pele, do ombro até a clavícula, fazendo um traçado de sangue escarlate.
Acabei caindo em cima dele e ao olhar novamente em seu rosto, pude ver o brilho vermelho da sede em seus olhos. Tentei não entrar em pânico, mas meu coração batia mais rápido que o normal e sentia o sangue pulsando por todo o corpo. Não era isso que havia vindo fazer? Oferecer meu sangue para que não morresse? Sim, vim fazer isso, mas não queria que me atacasse da forma como estava prestes a fazer.
— Não queria por causa disso. — e me segurou me ajudando a deitar ao seu lado ao invés de em cima dele.
— O que vai fazer? — não conseguir controlar o medo em minha voz.
— Nada. — no mesmo instante as sombras chiaram e avançaram em nossa direção. Ele me puxou para perto de si com dificuldade e me envolveu de forma protetora, o que me deixou completamente confusa.
— Não vai tentar me matar?
"Era o que deveria fazer"! A névoa praticamente gritou em resposta.
— Você quer me matar? — fitei seus olhos alarmada.
— Não. — A névoa investiu sobre nós, mas não teve coragem ou poder para machucá-lo. — Por quê?
— Não quero matar você. — e com a mão direita começou a acariciar meu rosto, fazendo meu coração disparar novamente. — Você deve me odiar pelo que te fiz, mas eu avisei. Avisei que não conseguia me controlar na maior parte do tempo e acabava ferindo as pessoas que tentavam se aproximar de mim.
— Eu te vi conversando com Leslie.
— O que ouviu? — sua expressão era confusa.
— Que você planejava ganhar minha confiança para depois me entregar. — senti um aperto no coração.
— Disse isso, mas não foi o que aconteceu. Quando descobri o que realmente queriam de você, desisti. E por isso te entreguei mais cedo como humana. Queria que fosse minha doadora e escrava para que pudesse protegêla.
— E tentei confiar em você. — tomei coragem e tentei fazer o certo. — Você traiu minha confiança e me atacou mais de uma vez! Como pretende que ainda confie em você?
— Sei que não é certo confiar em mim depois de tudo... — seus olhos estavam voltando ao tom de mel. — Mas também sei que você quer acreditar em mim. Que você quer confiar em mim.
— Querer não é poder. E só quero confiar em você porque detesto a sensação de ter errado e depositado a minha confiança em um traidor. — e o encarei tentando parecer séria e decidida. Ignorei o bolo que se formava em minha garganta, quando voltei a me concentrar em seus olhos e vi que estavam marejados.
— Entendo. Só que não acredito em suas palavras, sei que é mentira.
— Sabe? Tem certeza? — e uma ideia começou a se formar em minha mente.
— Não exatamente.
— Então beba meu sangue e vasculhe minha mente. Descubra se estou ou não mentindo. — minha voz soou firme e confiante e as sombras chiaram de ansiedade e desejo. Meu plano era que se concentrasse em descobrir se o que disse era mentira, assim não se importaria em vasculhar mais fundo as memórias que tentei esconder sobre a reunião e a Caverna de Cristal.
"Isso... beba o sangue dela.", névoa sussurrou de forma sedutora.
— Tudo bem. — sustentou meu olhar de uma forma que fez meu coração pular e meu corpo arrepiar. Ele era muito bonito! Concentre-se! Não pode encontrar suas memórias!
Ajeitou-me na cama de forma suave e tomou cuidado para as sombras não se encostarem a mim novamente. Depois, se ajeitou sobre mim colocando uma perna de cada lado do meu tronco e se apoiando em um dos braços. Com o outro tirou os cabelos que estavam colando no sangue que escorria do corte e por fim, inalou o ar ao nosso redor.
— Você se alimentou direito hoje?
— Sim, não vou morrer ou deixá-lo mais fraco. — então, avançou sobre o corte que as sombras haviam feito em meu ombro e começou a sorver o sangue. Dessa vez não senti dor alguma. Isso não é bom! Quanto menos dor sentir, mais memórias conseguirá ler. — Faça outro corte. Esse não parece apropriado, já que não foi você quem o fez.
— Tem razão. — e cicatrizou o corte que ia do ombro até a clavícula. — Onde devo fazer o outro? — sua voz soava sedutora e maliciosa. Senti meu corpo tremer e rezei para que não percebesse.
— Ahn... Pescoço? — e desviei o olhar do dele.
— Talvez... — senti seus dedos acariciando meu braço esquerdo. Engoli em seco e comecei a observar seus movimentos.
— Por favor, vá logo com isso. Preciso retornar ao meu quarto. — e podia jurar que estava ouvindo meu coração batendo descompassado.
— Por que a pressa? — e inclinou de leve a cabeça para o lado. Seus olhos estavam completamente vermelhos e sua expressão mudara. — A diversão ainda nem começou.
— Por favor, beba logo e me deixe ir. — tentei soar gentil e doce, ao
invés de irritada e assustada.
"Agora as coisas estão começando a ficar interessantes", a névoa sussurrou e começou a nos rodear mais de perto.
— Calem a boca! São vocês que estão fazendo isso com ele, não é? — gritei para elas. Zein me olhou assustado e confuso. — Elas estão te manipulando! Você vai me machucar!
— O que...? — parecia ainda mais confuso e seus olhos começaram a mesclar entre vermelho e mel novamente. As sombras chiaram irritadas e avançaram mais.
— Elas querem que me mate! Prometeu que não faria isso! — segurei seu rosto entre minhas mãos e o forcei a olhar em meus olhos. Ao mesmo tempo senti as sombras começarem a rasgar a barra da camisola e subirem devagar, tentando rasgar completamente o tecido fino. — Você precisa sair dessa! Não deixe te controlarem!
"Ela está mentindo! Isso é o que você quer fazer! Faça!", o corpo dele estremeceu. Percebi que estavam rasgando as roupas dele também e isso me fez entrar em pânico.
— O que diabos vocês estão fazendo? — tentei não gritar muito alto, minha voz saiu aguda demais.
"O que todo vampiro deseja de uma doadora e escrava."
— Por favor, não! Você queria ser meu amigo, lembra? Meu amigo! — Comecei a entrar em desespero, ainda segurando seu rosto entre as mãos.
"Ela mente! Está tentando te enganar para fugir! É uma mentirosa!" As trevas começaram a se enroscar em nossos corpos, conforme rasgavam as roupas.
— Você é uma mentirosa. — Zein olhava em meus olhos com uma expressão vaga.
— Não! Por favor, acredite em mim!
— Sim, é uma mentirosa. — a névoa já havia avançado até seus joelhos e agora trabalhava na blusa, enquanto em mim havia avançado até a cintura e agora corroía as alças da camisola.
— Parem! — e soltei o rosto dele tentando segurar o tecido que me era arrancado. Tentei me debater, mas começaram a me arranhar e ferir.
— Continuem. — ordenou em alto e bom som. As trevas estremeceram, mas pareceram rir e aceleraram o trabalho, arrancaram a camisa que vestia e terminaram o trabalho com minha camisola, me deixando apenas com as roupas de baixo e o deixando com uma calça esfarrapada. — Cubram-nos com os lençóis! Daqui em diante continuo sozinho! Saiam! Deixem-nos em paz! — sua voz estava cheia de poder.
Senti o desespero tomar conta de mim e as lágrimas me escaparem pelo rosto. As trevas ficaram irritadas com a ordem, mas desapareceram do quarto e ali não havia mais sombras, apenas algumas penumbras realizadas pelas velas acesas. Puxou o lençol e deitou ao meu lado como se estivesse desmaiando. Não entendi o que estava acontecendo. Automaticamente puxei o lençol sobre mim e o observei atenta.
— Desculpa. — algumas gotas de suor escorriam de seu rosto.
— Você lutou contra elas... — não conseguia acreditar e não pude deixar de sorrir ao compreender.
— Não podia deixá-las te machucar. — e virou o rosto para mim. — Principalmente me usando como arma.
— Eu sabia! — não consegui conter o impulso de abraçá-lo e quando fiz isso, senti que estremeceu e um arrepio correu minha coluna. Demorou um pouco, mas ele retribuiu o abraço.
— Mentirosa. — e sorriu de leve.
— Então foi por isso que me chamou de mentirosa?
— Sim, li sua mente e você mentia sobre o que estava dizendo. Você confia em mim e não apenas porque é orgulhosa.
— Leu minha mente? — esqueci-me de conter a preocupação que po-
deria entregar o segredo.
— Sim. — seu rosto ficou sério. — Mas havia uma parte que não consegui ler. Você bloqueou essa lembrança. Engoli em seco sem saber o que dizer. — Tudo bem. Não quero que me conte. Sei que não pode confiar em mim por completo por causa das trevas e não vou pedir que confie. Acho melhor esconder seja lá o que for de mim.
— Obrigada. — finalmente o soltei do abraço.
— É melhor você voltar ao seu quarto antes que as trevas descubram que não estou fazendo o que elas pensam que estou. — e se sentou na cama.
— Certo. — levantei-me enrolada no lençol.
— Você não pode voltar assim. — analisava-me preocupado. Senti meu rosto corar.
— É verdade... — desviei o olhar do corpo dele para um canto no quarto. Senti meu sangue gelar ao perceber as sombras se movimentando até mim. — Ah, não!
— Não cheguem perto dela! — e se posicionou na minha frente.
— Espere. — senti uma espécie de vertigem e uma confiança estranha naquela coisa que se movia até mim. — deixe se aproximar.
— Tem certeza?
— Tenho. — saiu da frente e as sombras começaram a se aproximar de mim e se enrolar nas minhas pernas por debaixo do lençol, subindo pelo meu corpo. Terminaram em meu pescoço e soltei o lençol ao perceber o que haviam feito.
— Como...? — Zein parecia confuso.
— Elas me ajudaram de novo. — sorri gentilmente para as sombras que saiam de mim.
— Elas já fizeram isso uma vez?
— Já. Mais de uma.
— Você... tem poderes com as trevas?
— O quê? Não!
— Tem sim! Do contrário as sombras jamais a ajudariam sem que eu
pedisse!
— Mas... — tentei pensar em um argumento, porém não consegui. — Pode não contar a ninguém?
— Claro. Vou manter segredo.
— Sorria. Isso pode ser bem útil para você, já que controla apenas a
parte boa da escuridão.
— Parte boa da escuridão?
— Sim. As sombras. Controlo as trevas e a névoa escura, que são as partes malignas da escuridão. No entanto, você controla apenas as sombras, a parte "boa".
— Isso é... estranho, mas também incrível.
— Sim. Quando estiver pronta, é melhor contar a seus amigos.
— Tudo bem. Agora preciso ir.
— Tenho certeza que irão encobri-la até seu quarto. Adeus. — e virou de costas para mim.
— Até breve. — deixei que as sombras me guiassem de volta ao meu quarto. Na manhã do dia seguinte, enquanto nos arrumávamos para almoçar com o pessoal, Cameron me contou como fora o encontro do dia anterior. Haviam contado o plano a ele e a Camilla, que conheceram os fundadores e ficaram emocionados ao saber que estavam vivos.
— Então tivemos que vir embora e Ária nos pediu para contar tudo
aos outros.
— Quem de vocês foi o guia?
— Foi Ária quem nos guiou.
— E quando voltaram ao castelo, os guardas desconfiaram?
— Não. — disse enquanto saíamos do quarto.
— Que ótimo! — sorri e o segui pelo corredor.
— Sim. Você ficou no quarto ontem ou foi dar umas voltas?
— Ah! Eu... — não pude deixar de me lembrar do que ocorreu e um leve pânico percorreu meu corpo e me fez gaguejar. Disfarcei com um riso forçado. — Fiquei no quarto estudando.
— Sério? — Cameron riu. — Que aluna aplicada...
— Pois é. — ri de leve e me senti aliviada quando mudou de assunto.
...
A semana passou rapidamente e logo chegou o sábado, dia da reunião em que iriam Ethan e Camilla. Durante a semana tentamos agir normalmente, como se não armássemos uma conspiração em segredo. E ainda me sentia um pouco mal por não confiarem de contar o plano para mim. Ao mesmo tempo em que me sentia mal, sabia que era o certo e que poderia não resistir completamente ao Mestre das Sombras em algum momento, o que com certeza estragaria tudo.
Essa foi uma semana de apresentações, Camilla e Julie me apresentaram mais amigos que se juntariam a nós no plano contra a Rainha. Eram ao todo umas seis pessoas: Carrie, a ninfa, Melanie, a feiticeira, Jasper, o elfo carpinteiro que morava perto do lago das fadas (seja lá onde isso fica), Giulia, a fada da terra, Roger, o troll que vivia nas florestas atrás do castelo e Milene, uma das poucas druidisas da escola.
Já era noite de sábado. Cameron havia saído com o pessoal para lhes contar mais algumas coisas sobre o plano e ficara no quarto lendo o livro de Ária. O capítulo que lia falava sobre festividades e adorei saber que Fantasy era apegada a bailes como os de antigamente. Havia no total, três bailes oficiais no ano: o Baile Nivoso, que simbolizava a chegada do inverno, o Baile Floreal, que simbolizava a chegada da primavera e o Baile Frutidor, que simbolizava a época das colheitas.
A decoração do Baile Nivoso era toda composta por flocos de neve e gelo, as pessoas se vestiam com cores que simbolizavam o inverno. Os rapazes se vestiam como príncipes e as garotas como princesas e isso era realmente encantador. Será que eu poderia participar de algum baile?
Havia no final do baile, próximo à meia noite, a Grande Valsa que, como as de antigamente, todos os presentes tinham que dançar. Durante a valsa, tinham também que trocar de pares até encontrar o seu novamente. Isso era tão fantástico! Espera... quer dizer que só entraria quem tivesse um par? Isso não era muito legal... se bem que para dançar também se precisa de um par, então talvez esteja me confundindo sobre isso ser algo bom.
Ouvi batidas na janela do quarto e quase tive um ataque cardíaco. Levantei com cuidado e fui até a janela, mas ao olhar para fora não vi ninguém e achei meio óbvio não ver, porque o quarto ficava no terceiro andar.
— Abra a janela! Ande logo! — ouvi uma voz conhecida e fiquei confusa, mas abri a janela. Senti um vento forte bater e me afastei rapidamente, então um minitornado entrou no quarto e dele saiu um rapaz. — Ethan? O que faz aqui?
— Vim te trazer doces... — e revirou os olhos. — Deixa de ser idiota!
Acabei de voltar da reunião.
— Sim, hoje era sua vez, e obrigada pelo "idiota".
— Desde quando se importa com o que eu falo? — e deu um meio
sorriso.
— Tem razão. Não me importo, mas o que quer comigo? — Três coisas.
— Diga. — senti meu coração acelerar de leve.
— Primeiro: vou te contar uma parte do plano como foi combinado. Segundo: quero sangue. Terceiro: quero que venha dar uma volta comigo pelo jardim.
— Não vou sair com você.
— Aqui não é um bom lugar para te contar o plano, mas lá fora posso
fazer o vento encobrir nossas palavras.
— Tudo bem...
— Siga-me. — e me aproximei dele. O vento nos envolveu e fechei os olhos com medo de cair ou sei lá. Acabei me segurando mais forte que o necessário.
Quando abri os olhos novamente, já estávamos no jardim dos fundos e caminhávamos em terra firme. Ficamos um tempo em silêncio e esperei o que tinha a me revelar sobre o plano, mas ao ver que não falava, limpei a garganta e dei uma parada na caminhada.
— Ah... — parou de andar e se virou para mim ainda ficando um pouco de lado. — Então... vamos realizar o plano no dia do Baile Floreal, que será um dia depois da nossa última reunião. No dia da nossa última reunião você ficará sabendo o que deve fazer e o que nós vamos fazer também. — Hum.
— E você sabe que terá que ir acompanhada ao baile e essas coisas, certo? — Parecia meio sem jeito.
— Sim, não sou idiota. — revirei os olhos incomodada com algo.
— Tenho minhas dúvidas. — e riu de leve. Dei um tapinha no ombro
dele.
— Idiota.
— Então... no dia da nossa última reunião, todos dormiremos no es-
conderijo e voltaremos ao castelo apenas pela noite, na hora do baile.
— Tudo bem, mas por que pediram para me contar isso agora?
— Primeiro porque acharam injusto não saber de nada, já que seria a chave do plano e segundo...
— Segundo...?
— Não pediram para te contar. — e desviou o olhar para o céu no-
turno.
— Ah. Por que contou?
— Já disse. É injusto não saber de nada. — e deu de ombros.
— Tudo bem...
— Agora quero o sangue. — e voltou a me olhar.
— Claro. Sou sua doadora, não tenho escolha. — soltei um suspiro de frustração. Ficou um bom tempo em silêncio. — E aí? Não vai beber?
— Olha... — e passou as mãos pelos cabelos, parecendo confuso. — Vou te dar liberdade de escolha. É como uma alforria.
— Isso é sério? Por que faria isso?
— Falei com a Sacerdotisa Luzia e me disse que tenho que seguir o meu interior. — falou com um gesto de desdém.
— E o seu interior quer que eu fique livre?
— É quase isso. Acontece que meu interior é mais confuso que a magia e se nem eu entendo direito, muito menos você entenderia.
— A Sacerdotisa mandou você ser mais gentil?
— Não. Só disse que preciso manter relações melhores com as pessoas que estão ao meu redor, arriscando suas vidas como eu.
— Ah. Entendi. — e sorri. — Te pediu para ter confiança em outra pessoa que não fosse você mesmo.
— É. Foi mais ou menos isso. — e revirou os olhos demonstrando ir-
ritação.
— E você escolheu confiar em mim?
— Não, não. Menti até agora. Tudo que quero é te seduzir e me aproveitar de você quando ganhar minha confiança. Ah, não! Espere! Esse não sou eu! Esse é o... — e parou de falar ao ver minha expressão. — Desculpa.
— Tudo bem. — não consegui disfarçar o tom áspero da voz.
— Não deveria ter dito, me desculpe, por favor. — e segurou minha mão com cuidado. — Só não estou acostumado a ser... gentil.
— A vida não te deixou ser gentil, não é? — fitei-o no fundo dos olhos e toda minha raiva pareceu sumir.
— Como você...? — parecia confuso e assustado.
— Eu li sua alma. — e só nesse instante percebi o que realmente tinha feito ao olhá-lo tão profundamente. — Ah... isso é realmente estranho. — ambos rimos, fazendo a tensão se esvair.
— Olha... deixo que beba meu sangue hoje e sempre que você precisar. — falei devagar, ainda segurando a mão dele. — Basta você fazer como fez hoje.
— Tudo bem. — e soltou minha mão devagar.
— Fico feliz que confie em mim e agora entendo que talvez tenha tentado ajudar a pessoa errada. — sorri de leve. — A pessoa que mais precisava de ajuda com amigos e confiança era você.
— Agradeço sua ajuda, mas não serei assim na frente dos outros. Vou continuar agindo como sempre agi, então não fique tão feliz.
— Estava bom demais para ser verdade! — falei rindo e me surpreendeu com um abraço apertado. O abraço foi tão rápido que não deu tempo de me recuperar do susto e abraçá-lo de volta. Quando me soltou, ficou me observando um pouco desconfortável.
— Não se preocupe. Não vou contar a ninguém. Agora ande logo com o sangue.
Me guiou até um lugar em que o chão estava menos sujo e mais macio, pediu para que me deitasse ali e ficou por cima, tirou os cabelos do meu pescoço e parou. Fiquei esperando que investisse e rasgasse a pele para beber o sangue, mas ficou apenas ali parado, observando.
— Está tudo bem?
— Quero te dar uma coisa. — e retirou um saquinho dourado do bol-
so da calça.
— O que é isso?
— Aqui dentro tem dois colares com pingentes de cristal, que são como um potinho. Neles você pode guardar alguma coisa pequena ou líquida.
— Para que quer me dar isso?
— Nos potinhos está contido pó de fada da troca... vou te entregar um dos potinhos e junto ao pó, você vai misturar meu sangue.
— Por que o seu sangue?
— Porque tem poder e para acionar essa mágica é necessário um pouco de sangue.
— E para que essa mágica serve?
— Quando estiver em uma situação de perigo, abra o frasquinho e beba o conteúdo. — riu quando fiz uma careta. — Quando fizer isso estará livre de perigo, pois terá trocado de lugar com seu inimigo. — Muito útil!
— Sim e como você não luta bem, achei que fosse precisar.
— Ei! — dei um tapinha nele de novo e ele riu. — E o que você vai
colocar no seu colar?
— Vou arrumar um pouco de sangue também...
— Pode ser o meu?
— Seria ótimo se fosse o seu...
— Então pode pegar! — sorri para disfarçar o medo de perder sangue de novo.
— Não tenha medo, só vou pegar um pouco.
— Tudo bem.
Abriu o saquinho e tirou os dois frasquinhos de cristal, pendurados em cordões, que pareciam feitos de palha ou corda. Os pingentes tinham a forma de um coração e dentro de cada um deles havia um pozinho preto que brilhava como as estrelas no céu. Abriu o frasquinho que seria meu e com um movimento rápido, cortou a própria pele e encheu o restante do potinho com o sangue dele. Depois fechou o recipiente e pendurou no meu pescoço, tomando cuidado para que ficasse escondido debaixo da blusa.
Em seguida foi a vez de tirar o meu sangue. Pediu para que relaxasse e, como se fosse beber, mordeu meu pescoço. Após sorver um pouco do sangue, parou e me observou com seus olhos ainda estavam vermelhos e suas presas projetadas, tinha uma expressão de confusão e descrença.
— Você doou sangue a ele ontem? — a voz dele soou amplificada pelo poder que adquiriu junto ao sangue.
— De quem está falando? — tentei ganhar tempo para pensar em uma explicação.
— De quem mais seria? Do Mestre das Sombras!
— Não adianta esconder... sim doei, mas não conseguiu ler minha mente porque o distraí e não me entreguei.
— Tem certeza? Não foi o que vi!
— Você conseguiu ler minha mente até esse ponto? — senti o rosto corar e por sorte também pareceu surpreso por entender o que havia feito e começou a voltar ao normal.
— Você deixou que lesse sua mente. — falou mais para ele do que para mim e começou a recolher meu sangue no outro potinho enquanto isso.
— Sim e se fosse continuar a lê-la, iria entender que não houve nada ontem, que não me entreguei como as trevas queriam.
— Não vou beber seu sangue de novo. Não preciso disso para acreditar em você. — e isso me deixou surpresa de novo.
— Tudo bem. — foi tudo que consegui dizer. Fechou o frasquinho e cicatrizou a mordida em meu pescoço. Depois pendurou o cordão com meu sangue e o pozinho no próprio pescoço, escondido sobre o tecido da camisa.
Nos levantamos e começamos a caminhar de volta ao castelo. Não falamos nada até certo ponto e ficamos apenas pensando e observando a noite. O céu estava estrelado e bonito, mas minha mente estava confusa e senti uma coisa estranha no ar, uma tensão que parecia estar até na leve brisa que batia.
— Não vai ter problema beber o sangue de um vampiro?
— Não! Vai estar misturado ao pó da fada. — e continuamos andando em silêncio. Ao chegar à frente da janela do meu quarto, parou e parecia estar se esforçando em falar. — Sei porque o ajudou... estava morrendo. Também sei porque o deixaram ficar assim. Desculpe agir daquele jeito, acho que isso não é o certo quando a gente tenta confiar em alguém.
— Tudo bem, acho que agiria da mesma forma se fosse eu no seu lu-
gar.
— Não está dizendo isso só para me consolar, não é? — e finalmente voltou a olhar em meus olhos. Os olhos dele estavam verdes novamente, aquela cor magnífica e encantadora que você jamais encontraria em qualquer outro lugar.
— Não. — e sorri com sinceridade. Se aproximou de mim e esperava que me abraçasse. Dessa vez estava pronta para retribuir, mas não foi o que fez. Ele me beijou. E novamente foi algo tão rápido, que parecia que o meu toque causava dor nele, mas ao mesmo tempo não conseguia resistir a me tocar. Como me pegou de surpresa, não tive muito tempo consciente para poder descrever o beijo com exatidão.
— Agora a aposta está paga. Quando quer fazer outra? — seu sorriso metido estava ali novamente, junto com sua pose de quem não se importa com ninguém além de si mesmo.
— Não sei. Quem sabe nunca mais?
— Nunca mais é muito tempo. — e sorriu de forma sedutora. — Não vai aguentar ficar tanto tempo sem um beijo meu.
— Idiota. — riu e com um movimento de mãos e algumas palavras sussurradas ao ar, fez com que o vento me levasse de volta à janela do meu quarto, no terceiro andar.
"Boa noite", ouvi sua voz sussurrada no vento.
— Boa noite. — falei para as paredes do quarto, mesmo sabendo que
não escutaria.
— Onde estava e com quem está falando? — Cameron saía do banhei-
ro e se dirigia à cama dele.
— Ah! — dei um pulinho de susto e me segui para minha própria cama. — Estava com Ethan, que me contou como foi a reunião de hoje, omitindo o que não poderia saber.
— Ah! Claro, que bom que já está sabendo.
— Sim.
— Mas porque está tão feliz após uma conversa com Ethan? Geral-
mente você fica irritada ou chateada... — já estava deitado e pronto para apagar a luz do abajur.
— Ele não foi tão desagradável hoje. Só um pouco... o normal dele...
— Que ótimo. — e apagou a luz. — Quase pensei que fora gentil.
— Isso nunca! — obriguei-me a rir também. — Boa noite.
— Boa noite. — e se ajeitou na cama. Fiz o mesmo e em pouco tempo adormeci, me lembrando do que acabara de acontecer e desse beijo, que apesar de ter sido o pagamento de uma aposta, fez meu coração acelerar e meu sangue esquentar.
No dia seguinte levantei com dor de cabeça, mas não era muito forte e resolvi ignorar. Como era dia Solis (Domingo), não havia aula e os alunos ficavam vagando pelo castelo-escola ou marcavam encontros e saíam juntos. Obviamente nosso grupo não marcou absolutamente nada, já que à noite alguns teriam que sair à surdina.
Dessa vez iríamos Noah, Ethan, Julie e eu. Recebemos ordens de voltar antes de amanhecer, se fosse possível, e teríamos que tomar extremo cuidado ao sair pela passagem secreta que Ethan nos mostrara em outra ocasião. Por enquanto os guardas não desconfiavam de nada (ou fingiam não desconfiar), então era seguro que continuássemos a sair apenas dando desculpas, no entanto, Ethan e Cameron concordaram que pelo menos dessa vez saíssemos às escondidas. Era apenas para testar a rota de fuga que usaríamos quando fôssemos fugir do castelo, após o Grande Plano.
Onde será que iríamos nos refugiar? Naquele pequeno e escondido mundo mágico da Caverna de Cristal? E se fosse realmente lá, como faríamos para levar todos que nos ajudaram sem sermos vistos? Ária usaria algum tipo de mágica de tele transporte? Pelo menos agora sabia que isso não era algo absurdo e que era perfeitamente possível.
Estava lendo o livrinho de Ária, continuando o aprendizado sobre os bailes, quando bateram à porta para avisar que já estava quase na hora de irmos à reunião. Enquanto me arrumava com uma calça jeans, um tênis All Star azul claro (que não era tão horrível assim) e uma blusa branca de mangas curtas, fiquei pensando no que acabara de ler sobre os bailes e como deveriam ser lindos e mágicos. Mágicos... quase ri enquanto pensava que todo esse lugar já era mágico por si só, com ou sem bailes.
Li sobre o Baile Floreal (que era o baile que estava mais próximo de acontecer) e nele a decoração era toda feita com temas de flores e jardinagem, com os toques do paisagismo (já que anunciava a estação trazida pelo mês Floreal, conhecida por nós como Primavera), as garotas tinham que ornamentar os cabelos com flores em penteados ajeitados e os garotos teriam de colocar uma flor no bolso do terno (ou smoking) que usariam. E sempre haveria uma valsa próxima à meia noite. Isso era tão romântico e surreal. Acho que posso aprender a gostar dos costumes de Fantasy, mas com certeza terei dificuldades em aceitar as condutas e leis impostas pela Rainha.
Por que será que Leslie fica ao lado da Rainha dessa maneira? Será só
por causa do poder e da riqueza? Pelo que entendi, traiu as irmãs para se juntar a corte da Rainha e isso não era exatamente algo aceitável ou facilmente explicável. Lembro-me de Cameron ter me contado sobre a outra irmã de Ária, a Ivy, que havia saído de casa por causa da traição de Leslie e jamais voltara. Será que havia saído de Fantasy? Ou será que apenas se escondera muito bem? Ou então... Não! Nada de pensar no pior! Pense positivo!
— Está pronta? — Julie entrou no quarto me fazendo dar um pulinho
de susto.
— Ah! Sim, estou.
— Sério mesmo que não me ouviu bater?
— Estava perdida em pensamentos... — dei um sorriso forçado. — Vamos?
— Sim, mas fale mais baixo.
— Tudo bem, desculpa.
— Temos de ser rápidos. A troca de guardas é agora e demora mais ou menos uns dez minutos. — Julie sussurrou enquanto fechava a porta.
— Certo. — e a segui pelo corredor. — Sabe onde Cameron está?
— Está no refeitório com os outros. Noah e Ethan também estavam
lá.
— Já estão seguindo para a passagem? — sussurrei extremamente baixo. Julie demorou a entender, mas assim que entendeu, balançou a cabeça afirmativamente. Terminamos de descer as escadas e saímos com cuidado pela enorme porta da frente do colégio. Não era muito tarde e ainda havia alunos circulando. Demos sorte, porque assim não pareceria errado que saíssemos do castelo em pleno domingo à noite para qualquer lugar que fosse ou simplesmente para dar uma volta no jardim.
Encontramos os dois rapazes parados exatamente no lugar que Ethan mostrou a mim e a Cameron quando ajudamos Lewis, Jim, Ônix e Carmen a fugir. Se vestiam completamente de preto para se camuflar com a noite e Julie se vestia com roupas roxas. Apenas eu parecia um ponto de referência. Minha sorte era a escuridão me cobrir por simpatizar comigo. Não acreditei que tinha poderes com as trevas, isso era ridículo. Prefiro acreditar que a escuridão simpatiza comigo porque também simpatizo com ela. Sempre preferi a noite e a lua, não gostava muito do dia e do sol com toda sua claridade e calor exagerados. A noite era escura e fria, mas não um frio congelante, um frio agradável, e a escuridão também não era tenebrosa e exagerada, mas sim misteriosa e interessante.
Passamos despercebidos pelos enormes muros do castelo-colégio (que mais parecia uma prisão, vista pela perspectiva de que os muros tinham pelo menos um metro de espessura e uns cinco ou seis de altura) e seguimos em completo silêncio pelas ruas e vielas escuras da única cidade/vila do reino de Fantasy.
Chegamos finalmente à Estalagem da Fronteira, onde Ária nos esperava já com os mantos pendurados nos braços e com tudo trancado para podermos sair pelos fundos sem sermos notados pelos viajantes que se abrigavam ali. Seguimos por todo o caminho até chegarmos ao mesmo ponto onde da outra vez a fada amiga de Ária nos recebeu e me deu o privilégio de nos guiar seguindo o seu fio mágico.
Seguimos pela Caverna de Cristal novamente e jamais imaginei que um mesmo lugar pudesse me surpreender duas vezes, coisa que essa caverna conseguiu de maneira fenomenal. Era realmente um lugar surpreendente e dessa vez reparei que no chão corria um filete de água, como se um pequeno rio corresse de fora para dentro da caverna. E essa água era iluminada pelas luzes dos cristais, fazendo com que brilhasse de uma maneira encantadoramente fascinante. Não era algo fácil de encontrar no nosso mundo, apesar de saber de uma caverna na Nova Zelândia que se assemelha de longe com essa. Com certeza essa caverna é muito mais bonita, brilhante e mágica que a caverna do meu antigo mundo, mas mesmo assim vale a pena a comparação. A caverna toda parecia um céu estrelado refletido com perfeição nas águas de um rio que corria logo abaixo.
Dessa vez não me assustei com os olhos amarelos do dragão Dust e
nem com sua voz gutural que parecia fazer o túnel todo chacoalhar. Nos guiou após ter dito a senha novamente (porque era a guia outra vez) e nos levou pelas trilhas daquele pequeno recanto escondido até a mansão de arquitetura campestre e luxuosa.
Enquanto discutiam o plano, fui dar uma volta pelo lado de fora da mansão, na parte dos fundos onde encontrei a Rainha das Sereias da outra vez. Caminhei com cuidado passando por diversos corredores (aquilo parecia um labirinto) até chegar à porta que levava ao jardim dos fundos e ao lago de Sarina.
Segui até a margem do lago e só então reparei que havia alguém do outro lado, colhendo frutas na árvore perto da beira. Fiquei em silêncio apenas observando, até que a pessoa se virou e pude vê-la direito.
Era uma mulher que parecia bem jovem, devia ter uns vinte ou vinte
e um anos, tinha cabelos loiros (estilo Barbie) e os usava soltos, na altura dos quadris (era muito longo! E bonito!), sua pele era bem clara, os olhos eram verdes e... parecia a cópia exata de Ária, só que com alguns anos a menos e um pouco mudada!
— Olá! Sou Alessia! — falei com um sorriso.
— O que faz aqui? — e atravessou o lago por uma espécie de ponte invisível para mim, parando à minha frente.
— Ahn... eu e meus amigos viemos para a reunião.
— Oh, não! Você conhece Ária?
— Conheço. Você é bem parecida com ela sabia? — sorri ainda mais e a mulher empalideceu. Ficou mais branca do que já era. — Você está bem?
— Estou... é que já faz muito tempo que não vejo minha irmã. — sor-
riu de leve, um pouco triste, se recuperando.
— Você é... é a irmã perdida? — agora foi a minha vez de ficar sur-
presa.
— Sim, me chamo Ivy.
— Prazer em conhecê-la! Ária está aqui, por que não vai falar com e-
la?
— Acho que não estou pronta ainda... encontrei esse lugar há apenas três dias e mal tive tempo de pensar em como falaria com minha irmã sobre meu sumiço.
— Entendi. Não se preocupe, não contarei a ela.
— Obrigada. — e me convidou para um passeio pelo bosque que ro-
deava a casa.
Me mostrou tudo o que conhecia sobre aquele lugar de pura magia. Era surpreendente, mas mais surpreendente ainda para mim, era como ambas eram tão parecidas. E não apenas no físico, mas na maneira como falavam e agiam. Acabada a reunião, Ethan veio me procurar e Ivy se escondeu rápido demais para se despedir.
Voltamos todos para casa com cuidado redobrado e apenas tivemos que passar pela passagem secreta outra vez. Sem guardas fazendo perguntas. Sem Leslie se intrometendo em nossas vidas. Segurança, mesmo que ilusória. Ethan, Noah e Julie se comprometeram a contar sobre a reunião aos outros no dia seguinte, então nos despedimos e voltamos aos nossos quartos.
...
Na nossa terceira semana de reuniões, o primeiro encontro foi cancelado. Por quê? Bem... essa semana Leslie havia sido promovida à vicediretora da escola e decretou que todos nós teríamos de ter mais uma aula por dia, uma aula para ensaiarmos para o Baile Floreal que se aproximava. O que fazíamos nessas aulas? Enfeitávamos a escola para o baile, ensaiávamos as danças clássicas dos bailes, tínhamos algumas aulas de etiqueta e escolhíamos as roupas que usaríamos, além de escolher com quem iríamos.
Para que tudo isso? Porque esse seria o baile em que Leslie seria admitida oficialmente como a vice-diretora da escola e a Rainha a presentearia com uma coroa de prata que indicava que era membro da corte real. Achei tudo isso ridículo e exagerado, mas tínhamos que cooperar e era bom que se mantivesse entretida com outros assuntos que não fosse espionar a vida de alguns alunos castigados.
Por falar em castigo... A reunião também não poderia ocorrer, porque assim que terminassem suas últimas aulas, todos os alunos deveriam se dirigir ao posto de doação de sangue do castelo. Os vampiros estavam com os estoques em baixa e precisavam estocar para o baile.
Depois de todos esses imprevistos, só sobraria o nosso último encontro para decidirmos tudo e para que me contassem o que raios teria que fazer. Mais ou menos já imaginava, mas ainda não queria acreditar em algo tão horrível e medieval. Achei melhor esperar receber a notícia para então poder me preocupar.
No sábado seguimos nossos esquemas de duplas para sairmos do castelo e irmos à reunião. Iria com o Noah, Ethan com a Julie, Cameron com a Camilla, e Ária nos encontraria nos fundos da Estalagem da Fronteira. Quando voltássemos, contaríamos tudo aos que prometeram nos ajudar. Pelo menos era esse o combinado...
Era sábado. Amanhã seria o dia do Baile Floreal e estava terminando de arrumar uma parte da decoração quando Julie me encontrou. Sabia que o dia da última reunião era hoje e que iria finalmente descobrir o que teria que fazer, mas não estava nem um pouco ansiosa para ouvir isso. Estava na verdade, assustada e nervosa.
— Ei! Você se lembra de que hoje combinamos de ir juntos buscar as roupas de amanhã, certo?
— Sim, Julie. Me lembro. — e prendi mais uma flor cor de rosa nas
pilastras do castelo.
— Está quase pronto. — e olhou ao redor. — E está realmente lindo.
— Todos os anos vocês usam flores cor de rosa?
— Não. A Rainha escolheu o tema rosa claro, rosa escuro, vermelho
e branco para este ano.
— Ah. Como foi no ano passado?
— Acho que foi cor de laranja, amarelo e branco. Ou com tonalidades
de azul e rosa... não me lembro direito.
— Entendi.
— Então não se esqueça! Até mais! — e saiu rapidamente para ajudar o pessoal do som.
Terminei de prender o enfeite no ponto mais alto e me arrependi ao olhar para baixo. Como foi que subi tão alto? Essa escada é bem maior do que esperava. Calma, Alessia! É só descer e parar de olhar para baixo. Desça degrau por degrau e logo a escada acaba.
— Problemas com a altura, Humana? — uma voz chata e irritante falou no meu ouvido. Rachel. Olhei pronta para dar uma resposta à altura, quando me ocorreu que estava voando. Arregalei os olhos e quase tropecei no degrau seguinte.
— Você voa? — quase tive um ataque cardíaco quando tropecei, mas consegui me conter para falar.
— É claro que sim! Sou uma ninfa como sua amiga que estava aqui ao seu lado agora a pouco, e voando!
— Nossa! Quanta paciência e delicadeza. — e desci mais um degrau.
— Olha que posso te jogar da escada. — e fez um movimento rápido balançando a escada. Agarrei-me mais firme na madeira e não pude deixar de fechar os olhos com força.
— Saia daqui sua idiota! — deu uma gargalhada e depois saiu voando de volta à nenhuma tarefa mais útil do que falar mal do que o que os outros estavam fazendo.
Quando terminei de descer a escada e soou o sinal do jantar, quase dei pulos de alegria. Estava faminta e... bem, não queria mais ter que subir escada nenhuma. Corri pelo salão de baile e fui direto para a ala de restaurantes, precisava comer alguma massa, por isso fui a um restaurante italiano.
Voltei à mesa e logo meus amigos se juntaram a mim, cada qual com a sua bandeja. Jantamos todos juntos e fingimos interesse na decoração e nas músicas que tocariam no baile para despistar a atenção de curiosos.
— Nenhum de vocês se esqueceu de seu par e do que terão que fazer hoje certo? — Ethan falou em tom sério.
— Tenho de ir com Alessia depois de todos vocês. — Noah o encarou, sustentando seu olhar.
— Sim. — assenti com a cabeça também, tentando demonstrar que realmente entendi.
— Vou com a Camilla primeiro. — Cameron falou e Camilla assen-
tiu.
— E vou com você depois para causar tumulto. — Julie sussurrou.
— Exatamente. — sorriu com seu jeito metido de sempre.
— Quando nós iremos? — e encarei-o tentando disfarçar a preocupa-
ção.
— Cinco para as dez, Cameron e Camilla. Dez e sete, eu e Julie. Dez e quinze Noah e Alessia. Fiquem atentos. — Ethan observou o rosto de cada um para ver a confirmação. Todos confirmaram e essa seria a nossa última reunião antes de realizar o plano final.
Saímos todos em duplas como foi combinado. Noah me esperava em frente à porta e fingimos que íamos à biblioteca fazer algum trabalho escolar atrasado. Cameron e Camilla já haviam saído e Ethan e Julie estavam indo agora. Entramos na biblioteca e nos escondemos entre estantes, perto das enormes janelas, sendo que uma delas estava aberta e seria aquela pela qual fugiríamos. Esperamos dar nosso horário e por fim, saímos.
Ethan e Julie haviam causado algumas pequenas confusões que mantiveram os guardas da Rainha bem ocupados, quando saímos não tivemos nem que dizer aonde íamos e o que iríamos fazer. Nenhum deles viu a Humana Híbrida saindo com o Elfo-Vampiro.
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