Capítulo 23
Chegamos perto da enorme mansão e seguimos a trilha que levava até a pequena varanda da frente. Ária apertou um botão, que devia ser a campainha e uma voz pediu a senha.
— Alessia, você é a nossa guia e por isso tem que ser você a dizer a senha. Lembra qual é? — Ária disse com um sorriso.
— Sim. A senha é: A-B-D-D-E-F-F-F-N-S-T. — senti-me realmente
aliviada por lembrar.
— Está correto. Só um minuto. — disse a voz atrás da porta e ouvi palavras em outra língua, como a conjuração dos feitiços da Havena.
— Se não se importam, vou voltar para meu posto. — e Dust, o dra-
gão, saiu voando de volta pelo caminho que fizemos até ali.
Logo a porta se abriu e pudemos ver a figura de um homem. Trajava um manto negro e longo que cobria suas vestes, havia uma fivela na altura do peito, para segurar a roupa. A fivela era prateada e tinha a forma de dois gravetos cruzados formando um "X". Não conseguia ver seu rosto, porque o capuz o cobria, então não pude deduzir qual deveria ser sua idade ou sua classe.
— Prazer em revê-lo, Ivan. — Ária sorriu para o homem e fez uma mesura. Achei melhor copiá-la e fiz o mesmo. Percebi de canto de olho que Julie e Camilla pensaram como eu. Quando Camilla ergueu-se novamente, estava pálida e observava o homem com curiosidade e descrença.
— Entrem, por favor. — a voz dele era forte, porém transmitia tranquilidade. Entramos e logo em seguida fechou a porta e se virou para nós, retirando o capuz que cobria seu rosto.
— Impossível... — ouvi Camilla sussurrar e arfar de surpresa ao meu lado. Tudo bem que o rapaz era bonito, mas não precisava reagir assim... Era alto, tinha a pele levemente corada (nem muito clara e nem muito escura), seus olhos eram azuis escuros e seus cabelos eram extremamente negros (e parecia penteá-lo como os príncipes de contos de fadas, repartido ao meio e cortado como um Chanel).
— Prazer em conhecê-las, Senhoritas. — falou de forma cordial. — Me chamo Ivan e sou o presidente do conselho de Bruxos e Vampiros desde pouco antes da época de Napoleão.
— Oh! Minha nossa! — Camilla agora parecia a ponto de desmaiar. Julie e eu a seguramos pelos cotovelos e observamos o hall para encontrar um lugar para sentá-la. O hall era grande, as paredes eram de madeira, entalhadas com figuras que não consegui decifrar. Havia um tapete grande vermelho e dourado no chão abaixo de nossos pés e aquilo parecia ter milhares de anos, mas era bem conservado. Havia duas mesinhas de madeira cor de tabaco, dos dois lados da porta, com alguns objetos sobre elas, mas nenhum lugar em que Camilla pudesse se sentar. Havia uma porta à direita, outra à esquerda e bem à nossa frente, uma enorme escadaria entalhada em madeira clara que levava aos andares superiores. Isso é incrível! E muito lindo e luxuoso...
— Sua amiga está bem? — Ivan parecia preocupado.
— Estou! — Camilla deu um pulo saindo de nossas mãos. Isso era realmente estranho, não era de se exaltar assim. — Oh! Minha nossa! É um enorme prazer conhecê-lo! Mas... você não deveria...
— Estar morto? Sim. — pareceu achar graça e riu de leve. — Se o que Antonieta conta fosse verdade.
— Então mentiu sobre... todos vocês? — parecia sem fôlego e eu deveria estar parecendo completamente perdida.
— Sim.
— Depois fazemos mais perguntas. Não podemos esquecer o real motivo pelo qual viemos até aqui e vocês ainda têm algumas criaturas para conhecer. — Ária falou de maneira decidida e Ivan assentiu.
— Sigam-me, por favor. Vou levá-las até o salão onde estamos reunidos. — Ivan começou a andar em direção à porta da esquerda.
Nós o seguimos pelo corredor repleto de portas feitas de madeira (uma madeira extremamente bonita e provavelmente muito cara). As paredes eram feitas, até a altura da nossa cintura, com madeira cor de tabaco e dali em diante eram aparentemente de concreto e pintadas de creme. À direita e à esquerda de cada porta haviam mesinhas redondas de cor dourada, com alguns objetos variados sobre elas (pequenos relógios de pêndulo, livros, canetas tinteiro, jarros de cristal com água e taças ao lado, bandejas de prata apoiando os jarros e taças, telefones daqueles bem antigos usados entre 1914 e 1967 e vasos com arranjos de flores em cores pastel de amarelo, vermelho e branco). Ao final do corredor havia uma porta maior que as demais e foi por ela que passamos para entrar no grande salão da mansão.
O grande salão se estendia à nossa esquerda e à nossa direita. O teto era alto e bem lá em cima havia um enorme lustre brilhante pairando sobre nossas cabeças. No canto da direita havia um palco com alguns instrumentos. Uma mulher de cabelos vermelhos da cor do vinho estava tocando um violino. À nossa frente, do outro lado do salão, havia uma mesa retangular grande com muita comida sobre ela. A comida também estava arrumada em arranjos e se separavam os doces de salgados aparentemente. Entre nós e essa mesa enorme havia um espaço realmente amplo, que deveria ser onde as pessoas dançavam se houvesse um baile. À nossa esquerda, as paredes eram repletas de janelas, que estavam cobertas por grossas cortinas vermelhas e douradas, em frente a essas janelas estava um conjunto de sofás e poltronas de tecido dourado, ocupados por um grupo que conversava animadamente. Ivan nos guiou até esse grupo e ao pararmos ao seu lado. O grupo parou a conversa repentinamente e nos lançaram olhares atentos e curiosos.
— Saudações Ivan! — falou o homem que estava sentado mais perto de nós. Não parecia ser muito alto, mas com certeza era bem forte. Tinha os cabelos ruivos desgrenhados e por cortar contrastando com a pele clara e perolada, a barba era longa e seus olhos eram castanhos e tinham uma expressão de astúcia. Parecia um Viking, entretanto suas orelhas me lembravam as dos elfos. Não eram grandes como, mas eram pontudas.
— Saudações Arak. — Ivan fez um breve aceno de cabeça. — gostaria que conhecessem algumas protegidas de nossa amiga Ária.
— Será um prazer conhecê-las. — disse a mulher sentada ao lado de Arak. Tinha o cabelo tão loiro que parecia branco e estava parcialmente coberto por uma espécie de chapéu de freira, sua expressão era gentil e seus olhos eram de um tom de verde bem claro. Usava algo que parecia uma túnica de padre e era de coloração branca e dourada, parecia ser um tecido leve. Nos pés calçava sandálias douradas e sem salto. — Olá! Sou Luzia, a Sacerdotisa Anciã. Uma das fundadoras de Fantasy.
— Então é verdade? Vocês não morreram? — Camilla estava voltando ao seu estado eufórico incomum.
— Sim, minha querida. Nós não morremos. Conseguimos finalmente fugir e nos refugiar aqui. — explicou a sacerdotisa com um sorriso gentil no rosto.
— Mas porque não atacaram a Rainha dos Vampiros ainda? Vocês sabem que é uma tirana! — Camilla os encarava indignada.
— Não temos poder suficiente ainda mocinha. — outro dos homens entrou na conversa. Estava sentado bem de frente para mim. Seu cabelo era loiro, cor de palha, cortado curto e repicado, seus olhos eram de um azul claro intenso e sua pele era clara, mas parecia também azulada. Não parecia ser muito alto também, mas com certeza era maior que eu.
— O que quer dizer com "não temos poder suficiente"? — intrometime antes que Camilla voasse no seu pescoço por causa de sua crise de euforia.
O homem voltou-se para mim e pude ver que tinha orelhas de elfo.
— Quem é você? — lançou-me um olhar incisivo.
— Meu nome é Alessia, sou uma humana híbrida.
— Híbrida? — Arak pareceu se surpreender.
— Sim. — confirmei após engolir em seco.
— Tem poderes com o que? — disse o elfo à minha frente, estreitan-
do os olhos.
— Com a Alma e com a Magia.
— Isso é verdade, Ária? — Arak se dirigiu diretamente a ela.
— Sim, Arak. Ela tem esses poderes.
— Fascinante... — Arak agora me analisava e me senti um pouco des-
confortável.
— Fascinante? — o homem à minha frente desviou o olhar como se não se importasse muito.
— Desculpa, mas já lhe disse quem sou, agora me diga quem é você.
— estreitei os olhos ao me dirigir novamente ao elfo.
— Sou Leon, o Guerreiro Alfa dos Elfos. Um dos fundadores primordiais de Fantasy. — e se levantou do sofá fazendo uma breve mesura. Senti-me um pouco envergonhada e me atrapalhei em responder o gesto.
— Acho que é hora de nos apresentarmos formalmente. Leon, vá atrás dos outros. Traga todos aqui. Vamos nos apresentar às nossas convidadas e as apresentaremos também. — Ivan ordenou e Leon saiu caminhando de um jeito imponente, atrás de seja lá quem for.
Ivan começou a organizar as pessoas que estavam sentadas e nos levou para a frente do palco, em seguida subiu e pediu para a mulher parar um pouco de tocar e descer com o resto de nós. Esperamos um tempo e logo Leon voltou com os outros habitantes da mansão, ao todo umas quinze pessoas.
— Começaremos as apresentações. — Ivan anunciou no microfone e não entendi para que tudo aquilo, mas fiquei quieta.
— Sou Ivan, o Presidente do Conselho de Bruxos e Feiticeiros. Fundador de Fantasy. — Senti como se já o conhecesse há mais tempo, mas isso era ridículo. Desceu do palco e outra criatura subiu.
— Prazer em conhecê-las visitantes! — era uma mulher de cabelos longos e loiros, seus cabelos iam até a cintura e eram ondulados, seus olhos me pareceram azuis claros, sua pele também clara e se vestia como uma hippie. — Sou Dahlie, a Líder Espiritual dos Druidas, uma das fundadoras de Fantasy.
— Olá, meninas! — disse uma mulher que mais parecia uma garotinha. — Sou Lisarin, a Princesa das Fadas. — Estava alegre e sorria. Não era muito alta, tinha a pele branca e perolada, que parecia brilhar em dourado, seus cabelos eram de um tom de loiro claro e cortados na altura dos ombros, seus olhos tinham um tom de mel e possuía asas, que cintilavam com a luz do salão e pareciam ter tons de dourado e prata. Vestia-se com um vestido branco de seda, curto, decorado com flores amarelas e brancas.
Os demais fundadores foram se apresentando em seguida e eram incríveis e poderosos. Luzia se apresentou parecendo muito uma freira. Depois Leon com suas vestes de camponês medieval, em seguida Arak, que era o Rei dos Duendes. Duendes! Então era isso que era! Se vestia como um Viking. Após Arak, apresentou-se um rapaz de cabelos castanhos escuros curtos, lisos e repicados, tinha a pele bronzeada e seus olhos eram de um tom de verde como o da folhagem das plantas na primavera, era alto e se vestia como uma mistura de mágico e motoqueiro fantasma. Seu nome era Linus e se apresentou como o Mestre dos Alquimistas. Outro rapaz foi flutuando até o palco e se apresentou como Cristian, o Líder dos Fantasmas, não sei dizer se era alto porque estava flutuando, sua pele era clara e acinzentada, seus cabelos eram pretos e estavam um pouco compridos, seus olhos eram de um tom de cinza escuro e suas vestes claras e leves, pareciam flutuar com o ar ao seu redor. Não dava para acreditar que essas pessoas tinham mais de duzentos anos!
— Boa noite, sei que lá fora está escurecendo agora, mas não se enganem, aqui o tempo passa de forma diferente. — falou a mulher que subiu ao palco, a mesma que estava tocando violino. Tinha cabelos longos e ondulados cor de vinho, sua pele bem clara e seus olhos de um tom arroxeado, usava um vestido preto em estilo anos 60, nos pés calçava sandálias pretas de salto. Todos que se apresentavam pareciam ter um corpo impecável e saudável e isso chegou a me causar certo estranhamento e assombro. — Sou Alexia, a Líder das Ninfas.
— Oh! Não acredito! — ouvi Julie falar atrás de mim.
— Quieta! — Camilla repreendeu-a.
— Sou Tatius. — um homem de cabelos curtos e verdes escuros disse timidamente. Era bem alto e forte, usava roupas um pouco rústicas, que pareciam uma mistura de camponês e guerreiro da idade média. Seus olhos eram escuros como jabuticabas e a pele de um verde musgo. — Sou o Líder dos Trolls.
— Ainda falta uma pessoa para vocês conhecerem meninas. — Ária nos avisou. — Mas apresentem-se primeiro.
Julie foi a primeira a subir no palco, animada e sorrindo o tempo todo. Se apresentou como uma ninfa que tinha poderes com a Alma e a Magia. Depois Camilla subiu relutante e se apresentou como uma bruxa que tinha poderes somente com a Magia. Por fim, foi a minha vez e sentia minhas mãos suando e minhas pernas tremendo. Que ridículo! Por que me sentia assim? Não era uma apresentação de trabalho valendo nota!
— Boa noite, sou Alessia, uma Humana Híbrida que tem poderes com a Magia e com a Alma. — falei tão baixo que as pessoas tiveram que se esforçar para me ouvir, mas ninguém me obrigou a repetir o que disse e enquanto descia do palco, senti vários olhares curiosos em mim. Então encontrei Lewis, Jim, Carmen e Ônix.
— Alessia! — Lewis veio rápido até mim e me abraçou forte. Como me pegou de surpresa, acabei retribuindo o abraço um pouco tardiamente e tive que rir para disfarçar.
— Vocês estão bem? — tentei dar uma conferida quando Lewis me
soltou.
— Sim. Este lugar é incrível! — Carmen sorria e parecia realmente estar muito bem.
— Certamente. — Ônix se aproximou sorrindo. — Aqui se respira magia.
— É um lugar fantástico! — Lewis era o mais animado.
— Garoto Fantasma? — Ivan chamou e Lewis se virou.
— Pois não?
— Pode levar as garotas para conhecer Sarina?
— Claro! — Lewis falou sorrindo e chamou Julie e Camilla para nos acompanhar no passeio até o jardim dos fundos da mansão, onde estava o lago de Sarina. Lago? Sarina era um peixe?
Não. Sarina não era um peixe. Era uma sereia.
Após Lewis nos guiar por dentro da mansão até o jardim dos fundos, onde havia uma trilha que levava a um lago, nos encontramos com Sarina, a Rainha das Sereias. Era inacreditavelmente bonita, tinha longos cabelos cortados em camadas, de cores que iam do azul escuro ao azul mais claro do céu. Seus olhos eram de um azul escuro intenso e observador, sua cauda seguia o mesmo padrão de cores do cabelo e cintilava de maneira surreal embaixo da água, sua pele bem clara e parecia de porcelana perolada. Emanava muito poder e parecia não gostar muito de visitas, mas isso foi apenas uma primeira impressão. Sarina era muito simpática.
— Olá, Garoto Fantasma. O que o traz aqui? — e saiu de dentro das águas para cumprimentá-lo.
— Ela é uma sereia! — falei estupidamente e Sarina riu de maneira graciosa. Julie e Camilla pareciam tão encantadas quanto eu.
— Sim, sou Sarina, a Rainha das Sereias. — apresentou-se formalmente e fez uma espécie de reverência que correspondemos um pouco atrapalhadas.
— Você é muito bonita! — Camilla sorria timidamente.
— Obrigada, você também é. Todas vocês são. — a sereia sorriu de maneira sincera olhando cada uma de nós atentamente.
— Bem, agora vocês poderiam se apresentar. — Lewis sussurrou apenas para que nós ouvíssemos.
— Ah! Claro! Meu nome é Camilla. Sou uma bruxa.
— Prazer em conhecê-la, Camilla.
— Sou Julie, uma ninfa com poder da alma.
— É um prazer conhecê-la Julie. — e olhou para mim. — E você?
— Ah! Sou Alessia, a Humana Híbrida com poderes de Magia e Alma.
— Isso é fantástico! Pode demonstrar? — a sereia parecia surpresa e desconfiada.
— Ahn... claro.
Então olhei ao redor e percebi que havia muitas árvores e arbustos. Calculei que caso causasse um incêndio, haveria água suficiente para apagá-lo por causa do lago. Por fim, me abaixei e conjurei o feitiço do fogo.
"In calore ignis,
Virtus derivatur,
Oh ignis amet,
Quos ego faciam!"
Logo uma chama interna começou a aquecer meu corpo, partindo do coração e se expandindo até as palmas de minhas mãos. Aproximei minha mão da grama, que começou a pegar fogo. Sarina, Lewis, Camilla e Julie observaram deslumbrados. Tentei controlar as chamas e não me importar muito com a plateia, mas achei melhor apagar logo o fogo e para isso conjurei a água.
"Gelidus in Aquam!
Indistincta manque puritatis!
Infinite etiam prisca nouitate,
Nunc obtestor!"
Logo o calor que percorria meu corpo foi substituído por uma sensação de umidade e refrescância e minha mão sobre o fogo agora produzia água, o extinguindo por completo.
— Incrível! — Sarina sorria maravilhada. — Agora conserte a grama que queimou, por favor.
— Ahn... — gaguejei sem saber como explicaria que não sabia fazer a grama voltar a ficar como era.
— Ela ainda não aprendeu isso. — Julie explicou por mim.
— Hum... Fantasma, você já aprendeu esse feitiço? — e se dirigiu a Lewis.
— Sim.
— Então agora mostre que tem poderes com a alma, humana Alessia.
Deixe-o entrar em seu corpo e conjurar o feitiço.
— Ahn... tudo bem. — olhei para Lewis de canto de olho, que assen-
tiu e retirou o medalhão. Camilla e Julie ficaram atrás de mim para se caso desmaiasse. Contou até três e investiu. Quando acordei, tinha outra consciência. — Ai...
— Está tudo bem, Alessia? — Camilla me encarava preocupada.
— Sim.
"Está pronta para o feitiço?", Lewis perguntou em minha mente. "Sim, pode fazer."
"Repita comigo.", Ajoelhei-me perto da grama queimada e repeti as palavras que sussurrava em minha cabeça.
"Species terram Renovamini,
Quod semel cremati Sed renatus"!
Minha mão e a grama queimada começaram a brilhar num tom de verde musgo e magicamente a terra vez com que a grama queimada renascesse mais verde do que era antes. A sereia sorriu agradecida e bateu palmas.
— Muito bonito! Você tem mesmo os poderes que disse que tinha...
— Agora posso tirar o fantasma de mim?
— Sim. — riu.
Lewis me avisou que sairia. Novamente desmaiei e ao acordar estava deitada em um dos sofás do grande salão, onde conhecemos os outros fundadores.
— Ah! Finalmente você acordou! — Julie estava sentada ao meu lado.
— Desculpem a demora. — sentei-me e ri de leve. Minha cabeça doía.
— Vamos começar logo a reunião? — Ária estava de braços cruzados impaciente.
— Sim, claro. O tempo está passando! — começava a me preocupar com o tempo que demorávamos.
— Não se preocupe, aqui em nosso esconderijo, o tempo passa de maneira diferente. — Ivan sorriu ao se aproximar de nós.
— Ah, claro! Havia me esquecido... — forcei-me a retribuir seu sorri-
so.
— Bem... nós já temos um plano articulado contra a Rainha. Só precisamos marcar uma data certa e arrumar um jeito de conseguir invadir o castelo sem sermos descobertos. — Ária sentou em uma das poltronas vagas.
— Tenho uma ideia. — Camilla se levantou de repente e todos se vi-
raram para ela. — A Rainha não fica sem seus bailes e temos um baile se aproximando. Nós que estudamos lá, temos como conseguir convites para vocês e os bailes sempre são de máscaras, de maneira que poderão ir sem serem reconhecidos.
— É uma ideia deveras interessante. — Arak coçava a barba pensati-
vo.
— Mas Camilla, em todos os bailes só se entra com um acompanhan-
te. — Julie a encarou franzindo as sobrancelhas.
— É só formarem casais. — deu de ombros e esperou a aprovação dos demais. Ninguém se opôs.
— Tudo bem, mas qual é o plano de vocês? — falei e todos se entreolharam.
— Ahn... Alessia... — Camilla me encarou incomodada com alguma
coisa.
— O que foi? — sustentei seu olhar.
— Não podemos te contar exatamente. — Julie respondeu por ela.
— Por que não? — encarei a todos incrédula.
— Ethan nos contou sobre você se entregar ao Mestre das Sombras e isso é um grande problema. Se você souber e não tiver como evitar, ele saberá de tudo. — Julie foi quem tomou a coragem necessária para dizer.
— Nunca mais vou me entregar a ele! — senti meu rosto corar. — E nunca me entreguei por inteiro!
— Sabemos disso, mas mesmo assim... é perigoso. — deu de ombros como quem diz não pode fazer nada.
— Mas então por que me trouxeram aqui? Estou sabendo do esconderijo! Estou sabendo dos fundadores poderosos aqui! Estou sabendo como se chega até aqui! — falei rápido sem conseguir manter o controle e todos se entreolharam. — Além do mais, se são tão poderosos, por que não atacaram ainda?
— Não conseguiríamos. — Ivan falou por fim.
— E por que não? Vocês têm o poder!
— Precisávamos de alguém como você. — Arak me encarou sério.
— Como eu? Por quê? Para quê? — senti-me completamente perdida.
— Para conseguirmos realizar o plano, precisamos de uma espécie de válvula de escape da magia e do poder que armazenamos. É uma magia e um poder puros e tecnicamente, só alguém puro pode controlá-los.
— E esse alguém seria eu?
— Sim. Ária nos contou que você sobreviveu ao sangue dela e ainda conseguiu poderes com a magia e com a alma. Isso é raro em um humano. No entanto, tivemos a certeza mesmo, quando Ária nos contou sobre você estar tentando ajudar esse tal de Mestre das Sombras e agora entendemos que é mesmo verdade. — Arak sorriu de leve.
— Entenderam o que?
— O poder mais puro que existe é o amor e a compaixão, e você os detém. — Luzia sentou mais perto de mim e me observou com um olhar calmo e compreensivo.
— Como é? — comecei a achar que meu cérebro terminaria cheio de
nós.
— Acontece que, mesmo que diga que não, você ama esse garoto e teve compaixão por ele, mesmo depois de ter te traído e contado a todos, sua verdadeira natureza. — explicou com um sorriso doce.
— Eu não o amo! — quase gritei, mas consegui me controlar.
— Você não percebe, mas responda-me: se tivesse que matá-lo para que consigamos libertar Fantasy da Rainha dos Vampiros... você o mataria? Ou deixaria alguém matá-lo? — Cristian, o Líder dos Fantasmas, se intrometeu na conversa e me lançou um olhar astuto.
— Eu... — tentei imaginar a situação e praticamente entrei em desespero ao me imaginar matando-o ou permitindo que alguém fizesse isso. — Não. Não deixaria...
— Exatamente. Agora Julie e Camilla, respondam essa mesma per-
gunta. — Pediu e voltou seu olhar para elas.
— Eu deixaria. — Julie falou sem hesitar.
— Eu também. Ele merece depois do que fez à Alessia e a um monte de outras pessoas. — Camilla cruzou os braços em frente ao corpo.
— Ele não teve culpa! Leslie e a Rainha o obrigam a fazer isso! Foi abandonado pelos pais e a vida toda sempre quiseram usá-lo! Pensou que encontraria um lar com Leslie e a Rainha, mas estas fizeram com que todos o temessem e se afastassem! Me contou que passou a não mais conseguir controlar seus poderes e por isso resolveu se afastar das pessoas que Leslie e a Rainha obrigavam a se aproximar dele! — não consegui mais me controlar e observei a todos como se fossem assassinos traidores.
— Você o defende. — Cristian sorriu novamente ao olhar para mim.
— Você justifica seus atos. — Arak riu de leve.
— Você afirma que te disse tudo isso, mas é mesmo verdade? — Ivan estreitou os olhos ao me encarar.
— Sim. — senti os olhos marejarem. — É a verdade. Sei porque quando me contou... senti em sua alma, senti seu coração e sua mente afirmando isso também.
— Ele é um ótimo ator. — comentou Julie com desdém.
— Nenhum ator conseguiria fingir assim! Eu sei! Eu vi! Eu senti! — tentei convencê-los por meio das palavras sem entender exatamente porque fazia isso.
— É verdade mesmo que sentiu quando ele falava? — a expressão de Cristian agora parecia de assombro.
— Sim.
— Acredito nela. Diz a verdade tanto sobre o que sentiu, quanto sobre o que o rapaz falou. Ele também dizia a verdade. — Cristian anunciou de repente e senti um enorme alívio tomar conta do meu corpo.
— Acredita no garoto das trevas? — Arak pareceu revoltado.
— Acredito no que a menina disse e disse a verdade.
— Ótimo! Já chega de discussões paralelas! Ela provou que tem a pureza de que precisamos! — Ivan se intrometeu encerrando o assunto.
— Sim. — Ária encarou um por um ao falar. — mas também precisamos tomar cuidado com isso. Seu amor pode acabar com todos nós.
— Eu não o amo. Só acho que ninguém merece ficar sozinho para sempre. — fitei o chão sem saber exatamente se acreditariam em mim. Sem saber se eu mesma acreditava em mim.
— Tudo bem, vou confiar em você, Alessia. — Ária esfregou os olhos e suspirou cansada. — Apenas lembre-se de não se entregar, mas também de não o manter completamente afastado.
— Claro. Mas será difícil. Ultimamente venho ficando com medo e
acabo por enfrentá-lo ou fugir.
— Por que? O que ele vem fazendo? — Ivan tinha um olhar curioso.
— Antes me protegia das sombras e apenas bebia meu sangue. Agora deixa as sombras me machucarem e parece querer me sequestrar ou me matar.
— senti um calafrio ao me lembrar de nosso último encontro sombrio.
— Anda enfrentando ou fugindo mais? — Ária me encarou novamente.
— Fugindo. — abaixei a cabeça envergonhada.
— Tente não fugir tanto e se acredita mesmo no que falou, tente trazê-lo de volta para o nosso lado. — tocou meu ombro e sorriu de leve. — Está bem. Vou tentar.
— Quando vocês vão voltar aqui? — Ivan cortou nosso momento de entendimento. Julie explicou a ele e a Ária o nosso plano de encontros e a distribuição, depois nos despedimos de todos e começamos a seguir o caminho de volta ao túnel escuro e à Caverna de Cristal.
Ao sairmos da caverna, Ária me segurou pelo cotovelo e sussurrou que teria que me lançar um feitiço. A questionei e me explicou que nem todo o conselho acreditou que resistiria ao Mestre das Sombras, que era melhor fazer acreditar que tudo aquilo fora apenas um sonho.
— Não! Por favor, Ária, não faça isso!
— Não posso ir contra a ordem dos fundadores.
— Finja que fez isso, mas não faça! Juro que não deixarei descobrir nada! Por favor!
— Tudo bem. — e suspirou. — Confio em você.
— Obrigada. — seguimos caminhando pela floresta até chegar à estalagem, para depois podermos voltar ao castelo. Fizemos o percurso da volta o mais rápido que conseguimos, pois tínhamos medo de ter passado um tempo excessivamente longo e os guardas não acreditassem no que estávamos alegando.
— Por que estavam fora do castelo? — disse um dos guardas.
— Nós fomos levar o meu manto para a costureira arrumar. — Camilla ergueu o manto que estava pendurado no braço esquerdo.
— E por que demoraram tanto? — a voz conhecida de Leslie ecoou da parte de dentro do castelo e os guardas estremeceram.
— A costureira em que iríamos estava fechada e levamos à outra, mas foi difícil encontrá-la tão tarde da noite. Quando encontramos uma, ficamos esperando terminar o serviço e voltamos para cá assim que pudemos. — Camilla estava estranhamente calma e agradeci por isso. Eu não estava.
— Claro... — Leslie disse em tom desdenhoso. — Mas por que foram três garotas se o manto era apenas seu?
— Elas me acompanharam. Julie tinha que consertar sua guitarra e Alessia queria conhecer alguns pontos do reino. — falou sem se deixar abalar.
— Tudo bem. Deixem-nas entrar. — Leslie ordenou e os guardas começaram a baixar o portão do castelo. Quando entramos, Leslie não estava mais lá.
Seguimos até nossos quartos em silêncio, sem ousar comentar nenhuma palavra sobre qualquer coisa que tenhamos visto ou duvidado na postura dos guardas. Despedi-me das duas e fui para o meu quarto, assim que entrei Cameron sentou-se na cama. Estivera me esperando.
— Correu tudo bem?
— Sim, o manto foi consertado impecavelmente. — encarou-me con-
fuso.
Apontei para que me seguisse até o banheiro, onde seria mais seguro passar as informações. Sentamos no chão e comecei a contar por meio de sussurros tudo que vi e ouvi no esconderijo secreto da Caverna de Cristal. Contei sobre os fundadores que estavam vivos, sobre nossos amigos que estavam bem, sobre a enorme mansão luxuosa, sobre o dragão Dust e que os fundadores tinham um plano articulado, mas que não quiseram me contar por causa da doação de sangue ao Mestre das Sombras.
— Entendo os argumentos deles. — e assentiu de leve com a cabeça.
— Ethan contou a todos vocês? — senti um misto de decepção e rai-
va.
— Não. Apenas à Camilla, Julie, Ária, Noah e eu, mas creio que Ária deve ter contado ao Lewis e ao Ônix.
— E aos fundadores.
— Sim, e talvez à Stella e Havena também. Mas porque contou isso ao Ethan e não contou a mim ou a qualquer outra pessoa? Por que confiou justo nele?
— Não sei ao certo. — fitei o chão pensativa.
— Desculpa. Não quis chateá-la.
— Tudo bem. Acho que contei porque havia acabado de descobrir sobre a morte de Carla e sobre o número onze. Estava triste e me sentindo muito sozinha e após fazer-lhe algumas perguntas sobre esse lugar, acabei contando que quase me entreguei ao Mestre das Sombras.
— Obrigado por me responder, mas não se sinta obrigada a responder tudo o que perguntar. Sinto muito, é pela sua segurança que faço essas coisas. — e me abraçou com cuidado.
— Eu sei. — retribuí o abraço me sentindo realmente cansada. — Agora acho melhor dormirmos. Estou exausta.
— Certo! — e me ajudou a levantar. — Boa noite!
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