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EuTeAmo.com | três.

29 de outubro – Segunda-feira
Assunto: Hora de desencanar.

Querido Matthew,

Sei que você deve estar querendo saber o que aconteceu na sexta-feira passada depois que terminei de te escrever aquele e-mail. Lamento desapontá-lo, mas não aconteceu nada demais naquele dia. De qualquer forma, tenho certeza que você vai ficar surpreso com o que aconteceu hoje no colégio. Fique calmo, pois vou contar em detalhes tudo que fiz no final de semana. Não quero que você me acuse de ser um péssimo amigo por não te contar as coisas.

Depois de te enviar aquele último e-mail, Arthur veio até o balcão retirar as folhas do trabalho que ele tinha impresso. Tentei manter a calma durante todo o atendimento. Evitei ao máximo olhar diretamente para ele, pois por algum motivo que eu ainda desconheço, ele me deixa nervoso e faz minha barriga ficar gelada, meu peito inflar como um balão e minha mente bugar igual a um computador quando dá aquela maldita tela azul.
Tudo bem que ele é lindo, mas não é para tanto.

— Quanto ficou tudo? — Arthur perguntou.

— Dois dólares de impressão — respondi, prontamente.

— E o tempo que usei o computador?

— Não se preocupe — falei sorrindo, mas ainda evitando olhar diretamente para ele. — O tempo fica por conta da casa.

— Muito obrigado! — Arthur agradeceu pegando as folhas e me entregando o dinheiro já trocado.

— De nada, e tenha uma boa-noite! — exclamei, educadamente.

Tentei não parecer um completo idiota na frente dele, mas acho que o Arthur não se importava nem um pouco em como eu parecia ou deixava de parecer. Ele foleou e revisou as folhas rapidamente, virou e saiu da loja.

Como sou estúpido! O que mais eu queria que ele dissesse?

Sei que você deve se perguntar o motivo de eu dar tanta importância para um garoto heterossexual que nem deve saber meu nome. Sinceramente, eu não faço a menor ideia. Talvez sejam meus hormônios gritando dentro de mim. Talvez seja o fato de eu nunca ter namorado na vida...

O sábado foi muito divertido. Logo pela manhã, acompanhei o Sr. Walsh até o hospital para ele fazer alguns exames. Ele não se sentia bem há vários dias. Durante a consulta, foi curioso o médico que nos atendeu pensar que eu era neto do Sr. Walsh por conta do grande cuidado que tenho com ele.

— Seu neto cuida muito bem de você — disse o médico.

— Ele não é meu neto — disse Sr. Walsh, dando tapinhas em minhas costas. — Ele é um amigo muito querido que veio me acompanhar.

O médico não deu boas notícias. Basicamente ele disse que o Sr. Walsh estava muito doente e que ele precisava ficar em repouso absoluto por alguns dias enquanto os resultados dos exames não saiam. Apesar da notícia, o Sr. Walsh sorriu e saiu do hospital mais tranquilo. Ele estava tão feliz e despreocupado que a primeira coisa que propôs para fazermos foi ir a um fast-food comer um grande e suculento hamburger.

Na parte da tarde, fui à casa do Sam como tínhamos combinado na quinta-feira passada. No momento em que entrei no quarto dele, senti como se eu estivesse entrando em uma loja japonesa, igual aquelas que íamos aos finais de semana para comprar mangás. O quarto do Sam é um templo de livros, gibis e bonecos de animê.
Conheci Danna, irmã mais nova do Sam. Achei ela um pouco antipática e metida no começo. Na primeira hora em que estive lá, ela passou grande parte do tempo se olhando no espelho e cuidando de seus longos cabelos loiros. Quando finalmente sentamos para conversar, percebi que ela era uma garota legal, apesar de ter o defeito de ser rude em respostas a perguntas simples. Ela não tem muita paciência para papo furado ou perguntas óbvias.
Também conheci Phillip, namorado do Sam. Ele é uma das pessoas mais divertidas que conheci até agora. A cada minuto de conversa, Phillip tinha que fazer uma piada irônica sobre o assunto em questão. As piadas dele não perdiam a graça para mim, mas Sam não parecia gostar ou achar tanta graça quanto eu. Sam e Phillip perdiam a paciência um com o outro de cinco em cinco minutos. Algumas vezes tive que tentar mudar de assunto para eles não começarem a brigar.
Passamos a tarde toda jogando conversa fora, comendo besteiras e jogando videogame. Só percebi que estava tarde quando Phillip decidiu ir embora e eu resolvi acompanhá-lo até o ponto de ônibus.

— Não ligue muito para o meu namorado — disse Phillip assim que saímos da casa do Sam.

— Não ligar para ele? — questionei. — Por qual motivo?

— Às vezes ele se acha o centro do universo — resmungou Phillip. — Danna e ele foram muito mimados pelos pais.

Phillip estava insatisfeito com as atitudes do Sam e, por todo caminho até o ponto de ônibus, falou sobre as brigas e desentendimentos que eles tiveram naquela semana. Ao que parecia, Sam se afastou de todos os amigos dele para ter uma relação fixa com Phillip, que também teve que se afastar dos amigos por causa do ciúme e insegurança do Sam. Naquele momento, Phillip me ofereceu sua amizade e disse que eu podia contar com ele para qualquer coisa já que eu era novo na cidade e não conhecia muita gente.
Foi aí que eu decidi pedir um conselho...

— Estamos falando de interesse sexual ou afetivo?

— Ambos.

— Todo cara gay da nossa geração deve saber que é total perda de tempo se interessar por um cara hétero de maneira afetiva.

— E sexual?

— É completamente normal acharmos um cara heterossexual atraente, afinal somos homens gays e temos desejos como qualquer pessoa.

— Mas...

— Já fiquei com um cara hétero uma vez em uma festa. Estávamos tão bêbados que ele nem se importou quando fiz um oral nele.

— Você fez o quê?

— No dia seguinte, ele veio falar comigo em particular e me fez jurar que eu jamais contaria o que aconteceu, afinal ele é hétero e não quer que ninguém saiba sobre essa pequena experiência.

— Então...

— Alguns caras heterossexuais são facilmente afetados por uma festa, uma garrafa de vodca e uma ereção. Eles se soltam e despertam uma bissexualidade oculta, mas nunca passa de uma noite, e no dia seguinte, o cara vai odiar o que fez pelo resto da vida.

— Foi o que aconteceu com o cara que você pegou?

— Ele nunca mais falou comigo! Ele me ignorou por quase dois anos até que saímos do colégio.

— Mas era só desejo sexual?

— Com certeza!

Phillip deu sinal para o ônibus que ele estava esperando parar e se despediu de mim com um abraço apertado antes de ir embora. Fiquei parado no ponto de ônibus alguns minutos pensando em tudo que ele disse sobre ter relações com um cara heterossexual... Eu nunca ia querer passar por aquilo.
Tenho que parar de me enganar e de tentar enganar você, Matthew... Sinto alguma coisa pelo Arthur desde a primeira vez que o vi. Eu não quero mais ter este sentimento. Sei que se eu desencanar agora, provavelmente em alguns dias vou rir de tudo isso.

Quando cheguei ao colégio hoje de manhã, fui recebido por um panfleto anunciando o baile de outono que o colégio realizará no próximo sábado. As garotas estavam eufóricas e andavam de um lado para outro falando sobre vestidos e acompanhantes.
Inglês era minha primeira aula do dia e eu sabia que o assunto seria esse tal baile. Minha professora de inglês é uma das organizadoras e é responsabilidade dela distribuir tarefas para os alunos. Encontrei meu amigo Thomas no corredor segundos antes de entrar na sala de aula. Ele estava me procurando para fugir da Nina e das ideias que ela tinha em relação ao baile.

— Já foi convidado para o baile? — perguntou Thomas, olhando estranhamente para os lados.

— Como assim? — questionei.

— É tradição que as meninas convidem os meninos para o baile de outono — explicou.

— Não acho que alguma garota tenha interesse por mim.

— Por isso que quero ir com você — sussurrou.

— Eu não sou uma garota.

— Alec, eu sei que você tem um pênis, mas não estou te convidando para ir como meu par — disse Thomas, ainda olhando em volta. — Vamos como amigos.

— Por qual motivo mesmo? — perguntei, confuso.

— Nina provavelmente vai me convidar e eu estou tentando escapar dela. — Thomas confessou.

Thomas era incrivelmente fofo. A confusão que ele fazia e o medo que ele tinha de se relacionar com a Nina eram tão cômicos que eu até shippava os dois em segredo.

— Thom, do que você tem tanto medo?

— Quem disse que eu tenho medo?

— Está na cara que você tem medo de ficar com a Nina.

— Quem disse isso?

— Eu estou dizendo!

— Não seja abusado, Sr. Alec!

— Do que você tem tanto medo?! — perguntei tão alto que todos que estavam próximos passaram a nos olhar com curiosidade.

Thomas e eu começamos a rir igual a um par de idiotas. Aquilo fez com que nossos colegas desviassem suas atenções para algo mais importante do que dois perdedores fazendo palhaçada. Ele não deu mais detalhes do que pretendia fazer em relação a Nina, ao baile de outono ou ao convite que me fez. Thomas apenas se despediu e foi para sua primeira aula do dia.

Fiquei surpreso quando entrei na sala de inglês e vi que quase o time de basquete inteiro estava fazendo companhia para o Arthur. Pelo pouco que consegui ouvir da conversa, eles estavam falando sobre o baile de outono. Quase todos os membros do time já tinham um par para o baile. Os únicos que ainda não tinham sido convidados eram Zach, lateral do time, e o próprio Arthur.

— Arthur, você é muito mole! — exclamou um dos amigos dele.

— Vocês sabem que não posso aceitar convites pois já tenho namorada. — retrucou Arthur.

Não consegui ouvir nada além daquela frase. "Já tenho namorada" ficou martelando em minha cabeça centenas de vezes durante todas as aulas e pelo resto da tarde. Acho que é o que eu precisava ouvir para parar de ficar suspirando por um rapaz como o Arthur. Tudo bem que ele é lindo e que me faz sentir estranhamente bem quando está por perto, mas ele é hétero! Arthur não sabe sobre minha patética existência e provavelmente não sabe nem o meu nome. Talvez ele nem faça questão de saber meu nome... Ele nem percebeu que o garoto que trabalha no Cyber Café é o mesmo que senta a poucos metros de distância dele na aula de inglês.

Neste momento estou terminando de arrumar as coisas para fechar o Cyber Café e me sinto bem melhor em relação a este assunto. Estou pronto para acordar amanhã com outras perspectivas e pronto para tirar Arthur Arthit da minha cabeça.
Matthew, não se preocupe com nada. Eu só me interessei pelo Arthur fisicamente. Ele é muito atraente, atlético, tem um belo sorriso e belos olhos orientais. Atrações físicas passam em um estalar de dedos. Provavelmente encontrarei outro garoto para admirar nos próximos dias.
Vai passar!

Tenho um trabalho muito complicado para entregar esta semana. Peço desculpas antecipadas se eu demorar para te escrever o próximo e-mail.

Obrigado por sempre estar aqui comigo.

Alec Stevens.

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