Capítulo 6: Nem sempre o significante tem um significado.
"Não existe a forma e uma ideia correspondente; não há a significação e um signo correspondente. Há formas e significações possíveis (nunca correspondentes); há, apenas, em realidade, diferenças de formas e diferenças de significações; por outro lado, cada uma dessas ordens de diferenças (por conseguinte, de coisas já negativas em si mesmas) só existe como diferenças graças à união com a outra." [Ferdinand de SAUSSURE]
Cheguei em casa, troquei de roupa e rapidamente abri meu tablet e liguei o Skype, logo recebia uma chamada de um certo Lancelot, e a tela estava preenchida pela imagem de Thomas, com seus cabelos bagunçados e informais, seu sorriso mais que divino e olhos azuis brilhantes, sua voz aveludada veio até mim zombeteira:
- Boa noite, princesa!
- Boa noite, Senhor! Como foi seu dia? – Não conseguia impedir o sorriso bobo em meu rosto, quase engessado e dolorido.
- Um pé no saco, seus colegas são terrivelmente óbvios e entediantes, até para as fotos, mas faz parte. O lado bom de você ser perseguida por eles é que eu posso ver como está. Mas peço desculpa por esses idiotas, eles são...
- Não precisa se desculpar. – Falo com um pequeno sorriso. – Eles são ridiculamente engraçados as vezes. Bem, por causa disso tudo estou afastada por 1 semana das minhas funções para esperar a poeira baixar.
- Vem pra cá. – Ele oferece de forma sedutora, como uma sereia chamando o marinheiro para nadar com ela em seu mar de perdição.
- Não, uma das ordens do meu chefe é literalmente não ir atrás daquele filho da puta.
Thomas irrompe em uma daquelas raras gargalhadas gostosas. Sabe aquelas que vem da alma, da cabeça cair para trás? Para ele que era aparentemente estoico, podia ser assustador, mas para mim que conhecia o homem sob tudo aquilo, era apenas adorável.
- Seu chefe me ama profundamente.
- Ele apenas pediu para que matasse os paparazzi de tédio, com uma vida simples e normal. Assim como você me aconselhou. E assim o farei, levarei roupa na lavanderia, vou ao supermercado, passearei com minha amiga Dana, vou viver simplesmente.
- Tudo bem, e o Jorge ficará a sua disposição.
- Eu agradeço, mas ter um motorista não ajuda muito neste lado da normalidade. – Minha resposta veio acompanhada de um rolar de olhos dele de pura impaciência.
- Ele acompanhará a distância, com um carro mais simples, se os abutres cercarem ele vai intervir. – Sua expressão era determinada, não dando margem ou brecha para negociação.
- Tudo bem. Se isso o deixa mais seguro. Eu aceito.
- Princesa, as coisas vão ficar meio apertadas nos próximos dias, vou tentar conseguir mais tempo para falar com você, mas será mais curto. Hoje eu consegui por que a coletiva foi durante o dia, e a estreia será só amanhã. Londres tem essa abertura maior por ser a porta de entrada da Europa. Mas nas outras cidades, as coisas serão mais corridas, vamos ter coletiva durante o dia, estreia a noite. Então imagina como são as coisas. Mas sempre darei um jeito de falar com você, entre um idiota perguntador e outro. – Sua expressão era de desapontamento, contrariado.
- Tudo bem. Enquanto isso ficarei aqui fazendo um monte de coisas chatas e entediantes.
- Sinto sua falta, sabia? – Seu olhar era de partir o coração, traduzia tudo que ele queria dizer.
- Eu também sinto a sua. – Sorrio tristemente.
Até que a voz do seu agente veio ao fundo: "Ei! Declan! Reunião cara! Vamos! O John já está ai!"
- Desculpa linda, mas tenho que ir. O diretor da série veio até Londres falar comigo, então preciso falar com ele. Mas assim que puder mando mensagem. – Ele inesperadamente joga um beijo para a tela.
E eu mais surpreendentemente ainda me pego retribuindo, jogando um beijo para a tela e como recompensa recebendo um sorriso bobo.
- Até mais! Beijos!
- Se cuida, menina! – Uma piscadinha veio com um sorriso lindo e aberto.
- Você também! – Sorri de volta.
Quando ele desligou, parecia que o apartamento tinha voltado a ficar cinzento a minha volta, e o sorriso foi vagamente se apagando, então estava pronta para afundar na rotina de fazer jantar, comer, me preparar para dormir, ler algo até cair no sono.
***
Batidas na porta me assustam, levanto a cabeça do travesseiro como se levasse um soco, então me sento na cama e caminho rapidamente para abrir a porta na esperança de que as batidas incessantes parassem de vez. E assim que abrir a porta, as batidas foram substituídas por uma torrente de cabelos ruivos e palavras:
- Eu pensei que estivesse morta! A dias sem dar notícia! Só vendo você através dos blogs! Na verdade estou acompanhando sua rotina chata através dos blogs, se bem que você quase não tem saído, em três dias saiu apenas uma vez ao supermercado e uma para a lavanderia. Pensei que encontraria seu cadáver! Aqui no chão! Com moscas! – Ela andava em volta inspecionando tudo, como se certificasse da minha saúde mental. – E Oh meu Deus! Seu apartamento está terrivelmente limpo! O que houve com você? Foi consumida por um alien? Sem recortes de jornal na parede, sem xícaras largadas sobre a mesa? Sem revistas de três semanas atrás sobre a mesa de centro? Sem louça suja na pia? Sem roupas largadas por ai? O que houve com você? Ai caramba! Você finalmente tirou a pilha de jornais velhos daqui! – Ela aponta estupefata para um dos cantos da sala - Katherine, você está bem mesmo? – Ela olha para mim chocada.
- Eu apenas estou com tempo livre suficiente para arrumar meu apartamento, só isso. Aproveitei para colocar a leitura em dia, separar algumas roupas antigas para doação, ler coisas que poderiam dar uma possível matéria, arrumar a dispensa. Estou até pensando em pintar as paredes mudar essa cor, eu mesma cuidar da pintura. – Falava pensativa olhando para a parede, até que canso de fingir a conformada, e rapidamente deixo jorrar meu descontentamento com a situação. - Oh! Meu Deus a quem estou querendo enganar? Estou quase enlouquecendo de tédio!
- E o Thomas? – E lá vamos nós a mais uma espécie de ping pong que éramos especialistas, com pergunta e respostas rápidas, olhando uma nos olhos da outra para ver se tudo estava bem mesmo. Nesse caso Dana com as mãos na cintura por que duvidava de que eu estava realmente bem e eu com a postura cansada de quem diz "vamos, eu provo que estou bem".
- Só algumas mensagens, ele tem estado ocupado.
- O David?
- No castigo do silêncio.
- Emily?
- Apenas informações vagas, gritinhos, "estou maravilhada" – imito o jeito dela elogiar tudo e então continuo com voz entediada - elogios ao James, e mais suspiros, como uma adolescente.
- Por que não me ligou?
- Por que você ainda trabalha.
- Olha pelo lado bom, são férias forçadas e remuneradas.
- Eu não tiro férias.
- Por isso são forçadas.
- Mas eu não deveria tirar.
- Bem que deveria tirar.
- Para descobrirem que tem outro melhor.
- Você é a melhor.
- Não sou a melhor, ainda não ganhei um Pullitzer.
- Foda-se o Pullitzer. Você é a melhor e por isso o David cuida de você.
- Desde quando castigo é cuidar?
- Pais fazem isso.
- Verdade.
- Você precisa de uma terapeuta, Kath.
- Não preciso, Dana.
- Precisa sim, conheço uma que é ótima. Para ter um homem como Thomas Declan do lado e ser uma super foda e power jornalista, precisa ter uma super autoestima.
- Eu tenho uma ótima autoestima.
- Você está de pijamas de flanela!
- E dái?!
- Desde quando pessoas que se acham maravilhosas usam isso. Usam camisolas de seda, meu bem!
- Eu queria me sentir confortável!
- Então dormiria nua como a Marilyn que era consciente do seu corpo e não tinha vergonha dele.
- Eu não tenho vergonha do meu corpo!
- Esse pijama dois números maiores que o seu, xadrez, ridículo que não marca uma forma sua se quer, a verdadeira imagem da derrota, só mulheres frustradas e abandonadas pelo marido usam isso, pelo que eu sei o Thomas não te deixou...Na verdade estou curiosa para saber o que a Dra. Lens dirá sobre isso. – Ela saca o celular e começa a discar.
- Não preciso disso, eu sei muito bem quem eu sou, não preciso... – Ela ergue o dedo me impedindo de continuar, enquanto um abre um sorriso pronta para falar educadamente e com aquele ar normalmente alegre que ela tinha quando queria conseguir algo de alguém.
- Olá! Derek querido! É a Dana, cliente da Dra. Lens. Você poderia marcar um horário...Não, não é para mim, é para uma amiga. Emergência. Sabe como é?...Que ótimo, o nome dela é Katherine Thompson. Muito obrigada! Você é maravilhoso! Beijos!
Ela desliga ainda meio derretida, como se tivesse comido um pote de brigadeiros, a cena até era engraçada, se não fosse uma consulta com a terapeuta para mim.
- Pronto! Daqui a uma hora a Dra. Lens vai te atender. – Ela entrega o cartão. – Aqui está o endereço. Não falte. Senão o Derek me conta. Bem, tenho que ir. O David acha que estou na rua fazendo matéria, então ainda tenho que farejar algo para chegar na redação com alguma coisa.
Vou a uma pilha de papel, reviro e entrego para ela.
- Toma essa. Cidadãos reclamando sobre a rede de metrô que não acompanha o crescimento da cidade.
- Obrigada. Matando a saudade de quando era uma foquinha iniciante e pauteira? Tadinha! Adorava te explorar, fico feliz em saber que ainda sente saudade daquele tempo. Isso é tão meigo! – Ela beija meu rosto. – Se cuida! Beijos! Mais tarde eu ligo para saber como foi!
Ela sai rapidamente, toda saltitante, me deixando para trás com aquela mistura de vontade de matá-la e carinho pelo cuidado que ela tem por mim. Suspiro e vou me arrumar, afinal, daqui a uma hora eu serei atendida pela doutora Sarah Lens, psicóloga e terapeuta. Vamos ver o que ela teria a dizer.
Era impossível não revirar os olhos.
***
O prédio de pedras ficava no Greenwich Village, um dos muitos edifícios com a fachada de pedra. Entrei no que parecia ser o porão da casa. Muitos médicos, advogados, arquitetos e profissionais liberais da região tinham por costume transformar os porões das suas casas em charmosos escritórios, muitas vezes para alugar ou para o uso próprio, como parecia ser o caso da Dra. Lens.
O jardim que ladeava a escada que levava para o nível abaixo da rua, dava um ar aconchegante e intimistas, o que já ajudava no processo de adaptação a situação e me deixava confortável para a consulta.
Bati na porta negra laqueada, e depois de alguns minutos um homem alto, loiro, de olhos azuis, que podia muito bem ser modelo abre a porta com um sorriso de anúncio de pasta de dentes.
- Olá! Sou o Derek, você deve ser a Katherine, amiga da Dana. Pode entrar. – Ele abre a porta para mim educadamente.
- Obrigada.
Enquanto me acomodava, começava entender por que Dana tinha se derretido toda ao telefone, tudo fazia imenso sentido. E começava a me perguntar se ela fazia terapia em favor próprio, ou só para ver Derek toda semana?
- Desculpa o pequeno imprevisto, é que um cliente chegou com um probleminha. Emergência mesmo, ataque de pânico. Então não podíamos deixar de encaixa-lo. O homem estava branco como uma folha de papel e suava demais.
- Sem problemas, talvez isso seja um sinal de que devo...
- Não faça isso, a maioria das pessoas...como esse cara...chegam em negação, achando que não precisam, mas depois que começam a conversar com a Dra. Lens, começam a ver que era necessário colocar todos os seus sentimentos em palavras. Isso começa a fazer sentido e até bem. Confie em mim. Enquanto isso posso ir pegando seus dados, pois sei que acabará se tornando cliente dela.
- Obrigada.
Enquanto informava meus dados, conversava um pouco com Derek, ele era muito animado, atencioso, franco e direto. Falamos de tudo um pouco, sobre onde eu morava, sobre onde ele morava. Eu morava no bairro vizinho de Gramercy Park, já ele morava em Greenwich mesmo, a algumas quadras dali, por isso adorava o emprego, por que conhecia pessoas novas, a Dra. Lens era "gente boa" com ele, como disse o próprio, e ele achava engraçado ver a expressão de surpresa do clientes quando ele abria a porta, já que a maioria das pessoas esperavam encontrar uma mulher como secretária de uma médica. Eu acredito que a beleza dele também ajudava no impacto.
Até que a abertura da porta abrupta corta nossa conversa, o homem passa andando a passos duros, com cara de "quem não gostou do que ouviu", arrumando os cabelos e a gravata, o terno sob medida, parecia um figurão. Foi impossível não pensar: "Se ele tem problemas, por que eu não terei? ". Então a voz de Derek me despertou:
- Acho que é a sua vez, Katherine.
- Obrigada, deseje-me sorte.
Ele abriu um sorriso e balançou a cabeça divertido com a situação, enquanto eu entrava cheia de receios no simples escritório da Dra. Sarah Lens, que logo ficou de pé para me receber com um sorriso acolhedor. Usando uma calça jeans e blusa de seda, sapatilhas pretas, elegante mais simples. Seu cabelo loiro e a maquiagem clara dava um ar jovial. E toda aquela atmosfera, aconchegante, me ajudou a relaxar. Ela falou amigável e cordial:
- Olá Katherine! Posso lhe chamar assim?
- Sim, claro. Pode!
- Sente-se, fique à vontade. Derek me disse que é amiga da Dana. Ela é um amor e sua alegria é contagiante.
- É sim. Ela me indic...me obrigou a vir com a senhora. – Meu comentário provocou um risinho da boa doutora.
- Como uma boa amiga, um bom motivo ela deve ter tido.
- Bem...Não sei...Talvez...As coisas tem estado meio confusas.
Enquanto me acomodava na poltrona creme em meio a sala que misturava branco com tons pastéis, me surpreendi com a facilidade que abandonei a timidez e comecei a falar. Talvez fosse por causa da personalidade afável da doutora, ou o consultório com aquele ar de sala de casa, com seu jardim de inverno visível pelos quadradinhos de vidro da porta larga de quatro folhas.
- Vamos juntas desatar esse nó e deixar as coisas bem mais simples...Por que acha as coisas confusas? Achando a ponta do fio é mais fácil desfazer o nó, não acha?
- Sim...Bem...Sabe quando sua vida está quieta e calma e do nada tudo fica bagunçado e revirado?...Pois bem, essa é a minha vida agora.
- Como assim? Especifique. – Estimulou a doutora.
- Eu era...eu sou jornalista. Tinha uma carreira estável, trabalhava muito bem, tinha grandes e boas matérias, entrevistava o prefeito, governador e tudo mais. Tinhas as preferências nas coletivas. – A doutora prestava atenção com um olhar de compreensão e confidente, as vezes fazia uma pequena anotação, mas logo voltava sua atenção para o meu relato. - Mas até que viajei para o casamento da minha amiga, ela casou com um desses astros de Hollywood. Ela abriu mão da vida dela, hoje viaja com ele para cima e para baixo, praticamente, ou melhor, vivendo a vida dele. Pois bem... – dispensei o comentário anterior com a mão. – No casamento dela, eu conheci o padrinho, um desses astros também bem vida torta: Thomas Declan. O cara com fama de tudo que não presta, sempre virando notícia por causa das piores coisas possíveis. Então quando me vi...Bum!!!...Lá estava eu, na cama dele, envolvida com ele, todo boba, cercada por paparazzi, em todas as capas de revista e blogs, meu chefe gritando pela merda que eu fiz. Resultado: Estou afastada do trabalho a 3 dias, e só vou poder voltar na segunda-feira.
- Bem...hum...Vamos por partes. Temos muitas coisas para analisar aqui. Primeiro de tudo: Como era a sua vida fora do trabalho antes disso tudo acontecer?
- Bem...eu...saia com a Dana para tomar uns drinks, arrumava meu apartamento quando dava, viajava para ver a minha amiga. Essas coisas. – Dou de ombros, meio desconfortável. Já percebendo onde ela queria chegar.
- Você trabalhava muito, deixou de lado sua vida pessoal, ai de repente descobre que tem uma, e não sabe o que fazer com isso. O que é normal. Trato muitos clientes com o mesmo problema, por incrível que pareça. Você mergulhou no trabalho por que é algo fácil de administrar, e esqueceu da vida pessoal por que ela é imprevisível, nada fácil de se organizar e completamente surpreendente, e você não gosta das coisas as quais não pode controlar. Até que surgiu o senhor Declan, o Thomas. Se tem uma impressão tão errada dele, por que se envolveu com ele?
- Isso é confuso. Eu li e vi várias coisas sobre o passado dele que são arrepiantes e desconcertantes, mas depois de convivi com ele descobri outra pessoa. É como se o Thomas que eu conhecesse não fosse o mesmo das notícias. Ele é educado, cordial, amável, protetor, sério e disciplinado.
- Você já se questionou qual desses é o verdadeiro?
- Sim, e creio que convivi com o verdadeiro, mas tenho medo de que aquela seja sua verdadeira face e ele se revele com o tempo. Ai será tarde.
- Tarde por que?
- Tarde por que terei investido muito, na verdade já estou investindo, já estou vendo minha carreira profissional virar do avesso, se perder completamente.
- Será que não tem medo de acabar como a sua amiga?
- Sim...Pode ser...Não quero ter minha vida roubada e monopolizada por ele.
- E será que isso não potencializa seus medos em relação ao Thomas?
Suspiro, silenciosa, ponderando a pergunta.
- Pronto! Já temos com o que trabalhar. – Fala a doutora. – Nos veremos semana que vem, você liga para o Derek, marca um horário e pense nisso até lá, ai podemos falar sobre essa sua insegurança. Talvez esse seja o seu nó.
- Obrigada Doutora! – Falo me levantando, ainda surpresa – É estranho, mas me sinto estranhamente bem. Não esperava me sentir assim.
- Assim como? – Ela pergunta curiosa.
- Mais leve. – Concluo com um sorriso.
- Às vezes um pouco de desabafo faz olhar as coisas com uma outra ótica. Não são só os loucos que precisam de terapia, as vezes os sãos também, para ver as coisas de forma diferente.
- Obrigada e até semana que vem!
Saio do consultório satisfeita comigo mesma, podia até fazer uma dancinha da vitória, mas eu não era disso. A doutora Lens vinha me seguindo e então falou para Derek.
- Derek, depois Katherine ligará marcando um horário para a semana que vem. Você está liberado para o almoço. Feche tudo. Eu vou usar a escada dos fundos. Bom almoço, até mais tarde! Mais uma vez, prazer em conhece-la Katherine!
- Prazer em conhece-la também, Doutora! – Respondo educadamente.
- Bom almoço para a senhora também, Doutora. Até mais! – Responde Derek.
A doutora volta a sua sala com um pequeno sorriso.
- Você e a Dana tinham razão. Ela é bem legal. – Concluo satisfeita.
- É sim. Muito legal. Eu gosto de trabalhar com ela...Bem, se quiser, se não for problema, você poderia aceitar um convite para almoçar, ai você me conta como foram as coisas.
- Bem...É...que...
- Vamos lá...Juro que não vou arrancar pedaço, sou da paz, bom moço. E nem vou dar em cima de você.
- Tudo bem. Sendo assim. Eu topo! Vamos!
- Boa garota!
Ele sorri e caminha comigo até a saída exalando por todos os seus movimentos sua satisfação.
***
- Por que você fica olhando em volta o tempo todo? Por algum acaso é procurada pela polícia? – Pergunta Derek curioso, colocando a batata frita na boca sem perder aquele ar de zombaria.
- Não...É que...Difícil explicar... – Fico vermelha imediatamente.
- Tente. Não vai ser difícil...E acredite, eu não me assustaria com nada. Por que eu já vi todo o tipo de maluquice. Acredite, aquele consultório da Dra. Lens já me fizeram ver cada coisa.
- São os paparazzi. – Simplesmente dou de ombros.
Derek dá uma gargalhada, até que corta ao ver que continuo séria com uma expressão que mostrava que não era brincadeira e que apenas lamentava aquilo.
- Fala sério! Por isso está se tratando com a Dra. Lens?
- Sim...Talvez...Pode ser.
- Você tem mania de perseguição? – Ele toma um gole do refrigerante.
Rolo os olhos, saco meu celular, abro o site TMZ em que eu era a notícia ontem, simplesmente fazendo compras.
- Olha.
Ele cospe todo o refrigerante, os olhos ficam largos e ele praticamente fala:
- Caramba! É verdade! – Ele traz o celular para mais perto do rosto e começa ler, então solta um grito atraindo todos os olhares da lanchonete – CARAMBA! VOCÊ É NAMORADA DO TOMAS DECLAN! AQUELE DA BAN...
- Xiiii! Cala a boca! – Sussurro o repreendendo, me encolhendo, enquanto os frequentadores curiosos aos poucos voltavam as suas atividades desempenhadas antes do grito. – Quer que todo mundo aqui corra atrás de mim? – Olho em volta assustada, como se a qualquer momento fosse surgir um grupo voraz de fotógrafos.
- Como assim? – Pergunta aos sussurros sem entender, achando que era exagero.
- Lá sei. Esses paparazzi são malucos. – Continuo falando baixinho.
- Mesmo? – Ele me olha como se eu fosse a maluca.
- Eles são como...lá sei...aranhas em filme de terror, surgem até da rachadura da rua, de todos os buracos imagináveis. Já me assustei com um que pulou de entre os carros na minha frente, perguntando milhares de coisas absurdas.
- Que maluquice. E como conseguiu sair sem eles por perto?
- Usando uma peruca. Um disfarce. – Retiro a peruca da bolsa mostrando pra ele, com um sorriso tímido.
- Legal! Eu conheço uma celebridade.
- Eu não sou uma celebridade. – O repreendo, mas ele parece nem ligar, me ignora continuando a divagar:
- Ainda bem que não dei em cima de você. Eu ia dar em cima de você, juro! Mas levaria um fora com toda certeza. Por que, cara! Não dá pra concorrer com o Thomas Declan. Jamais sacanearia com meu ídolo.
- Como assim? – Pergunto sem entender. Na verdade, eu já tinha entendido, só queria uma confirmação se tinha entendido direito.
- Sou fã do cara, tenho todos os CDs da banda dele, também os solo, assisti alguns shows, eu vi os filmes dele, que por sinal só se salvam por causa dele, juro!...Ah! E estou louco para ver o filme novo dele, dizem que é muito bom! – Falava Derek visivelmente empolgado.
- Sim, ele é muito bom...Digo, o filme.
- Você já viu?
- Sim, na pré-estreia de Los Angeles.
- Cara, que sorte a sua! Muita sorte mesmo! Você conseguiria um autografo pra mim, uma foto, ou até um ingresso? Lá sei. Qualquer coisa já me deixaria muito feliz. – Ele continuava falando como um adolescente animado com o ídolo. Era algo interessante de se ver.
- Sim, verei o que eu consigo. – Dou uma risadinha divertida, até que aproveito a chance para enriquecer minha pequena pesquisa, tendo um novo angulo. Afinal, um fã deveria saber tudo sobre seu ídolo. – O que você acha dele como pessoa, Derek?
- Ah! O povo fala um monte de babaquices sobre ele, sabe? Mas são um monte de besteiras. O cara é legal. Um bom compositor. Ele cometeu seus erros, mas sabe como é, o rock é meio foda neste sentido. Ele pede um certo comportamento, mas com um tempo acredito que acaba cansando, saindo dessa. Assim como ele saiu, eu sai. Eu tinha uma banda pequena, acredita? Tocava nos bares pequenos do SoHo e até fora da cidade, já tocamos em uns festivais. Mas não demos sorte, isso é para poucos, então larguei a música, consegui o trabalho com a Doutora, e estou sendo um homem sério. Sem drogas, sem mulheres diferentes todas as noites, vida correta e certinha como de qualquer cidadão. Então acredito que o Thomas está neste ritmo. Pelo pouco que vejo por ai, pelo que sei, tenho acompanhado ele nas redes sociais, até seu discurso anda mais sério, e conheço muito pouco de você, mas acho que você é um desses passos para colocar a cabeça no lugar.
- Será? Você não teve nenhuma recaída?
- Não, nenhuma. Quando você percebe que precisa mudar, isso vem fácil. Eu quase morri por causa destas farras, sabe?...Percebi que ia morrer sozinho. Por isso criei juízo, por que não queria morrer só. Amigos para farra todo mundo tem, mas amigos, como você tem, como a Dana, que cuida de você, que liga para a Dra. Lens para marcar consulta. São muito poucos. E quando coloca a cabeça no lugar você encontra pessoas legais, e traz elas à sua volta. A minha chefe é legal comigo, já considero isso um avanço, agora conheci você.
Seguro a mão do homem comovida pelo seu relato, meu olhar era de profunda admiração, entendimento e apoio.
- Mal nos conhecemos. Na verdade acabamos de nos conhecer, mas você já tem uma amiga aqui, Derek. Com toda certeza. E quanto a garota dos seus sonhos, ela pode estar mais perto do que imagina, deve ter um monte de garotas caidinhas por você por ai.
- Será? Sou feio pra caramba! – Ele brinca.
Dou uma gargalhada.
- Você pode ser tudo, Derek. Menos feio. Antes de te conhecer eu já sabia disso mesmo sem saber.
- Como assim? – Ele pergunta sem entender.
- Eu vi minha amiga toda derretida ao falar com você no telefone, então quando te vi eu entendi tudo.
- Sério? Mas cara, ela tem namorado.
- Aquele bundão não pode ser chamado de namorado. Ele nem dá valor para ela. Por favor, Derek!
- Eu não me meto com mulher comprometida, é regra da minha reabilitação.
- Pelo que já vi. Logo logo ela vai estar livre, do jeito que as coisas vão entre os dois, logo eles terminam.
- Ela é muito legal, e merece um cara legal.
- Tipo você?
- É...Tipo eu.
Nós dois rimos e conversamos mais um pouco, até que estava próximo do horário de almoço acabar. Ele pagou a conta da lanchonete, andamos pela rua movimentada, até chegar na esquina da calma rua do consultório, ele fez sinal para um taxi, enquanto este se aproximava e parava, ele fala:
- Bem, você tem meu número e eu tenho o seu, assim que chegar no consultório eu te adiciono com calma no Facebook, essas coisas. Manteremos contato. – Ele me abraça apertado e beija a minha testa. – Se cuida garota! Juízo!...E não fica encucada com besteira...Qualquer coisa me liga ou procura a Dra. Lens.
- Obrigada, Derek. E se cuida também. Beijos!
Beijo o rosto dele, o deixando vermelho, abro um sorriso, entro no taxi e vou rumo ao meu apartamento, com um sorriso bobo enquanto colocava minha peruca, me disfarçava.
Mesmo assim, ao descer do taxi fui logo rodeada por paparazzi, mesmo com peruca, eles tinham descoberto minha mentirinha que não funcionava mais. Um deles até elogiou minha peruca, outro perguntou como as coisas iam com Thomas, mas até que outro fez a ofensiva pergunta: "Você saiu do trabalho para ficar com ele? ". Colocando no sentido real com todas as entrelinhas: "Você trocou o emprego de jornalista pelo de namorada do Thomas dando golpe do baú? ". Apenas lancei um olhar congelante e bati a porta do prédio na cara do cara dele e de toda a corja.
Submergi na paz do meu apartamento. Respirando fundo, sentindo a alegria do refúgio que ele voltava a ser inteiramente para mim. Respirei fundo mais uma vez, lentamente, até que minha paz interior voltou. Fui até meu tablet e nada, nenhum sinal dele. Apenas a última postagem de Thomas no Instagram, uma foto dos fãs com ele sorridente e acompanhado da frase: "Me sinto menos solitário quando estou com vocês". Agora entendi como ele se sentia, por que aquele momento que passei com o Derek, ele falando do Thomas, é como se ele estivesse lá, fazia a saudade parecer menor, incomodar menos. Às vezes eu pensava que estava sonhando, que nada daquilo era real. Que ia acordar e eu estava na minha vida normal. Mas não, ele estava ali, sorrindo para mim, minha doce e louca realidade.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top