Wolfgang Etrius
Era madrugada. Ao ouvir um grande barulho, Wolfgang se apressou.
— Não, não. De novo não. — repetia para si, imaginando o pior.
Ao chegar diante da escada de madeira, reconheceu com dificuldade o corpo de Dominik jogado lá embaixo. Depois se afastou para o um banco de madeira caprichosamente colocado naquele corredor. Levantou a cabeça para olhar para a câmera pendurada na divisa entre a parede e o teto. Em algum lugar de Hans, estava Vladimir com toda sua arrogância assistindo a desgraça assolar novamente a antiga casa de sua família. Enterrou a cabeça nas suas mãos ossudas e, embalado por um silêncio fúnebre, sentiu vontade de chorar, perguntando-se a razao que levara aquele senhor a fazer aquilo à memória da sua doce irmã.
Thomas e Nathaniel chegaram.
— O que aconteceu aqui? — perguntou o policial, alarmado.
Wolfgang acenou com a cabeça na direção de Dominik.
— Meu Deus! Temos um cadáver num quarto e agora outro ao pé da escada. — falou o policial com o punho fechado diante da boca.
— Ele falou alguma coisa antes de cair. — mencionou Wolfgang. Tinha ouvido ele dizer muitas coisas desconexas num alemão mal falado e cheio de sotaque.
— Chegou a ouvir o que ele disse? — quis saber Thomas.
— Citou o nome de minha irmã. Disse algo sobre um amuleto e o resto não consegui entender.
Nathaniel se aproximou de Wolfgang.
— Não vai me dizer que acredita nessa bobagem toda de fantasma da sua irmã, vai?
Olhou-o bem fundo nos olhos.
— Não estou dizendo isso.
Nathan cruzou os braços, fechou os olhos e soltou um grande palavrão. Wolfgang olhou para ele de olhos arregalados, assustado com a atitude.
— Esse merda do Dominik nem me deu o prazer de enjaula-lo num manicômio, que é onde malucos homicidas como ele deviam ficar. Aposto que se jogou dessa escada para tirar de mim esse gostinho.
— Ainda está com a ideia na cabeça de que Dominik é o assassino de Eileen?
— E quem mais poderia ser? Sua irmã? Ou será que foi um pterodáctilo? — respondeu-lhe, o policial, com ironia.
— Não foi ele quem matou Eileen e também não se matou. — disse Thomas descendo vagarosamente a escada.
— Vai me dizer que também acredita nessa baboseira de espírito? Será que só eu tenho lucidez nessa casa?
Thomas não respondeu à ofensa gratuita do policial. O fidalgote, cria de Vladimir, continuou a descer a escada até chegar ao corpo de Dominik.
Wolfgang assistiu àquilo quieto e curioso. Perguntava-se o que aquele bastardo ia fazer. "Vai jogar outra pá de terra na minha dor?", pensou.
Thomas abaixou-se perto do cadáver e levantou sua camiseta. De onde estava, Wolfgang viu um símbolo da suástica nazista cortado ao meio, feito com uma espécie de faca. O velho Wolfgang, de imediato, pôs-se de pé.
— Não se suicidou. Mataram-no. — concluiu Thomas.
O policial desceu as escadas com pressa. Wolfgang acompanhou-o, na velocidade que sua idade permitia. Enquanto o fazia, a lembrança de sua irmã questionando ao pai o ódio gratuito dos nazistas espalhou-se como relâmpago por sua mente. Seus olhos voltaram a marejar e ele brigou com as lágrimas, para não deixá-las cair.
— Como isso é possível se nem podemos portar armas aqui dentro? E por quê uma suástica? Estamos sendo atacados por nazistas?
Wolfgang sabia o que significava aquilo.
— Não. Por anti nazistas. Meus pais eram desertores do exército nazista. E foi as perguntas inocentes de Kaillua sobre porquê meu pai tinha que odiar os judeus se eles eram gente como a gente que fez com que ele abandonasse o nazismo. Quando viemos morar aqui em Hans, viemos fugidos de Hitler e de suas políticas de opressão. Queríamos o perdão e planejávamos pedi-lo em praça pública, na véspera de natal de 1939, até que alguns dos que não nos queriam aqui por causa da nossa ligação com o nazismo, botaram fogo em nossa casa para nos expulsar. Só não esperavam que... — a voz de Wolfgang embargou quando as lágrimas que até então tinha segurado rolaram pelo seu rosto — Kaillua... ela não tinha ido para a praça conosco naquele dia. Atearam fogo à nossa casa com minha irmã dentro dela.
— E o que quer dizer com isso? Que Kaillua voltou dos mortos para se vingar dos nazistas a quem odiava matando Dominik e Eileen? — perguntou o policial, visivelmente cético.
— Não. — Thomas interveio. — O que acontece é que meu pai está usando a lenda para nos assassinar.
O policial franziu a testa e olhou bem para o rosto de Thomas. Wolfgang, com igual surpresa, parou na escada.
— Como?
— Exatamente. É isso que ouviu. Ele sabe de todos esses detalhes que Wolfgang acabou de contar e está usando a lenda da irmã dele para matar a todos nós aqui dentro dessa casa com a desculpa de manifestação espiritual. Vocês já pararam para reparar que todos vocês, em algum nível, tem algo contra meu pai? Então. Ele sabe disso e não aceita opositores.
— Você não pode estar falando sério. — o policial continuava a duvidar, mas o que Thomas falava fazia sentido. Em certo nível, todos ali odiavam Vladimir.
— Mas estou. Vim para esta casa a fim de desmascarar meu pai. Está vendo essa maçã na mão de Dominik? Está envenenada com fenciclidina, um alucinógeno muito forte que causa delírio. Aproveitando-se da condição patológica de Dominik, antes de colocá-lo aqui dentro, meu pai o fez assistir vários documentários macabros de nazistas tentando ser ressuscitados em cultos de magia negra. Esses documentários, não coincidentemente, eram apresentados por Eileen Schneider. O que meu pai fez foi incutir na cabeça dele que Eileen queria ressuscitá-los, por isso apresentava o programa. A intenção de meu pai era que Dominik matasse a todos nós aqui dentro também. Wolfgang é filho de nazistas. Você é um militar, assim como os nazistas também eram. Então era só fazê-lo comer algo com o alucinógeno para ativar a disfunção, desligando-o das boas condições mentais e fazendo com que ele assassinasse a todos nós, nos julgando nazistas.
— O que seu pai não previa era que Dominik se mataria ao invés de nos matar — concluiu Wolfgang.
— Exato.
— O que vamos fazer então? — ironizou, Nathaniel.
— Você é um policial, não é? O que está esperando? Vá atrás de meu pai e o coloque atrás das grades.
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