Capítulo 1.1

― Encontramos o Sr. Carter pela manhã. Kane, quero dizer ― comentou, tentando não transparecer a curiosa sobre o melhor amigo do irmão. ― Não sabia que ele havia voltado de Londres.

― Chegou faz alguns dias ― confirmou Leon. ― Fomos até Casarubra ontem, Steve, Jason e eu, para dar as boas-vindas a ele.

― Achei estranho você não comentar ― falou Marie.

― Ele esteve ocupado nos primeiros dias, se estabelecendo e organizando tudo ― justificou Leon, olhando-a com a testa franzida. ― E não pensei que ainda se importasse.

― O que quer dizer com isso?

― Hum... Eu suspeitava que você gostava dele ― respondeu, distraindo-se ao olhar pela janela. ― Mas agora você cresceu. Com certeza depois de todos esses bailes que terá pela frente, nem se lembrará dele. ― Ele se voltou para ela. ― É melhor descermos. Papai está recebendo um convidado de última hora e mamãe pediu para levá-la.

Marie imaginou que sua mãe não estaria feliz com um convite feito em cima da hora e ficou um tanto curiosa sobre quem seria.

Leon abriu a porta e a acompanhou. Enquanto desciam as escadas, ele notou que havia muito mais convidados do que quando subira para buscá-la. Pelo modo como Marie segurava firme em seu braço, Leon percebeu o quão agitada sua irmã estava.

Os "corvos", como ele chamava, ocupavam um lugar de destaque na ampla sala onde sua mãe recebia os convidados com graça e atenção.

As três delas que se ocupavam da organização da Temporada das Rosas estavam usando vestidos escuros, que pareciam sombrios apesar do luxo evidente. Enfeitando a luva da mão direita delas havia uma discreta rosa amarela bordada. Mesmo com as posturas gentis, Leon tinha certeza que teciam algum comentário sobre sua irmã ao verem-na.

Leon conduziu Marie até sua mãe, de quem se esquivou com sucesso antes que ela o obrigasse discretamente a fazer companhia aos "corvos". Foi quando viu Kane entrando e cumprimentando alguns conhecidos. Logo estavam reunidos com os outros dois amigos, todos com a mesma ideia de ficar um tempo por ali e sair sem serem notados para a noite nova-iorquina.

― Confesso que se as Rosas desse ano forem belas como sua irmã me arriscarei a ir a alguns desses bailes ― disse Jason, observando Marie.

Ela com certeza chamava a atenção dos convidados pela beleza e postura impecável.

― E desde quando você acha Marie bonita?

Leon olhou de canto para Jason, ainda olhando sua irmã.

― Desde sempre, ciumento.

― Você pode achá-la bonita, mas ir aos bailes da Sociedade da Rosa Amarela? Justo você? ― provocou Kane, rindo do amigo, que tinha entre as Damas da Rosa Amarela uma tia.

― Talvez ele queira ser perseguido por alguma mãe casamenteira ― zombou Leon, também rindo.

― Este é o grande inconveniente da Temporada das Rosas! ― opinou Steve, também observando Marie. ― É uma competição desleal, porque elas são realmente lindas e atraem pretendentes como o mel atrai abelhas.

― Bem, não será desta vez que tia Beatrice me arrumará uma Rosa! ― garantiu Jason, convicto.

― Sinto pelas Rosas ― brincou Leon, vendo Kane dar alguns passos para trás, tentando evitar a Sra. Carter, mãe dele, que decerto desejava exibi-lo às amigas.

― Seu pai conhece John St. James, Leon? ― perguntou Steve, de repente, olhando na direção contrária aos amigos assim que avistou o homem elegante sendo recebido pelo dono da casa, acompanhado da esposa e da jovem que ele supôs ser a filha do casal.

Quase que imediatamente os olhares de todos os presentes se voltaram não somente para a figura imponente e carismática do Sr. St. James, e sim para a moça no vestido cor-de-rosa.

Ela era uma visão impossível de se ignorar. A elegância em seus movimentos era hipnotizante. O nariz arrebitado lhe conferia certa petulância, o que a tornava ainda mais incomum para uma jovem que certamente tinha idade para estar entre as Rosas. A linda loira de traços delicados, olhos verdes e lábios rosados parecia ter enfeitiçado os convidados, que a observavam com curiosidade.

― Estou quase retirando o que disse ― comentou Jason.

― Posso ir aos bailes, de fato ― concordou Leon, esperando a oportunidade de se apresentar a moça, que sorria para seu pai graças à algum comentário.

A recepção parecia ter lhes interessado mais naquele instante, pois se tratava da filha do milionário do aço, John St. James, e o fato de estar ali naquela noite indicava que ele tinha muita estima pelo Sr. Armand.

Os rapazes queriam a chance de conhecer homem tão influente e perceberam quando o Sr. Armand apresentou o convidado à alguns sócios e sinalizou discretamente para que fossem até ele.

Enquanto isso, no outro lado da sala, Marie não entendia de onde havia saído a beldade que era alvo dos olhares das Damas da Rosa Amarela, ou, como Leon havia dito, os corvos.

A verdade é que não deveria se incomodar. Se aquela senhorita fosse uma das escolhidas, já deveria estar com o nome assegurado nos cinco bailes organizados pela Sociedade da Rosa Amarela, bem como muitos dos demais eventos. Marie pensava que com aqueles cabelos loiros dourados e o jeito de princesa, com certeza a linda desconhecida não precisaria invadir sua casa para roubar seu lugar ou, pior, os olhares de Kane.

Marie notou que, ao contrário dos demais, o jovem Sr. Carter preferiu observar o movimento alvoroçado em torno dos St. James de longe, os olhos azuis seguindo a jovem, que parecia nem sequer ter percebido, enquanto deslizava graciosamente em direção à sua mãe, que a recebia com um largo sorriso, já que era filha de um homem tão importante.

Marie tinha certeza que a Sra. Armand, por dentro, estava enlouquecida querendo saber se aquela senhorita era uma das Rosas.

― Minhas caras senhoras! ― exclamou sua mãe ao apresentar as convidadas inesperada às Damas da Rosa Amarela.

Marie não pôde deixar de notar os sinais quase imperceptíveis da insatisfação de sua mãe, que se mostrava uma ótima anfitriã, porém pouco gostava de ver a linda senhorita perto das Damas.

― Estas são a Sra. Grace St. James e sua filha, a Srta. Lyra Ann St. James.

Marie viu a Srta. St. James a olhar, deixando despontar um sorriso suave ao se virar novamente para as mulheres.

Era evidente como Lady D. olhava para a moça, com um misto de curiosidade e admiração, mesmo que a Sra. Reed, a Sra. Thompson e ela já soubessem tudo o que precisavam sobre ela e sua família.

Os St. James eram uma família discreta e muito rica. A boa condição financeira que tinham deu liberdade ao Sr. John St. James para se ausentar do país, deixando os negócios da família sob o encargo do filho mais velho, enquanto passava uma temporada na Europa com a mulher e a filha.

Não foi difícil para Marie, com um pouco de conversa com algumas convidadas mais jovens e melhor informadas que ela, saber que o Sr. St. James retornava aos Estados Unidos poucas vezes nos últimos três anos. Sua esposa e filha haviam se adaptado completamente à vida na Inglaterra, já que boa parte da família da Sra. St. James vivia em Londres.

Após conversar um pouco com alguns convidados, Marie voltou para perto do grupo, curiosa sobre a Srta. St. James a tempo de ouvir que ela recebera um convite para ser uma Rosa.

Marie, simpatizando com a delicada expressão de constrangimento de Lyra, pensava que talvez fosse bom tirá-la dali, pois passava a entender o apelido que seu irmão deu àquelas senhoras.

― Recebemos o convite hoje pela manhã ― dizia a Sra. St. James. ― Entretanto, meu marido e eu ainda não conversamos sobre o assunto.

― Eu entendo perfeitamente. Sra. St. James ― disse Lady D. ― Talvez a Srta. St. James gostasse de conhecer as demais escolhidas.

― Seria um grande prazer tê-las em Casarubra para o chá que oferecerei para as Rosas ― falou a Sra. Carter, já que ela própria era uma das Damas Amigas da Rosa Amarela.

― É uma excelente ideia, Hellen! ― Lady D. concordou, sorrindo.

Elas pareciam estar determinadas a fazer da Srta. St. James uma Rosa, já convidando mãe e filha para um chá na casa da Sra. Carter nos dias que se seguiriam, pois ela receberia o grupo para que se conhecessem melhor.

Marie viu uma troca de olhares rápida entre mãe e filha e teve a impressão que a Srta. St. James não estava realmente interessada em toda aquela conversa, contudo, sua mãe educadamente aceitou o convite, dando aos olhos da velha senhora um brilho de vitória.

― Querida! ― Marie ouviu a voz da mãe, que trazia Lyra para perto dela. ― Por que não convida a Srta. St. James para passar uma tarde conosco? Ela chegou há poucos dias e certamente tem muito a contar sobre seu tempo na Europa.

― Seria um prazer recebê-la ― afirmou Marie, sorrindo amigavelmente.

A outra sorriu, aparentando alívio. Marie notou que talvez não precisasse se preocupar com Lyra sendo uma rival e prometeu a si mesma que faria o possível para serem amigas.

― Eu agradeço o convite ― disse Lyra e um sorriso tímido enfeitou seus lábios.

― Venha comigo! ― Marie pegou a mão dela como se fossem velhas conhecidas. ― Quer um refresco?

A Sra. Armand observou discretamente a filha enquanto outras convidadas se aproximavam para conversar, certa de que Marie daria um jeito de neutralizar aquela atenção que a recém-chegada havia conseguido em poucos minutos. Achava que Lyra era uma grande ameaça a qualquer candidata à Rosa, pois as Damas da Rosa Amarela pareciam encantadas com a moça. Estava incomodada especialmente com convite para o chá da Sra. Carter, em sua opinião um tanto inadequado.

"Elas a escolheram somente pela fortuna e influência do pai", pensou. Tinha certeza que teria que ficar atenta. Ela era Louise Armand, ex-Rosa, Dama Amiga da Rosa Amarela, e não permitiria que ninguém furtasse de sua filha o brilho da Temporada das Rosas e um pretendente à altura. Ela faria qualquer coisa para que sua Marie recebesse a devida atenção, mesmo sabendo que aquela carinha de anjo, corpo perfeito e modos refinados de Lyra Ann St. James dariam muito trabalho.

Marie, no entanto, não parecia vê-la como ameaça, apesar do receio inicial. Para ela, Lyra era somente uma debutante como ela ― ria dos seus comentários sobre alguns convidados e preferia um lugar com muito menos pessoas naquele instante. Com alguns minutos de conversa, já era como se fossem amigas há anos.

― Estou em dívida com você por ter me tirado de perto delas! ― exclamou Lyra, evitando olhar na direção das mulheres que tentaram interrogá-la minutos atrás.

― Sei bem como se sente ― rebateu Marie, rindo. ― Isso tudo é principalmente por causa de minha mãe.

― Minha mãe nunca se importou com estes eventos ― disse Lyra, olhando discretamente ao redor.

― Você morou na Inglaterra ― retrucou Marie. ― Imagino que tenha sido convidada para muitos bailes lá.

― Por culpa de duas primas mais velhas, uma delas já na terceira temporada. ― Lyra riu. ― Cada baile uma história, decerto!

― Receio que uma terceira temporada seja uma heresia diante dos olhos da Sra. Louise Armand ― brincou Marie.

Ela não queria nem pensar nessa possibilidade e ao ver a mãe conversando animadamente com a organizadora tratou de afastar aqueles pensamentos.

Conversaram animadamente por um tempo.

Lyra se entendera muito bem com a divertida Srta. Marie Armand, que se ofereceu para acompanhá-la quando quisesse passear pela cidade, mas havia uma sensação estranha que não a deixava um só momento desde que chegara aquela casa.

Lyra se sentia observada. Mesmo que várias pessoas a fitassem, ela sabia que havia alguém em particular a encarando. Contudo, por mais que procurasse, ainda não encontrara em meio a tantos convidados quem lhe causava tal inquietação. Não era como se fosse algo ruim, apenas não sabia quem era, de onde vinha.

Algumas senhoras se juntaram à conversa das duas e a sensação só aumentava.

Foi quando ela o viu.

Um lindo par de olhos azuis olhavam em sua direção como se fosse uma presa. O olhar intenso era acompanhado de um sorriso que ela teve a impressão que a emudeceu por algum tempo, fazendo-a corar.

Virando-se para o outro lado da sala pôs-se a observar o quadro na parede, entretanto sua concentração não durou muito. Olhou por cima do ombro num movimento sutil, vendo aquele homem caminhar em direção à porta, mas não sem antes enviar a ela um último olhar.

Antes de desaparecer no outro cômodo, num gesto travesso que a desconcertou, ele piscou para ela como a promessa de um reencontro.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top