A volta de Sophia


Era noite, ventava forte; uma brisa gelada e reconfortante. Há décadas não sentia o contraste do ar frio com o calor de sua pele. As árvores no interior daquela floresta pareciam maiores do que da última vez e isso o fez refletir... Quão diferente iria encontrar o mundo agora, pois embora quarenta anos fosse muito tempo para uma vida humana ou até mesmo sobrenatural, não era nada se comparada com a história; ele tinha consciência de que era apenas um mero ser insignificante, talvez sem importância, mas isso não lhe afetava. Ter ficado quarenta anos sem observar a luz do sol, entretanto, o afetava. Ainda mais sendo pertencente da única família de vampiros que podia andar sob a luz do sol, e esses não eram os seus únicos benefícios, afinal, foi a mordida de um Habsburgo que foi capaz de gerar um híbrido (metade lobo, metade vampiro) e era exatamente por esse motivo que ele, Matheo, caminhava por uma grande floresta, a caminho de um dos lugares mais obscuros do mundo sobrenatural, onde criaturas de todas as espécies frequentavam os mesmos lugares. Criaturas hostis, assassinos, caçadores de recompensas. Por sorte, sua família era muito temida e respeitada nesses lugares, exercendo por vezes, o controle de algumas dessas vilas.

Finalmente se desvencilhou das grandes árvores e adentrou a uma pequena estrada de pedra localizada na parte mais interior daquela gigantesca floresta. Nenhum humano jamais avistara esse lugar; ao menos nenhum que tenha visto sobrevivera para contar. Caminhava lentamente pelas ruas estreitas, havia postes, algumas pessoas reunidas em pequenos grupos; nunca ninguém andava sozinho, e esse foi um dos motivos pelos quais fizera Matheo ser alvo das atenções. Ele cobria o rosto com um longo capuz preto, não sabia se seria reconhecido, mas preferiu não arriscar. Antigamente, esse lugar era pouco frequentado, sendo a espécie predominante a dos vampiros; entretanto, tudo parecia ter mudado, pois além das ruas estarem quase que totalmente ocupadas, havia espécies de todos os tipos em grande quantidade; lobisomens, bruxos, magos, vampiros... Os olhares causavam certo desconforto em Matheo, pois todos sabem que só há dois motivos para alguém andar sozinho em um lugar como este: Ingenuidade ou anseio desesperado pela morte. De qualquer forma, Matheo os considerava um pouco ousados em encará-lo com tanta confiança e desprezo, afinal foi ele junto com sua família que havia fundado esta vila.

Ele deu de ombros, continuou andando, ajeitando o capuz para não ser reconhecido e entrou em um dos antigos bares que há tanto tempo não frequentava. Assim que abriu a porta, se aproximou do balcão, localizado ao centro. O lugar era dividido em três andares; o primeiro havia várias mesas redondas, uma mesa de sinuca se localizava ao centro, ao lado de uma escada de madeira que levava para o piso superior. Matheo contornou a mesa de sinuca, encarando algumas pessoas sentadas a mesa circular, que gritavam e faziam apostas, aparentemente bêbadas, e prosseguiu em direção ao balcão, ignorando os olhares ameaçadores que um grupo de lobisomens lançava, enquanto jogavam sinuca.

- Há quanto tempo, Joseph! – Sussurrou Matheo para o barman.

Joseph o encarou, desconfiado, afinal o viu entrar sozinho em seu bar, e não conseguia ver o seu rosto.

- Quem é voc... ?

- Ora, você já se esqueceu de quem colocava para fora os briguentos de seu bar? – Respondeu Matheo, descontraído, enquanto se ajeitava em seu acento.

- Matheo! – Sussurrou Joseph, se aproximando do homem e lhe dizendo em seu ouvido, ainda mais baixo. – Melhor ir embora, você e sua família não são mais bem vistos aqui! – Disse ele, com um olhar preocupado.

- Do que você está falando? Fomos nós que construímos este lugar! – Irritou-se Matheo, apesar de não se reconhecer como Habsburgo.

- Eu sei! Todos sabem, mas é que com tudo o que tem acontecido nesses últimos tempos...

- Do que você está falando? Eu estou preso há mais de quarenta anos. – Matheo exibia um olhar irritado, mas aparentemente estava sob controle. O barman limpava o suor de sua testa, enquanto lembrava-se momentaneamente de como o seu colega lidava com a raiva. - Me atualize!

- Seus irmãos... Bom, digamos que as pessoas estão desconfiadas. – Ele serviu uma dose de uísque a Matheo, e continuou. – Estamos vivendo tempos difíceis, uns dizem que o fim do mundo está próximo e que uma grande guerra está por vir. Malignus está de volta; depois de séculos sem aparecer para ninguém, ele finalmente se mostrou. – Joseph sussurrava como se sentisse medo das próprias palavras e Matheo sentiu um calafrio em seu corpo ao ouvir aquele nome. Pareceu distante por alguns segundos, talvez atordoado, mas se recuperou rapidamente. – Pode-se dizer que ele não se mostrou da melhor forma, pois matou quase uma alcateia inteira de lobisomens. – Ele fez uma pausa e apontou disfarçadamente para um grupo de lobisomens que jogavam sinuca. – Dizem que eles foram os únicos que sobraram...

- Mas por que ele faria isso? – Retrucou Matheo, irritado.

- Essa é a questão, Malignus está indo atrás dos traidores. E seus irmãos, bom, já lutaram contra eles há muito tempo quando houve a guerra... Qualquer pessoa que for vista ajudando algum traidor, também será punida da mesma forma. Uma das maiores alcateias de lobisomens já foi dizimada, e agora... Quem será o próximo? Estão todos apavorados. E depois do que aconteceu a seus irmãos... Boatos se espalharam de que ele tinha a bruxa Sophia em suas mãos, e mesmo assim não a entregou a Malignus, e Cairo... Sinto muito por ele, mas as pessoas estão dizendo que eles não são mais fortes como antes. Um ser metade lobo metade vampiro acabar com uma das famílias mais poderosas que existe, digamos que isso não foi muito favorável à imagem de vocês, e agora as pessoas estão começando a questionar não só a lealdade, mas suas forças.

- Entendo... – Disse Matheo, lançando olhares disfarçados ao pequeno grupo de cinco lobisomens. – Bom, eu já estou indo embora, mas antes preciso de uma informação... Eu sei que muita coisa deve ter mudado durante quarenta anos, mas percebi que aqui ainda é o melhor lugar para se conseguir informação. Então quero que me diga, onde está esse tal de híbrido que matou o meu irmão?

Joseph o encarou assustado.

- Você vai matá-lo?

- Digamos que não estou indo lá só por causa dele...

- Bom, fiquei sabendo que o mago Mohamed estava junto com o híbrido, quando resgatou a bruxa...

- Mohamed? – Matheo se mostrou surpreso, enquanto se lembrava da noite em que o atacara. – Eu o conheço... Acho que já sei onde eles estão. – Concluiu pensativo, enquanto virava a dose de uísque de uma só vez. Estava sentado de costas para a porta de entrada, sentiu sua garganta arder e o aproximar de alguém desconhecido. Virou-se um pouco irritado e se deparou com um lobisomem, se aproximando do balcão e se sentando ao seu lado.

- Vou querer o de sempre, Joseph! – Disse o lobisomem, encarando Matheo com um sorriso confiante. O rosto do Habsburgo estava inteiramente coberto e isso acabava por chamar a atenção. – E você companheiro... ? Veio de fora, certo? – Disse o homem, enquanto servia-se de sua dose. – Olha... Não me leve a mal, mas esse não é um lugar para pessoas virem desacompanhadas. Se me permite lhe dar um conselho, vá embora!

Matheo o encarou de relance e respirou profundamente. Colocou a mão em um dos bolsos e tirou algumas moedas.

- Certo, estou indo embora. – Disse Matheo, sem olhar para o lobo que o aconselhara. Em seguida colocou as moedas sobre o balcão e virou-se para sair daquele lugar. – Fique com o troco, Joseph!

Já estava de saída, quando sentiu uma mão fria segurar seus ombros e o puxar. Ele revirou os olhos, irritado. Virou-se e se deparou com outro homem, aparentemente um bruxo, que encarou diretamente em seus olhos.

- Matheo!... Ele é um HABSBURGO! – Gritou o homem, enquanto todas as atenções no bar se voltavam para ele. Pela primeira vez, ficara sem reação. – A família traidora, Malignus irá...

Matheo aproximou-se rapidamente do bruxo e com um movimento rápido, agarrou sua nuca e forçou sua cabeça contra o balcão, mais rápido do que qualquer um ali presente pudesse acompanhar. Ouviu-se um estrondo da colisão e o homem caiu no chão, desacordado. O seu capuz deslizou para baixo e todos viram o seu rosto. Ele estava de cabelo cortado, a barba feita, não parecia mais aquele homem que ficara quarenta anos presos no subsolo de um castelo. Seu nariz fino e pontudo lembrava os traços de seus irmãos, embora ele odiasse isso. Todos imediatamente se levantaram. O lobisomem que o havia aconselhado desfizera o sorriso que estava em seu rosto.

- Não vim aqui para brigar, acalmem-se! – Disse Matheo, massageando as mãos, enquanto gesticulava para que tornassem a se sentar. Ninguém o obedeceu, mas ele não se importou. – Então, me deem licença. – Disse ele, se aproximando da porta de saída, que foi bruscamente fechada com um chute por um lobisomem. Matheo encarou o homem e depois a todos, um por um, observando com cautela e tentando descobrir quem seria o primeiro ingênuo que o atacaria. Algumas pessoas saíram do bar, sorrateiramente. Matheo se aproximou do balcão; Joseph não estava mais lá, o bar não estava mais tão cheio, não havia mais bêbados gritando ou jogando baralho, o grupo de lobisomens estava a sua frente; um deles partira o taco de sinuca ao meio, mas ninguém se aproximou. Matheo segurou um dos copos que estava na mesa. Ele o pressionava com sua mão, controlando sua força para que ele não estilhaçasse de uma só vez, mas exercia cada vez mais pressão. Finalmente o copo se rachou e depois se partiu em três pedaços. Aquilo fez um corte profundo em sua mão, que cicatrizou quase que imediatamente. Ele então começou a contar com os dedos quantas pessoas havia naquele bar, e isso pareceu deixá-los ainda mais irritados. Finalmente parou de contar, todos estavam completamente estáticos; em seguida Matheo conseguiu pressentir uma breve hesitação de cinco pessoas em posições diferentes. Milésimos depois, três delas estavam ensanguentadas e mortas sobre o chão, pois o vampiro lançara certeiramente os cacos de vidro em seus respectivos pescoços. Ele contemplou com satisfação cada olhar apavorado, e se surpreendeu por ninguém ali ter recuado. – Devia ter pegado um copo maior. – Disse ele, contemplando todos no bar avançarem em sua direção.

Sophia nos encarou, olhava cada um de nós com extrema cautela, tentando assimilar a situação. Seus olhos estavam confusos, mas logo ela se recuperou, depois de piscar algumas vezes e nos reconhecer, exibindo em seu rosto uma pequena felicidade misturada com exaustão. Ela olhou para Elvira e agradeceu com um sorriso disfarçado, Elvira apenas a olhou; parecia satisfeita, mas por algum motivo relutava em demonstrar isso.

- Mohamed? O que faz aqui? – Disse Sophia, aparentemente surpresa.

- Vim me certificar de que a profecia irá se completar. – Respondeu ele sorridente. – Mas para isso ser possível você teria que estar ciente de seu destino, e não presa com a família...

- Os Habsburgos! – Disse ela, mais para si mesmo do que para o mago. – Tom... Eles me levaram com eles, mas como? – Ela olhou para Mohamed, depois para mim e Elvira, em seguida encarou Arthur e voltou-se o olhar para o mago. – Como fizeram eles me deixarem ir embora? – Sophia se mostrava confusa e, a julgar pela sua agitação, extremamente ansiosa.

- Bom... Na verdade eles não tiveram escolha. – Mohamed se afastou um pouco para o lado e apontou em direção ao híbrido, desacordado no chão.

- Ele? – Perguntou ela levantando as sobrancelhas. – Só ele? Mas como?

- Hum! Parece que eu não sou a única...! – Resmungou Elvira, de braços cruzados.

- A família Habsburgo... Estavam todos lá. – Sophia analisava a situação parecendo procurar alguma justificativa lógica para explicar tal acontecimento, porém, acontece que, em minha opinião, o que aconteceu com Ethan não se dá para explicar por vias dedutivas, é algo que está além de nossa compreensão.

Sophia aproximou-se do híbrido, desconfiada. Eu me aproximei devagar deles; Ethan desacordado tinha feições completamente diferentes, notei. Sempre achei incrível a mudança de personalidade que parecemos sofrer quando não estamos conscientes; como se mostrasse o que há de mais puro dentro de nós, ou em alguns casos, revelasse alguém que um dia já fomos; e agora a expressão revelava um garoto inocente, com um olhar nada assassino, dormindo confortável sobre a grama, como se não houvesse preocupações.

- O que está fazendo? – Perguntei assustado, ao ver Sophia pressionar com cautela o seu dedo contra as bochechas do híbrido. – Para, você vai acordar...

- Ele é um... Híbrido! – Disse ela, afastando a boca de Ethan com os dedos e revelando seus dentes afiados. Eu não era o único que estava tenso, vi que Elvira nos lançava olhares disfarçados. – Por que será que nunca ouvi falar dele antes? Ele não estava em nenhum dos meus livros de profecia. – Perguntou Sophia curiosa, ainda abaixada estudando o corpo desacordado do homem ao chão.

- Ele não é tão velho como nós, Sophia! – Disse Mohamed, que estava um pouco distante deles, apreciando as árvores ao redor, junto a Arthur.

- Foi um Habsburgo que o transformou, certo? – Perguntou, parecendo já saber a resposta.

- Como sabe? – Indaguei.

- Eles são os únicos vampiros que andam sob a luz do sol, portanto os vampiros transformados por eles herdam esse mesmo benefício. Qualquer outro lobisomem teria morrido com a mordida. – Disse ela com simplicidade. - Pois não se pode ser um lobo e ao mesmo tempo temer a claridade da luz. A natureza sempre busca um equilíbrio, mas nesse caso, bom, não consigo ver um equilíbrio. – Concluiu ela, enquanto todos a escutavam, assim como um aluno escuta sua professora.

Sophia virou-se para Ethan, agora ela levantava suas pálpebras.

- Sua consciência está quase voltando, provavelmente vai acordar por volta de trinta minutos.

Concluiu ela, pronta para se afastar do corpo de Ethan, mas algo a impediu. Um pressentimento, talvez, a julgar pelos seus olhares. Quando perguntei a Sophia futuramente, ela me disse que nunca havia pressentido uma energia tão camuflada como a que estava diante de si agora. Em outras palavras, o fluxo fraco de magia enganava até os bruxos e magos mais poderosos deste mundo, mas não a Sophia.

- Tem alguma coisa aqui! – Sussurrou Sophia, tentando descobrir de onde aquele pressentimento estava vindo. Olhou para Ethan, colocou suas mãos suavemente em seu pescoço e a desceu lentamente por debaixo de sua camiseta, sentindo o calor intenso de seu corpo e as batidas amenas de seu coração; indo um pouco mais afundo, mas não tanto, sentiu um colar frio em suas mãos. – É isso! – Disse ela, segurando o colar e em seguida tendo o seu braço torcido agilmente pelo híbrido, que finalmente acordara. Sophia contemplou seus olhos abertos e hostis a encararem com desconfiança. Sophia com a sua outra mão tentou fazer algo que nunca iremos descobrir, pois o híbrido previu o seu movimento antes mesmo de realizá-lo, e agora seus dois braços estavam imobilizados, deixando ela face a face com o homem, que estava abaixo de si.

- Ótimos reflexos! – Disse Sophia, que estava a poucos centímetros de seu rosto, sem conseguir mover os seus dois braços. – Mas quero ver você prever isso aqui!

Em seguida Sophia colidiu sua testa fortemente contra o nariz do híbrido. Certamente ela o quebrou, mas Ethan continuou a segurá-la, com suas expressões inabaláveis de sempre.

- Ótimo, já chega gente! – Disse Mohamed, se aproximando, cauteloso. – Ethan, ela está com a gente. É a Sophia, você já ouviu falar dela, se lembra?

Ethan a largou, quase que instantaneamente. Suas expressões estavam confusas. Ele ficou calado por alguns segundos, sentado na grama, pensativo.

- Tome! – Disse Sophia, aproximando uma de suas mãos de seu rosto. Ethan se afastou instintivamente. – Fique tranquilo, isso vai te ajudar. – Com um toque de mágica, Sophia endireitou o nariz quebrado e limpou o sangue de seu rosto. – Desculpe pela cabeçada, eu me empolguei. – Disse ela, constrangida.

- Tudo bem! – Respondeu Ethan. – Eu não sabia que era você por isso te segurei! – Resmungou Ethan, sem encarar a bruxa. Elvira o encarou, aparentemente surpresa pela sua pequena interação com Sophia. – O que houve?- Foi tudo o que perguntou.

- Do que você se lembra? – Perguntou Mohamed.

- Lembro-me de ter arrancado o coração de um deles, e depois... – Ethan colocou uma das mãos em seu peito. Estava pensativo. – Senti Tom esmagar meu coração, mas eu estou... Vivo.

- Está dizendo que não se lembra de nada depois disso? – Vociferou Elvira, se aproximando deles. – Não se lembra de ter quase matado Tom.

- Espera... Quem você matou? – Perguntou Sophia.

- Cairo! – Respondeu Elvira.

A bruxa pareceu espantada por certo momento.

- Ah, sim. Nunca gostei dele. – Respondeu Sophia, tentando disfarçar o seu alívio.

Ethan tentou se levantar, mas seu corpo cedeu.

- O que está acontecendo? – Perguntou Ethan a Mohamed.

- Você ainda está fraco... Não é qualquer um que enfrenta a família Habsburgo inteira e ainda vive para contar. – Respondeu Mohamed. – Você se transformou ontem, vai ficar debilitado por algum tempo ainda...

O dia passou rápido, aos poucos o sol desaparecia no horizonte, dando lugar a uma noite fria e estrelada. Ficamos o dia inteiro parados no mesmo lugar da floresta; Ethan ainda estava fraco, não conseguia andar, e também Mohamed nos alertou que em pouco tempo o conhecimento de que Ethan derrotara a família Habsburgo iria se espalhar. Vivíamos em tempos em que não havia espaço para o meio termo, apenas para o sim e não; um talvez já não era mais bem visto, as pessoas logo teriam que se posicionar, em um mundo que seria dividido em dois polos opostos: Os que eram contra Malignus e os que estavam ao seu lado... Certamente estava claro publicamente que Ethan não estava ao seu favor, pois libertara a única pessoa que poderia derrotar esse tenebroso ser. Sophia era essa pessoa, e eu, bom, não sei muito bem onde me encaixo nisso tudo. Em pouco tempo começaríamos a ser procurados e caçados, mas em contrapartida, também receberíamos a ajuda daqueles que estavam contra Malignus. E o restante, digo, aqueles que não se posicionarem, morreriam antes mesmo de a guerra começar.

Sophia e Mohamed lançavam feitiços ao redor, para nos proteger de qualquer estranho que aparecesse na floresta. Dormiríamos naquele lugar. Por um momento eu não pude deixar de sentir falta do conforto da casa de Mohamed, em contraste com a grama fria e úmida que teríamos que dormir. Sophia parecia estar mais animada do que da última vez em que a vi; acho que ela deve pressentir que seu destino está perto de se completar. E isso a fazia bem... Senti-me bem também. Logo adormeceria, ao lado de Ethan, que estava sentado e encostado em uma árvore, lançando olhares frustrados a grande floresta a sua volta, como se sentisse incapaz de se proteger. Ele não dormiria aquela noite. Mohamed finalmente se deitara também. Sophia era a única em pé; observava a floresta com a mesma admiração que antes Mohamed observara. E então adormeci.

Arthur, Mohamed e o herdeiro dormiam no silêncio de uma noite fria. Ethan ainda estava sentado na mesma posição, com os olhos abertos, como se meditasse. Sophia se encontrava um pouco afastada de todos, sentada em uma grande pedra que tivera certa dificuldade em subir. Mas lá de cima conseguia observar a floresta em seu todo; e misturada à brisa noturna, era muito reconfortante. Ouviu passos se aproximarem e olhou para baixo; era Elvira. Com apenas um salto, ela chegou ao topo da grande pedra.

- Bonito, não? – Perguntou Sophia a loba, referindo-se a floresta ao redor.

Elvira fez que sim com a cabeça, mas não deu muita importância.

- Presumo que não tenha vindo aqui para observar a paisagem junto comigo, estou certa?

- Está...! – Respondeu, rispidamente.

- Então, o que houve?

- Eu não posso revelar a verdade ao... Você sabe. Eu estou com as memórias dele, fui eu quem as tirei...

- Eu sei! – Disse Sophia, seca. – Mas sem a sua memória ele não vai conseguir acessar sua verdadeira força, o seu potencial...

- Mohamed falou a mesma coisa! – Disse Elvira.

- Eu sei, fui eu quem o ensinou essas coisas? – Disse Sophia, sorridente, enquanto encarava o céu estrelado. – Eu não sei do que você tem tanto medo, ele é uma boa pessoa, eu garanto que vai entender...

Elvira riu inconformada.

- Mesmo se eu disser que toda a vida dele foi uma mentira? Pelo menos nesses últimos dezessete anos. – Elvira encarava a bruxa.

- Últimos dezessete anos? Como assim? Pensei que essa era a idade dele...

- Não é! – Respondeu Elvira, relutante em contar. – É por isso que eu não posso revelar a verdade. Eu escondi mais da metade de sua vida, a única lembrança que ele tem agora é de seus pais mortos... E se eu te dissesse que aquelas duas pessoas que morreram não eram seus pais de verdade. Isso não tem perdão, camuflar mais de uma vida inteira. – Elvira fez uma pausa. – Ele provavelmente já deve ter tido conhecimento de parte de seu poder. – Sophia por um momento se lembrou do pressentimento que o herdeiro tivera quando Dom Sebastião se aproximou. Também houve o momento quando ele pensou que os maledictus eres haviam matado Sophia, que ele liberara uma grande quantidade de poder. – Como você acha que ele conseguiu fazer isso sem nenhum treinamento. Lá no fundo, parte de seu corpo se lembra de quem ele é; como você acha que ele está lidando com isso tudo numa boa... Mortes, híbridos descontrolados, sangue, magia, poder... Qualquer pessoa fora dessa realidade iria enlouquecer...

- Você está me dizendo que ele tem acesso ao seu poder?

- Parte dele, sim!

- E a única coisa que impede ele de ter o resto de seu poder são as suas memórias...

-Talvez!

- Não há espaço para talvez, Elvira! – Irritou-se Sophia. – Eu quero que me conte!

- Por que você quer que eu conte? – Perguntou Elvira, se aproximando da bruxa. – Se eu posso lhe mostrar!

Elvira colocou suas garras na nuca da bruxa, que permitiu que a loba invadisse sua mente. Ela queria saber, precisava saber quem era o herdeiro, quem era o homem a que foi destinada a treinar para enfrentar Malingus. Sentiu o mundo a sua volta desabar, o céu se desfizera, a noite virava dia e ela sentiu um leve embrulho no estômago. Viajara sessenta anos no passado e finalmente abrira os olhos, ansiosa, pois agora, depois de tanto mistério, iria saber o que realmente aconteceu entre Elvira e o herdeiro.

Falaa pessoas! Chegou finalmente o momento da revelação de Elvira. Espero que tenham gostado e não percam o próximo capítulo! Estamos chegando perto do final dessa minha história. Deixem nos comentários o que vocês fariam se tivessem parte de suas memórias roubadas de si. Até a próxima, deixe seu voto, obrigado! (: 

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