Um dia depois
Um dia depois
Eu disse a minha mãe que iria me encontrar com algumas amigas depois da escola e ela disse que se eu precisasse dela, ela estaria vendendo mais algumas invenções mirabolantes de meu pai em algum lugar perto do centro.
Peguei as cartas e as coloquei em minha bolsa da escola, escondi o fax e o datilógrafo em meu quarto, embaixo de minha cama sabendo que qualquer pessoa que tentasse entrar ali ficaria tão absorta com as roupas e objetos de Will para a venda e doação que acabaria se esquecendo do restante.
Eu precisava de um lugar com menos propensão a meus pais verem o que eu estava fazendo, pois se eles abrissem a porta e descobrissem que eu estava escondendo algo deles ficariam desconfiados e as perguntas não se calariam mais.
Resolvi pegar o dia para descansar, afinal a escola não poderia reclamar de minha conduta, pois eu estava sempre atarefada demais com a vida escolar matutina tentando tirar boas notas e sempre sem quebrar nenhuma regra.
Depois da morte de Will, o álcool e os estudos me fizeram parar de pensar tanto nele e em minhas dúvidas.
E se ele foi morto por alguém?
Pedalei minha bicicleta até o outro lado da ilha fazendo o seu contorno e me mantendo afastada das reservas naturais que havia em seu centro, pois havia monstros pavorosos ali — ou era isso o que o ditado popular dizia.
Sentei-me na praça, longe do penhasco, longe da praia, longe das lembranças e das minhas dúvidas.
Abri o envelope mais antigo, era do começo do ano anterior, há quase um ano atrás, talvez mais.
Comecei a lê-la já confusa, pois aquilo não era uma carta qualquer.
Aquilo era uma carta de ameaça contra a vida de meu irmão!
Ela não possuía uma assinatura, provavelmente o ser misterioso não almejava ser reconhecido por terceiros.
Nela estava escrito que o homem estava esperando o retorno de William para saldar a dívida acumulada há meses. Disse que entraria em contato para conversarem sobre a questão.
Eu não sabia que Will se correspondia por cartas, não sabia que ele sabia mandar uma carta, afinal sempre foi extremamente dependente de mim para dar dois passos fora do caminho convencional e confortável a ele.
Recordava-me de poucos momentos em que ele se manifestava sobre fazer algo — que normalmente ia de comprar papel-higiênico a sua necessidade de encontrar seu tutor de matemática antes que reprovasse de ano.
— William, o que você estava fazendo? — suspirei inclinando minha cabeça para o lado voltando a ler a carta.
Passei para a próxima, a próxima da próxima e assim em diante.
Em todas elas nada comprometedor era dito, nada que merecesse um fundo falso no armário e meses de segredo.
Ele não havia deixado uma carta de despedida, mais tinha que haver um motivo para que ele guardasse aquelas cartas tão bem escondidas.
Espere.
William havia sido ameaçado implicitamente por cartas; isso poderia dar mais base a minha teoria que ele havia sido assassinado, porém não havia provas para isso, apenas a minha intuição e algumas interpretações.
Quer dizer, se uma carta ameaçando a vida dele já não fosse suficiente para a polícia...
Eu não sei, sinceramente não tenho certeza se algum dia eu estaria pronta para a verdade mesmo que o que eu estivesse buscando era a mesma.
Poderíamos ser irmãos, entretanto éramos duas pessoas completamente diferentes.
Ele não era extremante responsável, porém era pontual. Não gostava de falar sobre os seus problemas, porém fazia questão que eu falasse dos meus. Não era muito carinhoso, mas sabia quando precisava estar ao meu lado. Ele sabia guardar um segredo, eu não.
Um completava o outro.
Eu só não apreciava a nossa última e mais recente diferença: eu estava viva e a vida dele havia sido roubada pelas rochas.
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