Metade do dia depois
Metade do dia depois
Eu fui à casa de Jason naquela noite.
Contei pelo telefone para ele sobre o meu pai e me impedi de chorar.
Ele ficou feliz por mim, disse que sabia que este dia chegaria, eu só precisei dar o espaço necessário para ele perceber o que estava perdendo para sempre para poder começar a agir.
Eu não me importava com as minúcias do assunto. Simplesmente estava contente por ter passado a tarde nos braços de meus pais e com William.
Toquei a campainha depois de estar quase atrasada com o conflito de que roupa eu deveria usar.
Convidar Vanessa, Carrie, Jenny, Gabriel e minha mãe para tentar encontrar a roupa perfeita para eu usar no meu encontro com Jason demorou quase uma hora inteira por causa da divergência de opiniões, mas, no final, eles entraram em consenso.
Arrumei minha saia salmão e verifiquei a blusa de seda rosa-clara que eu peguei emprestado de Carrie tendo certeza que ela não estava amarrotada.
Nunca mais convidaria aqueles cinco lunáticos para escolherem minha roupa.
Ele abriu a porta com um sorriso que me fez sorrir.
— Oi — eu disse apoiando meu corpo em uma perna olhando para ele, seu cabelo estava mais curto — gostei do novo corte.
— E você é linda — ele me convidou para entrar.
Entrei e vi o senhor Gutcher passando de um lado para o outro da sala com sua roupa arrumada sem estar suja de graxa, a madrasta de Jason estava linda com seu vestido azul.
— Vamos sair, comportem-se crianças — Gutcher disse depois de me cumprimentar e piscou para mim deixando minhas bochechas vermelhas.
A madrasta dele me deu um beijo em cada bochecha e saiu.
Ela me adorava depois de tudo o que fiz — mesmo não sendo proposital — para ajudar a sua missão de prender o pai de Scott e o próprio filho — esses dois estavam muito bem presos no continente, longe de nossa ilha, pagando com anos de prisão pelos crimes cometidos já que ambos eram maiores de idade.
As pessoas sequestradas foram levadas a uma clínica de reabilitação, um mês depois eles voltaram com a abertura de uma clínica na própria ilha. Muitas pessoas começaram a frequentá-la.
— Você está com fome? — ele perguntou um pouco desconfortável, passava sua mão pelo antebraço e depois pela sua nuca, olhava para cima e para baixo, suas bochechas estavam coradas.
Ele era lindo.
— A mãe de Carrie levou um bolo de gengibre em casa hoje e me fez comer quase inteiro — ela havia pedido demissão, depois do sufoco e perigo que sua família sofreu nesta missão, ela decidiu que estava na hora de parar — mas se você estiver com fome...
— Não estou — ele respondeu com prontidão.
Seu celular começou a tocar, ele fez uma careta e o desligou.
Meu celular começou a vibrar, olhei no visor e ignorei.
Não havia privacidade em um encontro!
Peguei o celular dele e o meu, retirei a bateria de ambos e os deixei na mesa da sala sorrindo para Jason.
— Não quero que você dê mais atenção ao seu celular do que para mim — eu falei com um toque de provocação.
— Vamos assistir a um filme? — ele convidou apontando para a televisão e o sofá que eu já bem conhecia.
Adorava passar minhas tardes no sofá enquanto ele se divertia em seu videogame.
— Você disse que queria me mostrar uma coisa, que era algo importante — relembrei-o apontando para a escada que levaria ao seu quarto.
Quando ele me convidou para o encontro naquela tarde, disse que havia algo que eu tinha que ver, algo que ele estava esperando para me devolver.
O rosto dele ficou ainda mais vermelho e ele olhou para cima.
— Eu acho melhor não... — ele começou a falar e isso me acendeu uma pequena fagulha de curiosidade.
Eu queria saber o que havia lá que eu não poderia saber, a ponto de ele ficar avermelhado e desconfortável na própria casa.
Comecei a subir os degraus com ele logo atrás de mim dizendo que não era para eu ir. Não escutei o que ele tinha a me dizer.
Reconheci a porta dele e vi que havia um tipo de luz que iluminava a fresta. Abri a porta.
O quarto estava repleto de velas brancas acesas espalhadas pelo chão, em cima do armário, da estante, da mesa, da cadeira, em todos os lugares com algumas pétalas de rosas em sua cama ao leve som de uma música calma como plano de fundo.
— Isso foi ideia de Jenny e Vanessa, as duas vieram aqui em casa e... — ele colocou uma mão sobre o seu rosto — não ria de mim, por favor.
Eu jamais iria rir dele por isso.
— Se você queria me seduzir, não precisava planejar incendiar a casa com tantas velas — sentei na cama dele e sorri.
Eu gostava de descontrair o clima com um pouco de provocação e piadas que ele entenderia. Era fácil fazê-las perto dele e saber que ele entendia que aquilo não era um convite.
— Fiquei sabendo que você é do tipo de garota difícil, tive que me esforçar — ele deu um suspiro aliviado e começou a apagar algumas velas — mas não era isso o que eu queria dar a você.
A luz do quarto estava diminuindo gradualmente, um pouco de cada vez, até chegar o momento que eu via o seu semblante com um contorno amarelado da chama da vela.
— Era isso — ele retirou algo de sua escrivaninha e me entregou.
Era uma carta.
Eu a desdobrei e aproximei-a de meu rosto tentando ler o que estava escrito nela.
Querida Ellie,
— Como você conseguiu esta carta? — perguntei apenas passando os olhos por ela, não me atrevi a lê-la.
— Minha madrasta a encontrou no fax que Scott levou do seu quarto, ela ainda estava lá, esperando para ser lida.
— Eu não acho que eu... — comecei a falar e ele me beijou, eu deixei a carta cair no chão enlaçando minhas mãos no pescoço dele, trazendo-o mais para perto.
— Você não tem que ler se não quiser — a mão dele deslizou contra a pele do meu quadril e eu senti um arrepio bem vindo — eu só queria que você tivesse a opção de ler ou não. Fazer a sua escolha.
Ele sabia melhor do que qualquer um como eu tinha medo de William e suas cartas...
Eu não estava pronta.
— Eu não quero mais dizer adeus a ele — comentei pronta para deixar aquele assunto de lado — você fez um trabalho admirável em seu quarto — retirei minhas sapatilhas e deitei na cama dele olhando ao meu redor, aproveitando para sentir a maciez de seus lençóis contra a minha pele.
Era um tipo de algodão que minha mãe era alérgica, portanto ele foi banido de casa, porém como na casa de Jason ninguém era alérgico, eu aproveitava ali mesmo.
— Acho que as decoradoras vão ficar contentes com a sua avaliação — ele sentou ao lado do meu corpo e eu rolei para encará-lo.
— O que você acha? — perguntei me espreguiçando.
Não cheguei a imaginar que um enterro e uma reconciliação familiar poderiam sugar tanta energia de meu corpo como haviam feito. Eu estava exausta.
Ele me olhou e sorriu, um sorriso quebrado que tinha mais de um milhão de significados e só eu conseguia perceber a diferença de cada um.
Era como se Jason Wright fosse um código e eu tivesse o segredo que o decifrasse.
— Acho que eu nunca vi algo mais bonito — ele ainda estava sentado, eu ainda estava deitada, nós ainda estávamos nos olhando.
Senti que ele estava perto de meu corpo, senti o calor de sua mão perto de meu braço. Era como se eu estivesse em chamas.
— Eu também achei bonito o clima das velas, muito romântico, mas é um pouco exagerado — dei de ombros.
— Eu não estava falando das velas — ele me olhou sério, porém seus olhos sorriam, traindo sua encenação.
— Não? — fingi estar desentendida.
— Eu estava falando de você na minha cama — ele sorriu inteiramente e eu dei uma risada irônica.
— Eu sempre estou na sua cama quando venho atrapalhar a sua hora de estudo — constatei apontando o dedo para ele.
— E eu sempre penso a mesma coisa — ele segurou meu dedo e inclinou seu corpo na direção do meu.
— Oh! Socorro! Vou ser atacada por este rapaz — tentei ser tão verdadeira quanto pude, queria que ele hesitasse por um segundo para eu encontrar uma saída.
Tarde demais.
— Vítimas indefesas são as minhas preferidas — ele comentou beijando meu pescoço. Fechei meus olhos.
— Desde quando você tem preferência? — tentei aparentar indignação, porém eu acabei caindo no riso ao fugir dos beijos dele.
Eu teria caído da cama se ele não estivesse de prontidão para me segurar.
— Na verdade eu não tenho, gosto de você de todos os jeitos — senti o hálito morno dele contra meu nariz.
A sua voz me trazia tanta calma e tranquilidade que eu sentia como se estivesse sendo embalada para dormir.
E eu não queria deixar de ouvir a sua voz.
— Sério? — indaguei arrumando-me na cama, colocando minha cabeça contra o travesseiro.
— Nunca tive dúvidas quando se tratou de você — ele respondeu e senti os lábios dele encontrando os meus.
Seria romântico se eu dissesse que eu também não, mas, ao mesmo tempo, seria uma mentira.
— Nem eu — comentei sorrindo contra os lábios dele e, novamente, estávamos em uma pequena luta enquanto ele tentava me imobilizar e eu tentava escapar.
Eu sempre o deixava ganhar.
Ele estava sorrindo.
Eu estava sorrindo.
Não sentia mais culpa por aproveitar minha vida, não sentia mais os estilhaços que me faltavam assombrando minha vida.
Eu era feliz.
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