Capítulo Trinta e Nove

Connor Wessex:

Uma semana depois....

Todos os dias, na última semana, tenho ido ao hospital para cuidar de Pedro e acompanhar sua recuperação. Tem sido uma rotina diferente, mas necessária. Acabei ficando no antigo apartamento dele e de Samuel, o que, preciso admitir, é surpreendentemente bem organizado. Quem diria, né? Pedro realmente não tolera nada fora do lugar. Nem um grãozinho de poeira escapa do radar dele. Acho que, se uma almofada estiver milimetricamente torta, ele vai saber.

Logo de início, quando o vi naquele estado, o choque foi grande. Senti um nó pesado na garganta, daqueles que te fazem querer engolir o choro, mas você sabe que não vai adiantar. Ele parecia tão frágil, tão diferente do Pedro que eu conhecia, sempre cheio de energia e com aquele olhar de quem quer dominar o mundo... ou pelo menos o controle remoto. Agora, vê-lo deitado, sem aquele brilho costumeiro, foi como levar um soco no estômago.

Mas, aos poucos, as coisas estão melhorando. Dá para ver sinais de recuperação, mesmo que lentamente. Ele até tenta fazer piadas para disfarçar o cansaço. E não importa o que aconteça, ele continua querendo ser o pai babão que sempre foi. Outro dia, enquanto mal conseguia levantar da cama, ele perguntou se Samuel tinha terminado o dever de casa. Como se ele não estivesse numa cama de hospital! A parte engraçada é que, mesmo do jeito que está, ele ainda acha um jeito de controlar a casa – e as nossas vidas – com aquele toque típico de "não mexe nisso aí!"

Ver isso me alivia e traz uma sensação de esperança, mas não nego: cada dia é uma montanha-russa de emoções. E, entre uma consulta e outra, entre as visitas e os cuidados, percebo o quanto o humor de Pedro, mesmo nesse momento difícil, ainda ilumina o quarto. É como se, no meio de toda essa bagunça de sentimentos, ele conseguisse me fazer rir. E, sinceramente, não há nada mais reconfortante do que saber que, apesar de tudo, ele ainda é o Pedro que eu amo.

— Mentiroso! — Samuel disse, apontando o dedo pequeno e acusador diretamente para Pedro, que o encarou, confuso, como se tivesse perdido algum capítulo importante dessa história.

— Sobre o que eu menti pra você? Com toda a honestidade, nunca menti pra você. — Pedro falou, franzindo o cenho, tentando entender onde tinha pisado na bola.

Eu observava a cena com um sorriso já se formando no rosto. Ah, a dinâmica entre pai e filho... Sempre um show à parte.

— Você disse que eu ia escolher a decoração do quarto do meu irmão ou irmã. — Samuel rebateu com aquele tom de voz típico de quem foi traído no mais profundo sentido infantil da palavra. — Mas agora o tio Caio falou que vai passar isso pra vó Gisele, a vó Agnes e o vô Elio!

Pedro ficou atordoado por um segundo, como se tivesse levado um soco de pelúcia no meio da conversa.

— Está gostando da ideia de ser o irmão mais velho, hein? — Pedro tentou mudar o foco, mas Samuel não estava tendo nada disso, e fez um beicinho que seria capaz de derreter até o mais duro dos corações.

Após uma semana de recuperação, Pedro estava claramente se sentindo melhor. Não só sua mobilidade tinha melhorado consideravelmente, mas ele também parecia cheio de energia... Energia suficiente para provocações, claro.

— Parece que você está se recuperando bem, hein? Tem energia até pra me provocar. — Falei, me aproximando com um sorriso que eu não conseguia esconder. — Acho que preciso começar a tomar cuidado com você.

— Ah, não, vou ficar quieto. — Pedro respondeu, virando-se para o filho emburrado à sua frente. — Mas, entre nós, é só pra dar algo pra tirar minha mãe desse quarto.

Ao ouvir essas palavras, minha mão tremeu de leve, uma reação automática. Eu sabia que a mãe de Pedro podia ser... bem, intensa.

— Pai, você fez isso de propósito! — Samuel acusou, sua voz ecoando pelo quarto, enquanto Pedro, agora coberto de inocência, tapava os ouvidos dramaticamente.

— Samuel, calma, eu não gritei! — Pedro retrucou, olhando para mim como quem pede socorro silenciosamente.

Pude notar que, apesar de toda a confusão, Pedro claramente não sentia mais as dores de antes. Gisele tinha me dito que os analgésicos e anestésicos já haviam sido suspensos, e era visível que ele estava melhorando a cada dia.

— Parem com isso, vocês dois! — Interrompi, tentando assumir o controle da situação. Ambos me olharam com os mesmos olhos grandes, expressões que não deixavam dúvidas de que eram pai e filho. — Essa discussão não vai levar a nada. Vamos só esperar até ser a hora de escolher a decoração do quarto do bebê, combinado? Agora, peçam desculpas um ao outro.

Eles ficaram emburrados por um segundo, trocando olhares de quem foi pego no flagra, mas eu não ia desistir fácil. Cruzei os braços e bati o pé, e, lentamente, Samuel se aproximou do pai, deixando o orgulho de lado.

— Desculpa. — Disseram os dois, praticamente ao mesmo tempo, e eu balancei a cabeça, esperando um gesto a mais. Não demorou muito até que Samuel envolvesse os braços pequenos em volta do pescoço de Pedro, puxando-o para um abraço, e o ambiente se suavizou.

— Agora, lembrem-se de serem legais um com o outro de agora em diante. Vocês são uma família, e família não ofende uns aos outros. — Falei, tentando soar sábio, mas ambos me olharam emburrados, como se o conceito de "ofensa" fosse um mistério insondável.

Pedro, com aquele brilho travesso nos olhos, olhou para mim com um sorriso no rosto.

— Você vai ver... Nunca mais vou deixar que faça algo contra você. — Ele disse, mas não havia raiva em sua voz, apenas diversão. Eu conhecia aquele olhar.

— Ah, é? Vou pagar pra ver do que você é capaz. — Respondi, soltando uma risada, enquanto ele resmungava baixinho, como se já estivesse tramando sua próxima provocação.

E, assim, a nossa pequena guerra de brincadeiras continuava.

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À medida que a energia e a resistência de Pedro foram voltando, o hospital parecia virar ponto de encontro. Cada dia mais pessoas vinham visitá-lo, e até meus amigos apareceram por lá, pela primeira vez, o que foi um alívio, pois eu já estava começando a achar que meu círculo social se resumia à equipe médica e às visitas constantes de familiares.

Foi então que minha sogra, Gisele, me puxou de lado. Até aquele momento, eu achava que já tinha visto de tudo, mas aparentemente o dia ainda guardava surpresas.

— Preciso que você faça algo por mim — disse ela, com um tom sério, e antes que eu pudesse perguntar o que era, ela já estava me levando para um quarto no final do corredor. Assim que abriu a porta, vi uma garota sentada na cama, os olhos fixos na televisão, que parecia responder aos movimentos preguiçosos de sua mão. Era como se a estática dançasse ao seu comando.

— Connor, essa é a...

— Me chame de Bella — interrompeu a garota, sem sequer desviar o olhar da tela.

— Ela... é meio que uma parente minha — Gisele disse, com uma expressão que deixava claro que a explicação seria muito mais complicada do que isso. E, honestamente, eu nem sabia por onde começar a processar tudo.

Bella finalmente olhou em nossa direção, seus olhos semicerrados, como se todo aquele encontro fosse uma grande inconveniência.

— Já decidiram o que vão fazer comigo? — Ela perguntou, mexendo distraidamente em uma mecha de cabelo colorida, que parecia recém-pintada. — Já que, oficialmente, sou como um fantasma para a sociedade...

Gisele suspirou, como se essa fosse uma longa e exaustiva história.

— Ela é... um clone que minha irmã desenvolveu — Gisele falou, tentando manter a calma.

Um clone? Eu achava que estava preparado para qualquer revelação nessa família, mas essa superou todas.

Bella riu, um som que deveria ser encantador, mas havia uma crueldade escondida em seus olhos coloridos que me fez ficar alerta.

— Então, acho que vocês vão ter que me compensar por isso. Estive presa por muito tempo e Lilly se livrou de mim. — Seus olhos brilharam de forma sinistra enquanto falava, e por um segundo, vi uma versão assustadoramente fria da minha sogra, aquela que geralmente se apresenta como uma mulher tão gentil.

— Me deixe viver como eu quero. Acho que isso é uma compensação justa — Bella disse, com uma confiança que faria qualquer um hesitar. Suas palavras tinham um peso que me fazia pensar em um aviso de que tentar controlá-la seria como segurar um furacão com as mãos.

— Já disse que, até termos certeza de que você não é instável, vamos ter que fazer mais alguns exames antes de decidir o que acontece com você — Gisele retrucou. As duas se encararam, e o ar no quarto ficou pesado. Eu quase parei de respirar. — Só falta mais um exame.

No entanto, no segundo seguinte, Bella simplesmente jogou seu corpo para trás na cama com um suspiro exagerado.

— Tá bom, tá bom. Vou fazer esse exame, desde que eu possa sair logo daqui e viver minha vida. Estou morrendo de tédio nesse lugar. — Ela resmungou, claramente contrariada, mas derrotada.

— Ah, sim! — Gisele acrescentou, como se tivesse acabado de lembrar. — Connor, eu queria saber se você poderia ficar de olho em Bella, caso ela passe nesse exame. — Bella soltou um resmungo alto, mas Gisele a ignorou completamente. — Mesmo que tenha esse jeito único de agir, ainda é menor de idade.

— Eu tenho quinze anos! — Bella exclamou, claramente irritada. — Sei muito bem me cuidar sozinha.

— Legalmente, você precisa de um responsável até a maioridade. E, pelo que me contou, só quer ter uma vida normal. — Gisele rebateu calmamente, e Bella, por incrível que pareça, se calou.

— Então, basicamente, vocês já resolveram tudo entre vocês? — Perguntei, aproveitando a brecha para me virar e sair daquele ambiente pesado.

— Não tão rápido — Gisele falou, segurando meu ombro antes que eu pudesse escapar. — Ainda tem que se preocupar com as decorações do quarto do bebê. Seu pai, Agnes e eu estamos analisando opções unissex.

Suspirei, já prevendo a confusão que isso traria, quando Bella, com sua língua afiada, decidiu soltar uma bomba.

— Então, vai ser avó de novo, hein? Quem diria. Está bem acabada para a idade. Realmente, uma mulher velha.

O clima no quarto mudou drasticamente. Se eu já achava que a temperatura estava fria, agora parecia que estávamos prestes a entrar em uma nevasca.

— O que foi que você acabou de dizer?! — Gisele rosnou, seus olhos faiscando como se fosse partir para cima da garota a qualquer momento.

Eu não precisava de mais nenhum indício para entender que estava na hora de sair dali. E rápido. Antes que o quarto fosse literalmente destruído.

Quando passei pela porta, o primeiro grito surpreso de Bella ecoou pelo corredor, e eu quase ri, imaginando o que Gisele devia estar aprontando lá dentro. Definitivamente, depois vou ter que perguntar para Alice ou um dos meus cunhados como são as broncas de Gisele. Parece que Bella estava prestes a descobrir da pior forma.

— Bem, ela pediu por isso — murmurei para mim mesmo, quando outro grito veio do quarto.

Segui sem rumo pelos corredores, tentando afastar o pensamento do que tinha acabado de testemunhar. Enquanto andava, parei em frente a uma televisão que ainda falava sobre o prédio atacado por bombas. Felizmente, ninguém havia se ferido gravemente, mas um arrepio percorreu minha espinha ao pensar no que Lilly Alves poderia ser capaz.

Sacudi a cabeça, tentando afastar o frio que sentia, e voltei para o quarto de Pedro. Lá, a cena era completamente diferente. Todos estavam reunidos, e Samuel, como sempre, estava no centro das atenções, mostrando como ele seria o melhor irmão mais velho do mundo.

Voltei para o quarto de Pedro, onde o clima era muito mais leve. Samuel estava todo animado, desenhando no quadro branco do hospital e explicando como ele seria o melhor irmão mais velho. O sorriso no rosto de Pedro era algo que eu não via há algum tempo, e não consegui deixar de me sentir aquecido por dentro ao vê-lo tão tranquilo, apesar de tudo que tinha passado.

Quando Pedro me viu entrar, seus olhos brilharam, e ele fez um gesto discreto para que eu me aproximasse. Eu já sabia o que estava por vir, então me inclinei para perto dele.

— Eu estava pensando... — Pedro começou, a voz ainda um pouco rouca, mas carregada de uma malícia suave. — Quando vamos finalmente voltar para casa e ter um tempo só nosso?

Eu ri baixo, tentando não chamar a atenção de Samuel, que estava concentrado em seu projeto de irmão mais velho.

— Só nosso? — sussurrei de volta, um sorriso brincando nos meus lábios. — Acho que Samuel vai ter algo a dizer sobre isso.

Pedro fez uma careta fingida de frustração, mas seus olhos brilhavam de diversão.

— A gente dá um jeito — ele respondeu, sua mão encontrando a minha. O toque suave dele me fez lembrar do quanto senti falta desses pequenos momentos, dessas conexões silenciosas que sempre tivemos, mesmo nas situações mais caóticas.

— Você está se recuperando rápido demais — provoquei, apertando de leve sua mão. — Acho que vou ter que tomar cuidado quando você estiver completamente de pé de novo. Vai me fazer correr atrás de você.

Ele deu um sorriso cheio de charme, aquele sorriso que sempre me derretia por dentro.

— Ah, eu já disse, vou fazer você correr muito. Só estou esperando a hora certa.

Nós dois rimos, mas havia algo mais profundo por trás daquele momento de leveza. Era como se estivéssemos reconectando, não apenas fisicamente, mas emocionalmente também. Tudo o que passamos nas últimas semanas, as preocupações, as dores... estavam se dissolvendo lentamente, deixando espaço para nós. Para o "nós" que sempre fomos, mas que estava um pouco perdido nas preocupações recentes.

— Connor, você sempre faz parecer que cuidar de mim é fácil, mas sei que não é — ele disse, sua voz ficando mais suave, mais séria. — Não sei o que faria sem você aqui.

Senti um calor subir no peito, e apertei sua mão um pouco mais forte.

— Você não vai precisar descobrir — respondi, olhando diretamente em seus olhos. — Porque eu não vou a lugar nenhum.

Ele sorriu, aquele sorriso genuíno, e sem que Samuel percebesse, Pedro se inclinou para mim, seus lábios tocando os meus suavemente. Foi um beijo curto, mas cheio de significado, como se disséssemos um ao outro, sem palavras, tudo o que precisávamos sentir naquele momento. Um beijo que, mesmo no meio do caos, me fazia lembrar de por que eu estava ali, de por que nunca iria embora.

— Tô vendo vocês aí! — A voz de Samuel nos tirou do nosso pequeno momento particular. Ele nos olhava com aquele típico olhar travesso, cruzando os braços como um mini-adulto. — Vocês dois sempre acham que podem me enganar.

Pedro e eu rimos juntos, enquanto Samuel voltava para seus desenhos, balançando a cabeça como se estivesse lidando com dois adolescentes.

— Ah, parece que teremos que esperar mais um pouco por um tempo só nosso, hein? — Pedro disse com uma piscadela, e eu sorri, meu coração batendo mais forte.

— Sim... mas vai valer a pena, como sempre.

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Gostaram?

Até a próxima 😘

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