Capítulo Dezessete
Pedro Alves:
Como eu detesto a forma como minha família simplesmente ignora o conceito de limites. Parece que eles mal conseguem se conter quando o assunto é saber como foi meu encontro com o Connor. Mal tive tempo de respirar quando percebi o interesse crescente de todos ao meu redor. Era como se todos estivessem sedentos por detalhes, mas, naquele momento, eu preferia apenas focar no que estava diante de mim.
O restante da família parecia ter encontrado algum tipo de harmonia naquela tarde. Samuel estava completamente absorvido ao lado de Connor, ambos entretidos com uma história divertida, enquanto Alice os ajudava. O restante do pessoal estava espalhado pelo sofá, assistindo à cena com sorrisos suaves, como se não quisessem perturbar a atmosfera tranquila que se formara. Era raro ver Samuel tão à vontade com outra pessoa além de mim, mas ali estava ele, rindo e trocando olhares cúmplices com Connor.
Depois de um tempo, Samuel acabou deitado em uma das mesas laterais, alternando entre ler ou desenhar. Nada parecia capaz de interromper aquela tranquilidade, e a conexão entre ele e Connor era quase palpável. Minha mãe e Agnes surgiram apenas uma vez, trazendo lanches e frutas com uma leveza quase reverente, como se temessem estragar aquele momento sereno. Normalmente, Samuel preferia o silêncio, mas, com Connor por perto, as coisas pareciam diferentes. Ele estava mais aberto, mais relaxado.
Eu notei, pelo canto do olho, que meu pai observava atentamente o desenrolar daquela interação. Era claro que Connor não estava tentando se aproximar diretamente de mim ou de Samuel, mas ainda assim, havia uma conexão. Ele estava ali, presente, mas sem invadir nosso espaço, deixando as coisas fluírem naturalmente. Samuel sempre fora uma criança agitada, curiosa, mas com Connor ele parecia encontrar um tipo de paz que eu raramente via.
Conforme a tarde avançava, pude perceber Samuel espiando Connor de vez em quando, com um olhar que era, ao mesmo tempo, animado e tranquilo. Ele não era o mesmo garoto agitado que costumava correr pela casa com os tios, mas sim uma versão mais serena de si mesmo, quase irreconhecível de tão calmo.
Minha mãe e Agnes logo tiraram o restante da família de casa, deixando-nos a sós. O clima que se instaurou era de união e paz, algo raro em nossa casa. George havia saído para almoçar com Oleg e, sinceramente, nem eu sabia como definir o relacionamento deles. Tudo o que sabia é que, naquele momento, só estávamos nós, desfrutando do silêncio confortável que se seguiu.
Quando chegou a hora de ir embora, foi difícil convencer Samuel a se separar de Connor. Ele não queria desgrudar nem por um minuto. Eu o coloquei no carro, mas não sem antes ver Connor se aproximar e dar um beijo carinhoso na bochecha de Samuel. Algo no gesto fez meu coração acelerar, e, por um breve momento, nossos olhares se encontraram. Eu senti uma pontada de surpresa e algo mais profundo, algo que me fez questionar tudo o que eu achava que sabia sobre nós dois.
Connor se aproximou ainda mais e, sem hesitar, me deu um selinho rápido. O gesto foi tão inesperado quanto significativo. Ele sorriu e disse:
— Até mais ver — suas palavras saíram suaves, mas com um peso que eu não conseguia ignorar. — Fala para o Samuel que vou querer ver o desenho que ele fez de mim assim que terminar.
Levantei o rosto, ainda atordoado, tentando processar o que ele havia dito.
— Ele... estava desenhando você? — perguntei, quase sem acreditar.
— Sim — Connor respondeu, apontando discretamente para Samuel, que segurava a folha com o desenho firmemente contra o peito, como se estivesse guardando um tesouro. — Eu notei por alguns segundos antes dele esconder.
Eu olhei para Samuel, que parecia um pouco nervoso, talvez preocupado com o que eu pensaria do desenho. O contraste entre as cores vibrantes e as linhas intensas lembrava o estilo fauvista, algo surpreendentemente avançado para uma criança da idade dele. Eu podia ver a tentativa de Samuel de expressar algo mais profundo através daquelas cores.
— Isso é... incrível! — Connor exclamou, visivelmente impressionado. — Posso tirar uma foto para usar como papel de parede no meu telefone?
A alegria genuína no rosto de Connor era contagiante, e eu sabia que ele não estava apenas tentando ser gentil. Ele realmente apreciava a arte de Samuel.
Samuel, tímido, apertou os lábios e entregou o desenho para Connor, seus olhos brilhando com orgulho.
— Para mim? — Connor perguntou, surpreso.
— Sim, tio Connor. Posso fazer outro lá em casa — Samuel respondeu, assentindo com entusiasmo.
— Obrigado! Eu amei! — Connor falou com tanto carinho, abraçando Samuel e dando-lhe outro beijo na bochecha. A expressão de felicidade no rosto do meu filho era algo que eu não via com frequência, e isso me aqueceu por dentro
Enquanto eu observava os dois, meu coração se encheu de algo indescritível. Havia uma conexão ali, algo que ia além das palavras. Connor não era apenas alguém em minha vida; ele estava se tornando alguém importante na vida de Samuel também, e isso me tocou profundamente.
****************************
Desde o momento em que Connor e Samuel se conheceram, eles pareciam ter uma conexão natural. Era algo que eu não conseguia ignorar, e, para minha surpresa, isso me trazia uma felicidade que eu mal conseguia disfarçar. Ver os dois interagindo de forma tão calorosa mexia comigo de um jeito inesperado.
Connor levantou o olhar para mim, e por um instante ele pareceu surpreso, como se não soubesse como reagir.
— Pedro... você está sorrindo com os olhos brilhantes? Posso dizer que você fica ainda mais lindo assim. — Ele cruzou os braços, com um sorriso divertido no rosto, mas eu podia sentir a sinceridade por trás das palavras.
Desviei o olhar, tentando manter o controle das emoções que borbulhavam dentro de mim. — Não sou tão insensível quanto você ou minha família pensam — murmurei, balançando a cabeça. — Só não gosto de mostrar abertamente. E, para ser honesto, é a primeira vez que Samuel desenha um retrato humano... e entrega para outra pessoa.
Observei o desenho nas mãos de Connor, enquanto Samuel ficava cada vez mais envergonhado, mexendo nos lápis de cor que usara. Connor, por outro lado, parecia genuinamente emocionado.
— Sério? Então isso é uma grande honra! — Connor exclamou, seu sorriso se alargando de uma maneira quase infantil.
— Não é nada demais... — Samuel respondeu timidamente, quase escondendo o rosto. — Só quis dar um presente pra você, tio Connor.
— Mas está maravilhoso! E me sinto ainda mais honrado por receber um presente tão especial. — Connor bagunçou os cabelos de Samuel, e a forma como ele olhava para o meu filho fez meu coração se aquecer ainda mais. Havia algo tão genuíno em sua afeição.
Eu e Samuel claramente não queríamos nos afastar de Connor. Havia um tipo de magnetismo que nos mantinha ali, perto dele. Connor começou a se virar para ir embora, mas Samuel me olhou com aqueles olhos que pediam por algo a mais. Respirei fundo e, com um toque de hesitação, perguntei:
— O que você vai fazer na próxima sexta-feira?
Connor parou e virou-se para mim, seus olhos fixos nos meus. Meu coração disparou, mas tentei manter a calma.
— Estava pensando em levar o Samuel para um passeio no parque e, à noite, irmos ao cinema. — Segurei sua mão com delicadeza, tentando não demonstrar o quanto aquilo significava para mim.
Ele estava prestes a responder quando o telefone tocou, cortando o momento. Connor pegou o aparelho, e ao ver o nome na tela, suspirou.
— Olá, Mariano... O quê? 16h? Hoje? Mariano, por que você não me avisou antes? Já são quase 15h! Como é que eu vou me arrumar e ainda chegar a tempo? — Connor falava enquanto seu rosto expressava frustração. — Ah, Mariano... Vai ficar me devendo essa!
Após desligar o telefone, ele se virou para mim e Samuel, tentando recompor a calma.
— Desculpa por isso. Mariano acabou de me pedir para acompanhá-lo a um leilão, e parece que não tenho escolha. — Antes que eu pudesse responder, o telefone tocou novamente. Ele olhou o número e rolou os olhos.
— Já até sei o que é agora. — Atendeu com uma expressão impaciente. — Oi, pai. É só um leilão, não preciso estar lá. — Houve uma pausa, seguida de um suspiro longo. — Tá, tudo bem... Mas eu quero o seu cartão para comprar alguma coisa interessante.
Quando ele finalmente desligou, Samuel, confuso, perguntou:
— O que aconteceu?
— Meu pai se juntou ao Mariano para me forçar a ir nesse evento. Nem se importou que Mariano só me avisou agora. — Connor bufou. — Leva pelo menos 50 minutos para chegar ao Grand Pearl Hotel, e eu nem estou arrumado.
— Você está ótimo assim — falei, sem pensar muito, minhas palavras saindo mais suaves do que eu esperava.
Connor pareceu atordoado por um momento, claramente não esperava um elogio tão direto. Ele coçou a cabeça, um tanto envergonhado, e tossiu uma vez para disfarçar.
— Obrigado, Pedro... mas, honestamente, não tenho nenhuma roupa adequada para isso. — Ele balançou a cabeça. — A família do Mariano é obcecada por tudo que é chique.
— Espera um pouco. — Levantei a mão, tentando acalmá-lo, e peguei meu telefone.
Dez minutos depois, estávamos no sofá assistindo TV, com Samuel no meio de nós, tomando suco, quando Alice apareceu, ofegante.
— Pedro, eu trouxe tudo o que você pediu! Estamos prontos para começar? — Alice exclamou com entusiasmo. Ela usava jeans rasgados e uma jaqueta cinza, com um brinco azul-escuro que brilhava em sua orelha. — Estou tão animada por você ter me chamado para ajudar a montar um visual!
— Não é para mim! — protestei, levantando rapidamente. — Isso é para o Connor.
Alice me ignorou completamente, batendo palmas e olhando para o relógio.
— Então, preparado para brilhar, Connor?
Connor saiu do quarto, impecavelmente vestido da cabeça aos pés. Alice sorriu com orgulho.
— Sou muito boa nisso. Até maquiagem eu escolho bem! — Alice brincou, apontando para mim. — Aproveita e cuida da sua aparência também, Pedro.
Eu apenas franzi a testa, mas Connor riu. Ele pegou as chaves do carro, ainda rindo.
— Eu te levo — ofereci. — Vai ser mais rápido assim.
Connor assentiu, e após se despedir de Samuel, seguimos para o carro. Enquanto dirigia, eu não conseguia deixar de pensar no quanto aquela tarde havia mudado.
Enquanto dirigíamos, o silêncio no carro parecia pesado, mas não desconfortável. Era como se estivéssemos ambos absorvidos em nossos próprios pensamentos, tentando processar tudo o que havia acontecido até aquele momento. De vez em quando, eu olhava para Connor pelo canto dos olhos, vendo-o mexer nervosamente no telefone, provavelmente checando as mensagens de Mariano e tentando se preparar mentalmente para o leilão. Mas havia algo mais. Algo que estava entre nós, algo que não se podia ignorar.
Depois de alguns minutos, ele quebrou o silêncio, sua voz soando mais calma do que eu esperava.
— Obrigado por me ajudar a me preparar tão rápido. E, claro, pela carona. — Ele olhou diretamente para mim, com um sorriso que era mais gentil do que qualquer coisa que eu havia visto nele até agora.
— Não tem problema — respondi, tentando soar casual, mas meu coração estava batendo mais forte do que eu gostaria de admitir. — Achei que seria mais fácil do que você ter que correr contra o tempo.
Ele riu suavemente, mas havia uma leveza em sua risada que me fez sentir mais à vontade.
— Eu nem sei como Mariano conseguiu me convencer a ir nesse leilão. E meu pai... — Connor balançou a cabeça, quase com diversão. — Eles são uma dupla. Eu devia saber que isso ia acontecer.
— Pelo menos você está arrumado para o evento. Alice realmente sabe o que faz. — Tentei mudar o foco da conversa, mas logo percebi que havia um traço de nervosismo na minha voz. Talvez porque eu sabia que o que mais importava não era o leilão em si, mas sim o tempo que estávamos passando juntos.
Connor soltou um suspiro mais profundo dessa vez, recostando-se no assento e relaxando um pouco mais. Ele parecia estar escolhendo as palavras com cuidado antes de falar novamente.
— Sabe, Pedro, hoje foi... diferente. Não esperava me sentir tão à vontade com você e Samuel. — Ele olhou pela janela por um momento, como se estivesse refletindo sobre o que dizer a seguir. — Eu pensei que seria só uma visita rápida, mas acabou sendo mais... especial.
Eu não estava preparado para a sinceridade em sua voz, e por um momento, não soube como responder. Algo dentro de mim queria que aquela conexão fosse real, mas eu ainda lutava contra o medo de me envolver profundamente.
— Foi especial para nós também — falei, minha voz saindo mais suave do que eu pretendia. — Samuel realmente gosta de você. É raro vê-lo tão confortável com alguém assim, tão rápido.
Connor sorriu, e havia algo em seu sorriso que fez meu estômago revirar de uma maneira boa.
— Eu gosto dele também. Ele é um garoto incrível. E você... — Ele fez uma pausa, olhando diretamente para mim. — Você é diferente do que eu imaginava. Mais aberto, mais... genuíno.
Senti o calor subir ao meu rosto, e agradeci mentalmente por estar focado na estrada.
— Acho que as pessoas me subestimam — murmurei. — Não mostro muito, mas isso não significa que eu não sinta. Só... escolho minhas batalhas.
Connor riu de leve, mas seu olhar permaneceu intenso, como se estivesse vendo algo em mim que eu tentava esconder.
— E eu gosto disso — ele disse, sua voz ficando mais baixa, mais íntima. — Gosto que você não seja como todo mundo. Há algo em você, Pedro, que me faz querer estar por perto. E, honestamente, isso me assusta um pouco.
Minhas mãos apertaram o volante com mais força enquanto digeria suas palavras. Connor, que sempre parecia tão confiante, tão seguro de si, estava admitindo algo vulnerável. E isso fez com que eu também me sentisse exposto.
— Talvez... talvez a gente devesse arriscar mais — falei, sem saber de onde vinha essa coragem repentina. — Quem sabe onde isso pode nos levar?
Connor olhou para mim, seus olhos brilhando com uma mistura de surpresa e algo mais profundo, algo que eu não conseguia nomear, mas que sabia que estava ali, pulsando entre nós.
— Talvez — ele disse suavemente. — Talvez devêssemos mesmo.
O resto do caminho foi percorrido em um silêncio confortável, cheio de possibilidades não ditas.
___________________________________
Gostaram?
Até a próxima 😘
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top