2. Flagrada
- Um Sexo na Praia, mesa sete!
Assim que ouço Trisha, passo por ela equilibrando sobre minha palma da mão a bandeja vazia e as nossas mãos se chocam no ar quando ela me entrega o papel com o pedido. Dirijo-me ao balcão do bar e peço a bebida ao bartender.
O Dragon's Club está felizmente lotado para o dono e isso implica mais trabalho e rapidez dos funcionários no serviço. Está tendo uma pequena apresentação de dança sensual no palco principal, enquanto as outras meninas fazem pole dance no ambiente que é tipicamente mal iluminado.
As luzes coloridas ondulam numa sintonia própria e a música eletrônica está tão alta que mal consigo ouvir o que Hannah, uma das strippers, fala quando se junta a mim no balcão do bar. Ela está usando uma fantasia de mágica sexy com lantejoulas pratas bordando as beiradas de seu sutiã dourado, e está calçando botas de borracha com salto que batem na altura de suas coxas que estão à mostra.
Vendo que não entendi o que me disse pela segunda vez, ela grita, chegando mais perto do meu rosto para que eu a ouça por cima do barulho:
- Cuidado com a mesa sete! Hope disse que estava dançando lá há poucos minutos e os caras foram muito atrevidos!
- Eles tocaram nela?
- Tentaram!
Faço uma careta, já imaginando pelo que terei de passar. A regra básica do estabelecimento é que nenhum cliente pode tocar nas garotas, mas isso não significa que todos a sigam. Quando isso acontece, temos que chamar Hércules, o segurança e o nosso salvador nas horas difíceis. O nome faz jus ao cara corpulento e monstruoso de grande que veste roupas escuras todas as noites. Ele tem cara de poucos amigos, mas eu e as meninas sabemos que no fundo ele é muito doce.
Uma vez, com o fim de nosso expediente e quando todos os clientes foram embora, nós estávamos arrumando o lugar e engatamos ao acaso uma conversa com ele. Foi meio engraçado vê-lo sem jeito rodeado de mulheres com roupas sensuais que exalavam docilidade e beleza para cima dele. Quero dizer, pode ser o sonho de qualquer cara, mas não de Hércules. Ele faz o tipo sério e calado que só observa.
- Essa música está me matando - Hannah reclama fazendo um beicinho. Hoje ela será a atração da noite e entrará dentro de alguns minutos. Ela bebe seu drinque e pisca para mim. - Vou indo nessa, garota. Deseje-me sorte!
Se tem uma coisa de que Hannah precisa, essa coisa definitivamente não é sorte. Com os cabelos longos e esvoaçantes que deslizam naturalmente pelos seus ombros, os olhos expressivos bem maquiados e um corpo de dar inveja a qualquer mulher, a garota sabe se mexer como ninguém no pole dance.
Ela caminha com suas botas de cano alto até o palco principal e se posiciona estrategicamente com a mão no chapéu colorido e brilhante que usa, de forma que não dá para ver totalmente seu rosto. A música começa e, consequentemente, o show. Ela atira o chapéu quando as batidas fortes soam e dá início à sua dança entusiástica.
Com a bebida pronta e arrumada na bandeja, eu me desvio dos vários corpos que estão na minha frente e alcanço a mesa sete, onde há três homens bem mais velhos que devoram descaradamente o fino vestido curto de cetim vermelho e a meia arrastão preta que estou usando com saltos altos.
Dragon, como gosta de ser chamado o dono do estabelecimento, tem alguma fascinação pelo vermelho, por isso faz todas as funcionárias se vestirem com esta cor. Talvez por achar que se um dragão existisse, ele seria vermelho. Ou talvez fosse em homenagem ao fogo que os dragões cospem. Não sei ao certo. A única coisa que sei é que me sinto nua com a peça, apesar de já ser o segundo mês consecutivo que eu a estou usando. Ela tem uma abertura na lateral das minhas costelas e deixa grande parte das minhas costas nua. O decote é em O e bem cavado, deixando parte dos meus seios apertados à mostra.
Tentando parecer profissional e prestativa, sirvo a bebida e jogo um dos meus melhores sorrisos.
- Gostariam de mais alguma coisa?
- Sim - um careca responde. Ele passeia os olhos pelo meu corpo e acrescenta com o seu olhar lascivo de homem excitado: - Você.
Os outros dois riem e eu continuo com o meu sorriso congelado. Dragon costuma dizer que temos que sorrir, não importa o que aconteça. Se ele soubesse de alguma reclamação dos seus clientes, estaríamos na rua num piscar de olhos.
Ao me lembrar de outras ordens do patrão, procuro brincar para fingir que o homem velho é realmente divertido:
- Acho que isso não está no cardápio, senhor.
Quanto mais eles voltassem, melhor. Esse é o lema e temos de segui-lo à risca se quisermos continuar sendo bem pagas. O Dragon's Club é um clube de strip altamente requisitado que costuma lotar, especialmente às sextas-feiras e fins de semana. Dragon faz questão de nos aterrorizar com esse argumento, dizendo que qualquer uma ali pode ser facilmente substituída se fizer alguma besteira.
O careca se recosta ao sofá de couro e toma sua bebida enquanto me olha com uma sexualidade crua estampada em seus olhos que me causa repúdio, mas eu me controlo.
- Talvez alguns petiscos - ele responde, por fim.
- O que gostaria de comer?
O sorriso malicioso que me dá revela o que ele de fato gostaria de comer esta noite.
- O que vocês têm?
Faço uma pausa para lembrar o que ainda está disponível na cozinha.
- Camarão, peixe, filé...
- Filé. Bem passado e com algumas rodelas de cebola.
Assinto com a cabeça e anoto prontamente no bloco de papel com a caneta.
- Eu gosto de carne... - Ouço ao meu lado.
Então ele coloca a mão na minha bunda que está praticamente descoberta por causa do vestido curto, e aperta um dos lados com deleite, deliciando-se mais ainda quando seus dedos nojentos abrem caminho por entre as minhas nádegas com a tanga vermelha que estou usando. Sei que isso é assédio sexual, mas meu desespero pelo emprego não me permite olhar para meus direitos agora. Não me afasto nem nada, pois recordo muito bem as palavras ácidas de Dragon se fizermos um escândalo na boate.
Procurando manter a calma e a bile que quer vir pela minha garganta, tiro educadamente a mão de mim.
- Voltarei logo com seu pedido, senhor.
E me retiro antes que tenha que chamar Hércules e aí então a coisa ficaria feia. Fomos ensinadas que era melhor evitar a briga ao máximo antes de perder um cliente, que diz sempre ter a razão. Ele pode até não ter a razão, mas tem o dinheiro que entra no caixa e isso já nos faz calar a boca.
Ajeito a peruca rosa chanel que estou usando essa noite, enquanto escuto Feeling Good de Muse tocando alto. Hannah finaliza seu número tirando o sutiã e começa a rastejar sensualmente pelo palco semicircular rodeado por homens de todos os tipos. Eles estão enfiando diversas notas de dólares na cinta-liga da coxa que ela oferece. Ao me flagrar olhando-a, ela pisca para mim e depois se levanta, jogando um beijo na minha direção antes de se virar e desaparecer pelas cortinas.
Sorrio, partindo para atender outra mesa. Desde que cheguei ali, as meninas foram bastante auspiciosas e não haviam me tratado mal em nenhum momento. Estamos no mesmo barco da necessidade e procuramos ajudar umas às outras sempre que podemos, como em alguma espécie de irmandade. Quando estou com elas, sinto o mesmo sentimento que tenho quando estou com Beth e Holly. É divertido. A diferença é que aquelas mulheres são strippers ou garçonetes da casa, assim como eu. Já Beth e Holly podem ser tão frescas quanto eu, por isso é muito provável que as duas pirassem assim que soubessem dessa parte oculta da minha vida. Ser stripper não é uma profissão muito bem vista pelas pessoas, afinal. Eu mesma não via com bons olhos meses atrás, mas, depois de conhecer as garotas, mudei totalmente de ideia. Contar onde trabalho não é uma opção, entretanto. Prefiro não arriscar perder a estabilidade da minha vida social. Nem que isso signifique continuar sendo chamada de "Rainha de Gelo".
Muitas mesas são servidas até que a noite seja encerrada com uma última apresentação que arranca muitos urros dos homens suados e excitados, até mesmo mulheres estão ali no meio. Depois, como é a tradição, todas as luzes se apagam e uma música eletrônica começa a tocar.
Sabendo do que se trata, há mais assobios e uivos das pessoas que ocupam o local quando as luzes novamente se acendem para mostrar que as garçonetes estão subindo no balcão do bar para dançar. Eu sou uma delas e essa é meio que uma oportunidade para ganharmos um extra além do salário que recebemos. Tenho que parecer sensual, fazer movimentos sexy com o corpo, mover os quadris, a cintura, tocar em mim mesma... Faço todas essas coisas com o rosto bonito de Jo na minha mente enquanto estou de olhos fechados. É por mim e por ela. Isso é por nós, e eu farei valer a pena. Quando aceitei o emprego, fiquei extremamente aliviada que não precisaria tirar a roupa, como as strippers fazem. Ficar de topless na frente de uma multidão de homens pode ser extremamente perturbador.
Abaixo o corpo e dobro a perna para frente, exatamente como as outras garotas fazem, e espero como uma bela estátua maquiada e programada para ser bem-educada enquanto engancham dólares na minha cinta-liga. Procuro sorrir com doçura e agradecer a cada cidadão e cidadã que me escolheu.
O show termina e o estabelecimento se esvazia momentos depois.
- Estou morta!
Trisha joga sua peruca em cima de uma mesa e desaba na cadeira, seu super curto vestido vermelho subindo por suas coxas quando cruza as pernas. Quando encara a bagunça das mesas que ainda terá que arrumar, geme como se estivesse com uma dor de cabeça horrível.
- Eu preciso de um banho. De um banho quente, na verdade. Não, de um banho quente com sais - corrige-se Crystal, uma mulher negra que também é stripper.
Nós rimos e nos colocamos ao trabalho. Removo a peruca rosa e a jogo em um canto qualquer. Meu couro cabeludo está incrivelmente abafado, então é um alívio poder me livrar do acessório. Corro a mão pela cabeça, espalhando os fios para que possam respirar.
- O tarado da mesa sete tocou em você, não tocou? - Hannah me pergunta com um olhar preocupado. Ela é a mais velha e parece nutrir um sentimento de responsabilidade para com todas. Soma-se ainda o fato de que ela está ali há muito mais tempo.
Recolho alguns pratos e dou uma resposta evasiva para não deixá-la preocupada à toa:
- Não foi nada de mais.
- Nada de mais? Ele passou a mão na sua bunda, Kris! Eu vi, ok?
Eu me viro com os pratos sujos ainda em mãos.
- E o que você queria? - Olho rapidamente para o restante das garotas que conversam animadas sobre alguma coisa e adiciono em voz baixa para que apenas ela me ouça: - Todas aqui são tão reféns quanto eu. Você melhor do que ninguém sabe como Dragon é quando se trata da clientela dele.
Ela suspira, sabendo que tenho razão, e me ajuda a carregar a louça suja até a pia da cozinha, onde mais funcionários estão trabalhando. Isso definitivamente não é trabalho dela como stripper, mas estou agradecida. De forma geral, o dinheiro é bom. Mas às vezes sinto que o local precisa de mais funcionários para dar conta da demanda que aumentou significativamente no último mês.
- Como está Jo?
Hannah, na verdade, é a única que sabe da minha irmã caçula. Eu não sei por quê. Talvez seja a confiança que emana dela e, somado ao dia de frustrações que tive quando descobri que mamãe teve que ser sedada mais uma vez para não agredir ninguém, acabei contando quando ela me abordou para uma conversa casual.
- Ela está linda - digo com um sorriso ao me lembrar da adolescente de 15 anos com cabelos loiros que visitei ontem. - A cada dia que passa, ela fica mais parecida com nossa mãe.
Hannah sabe sobre Serena, apenas não sabe o motivo de ela estar internada.
- Tem ideia de quando poderá receber a guarda dela?
Encolho os ombros, lembrando-me da incômoda barreira chamada "justiça".
- Somente quando eu conseguir sustentar a mim mesma e comprovar que também posso sustentá-la. Mas primeiro preciso conseguir manter um apartamento. Ela não pode morar comigo no dormitório.
Hannah balança brevemente a cabeça, concordando, e tem que se afastar quando uma das garotas a chama.
Giro o pescoço, alongando-o e sentindo-me exausta. São três da manhã, o céu está incrivelmente escuro, e meus pés doem em cima dos saltos. Pego o saco de lixo preto com ambas as mãos e saio pelas portas dos fundos para arremessá-lo na enorme lixeira que fica ali perto.
Com um movimento rápido, coloco o saco para dentro do grande contêiner enferrujado e baixo a tampa quadrada. A brisa da noite sopra em meus cabelos, bagunçando-os na frente do meu rosto, enquanto sinto um frio terrível apertada dentro do vestido indecente que mal cobre minha bunda.
- Kristanna?
Eu ainda estou de costas. A forma como a pessoa me chamou me faz virar, curiosa. Ninguém nunca me chama pelo nome. Geralmente é pelo meu apelido Kris ou Rainha de Gelo, mas esse último é usado somente quando estou na universidade.
Os meus olhos encontram dois outros misteriosos. É um homem. Ele é forte, alto, com ombros musculosos, e me lembra alguém. Não dá para ver direito quem é por causa do capuz que ele usa cobrindo a cabeça. É quando ele o baixa lentamente que tenho vontade de gritar como uma louca. Seus olhos são castanhos-chocolate, tem uma tatuagem no pescoço, e ele é...
Ele é Aiden!
- Kris!
Eu me encontro chocada demais para responder ao chamado de Hope.
- Eu preciso de você aqui, Kris!
O tatuado compartilha do mesmo choque que eu, piscando bastante impressionado com a roupa provocante que estou usando, com a maquiagem carregada no meu rosto. Isso tem que ser um sonho. Isso tem que ser um maldito sonho do qual eu acordarei em questão de segundos.
- Kris, onde você está? - A voz fina de Hope ressoa mais uma vez e concluo que quanto mais rápido eu sair dali, melhor.
Talvez... Talvez ele nem lembre no dia seguinte. Talvez esteja chapado e não se lembre de nada do que aconteceu. Ainda olhando para ele com uma expressão de terror, noto com tristeza que ele não parece estar chapado. Na verdade, nem sei se ele é esse tipo de pessoa que fica chapada.
Desesperada, faço o impensável: saio correndo. Mas como estou com saltos, está mais para uma corridinha de meio passo.
Hope me chama outra vez e sai pelas portas dos fundos para ver onde diabos eu me meti.
Ainda correndo ridiculamente nos meus saltos em direção à ela, grito ofegando antes que ela me chame de novo:
- Estou indo!
Então eu a empurro para dentro e tranco as portas dos fundos como se estivesse fugindo da polícia. Na verdade, eu estou fugindo. Mas é de algo bem pior e que abalou completamente o meu emocional.
Droga, fui reconhecida.
Isso não podia ter acontecido.
Merda! Merda! Merda!
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