1. Confronto
Hoje
- Veja, tem gente olhando para você, Kris.
Tiro os olhos do meu DSM-5 para ver que Holly está apontando toda excitada para algum lugar do refeitório da universidade. Giro os olhos ante o gesto que me atrapalhou na resolução de um estudo de caso da semana, mas olho.
Então, ergo uma sobrancelha sem perceber que estou fazendo isso.
O que aquele tatuado acha que está fazendo me encarando abertamente daquele jeito?
- Parece que o bonitão do Aiden está interessado em você, afinal - comenta Beth com interesse.
Holly dá uma risadinha enquanto termina de tomar o seu Dr. Pepper e eu me mantenho firme, tentando desvendar no que uma pessoa tão mal-encarada quanto aquela está pensando ao entrar numa espécie de batalha de olhares comigo.
Segundos se passam e ele ainda está me encarando do outro lado do refeitório.
Não me sinto desconfortável. Na verdade, enquanto pessoas tatuadas e com piercings como Aiden Blackwell permanecerem a metros de distância de mim, eu estaria perfeitamente bem. Cabelos escuros, olhos castanhos misteriosos, corpo sarado e sexy como o inferno - é como a maior parte das garotas da universidade descrevem-no. Eu sinceramente me pergunto o que há de sexy em ter mais buracos no corpo do que uma garota.
Dou de ombros e volto a ler o manual, eventualmente dando uma garfada em meu macarrão.
Dane-se o tatuado.
- Ele ainda está olhando para você.
- Deixe que olhe. Caras como ele acham que podem intimidar uma garota com um simples olhar.
- Ele não intimida você? - Holly questiona, parecendo se divertir muito com a minha opinião. - Porque, sabe, ele me intimida bastante. Ah, meu Deus, olhe para aqueles olhos penetrantes! Preciso de um incentivo desses na minha vida acadêmica.
Novamente reviro os olhos e viro uma página do livro, sem muito interesse na conversa que se desenrola.
- Não, o que você precisa é de um namorado e você sabe disso.
Beth ri e Holly finge sentir-se ofendida com o que falei, mas depois acaba se juntando a Beth nas risadas.
Com seus cabelos pretos curtos, olhos claros e uma incrível propensão para arranjar confusão, Holly é a mais extrovertida de todas nós. Ela terminou recentemente com o namorado e aparentemente já superou isso, mas Beth e eu sabemos como foi difícil na época. Tivemos que nos munir de muito sorvete, chocolate e lenços de papel para conseguir tirar Holly do luto em que havia ficado após o término de namoro com Charlie, o babaca que a traiu com uma das animadoras de torcida.
- Eles estão namorando oficialmente agora. - Holly suspira com melancolia.
Não aguento e fecho o livro grosso com um barulho forte.
- Não acredito que ainda está acompanhando as redes sociais dele.
- Holly! - Beth diz em tom de censura.
- Não fiz nada de mais! O boato que corre é esse. Eu simplesmente não pude tapar os meus ouvidos e pedir que dezenas de pessoas parassem de sair falando por aí que ele terminou comigo porque sou ruim de cama.
Suspiro forte e com tanta impaciência que as garotas desviam suas atenções para mim.
- Que idiotas! - Guardo o manual na mochila, fechando o zíper com rapidez. - Tenho que terminar um trabalho na biblioteca. Vejo vocês depois?
Após jogar beijinhos rápidos para as meninas com a mão - nossa típica despedida de amigas -, saio do refeitório lotado de universitários famintos e me dirijo ao prédio da biblioteca do campus.
É um espaço bem cuidado e limpo, com mesas, cadeiras e estantes e mais estantes de livros que possam atender às necessidades dos alunos. Escolho a mesa redonda com quatro cadeiras à qual costumo sentar e tiro os livros e caderno da bolsa para dar início às anotações. Empilho os volumes em um lado e posiciono o caderno simetricamente no outro. Ao tirar do estojo a minha caneta com pompom rosa, começo a escrever na folha do caderno pensando que daqui a duas horas terei que comparecer a uma aula.
Eu me formarei dentro de um ano e meio, então meio que não vejo a hora para os dias, os meses e os anos passarem. Como o dinheiro que tenho na poupança não é suficiente, já que mal dá para pagar as mensalidades, e com o auxílio financeiro retirado, eu trabalho e costumava fazer alguns bicos aqui e ali, o que ninguém sabia, claro.
Nem mesmo minhas amigas.
Quero dizer, elas sabem que já trabalhei em um café como garçonete. Mas o que elas e mais ninguém sabe, exceto as garotas com quem eu trabalho e Gary, o meu peixinho dourado de estimação, é que atualmente trabalho em uma casa de striptease. Não como stripper, claro. Mas sirvo os pervertidos que frequentam o estabelecimento, como garçonete. Homens repugnantes que se embebedam e se excitam com as minhas colegas de trabalho tirando a roupa. Tenho esse lado sombrio escondido até do FBI para pagar as contas, inclusive as mensalidades.
Por mais que eu saiba que fazer striptease dá uma boa grana, não me atrevo a fazer isso. São nojentos os olhares que lançam aos corpos femininos seminus. Por saber disso, admiro aquelas meninas por ainda se manterem de pé e dispostas a dançar sensualmente para conseguirem o dinheiro de que precisam.
Com uma mãe internada num instituto de saúde mental, um pai que nunca fez questão de me conhecer e uma irmã mais nova vivendo de lares adotivos, a minha vida não é exatamente o mar de rosas que as pessoas pensam que é.
Costumo visitar minha mãe periodicamente, quando obtenho a permissão e ela não está agitada e tendo surtos a ponto de agredir alguém. Já com a minha irmã, é diferente. Ela não tem nenhum problema mental grave. O grande problema reside no fato de que, uma vez sem pais e sem qualquer pessoa que possa sustentá-la sem que viva em condições miseráveis, ela tem que ficar se transferindo de um lar adotivo para outro até atingir a maioridade.
Uma vez tentei persuadir a assistente social a acreditar que eu seria uma ótima responsável e que podia dar conta de todas as necessidades de Jo. Juntei dinheiro e deliberadamente aluguei por alguns dias um apartamento. Era mobiliado para que transmitisse conforto e bem-estar aos olhos da examinadora, mas o tiro saiu pela culatra e ela terminou descobrindo que eu, na verdade, ainda ia começar a universidade com um montante que mal atenderia às minhas necessidades, muito menos às de Jo.
Não sei exatamente no que estava pensando na época, mas a minha insistência em querer tirar minha irmã daquele lugar solitário era grande.
Queria que ela ficasse comigo, que crescesse perto de mim, assim como eu havia crescido alguns anos perto de mamãe. Ela precisa de uma figura, um ideal a seguir. Precisa de uma pessoa que passe segurança e estabilidade depois de tudo o que ela perdeu, quando mamãe foi internada. Eu queria ser essa pessoa. Queria poder ajudar minha irmã caçula porque eu a amo incondicionalmente, apesar de termos convivido por poucos anos, quando ainda éramos uma família harmoniosa.
Vejo Jo quase todos os dias. Sempre fiz questão de conhecer pessoalmente as pessoas que tomam conta dela temporariamente. Faço o que posso, dou o que posso, até ter condições de manter um apartamento para nós duas. Todo mês guardo uma parte do dinheiro do salário para realizar esse propósito grandioso para mim: tirá-la daquele lugar, desta situação desconcertante. Sei como passar quatro anos trancada num centro mental pode ser horrível. Transitando de um lar adotivo para outro, aos cuidados de estranhos, então, poderia ter o mesmo impacto sobre uma adolescente que passou quase oito anos de sua vida à mercê de outras pessoas.
Sei o que é estar à mercê de outras pessoas.
E não é nada bom.
Antes me trazia pesadelos terríveis sempre que eu lembrava o que aconteceu, ainda que tenha me tratado do trauma. As pessoas não podem saber de nada disso, porque elas são perversas. Elas sabem apontar dedos e julgar. Elas riem. Sabem fazer qualquer um sentir-se mal, por isso jamais deixarei que saibam sobre essa parte da minha vida. Elas não têm nada a ver comigo, nada a ver com os desafios que enfrentei e ainda enfrento para me firmar e ser quem sou.
Essas pessoas acham que sou a garota mais correta e fresca da universidade, porque sou metódica e sigo à risca aquele manual de instruções imaginário de como ser o melhor e mais brilhante aluno, se eu quiser uma chance de ter uma vida normal.
Mas elas não sabem disso. Não precisam saber. É por isso que me apelidaram de "Rainha do Gelo". Todos os caras que se aproximam de mim saem com seus corações congelados, como dizem os fofoqueiros.
Porque eu dou um gelo neles.
Ridículo, e ainda vou matar o babaca que inventou essa referência depreciativa para mim.
Dizem que sou fria com os homens. Mas a verdade é que, depois de anos de cuidados para não enlouquecer nem com o trauma nem com o tratamento, criei objetivos para não me perder de novo. Consequentemente não sou aquela garota normal que morre de amores pelo cara mais popular e gostoso de todos os tempos. Não é como se eu tivesse tido escolha. Querendo ou não, endureci um pouco e, pensando bem, talvez as pessoas estejam certas sobre mim. Talvez realmente haja uma pedra de gelo no lugar do meu coração. Mas não me importo, de verdade. Não enquanto eu tiver metas mais importantes para alcançar.
O barulho de livros sendo pousados no espaço desocupado da mesa chama minha atenção. Respiro fundo, concluindo que alguém, inteligentemente, decidiu se sentar à minha mesa ao invés das outras dezenas que estão completamente vazias.
Levanto o rosto das minhas anotações e o olhar de desagrado para a pessoa que se senta de frente para mim é inevitável.
Aiden Blackwell.
Ah, que ótimo.
Ele faz o maior barulho ao colocar os volumes grossos na mesa e isso me irrita. São tantos livros que ocupam a minha metade da superfície do móvel, apertando-me entre os meus próprios livros e caderno.
É a gota d'água.
- Com licença - digo e ele me olha com indiferença. - Você está ocupando a maior parte da mesa.
- E o que tem isso?
Como assim "e o que tem isso"?
- Essa é a minha metade da mesa. - Faço um gesto com o indicador traçando uma linha imaginária sobre a superfície, dividindo-a em duas metades. - Você não pode simplesmente ocupá-la com as suas coisas.
- Por que não? - Seus olhos castanhos parecem querer rir de mim.
- Porque é a minha metade - falo como se fosse óbvio, querendo que ele entenda de uma vez por todas que existe ali um acordo tácito para o uso compartilhado das mesas da biblioteca.
- Mas você não estava usando todo este espaço momentos atrás, estava? - Seu sotaque sexy canadense nunca esteve tão evidente para mim. Talvez o que as garotas dizem sobre ele seja metade verdade, afinal.
- Não - respondo e trato de adicionar para que eu não pareça a egoísta da situação: - Mas suas montanhas de livros ao meu redor estão me sufocando e limitando o meu espaço.
- É mesmo?
A expressão de atrevimento com que ele me olha quase me faz pular em cima dele. No mau sentido, claro.
Ao olhar para as suas tatuagens no braço e pescoço, e o piercing com bolinhas de prata que ele usa verticalmente no final da sobrancelha esquerda, dou um longo suspiro e sacudo a cabeça. Não vale a pena a briga com o tatuado. Volto a enterrar o rosto no caderno e procuro me concentrar com os barulhos ininterruptos que ele começa a fazer ao digitar em seu laptop.
Okay, paciência é o meu nome do meio. Se eu quero ser uma boa psicóloga, tenho que ser uma pessoa benevolente para com o próximo. Com isso em mente, volto para a resolução do estudo de caso.
Quando folhas de papel são arrancadas escandalosamente de um caderno, fazendo-me errar a escrita com o susto, a minha pressão sobe.
- Com licença. - Sorrio com uma amabilidade fingida, como costumo fazer quando estou perdendo a paciência.
Os dois olhos castanhos são inocentemente tirados da tela do laptop para me olhar.
- Sim?
- Eu realmente apreciaria se você não fizesse muito barulho. A placa ali é bem clara quando diz que temos que fazer silêncio. - Aponto com o polegar, ainda sorrindo e, ao olhar para o lado, percebo que outros estudantes estão olhando feio para Aiden.
Com os dedos pairando sobre o teclado, ele olha para a placa ao longe como se nunca a tivesse visto antes.
- Ah, sim. Nunca vi isso antes. É que sou novo por aqui - ele fala como se nunca tivesse visitado uma biblioteca na vida.
Eu me controlo para não revirar os olhos. Sei que ele se transferiu de Toronto para Oregon, mas isso foi quase três anos atrás, então de "novo" ele não tem nada. E é quase impossível que as bibliotecas de Toronto não peçam por silêncio assim como a maior parte das bibliotecas pelos arredores do mundo pediria.
- Claro - murmuro docemente, ainda dando o meu sorriso amável forçado para que ele não se sinta um retardado mental com a desculpa.
Mais uma vez, volto aos meus estudos, amando o silêncio que reina entre nós. Nada de barulhos, nada de papéis sendo rasgados, nem dedos batendo no teclado do laptop. É maravilhoso. E estou quase terminando as minhas ruminações no caderno quando ele decide que engatar uma conversa comigo é a melhor coisa a fazer no momento.
- O que você estuda?
- Psicologia - respondo sucinta, com os olhos baixados para o que escrevo com atenção.
- Eu estudo Direito - ele fala sem que eu tenha perguntado. - Vou me formar esse ano.
- Legal.
Então o tatuado se formará em Direito? Simplesmente não consigo imaginar alguém como ele bancando o advogado. A menos que seja o advogado do Diabo, claro.
Como não dou indícios de que vou contribuir com o andamento da conversa, ele prossegue com o monólogo:
- Você parece bem concentrada no que está fazendo. É algum trabalho importante?
- Mais ou menos isso.
Ele não pode simplesmente ficar calado?
- Você tem cabelos bonitos, Rainha do Gelo - elogia de súbito, deixando-me irritada ao ouvir o apelido pelo qual a maioria dos universitários me chama.
Ergo o rosto e percebo que ele me olha como se eu estivesse sendo leiloada ou algo assim. A minha sobrancelha se levanta como se tivesse vida própria.
Além de me atrapalhar, de me sufocar com as suas montanhas de livros, agora ele está elogiando os meus cabelos? É bom demais para ser verdade. Sei que o fato de ser loira atrai a atenção dos homens, mas certamente não é logo a dele que quero atrair.
Ele abre um sorriso extremamente sedutor para mim e fecha o laptop para em seguida pousar os cotovelos em cima da mesa e me observar mais. Suspiro mais uma vez, vencida, hipnotizada por seus olhos. Ele irradia sensualidade e pura autoconfiança, a qual é derrubada em questão de segundos quando levanto da cadeira e transfiro minhas coisas para a mesa ao lado.
Problema resolvido.
Ele fica ligeiramente atordoado com a minha atitude, depois pigarreia para disfarçar a reação. Sinto uma breve pena do rapaz, que depois passa tão logo me atenho ao trabalho que ainda tenho pela frente.
Os homens nunca se dariam conta de que agir como se fossem o King Kong no Empire State Building não é nada atrativo? Todo o romance sumiu para ser substituído por essa sexualidade crua em alta. Chega a ser meio preocupante, levando-se em conta o número de crianças que estão vindo precocemente ao mundo sem que suas mães estejam preparadas para cuidar delas.
De repente, sou atingida por uma bola de papel que vem aterrissar sobre a minha mesa. Não preciso olhar para saber de onde veio. Francamente, é isso o que o tatuado bad boy faz para chamar a atenção das garotas?
Ignoro a bola amassada, deixando-me ser imersa novamente no meu mundo da lógica e objetividade. Segundos depois, outra bola me acerta no ombro e cai no chão ao meu lado.
Viro a cabeça para ele, um pouco alterada.
- O que você quer?
Ele aponta para a bola de papel que ainda está em cima da minha mesa, sussurrando alguma coisa incompreensível em um tom baixo.
- O quê? - pergunto com o cenho franzido.
Ele aponta de novo e finalmente entendo quando repete:
- Abra.
Sem mais delongas, pego a droga da bola de papel, já impaciente, e abro.
Quer sair comigo?
O que o faz pensar que eu quero sair com alguém como ele? Eu rio sem que possa me conter e escrevo uma breve resposta com um sorriso malevolente.
Não.
Lanço a bola, ao que ele pega no ar com habilidade, e desembrulha. Aiden não parece decepcionado nem nada. Pelo contrário, incrivelmente parece estar se divertindo com a minha negativa.
Ele só pode ser masoquista.
Dou de ombros, meu último olhar caindo sobre as leves ondas de seus cabelos. Não tenho muito tempo para pensar sobre por que fiz isso, pois algo aterrissa sobre minha mesa mais uma vez.
Por que não? Já tem compromisso?
Minha vida realmente não é da conta dele, mas tento ser educada ao escrever:
Tenho.
A bola de papel voa pela biblioteca, despertando a atenção de algumas pessoas que começam a nos lançar olhares curiosos. Isso não é bom. Do jeito que as fofocas correm pelo campus, é provável que já estejam pensando que eu e Aiden estamos transando.
O mal deve ser cortado pela raiz antes que seja tarde demais.
Levanto-me e recolho minhas coisas, colocando tudo dentro da mochila com calma. Eu poderia terminar depois o trabalho na arquibancada do campo de futebol. Quase ninguém vai lá quando não tem treino ou jogo.
Recolho a outra bola de papel que ainda está no chão e a arremesso no lixo, passando em seguida pela porta automática sem olhar para trás.
- Você tem um aquecedor?
Ele, de novo.
Suspiro com força e apresso os passos.
- Para quê?
- Para derreter o gelo que você jogou em mim minutos atrás.
- Eu não joguei nada em você. Apenas respondi sua pergunta.
Ele se cala, meditando sobre minha resposta.
- Por que não quer sair comigo?
- Porque tenho compromisso.
- Não, não tem.
Paro e giro nos calcanhares para ficar cara a cara com ele, e termino percebendo como seu porte é mais alto do que eu esperava.
- Como sabe que não tenho compromisso?
- Bem, está óbvio que não quer sair comigo, seja lá quais forem as suas razões.
- E não quero mesmo - afirmo sem qualquer peso na consciência.
- Não é de se espantar, então, que tenha arranjado essa desculpa para me evitar.
Abro um pouco os olhos, surpresa com sua dedução. Talvez ele esteja acostumado com esse tipo de coisa, já que me pegou tão rápido na mentira.
Dou de ombros como se eu não me importasse com o assunto.
- Tanto faz.
- Eu queria te conhecer melhor, Rainha do Gelo.
Inclino a cabeça para analisar suas linhas faciais interesseiras.
- Não, não quer. Você só quer fazer sexo comigo e depois sair contando por aí que há menos uma na sua lista pessoal de garotas que já pegou.
As sobrancelhas escuras se levantam. Então ele ri, jogando a cabeça para trás.
- De onde tirou essas coisas? Não falei nada disso.
- Vai negar? - inquiro e ele de repente fica sério, mantendo o meu olhar glacial.
Há um longo momento de silêncio, até que ele provavelmente conclui que sou realmente merecedora do apelido que havia recebido, pois revela:
- Eu fiz uma aposta com os meus amigos e gostaria que você me ajudasse com isso.
- Que aposta?
Pigarreando, ele olha para além de mim, como se estivesse se repreendendo por estar contando algo que não queria contar.
- Apostamos que eu conseguiria transar com você em menos de um mês.
Não me surpreendo com o que ele está me contando. Às vezes os homens sabem ser tão idiotas ao fazerem coisas desse tipo.
- E o que ganharia com isso?
- Uma grana alta.
Meus olhos se estreitam com desconfiança.
- E como exatamente eu ajudaria você? Não está achando que vou sair falando por aí de livre e espontânea vontade que transei com alguém como você, está?
- Alguém como eu? - Ele parece ofendido e troca a alça da mochila para o outro ombro, exibindo uma certa irritação. - Claro que não estou pensando nisso. Esse é o tipo de coisa que eu jamais esperaria da Rainha do Gelo.
- Então...?
Ele me olha dos pés à cabeça com um sorriso de lado que me deixa com a sensação de ser nada além do que um pedaço de carne à venda no açougue. Está óbvio que ele não tem problemas algum em me comer. Afinal, eu seria só mais uma que entraria para a lista de Aiden Blackwell, o cara mais desejado do momento.
Que emocionante.
- Pensei que pudéssemos realmente fazer a aposta valer. Pode ser divertido.
O meu espanto é divino diante de tanto atrevimento numa única frase.
Pisco, desorientada.
- Perdão?
- Estou dizendo que poderíamos realmente fazer sexo. Você me pareceu tão franca que pensei que não teria problemas com isso. E você é gostosa.
O silêncio se estabelece entre nós até que subitamente dou uma gargalhada, mal me contendo sobre as minhas pernas que não param de tremer com o ataque de risos.
A testa de Aiden se enruga e toda a luxúria com a qual ele me olhava antes é substituída pela confusão momentânea.
- O que é tão engraçado?
- Você achar que vou fazer sexo com você. Desculpe, mas isso é muito engraçado. De verdade. - Seco com o indicador as lágrimas que caíram e respiro, tentando recuperar o fôlego. - Aiden Blackwell, sei que muito provavelmente não está acostumado a isso, mas eu não tenho razões para transar com você, ainda mais por conta de uma aposta estúpida entre homens que não conseguem controlar a testosterona ao ver uma minissaia.
- Não quer, então?
Nego com a cabeça, ainda rindo da presunção dele.
- Claro que não. A única coisa que eu ganharia com isso seria arrependimento.
Ele ergue uma sobrancelha para mim, inconformado com a minha recusa.
- Bem, poderíamos repartir o prêmio.
O meu sorriso se desfaz tão rápido quanto apareceu enquanto o nome de Jo ressoa infinitas vezes dentro da minha cabeça.
- De quanto é a aposta? - procuro saber.
- Mil dólares.
Engulo a saliva com dificuldade. Seriam quinhentos dólares que iriam parar diretamente nas minhas mãos e consequentemente na minha conta bancária. No ritmo de economia que estou, eu poderia alugar no ano que vem o apartamento no qual estou interessada. Mas se eu adiantasse uma parte... poderia adiantar muitas outras coisas também.
Reflito bastante antes e pergunto com uma careta:
- Nós temos mesmo que transar?
Ele ri.
- Se não quiser, claro que não. Os boatos são mais fortes do que a confirmação dos fatos.
Se eu não quiser?
Esse cara é esquisito.
Olho-o desconfiada, estranhando o modo tão sábio com que falou. Caras como ele geralmente falam uma linguagem mais cheia de gírias. Palavras como "foda" ou "porra" são coisas que ouço bastante por aí dos garotos da minha turma. Mas Aiden Blackwell... ele parece ser uma mistura de bandido com nobreza. E ainda não sei ao certo o porquê de achar isso, ou o que ele estaria também escondendo das pessoas.
Então tenho que dizer que transei com ele para ganhar o dinheiro... Isso soa tão interesseiro e ao mesmo tempo prostituto, como se eu fosse uma vadia que se vende por dinheiro. Ele olha para mim e sei que é exatamente isso que deve estar passando pela sua cabeça.
Imagino um futuro com a minha fama espalhada por aí. As pessoas dizendo que a Rainha do Gelo se tornou a Vadia do Gelo, e o resto dos caras pensariam que sou fácil. Provavelmente o número de assédios aumentaria e eu sei que não aguentaria, caso isso acontecesse.
Nego com a cabeça, dando o meu sorriso amigável forjado.
- Não, obrigada. Prefiro morrer a ter que fingir que transei com você. Até mais, Aiden.
Aceno com a mão e me viro para fazer o caminho para meu prédio, calculando mentalmente os meses que teria que trabalhar para recuperar os quinhentos dólares que perdi tão facilmente.
É uma pena, mas é a realidade.
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