Capítulo 27 - Espiã

~ Wendler

     Joana ainda não acredita. Até que, por fim, ela se levanta.

– Sabe, pode parecer loucura o que eu vi. Porque caramba, prisão. Uma prisão? O tio Alex fazer tudo aquilo? Meu tio nunca levantou sua mão contra mim. Como eu posso acreditar nisso, certo? - ela me encara implorando para o que parece ser normal, que agora, sou eu, um guarda.

     Vou arriscar. Espero não me arrepender.

– Desculpa, não vou mentir pra você.

– O quê? – ela me encara assustada.

Retiro o capacete. Inicialmente, ela me encara por longos instantes, depois balança a cabeça, que não consegui discernir se está incrédula ou outra coisa.

– W-wendler? – sua reação é do mais puro espanto, mas acho que por ter dito meu nome.

– Oi, faz bastante tempo.

     Ela se senta, devagar. Falo para ela tudo que ocorreu na ausência dela.

*

~ Guilherme

     Já faz alguns dias desde que Wendler saiu, Alice parece ligeiramente preocupada, mas acho que não há necessidade, ele sabe se virar. Muito bem, por sinal.

     Acabo de voltar de mais uma missão de patrulhamento. Recentemente, tive algumas para sair daqui, reconhecimento de bases, e destruir alguns armazéns.

     Pensei que fazer isso fosse... Me animar, eu acho. Digo, eu estou fazendo isso mais por ela, do que por qualquer pessoa que aqui esteja...

     Caminho por dentro da base. Mia passa por mim e pede pra que eu ajude com os revolucionários machucados.

     Entro na trigésima porta à esquerda, Ben deu a ideia de enumerar as portas pra facilitar a localização, Mia está cuidando de um brutamontes que até hoje não sei o nome, enquanto eu estou com Maria. Ela tem cabelos loiros e olhos azuis, parece muito com Flora, mas não são irmãs, já perguntei. Ela tem um corte enorme na coxa esquerda, pego um banquinho e o aproximo da cama dela, cumprimento-a e começo a pegar as bandagens que eu trouxe para trocar. Ela parece feliz por eu ter vindo.

*

~ Wendler

     Joana continua a absorver o choque, olhando paralisada para o chão. Continuo a ouvir atentamente o que quer que esteja acontecendo com Eleonora, ouço passos pesados, andando por um longo corredor. Eles param e ouço o barulho de correntes.

      ''Bom dia, princesa! - parece ser a voz do Vergolino. - Em poucos instantes, começaremos uma festa inesquecível, está vendo essa maleta com esses brinquedinhos? Calma, não precisa ter medo. - sua voz calma acaba por fazer suas palavras ficarem - Sabia que seus órgãos são muito desejados? Aparentemente, vocês conseguem produzir células troco independente da idade, desde então, vocês têm sido importantíssimos para o mundo. - seu tom de voz aumenta e ele parece falar com uma felicidade genuína. - "Então, não se preocupe, daqui a pouco vou começar a operação e vou tirar algumas coisas, não se preocupe, matarei você antes de eu começar a cirurgia na sua coluna."

     Esse porco nojento vai morrer hoje. Tento me acalmar, não posso perder a calma e o raciocínio agora. Não agora. Me viro para Joana, que ainda está absorvendo a informação, mas preciso da ajuda dela, como já expliquei sobre o que vim fazer aqui, acho que ela vai concordar. Espero.

– Olha, de verdade, desculpa. Preciso da sua ajuda, acha que consegue usar essa sua sombra e tirar a gente daqui? – pergunto com pressa.

– C-claro. – ela balança a cabeça e reconta a compostura. Levanta em um instante. – Não sei se consigo fazer perfeitamente isso, mas vou tentar. Gui já te falou como eu usava? - ela chora ao falar o nome do irmão, mas acho que é de alegria.

– Ele disse que você se deita e dorme por uns instantes, mas tem que pensar no seu objetivo, antes de cair no sono.

– Eu não vou conseguir dormir, a minha cabeça está muito acelerada agora.

– Certo... Já pensou no seu objetivo? – caminho até ficar nas costas dela.

– Já... Por quê?

     Nocauteio-a com um golpe na nuca e seguro-a para que não caia de rosto no chão, deixando-a encostada na parede. Sinto algo puxar minha calça, olho pra baixo e a vejo. Aceno com a mão, ela soca meu calcanhar fazendo uma dor bem interessante, vamos dizer assim.

     Poucos instantes se passam, até que a porta se abre. Joana acorda e, antes que eu agradeça, ela desce um cascudo na minha cabeça.

– Não reclama. – ela diz séria, mas deixo um riso escapar.

– Tá, tá. – massageio o lugar que ela bateu, que força monstruosa. - Vamos nos separar, eu vou pelo corredor à direita, você pelo da esquerda.

– Certo.

     Ela empunha uma espada, que parece ter sido... Invocada? Não sei como posso chamar isso; e avança pelo corredor dela. Encaro o meu, uso força máxima no primeiro impulso, conseguindo chegar ao fim desse corredor rapidamente, começo a usar o teleporte cinco vezes seguidas, e compenso os segundos que tenho que esperar para reutilizar correndo na minha velocidade máxima, quebro portas ao longo do caminho, e acabo esbarrando com alguns guardas, elimino-os rapidamente com minha cauda, já que não tenho tempo a perder com eles.

      Ouço pelo escuta o som inconfundível de uma furadeira. Droga. Ponho mais força na minha locomoção, passando por uma infinidade de portas. Ouço Eleonora se contorcer, com medo.

     Ao longe, vejo a última porta que está faltando. Um grito ressoa dessa porta que está no final do corredor. Soco a porta com toda a força, fazendo-a voar pra longe, vejo o porco asqueroso atrás de Eleonora, ele tira a furadeira pelo susto, teleporto até ele e meto minha mão em sua garganta, batendo sua cabeça contra a parede, enforcando-o, vejo uma mesa ao meu lado, há poucos pregos, usando a mão livre, esquerda, os pego e enfio dois em cada pulso dele. Ele grita em agonia, deixando lágrimas e catarro preencherem seu rosto.

– P-por favor, me poupe. O que você quer? Seus companheiros? Eu solto eles. Quer dinheiro? Eu tenho muito, muito mesmo. Posso torná-lo rico. Melhor, posso lhe dar isso e mulheres, escravas, quantas quer.

Pego outro prego e puxo a língua desse desgraçado, enfio o prego nela. Fazendo-o olhar para cima agonizando em dor, ele olha pra baixo. Distante.

Uso a cauda e quanto as correntes de ferro. Quando me viro pra Eleonora, ela me abraça. Está tremendo, com medo. Retribuo e volto minha atenção pro porco atrás de mim.

– O que aconteceu com os revolucionários que estavam aqui?

– Eu os matei... Afinal, eles eram todos tão perfeitos. Com aqueles corpos magros e musculosos, tão honestos. Puros. Um deles ousou cuspir no meu rosto.

      Pego um último prego e aponto para o olho dele. Ele se cala, e o corpo fica rígido.

– Os olhos estão ligados ao nosso corpo por um canal onde se encontra o nervo óptico, sabia? Então, deixa eu te contar uma novidade: sabia que se eu puxar seu olho, sem quebrar esse canal, você ainda pode enxergar. Incrível, não? Agora, me diz, quanto deve doer se eu deixar um prego nesse espaço vazio.

      Ouço alguém parar na porta atrás de mim, mesmo tremendo, sinto Eleonora se preparar pra lutar.

– Calma, ela é uma amiga. – Eleonora se acalma.

– Vamos embora daqui.

– Certo. Veja se não tem nada nos corredores, só vou terminar com ele.

– Não há mesmo... Outra maneira?

– Desculpa, não há. Ele pode nos entregar.

       Joana sai da sala à passos rápidos. Vou soltar os outros erros pelo menos, não posso deixar os guardas saírem... Alexander não vai cair nisso. Preciso pensar. Peço para Eleonora sair, nisso, mato o porco desgraçado.

– Como é seu nome? – ouço Joana perguntar pra Eleonora.

     Eleonora recua um pouco, talvez por medo do que quase aconteceu. Vejo um pouco de sangue escorrendo pelas suas costas. Entro novamente na sala e procuro umas bandagens, ao voltar, enrolo ao redor do corpo dela, ela parece desconfortável, então diminui a força.

– Eleonora. É o nome dela.

– É bem longo... Que tal... Elen!

– Se ela não se incomodar.

     Ela apenas acena com a cabeça, concordando.

– Precisamos de um plano. Alexander não vai acreditar que nós fugimos sem mais nem menos.

– Concordo, mas o que?

– Não sei.

– E se – alguns minutos se passam até ela ter uma ideia – nós fizermos o seguinte: soltamos os soldados, digo que tive que matar Vergolino porque, caso contrário, ele o faria conosco. Podemos dizer que horas já se passaram, mas você leva os Erros de volta para onde quer que você esteja.

– Certo, qual a parte que você vê seu irmão?

– Não tem. O prazo de tempo que eu deveria estar aqui é de apenas dois dias, contando com a minha chegada. Cheguei aqui às oito da manhã, por sorte, ainda não é de noite, acha que consegue voltar a sua base e me trazer de volta pra cá?

– Não. Certo, deixarei um escuta com você. Aceita trabalhar comigo para destruir a Liga, certo?

– Sim... Mas ainda serei uma heroína, preciso fingir.

– Eu sei, preciso que me deixe alerta sobre tudo.

– Certo.

      Aproximo-me de Elen e tiro o escuta que coloquei nela, entrego para Joana que o toma.

      Fazemos como Joana planejou, depois de estarmos prontos pra partir, e deixado os Erros em um lugar um pouco longe para que eu os traga comigo, voltamos à cidade pelo elevador. Já anoiteceu. De alguma maneira, os soldados acabaram criando um respeito por Joana, já que os defendeu enquanto estavam apagados. Enquanto eles estão voltando, percebo que o comboio ainda não chegou. Digo para Joana, usando o escuta, que vou devolver o uniforme do guarda dela.

      Pego minhas roupas e deixo o guarda deitado, ainda inconsciente.

      Mais tarde naquela noite, fora da cidade, Joana vai até a duna de areia em que eu estava antes, enquanto os vigiava.

– Então, isso é um adeus.

– Não, só um tchau - digo, brincando. - acho que vou te encontrar de novo.

– É...

– Algum problema?

– O que é que o meu irmão mais gosta de fazer?

– Ah, compor música.

– Sério?

– Sim, mas ele sempre fala que era melhor fazer com você, já que o vocal dele é horrível. – ela ri um pouco pelo último comentário.

– Cuida dele.

– Ok.


Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top