Capítulo Quatro
«Joslin James é apenas uma em possivelmente centenas de mulheres que foram vítimas deste tipo de abuso de autoridade. Desde violações a homicídios – caso em que o restante da família James se insere -, o caso Joslin é apenas um exemplo no grande plano da corrupção infiltrada nas nossas autoridades. A Família James deve ficar nas nossas mentes para sempre. Que os nomes Joslin, Jason, Michael e Mark nunca sejam esquecidos. Que olhemos para eles e percebamos quão quebrado está o sistema de segurança deste país.»
Theo terminou de ler o artigo escrito por Arden Kallis e suspirou de alívio. Quando a vira no café que costumava frequentar, entrara quase em pânico e o seu instinto fora fugir. Sabia que tinha chamado a atenção da jornalista, mas só se apercebera disso quando já era tarde demais. Só conseguia pensar que os seus pais tinham razão, que ainda era demasiado cedo para sair em público tão frequentemente, mas Theo não conseguia evitar. Estava farto de estar fechado em casa e só a sair uma vez a cada dois meses. Theo estava tão cansado da sua vida, algo que não falhava em fazê-lo revirar os olhos de si mesmo. Nunca se sentia satisfeito.
Ler o último artigo da jornalista mais falada dos últimos anos deu-lhe demasiadas emoções. Por um lado, o seu coração partiu pela história que tinha sido contada mas, por outro, alívio por o artigo não ser sobre ele. Embora tivesse sido irracional da sua parte, Theo não poderia desleixar-se. Tinha que estar sempre atento a todas as possibilidades. Se era paranoico da sua parte? Claro que era, mas nunca se poderia ter demasiado cuidado. Era preferível viver paranoico até morrer do que ser descoberto. Se isso acontecesse, ele nunca mais descansaria na vida. O mundo pararia de rodar. O sol aumentaria de temperatura. Todos morreriam.
Theo, acalma-te. Idiota.
Era incrível como a voz que ele ouvia na sua mente nunca era a sua mas a da sua irmã mais velha que, apesar de estar viva e completamente saudável, vivia demasiado longe. Isso não a impedia de ser a voz da consciência de Theo, impedindo-o a toda a hora de fazer as coisas mais idiotas. Ele não saberia se existiria alguma coisa mais idiota do que aquilo que ele já fizera, mas as intervenções da sua irmã continuavam perfeitamente válidas. Theo era um idiota, a voz da sua consciência só fazia o seu trabalho ao relembrá-lo. Ele nunca poderia esquecer-se disso.
- Theo? Onde estás? – ouviu a voz da sua mãe, ao fundo das escadas, à porta de casa.
- No quarto! – gritou de volta, mas saiu da divisão e foi ao encontro da sua mãe. Sorriu ao ver a senhora mais velha, com os cabelos completamente brancos até ao ombro e os braços cheios de sacos de compras. – Queres ajuda?
- Não, Theo, claro que não. Eu sou a Super-Mulher, eu consigo. – Theo revirou os olhos para a resposta sarcástica, não deixando de rir, e desceu as escadas a correr para ajudar a sua mãe com as compras. – Não desças as escadas tão depressa! Qualquer dia ainda partes uma perna.
- Mãe, eu tenho trinta anos. Não precisas de me tratar como uma criança. – ele riu alto, tirando dois sacos de cada uma das mãos da sua mãe. – Cozinha?
- Sim, obrigada. – ela sorriu-lhe, enchendo as suas bochechas de ar e inspirando logo a seguir. – Está tão abafado lá fora. Odeio este tempo.
Theo não respondeu, porque não havia mais nada a dizer. A sua mãe tinha sempre demasiado calor, mesmo que toda a gente estivesse a tremer de frio. Era por isso que a casa em que ele vivia com os seus pais estava sempre gelada; Theo e o seu pai preferiam andar um pouco mais agasalhados do que fazer a sua mãe estar sempre de top e, ainda assim, estar constantemente a suar. A vida era muito mais pacífica para todos se ela não estivesse constantemente a desidratar por estar sempre a suar demasiado. Não era algo que ela controlava, então era sempre mais fácil prevenir.
Era por isso que, apesar de estar um clima ameno na rua, Theo estava dentro de casa com chinelos de inverno, calças de pijama e uma camisola de manga comprida. Ele não se importava, porque também preferia sentir-se mais agasalhado a ter calor. Era sempre um choque quando se saía de casa, mas não era como se ele saísse muito de casa, portanto não tinha problema algum.
A sua mãe seguiu-o até à cozinha falando de tudo o que aconteceu durante o caminho de casa ao supermercado, dentro do supermercado, e do caminho de lá para casa de novo. Theo ouviu a sua mãe atentamente, porque sabia que ela contava tudo por ele, porque ele vivia basicamente pelas histórias que os seus pais tinham. Os seus pais podiam sair de casa, mas ele não. Ele tinha sempre que sair de casa com uma peruca, umas sobrancelhas postiças e um bigode - e óculos de sol, para prevenir. Dava demasiado trabalho para ele o fazer frequentemente, apesar de estar completamente exausto de estar sempre fechado em casa. Já contavam cinco anos daquilo, mas fora ele que escolhera, afinal.
- Viste aquilo que procuravas na revista que pediste?
- Sim. Mais ou menos. Não era sobre mim o artigo, afinal.
- Claro que não! Tu viste-a num café completamente aleatório, Theo. Há cinco anos tu nunca tinhas lá ido, ninguém sabe que agora é o teu sítio preferido.
- Não me podes julgar por ter cuidado, mãe. – comentou apenas, abrindo o frigorífico para começar a arrumar as coisas que lá pertenciam.
- Não, não posso. – a mãe cedeu, mostrando um tom mais suave. – Mas também não te faz bem estares sempre assim tão paranoico. Se calhar tens que comprar uma peruca diferente, para poderes sair mais vezes de casa. Tens trinta anos...vais viver o resto da vida assim?
- Vocês é que não me deixaram mudar de identidade e viver na Jamaica, se bem me lembro.
A sua mãe ignorou-o, como fazia sempre que Theo tentava desviar o assunto com humor, e Theo revirou os olhos, com um sorriso no rosto. Os seus pais – aliás, toda a sua família – sempre apoiaram a sua decisão, por muito difícil que tivesse sido para eles. No entanto, isso não os impedia de se preocuparem com a vida de Theo. Já tinham passado cinco anos e ele ainda tinha medo de sair à rua com medo de ser reconhecido, e ninguém sabia quando chegaria a altura em que ele poderia realmente sair de casa sem ter um ataque de pânico. A sensação de pânico tinha sido exatamente a razão principal para ele ter feito o que fez, mas era algo que o perseguia de qualquer forma, mesmo que fosse num nível muito menor.
Theo estava cansado, mas não diria isso à sua mãe. Ela preocupar-se-ia demasiado.
Depois disso, eles seguiram a rotina de sempre. Theo ajudou a mãe a terminar de arrumar as coisas, ouviu a história do resto do seu dia, e conversaram sobre as coisas que Theo tinha visto na televisão e na Internet. Da parte de Theo nunca havia muito a dizer, mas a sua mãe mostrava-se sempre infinitamente interessada naquilo que ele tinha para lhe contar, algo que o fazia sempre sorrir e sentir-se melhor. O dia anterior tinha trazido a maior emoção dos últimos tempos, com Theo a achar que estava a ser seguido por jornalistas, cinco anos depois de tudo ter acontecido. Com o quinto aniversário a aproximar-se, não faltariam jornalistas a aparecerem na porta da casa dos seus pais a perguntarem sobre tudo, sobre o passado e sobre como estava a sua vida agora. Theo estremecia só de pensar.
- O que é que queres no teu aniversário?
- Eu já tenho tudo o que preciso, mãe. Não tens que me comprar nada. – o olhar que a sua mãe lhe lançou foi o suficiente para o forçar a começar a pensar. – Talvez um livro?
- Hm. – a sua mãe pressionou os lábios um no outro e olhou-o atentamente. – Acho que vou apostar na peruca nova.
- Pronto. – Theo cedeu, rindo alto. – Faz como quiseres, eu vou gostar de qualquer forma.
Meia hora depois, Theo e a sua mãe estavam sentados no maior sofá da sala, em frente à televisão. No canal de notícias, passavam a mesma notícia do artigo que Theo tinha lido. Não falaram do nome da jornalista, claro, mas ambos comentaram na falta de tato de repórteres para aquelas coisas. O artigo de Arden Kallis estava incrivelmente bem escrito – aliás, Theo tinha visto que ela tinha sido nomeada para um Pulitzer naquela semana – e grande parte da informação tinha sido ela a conseguir, notava-se na perfeição. Ainda assim, os canais de noticias e todas as outras empresas de media não se acataram de utilizar a mesma informação nas suas peças.
Theo odiava jornalistas.
Era um ódio que já tinha perto de uma década, porque foram jornalistas que forçaram o início do fim da sua carreira. Talvez mais paparazzi que jornalistas, Theo sabia, mas jornalistas tinham desempenhado um papel também grande em tudo. Foram a causa da ansiedade, do pânico e de tudo aquilo a que isso levou. Ele já sabia melhor que culpar as outras pessoas por aquilo que ele tinha feito, mas era inevitável. A sua vida era bonita antes de os media entrarem nela e, disso, ele não poderia assumir as culpas. Não tinha culpa de se ter tornado famoso, nem de ter tido demasiado sucesso para aquilo que estava preparado.
Ainda assim, ele sabia que não era justo da parte dele generalizar toda uma profissão com base naqueles que estragaram a sua vida. Jornalistas como Arden Kallis ele não odiava, mas receava. Tinha medo de um dia estar frente-a-frente de jornalistas como ela e de o seu maior segredo ser revelado, da mesma forma que o maior segredo de Joslin James tinha sido. Eram casos diferentes, porque Joslin queria partilhar a sua história, mas mostrava igualmente quão facilmente Arden Kallis conseguia adquirir a informação que queria, quando a queria. Theo tinha medo e esse medo causava-lhe pânico.
Quando a notícia do dia terminou, ambos ouviram a porta da frente abrir e, passados segundos, fechar de novo. Os passos pesados deram logo a entender que era o pai de Theo que tinha chegado e, pouco tempo depois, a figura alta e magra do homem em questão apareceu na porta da sala de estar. Viu o seu filho com o braço a envolver a mãe e sorriu, caminhando até ao sofá e sentando-se ao lado da mulher. Com um beijo na testa à mulher e uma mão a despentear os cabelos do filho mais novo, John Levi tornou-se confortável.
- O artigo não era sobre ele, tal como nós dissemos. – John revirou os olhos. – Afinal foi a tal jornalista que escreveu o artigo sobre a morte daquele pobre rapaz.
- O rapaz preto que foi morto por um polícia? – Linda, a sua mulher, assentiu. John olhou para Theo, que observava os pais com um sorriso suave no rosto. – Estás mais descansado?
- Nem por isso. – encolheu os ombros. – Ela viu-me fugir, tenho a certeza. Deve ter ficado desconfiada.
- Mas não te viu. Viu alguém a fugir. – a sua mãe corrigiu, sendo sempre mais racional que o seu filho.
- De qualquer forma, é melhor não arriscar. Não volto ao café nas próximas semanas. – suspirou e mudou de canal, para um onde parecia estar a dar um filme romântico.
John não disse nada, limitando-se a olhar para sua mulher e partilhar o mesmo olhar triste e de arrependimento. Há cinco anos, eles nunca pensariam ter o seu filho de volta, mas ali estava ele, a esconder-se do mundo. Não se arrependiam de tudo o que tinham feito, mas odiavam ver Theo daquela forma, fechado e longe do resto do mundo. Ele costumava ser uma pessoa tão cheia de vida e parecia irreconhecível. A sua carreira marcou-o mais do que qualquer pessoa estava à espera, apesar de ele nunca ter sido destinado para aquela vida. Tinha o talento, tinha o carisma, mas não aguentou o ritmo.
Memórias daquele dia em particular, o dia do vigésimo-quinto aniversário de Theo, estavam sempre a encher os pensamentos de John e de Linda. Sem eles saberem, também enchiam os de Theo, mas eram de perspetivas diferentes. Os pais viam Theo numa maca de hospital a lutar pela vida que tentara terminar e Theo via os comprimidos numa mão trémula, em frente ao espelho, onde ele decidira definitivamente que a sua vida não valia a pena. Cinco anos depois, ali estava ele, com a saúde física melhor que nunca, mas praticamente a dar em doido.
Theo era uma bomba quase a explodir e os seus pais precisavam de fazer alguma coisa.
bem-vindos à vida do meu Theo, o mais lindo do mundo. não me julguem, eu só adoro as personagens principais desta história lmao
a música do Theo é muito a Good Years do Zayn, ouvi-a IMENSAS vezes enquanto escrevia a sua perspetiva e não duvido que tenha emprestado muitas das sensações que o nosso zayn tentou passar na sua música para o Theo. logo perceberão porque é que digo isto, daqui a uns capítulos
espero que estejam a gostar e obrigada a quem tem continuado a ler!
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